segunda-feira, 28 de junho de 2021

O DOGMA DO PURGATÓRIO (X)

 

Capítulo X

Dores do Purgatório - Santa Catarina de Gênova - Santa Teresa - Padre Nieremberg -  A Dor da Perda 

Depois de termos ouvido os teólogos e os doutores da Igreja, ouçamos outros doutores: são santos que falam dos sofrimentos da outra vida e relatam o que Deus lhes deu a conhecer por comunicação sobrenatural. Santa Catarina de Gênova, em sua obra 'Tratado sobre o Purgatório' (cap. II, 8) diz: 'As almas suportam um tormento tão extremo que nenhuma língua pode descrevê-lo, nem o entendimento poderia conceber a menor noção disso, se Deus não o fizesse conhecido por uma graça particular'. 'Nenhuma língua' - acrescenta - 'pode expressar e nenhuma mente pode conceber qualquer ideia do que é o Purgatório. Quanto ao sofrimento, este é igual ao do Inferno'.

Santa Teresa, na obra 'Castelo da Alma', falando da dor da perda, assim se expressa: 'A dor da perda ou a privação da visão de Deus supera todos os sofrimentos mais lancinantes que podemos imaginar, porque as almas, impelidas em direção a Deus como para o centro de sua aspiração, são continuamente repelidas pela sua Justiça. Imagine-se um marinheiro naufragado que, depois de uma longa batalha contra as ondas, chega finalmente ao alcance da costa, apenas para se ver constantemente empurrado para trás por uma mão invisível. Que agonia torturante! No entanto, para as almas do Purgatório são mil vezes maiores!' (parte 6, cap. 11).

Padre Nieremberg, sacerdote da Companhia de Jesus e falecido em odor de santidade em Madri em 1658, relata um fato corrido em Treves e que foi reconhecido pelo Vigário Geral da diocese (de acordo com o padre Rossignolli em Merveilles, 69), como possuindo todas as características da verdade. Na Festa de Todos os Santos, uma jovem de rara piedade viu aparecer diante dela uma senhora conhecida que havia morrido algum tempo antes. A aparição estava vestida de branco, com um véu da mesma cor na cabeça, e segurando na mão um longo rosário, um símbolo da terna devoção que ela sempre professou em favor da Rainha dos Céus. Ela implorou a caridade de sua piedosa amiga, dizendo que tinha feito voto de que três missas fossem celebradas no altar da Virgem Maria e que, não tendo podido cumprir o seu voto, essa dívida aumentava seus sofrimentos. Ela então implorou que ela pagasse essa dívida em seu lugar. 

A jovem concedeu de bom grado a súplica que lhe fôra pedida e, depois de celebradas as três missas, a falecida apareceu de novo, exprimindo a sua alegria e gratidão. Ela sempre continuou a aparecer todos os meses de novembro, e quase sempre na igreja. Sua amiga a viu ali em adoração diante do Santíssimo Sacramento, dominada por um temor que nada pode dar ideia; ainda não podendo ver Deus face a face, ela parecia querer indenizar-se contemplando-o pelo menos sob as espécies eucarísticas. Durante o Santo Sacrifício da Missa, no momento da elevação, o seu rosto tornou-se tão radiante que parecia um serafim descido do céu. A jovem, cheia de admiração, declarou que nunca tinha visto algo tão bonito. 

Enquanto isso, o tempo passava e, não obstante as missas e orações oferecidas por ela, aquela alma sagrada permaneceu em seu exílio, longe dos Tabernáculos Eternos. No dia 3 de dezembro, festa de São Francisco Xavier, quando a sua protetora foi receber a comunhão na Igreja dos Jesuítas, a aparição a acompanhou até a Mesa Sagrada e ficou ao seu lado durante todo o tempo de ação de graças, como se para participar da a felicidade da Sagrada Comunhão e desfrutar da presença de Jesus Cristo. No dia 8 de dezembro, festa da Imaculada Conceição, ela retornou novamente, mas tão brilhante que a amiga não conseguia mais olhar para ela. Ela visivelmente se aproximava do prazo final de sua expiação. Finalmente, no dia 10 de dezembro, durante a Santa Missa, ela apareceu em um estado ainda mais maravilhoso. Depois de fazer uma profunda genuflexão diante do altar, ela agradeceu à piedosa menina por suas orações e subiu ao céu na companhia de seu anjo da guarda.

Algum tempo antes, esta alma sagrada havia feito saber que ela não havia sofrido nada mais do que a dor da perda ou da privação de Deus; mas ela acrescentou que essa privação lhe causou uma tortura intolerável. Esta revelação justifica as palavras de São Crisóstomo na sua 47ª Homilia: 'Imagina todos os tormentos do mundo e não encontrarás igual à privação da visão beatífica de Deus'.

Na verdade, a tortura da dor da perda, de que agora tratamos é, segundo todos os santos e todos os doutores da Igreja, muito mais aguda do que a dor dos sentidos. É verdade que, na vida presente, não podemos compreender isso, porque temos muito pouco conhecimento do Bem Soberano para o qual fomos criados; mas, na outra vida, aquele Bem inefável parece para as almas o que o pão é para o homem faminto ou a água cristalina para o que morre de sede, como a saúde é para o doente torturado pela longanimidade da doença; que faz excitar os seus desejos mais ardentes e que o atormentam sem nunca poder satisfazê-los.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)