quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022
CINCO PASSOS PARA UMA CONFISSÃO PERFEITA
✅ Exame de Consciência: piedade, piedade, piedade
✔ quando foi a minha última confissão?
✔ quais são os meus pecados, cometidos por palavras, ações, pensamentos, livre imaginação?
✔ quais são os meus pecados especialmente mais graves?
✔ quais são os meus pecados veniais, que se repetem mesmo após as minhas confissões?
✔ quais são os meus pecados contra a minha família?
✔ quais são os meus pecados contra a caridade?
✔ quais são os meus pecados por omissão?
👉Utilizar listagens conhecidas e detalhadas de exames de consciência específicos e buscar enquadrar as faltas cometidas no escopo dos Dez Mandamentos da Lei de Deus.
✅ Dor Espiritual: pesar, pesar, pesar
✔ pesar pelas faltas cometidas
✔ pesar por ofender a Deus
✔ pesar por ofender o sacrifício da redenção de Cristo
✔ pesar por abusar das graças recebidas
✔ pesar pelo afastamento da Sagrada Eucaristia
✔ temor de Deus
✔ temor do inferno
👉 Rezar o Ato de Contrição e manifestar, com a dor espiritual, um ato de contrição perfeita.
✅ Confissão Sincera: humilhação, humilhação, humilhação
✔ confessar todos os pecados cometidos
✔ confessar as circunstâncias e agravantes dos pecados cometidos
✔ confessar o inteiro domínio dos pecados cometidos
✔ não minimizar a dimensão dos pecados cometidos
✔ não atenuar as circunstâncias e condicionantes dos pecados cometidos
✔ não esconder por pudor ou vergonha os pecados cometidos
✔ não 'esquecer' pecados que não estão esquecidos
👉 A confissão é um ato de humilhação da criatura suplicando o perdão e a infinita misericórdia do Pai e essa só se manifesta em plenitude diante da verdade e do coração aberto da alma sob contrição perfeita.
✅ Propósito de Emenda: perseverança, perseverança, perseverança
✔ firme resolução de não tornar a pecar (particularmente pecados mortais)
✔ firme resolução de arrependimento sincero ao pecar novamente
✔ firme resolução de santificação pessoal
✔ firme resolução de ser um católico melhor a cada dia
✔ firme resolução de ser homem de oração
✔ firme resolução de ser exemplo
✔ firme resolução de praticar, cada vez mais, a caridade.
👉 Tome o firme propósito de dizer NÃO a tudo que nos afasta de Deus e da caridade para com o próximo.
✅ Penitência Final: reparação, reparação, reparação
✔ reparar as ofensas cometidas contra Deus
✔ satisfazer a culpa dos pecados cometidos
✔ satisfazer a culpa de dano dos pecados cometidos
✔ cumprir integralmente a penitência manifestada pelo confessor
✔ cumprir a penitência no menor prazo possível
✔ cumprir a penitência com contrição e sincero arrependimento
✔ cumprir a restituição devida quando for o caso
👉 Fazer, durante a penitência final, o firme propósito de melhorar como criatura de Deus, como católico, empenhado cada vez mais no projeto de sua santificação pessoal.
terça-feira, 15 de fevereiro de 2022
O DOGMA DO PURGATÓRIO (XXV)
Capítulo XXV
Duração do Purgatório - A Abadia de Latrobe - Cem Anos de Sofrimento por Retardar a Recepção dos Últimos Sacramentos
O seguinte incidente é relatado com autenticação de prova pelo jornal The Monde, no número de abril de 1860. Ocorreu na América, na Abadia dos Beneditinos, situada na aldeia de Latrobe. Uma série de aparições ocorreu durante o ano de 1859. A imprensa americana abordou o assunto e tratou essas graves questões com a sua habitual leviandade. Para acabar com o escândalo, o abade Wirnmer, superior da casa, dirigiu aos jornais a seguinte carta.
'O seguinte documento é uma verdadeira declaração do caso: Em nossa abadia de São Vicente, perto de Latrobe, em 10 de setembro de 1859, um noviço viu a aparição de um beneditino composto com traje completo de coro. Esta aparição se repetiu todos os dias, entre 18 de setembro e 19 de novembro, às onze horas, ao meio-dia ou às duas horas da manhã. Somente no dia 19 de novembro, o noviço interrogou o espírito, na presença de outro membro da comunidade, e perguntou o motivo dessas aparições. Ele respondeu que já havia padecido por setenta e sete anos no Purgatório por ter deixado de celebrar sete missas de obrigação; que ele já havia aparecido em ocasiões diferentes a outros sete beneditinos, mas que estes não lhe deram ouvidos, e que seria obrigado a efetuar outra aparição novamente, após onze anos, se o noviço não viesse em seu auxílio.
Finalmente, o espírito pediu que estas sete missas fossem celebradas na sua intenção; além disso, o noviço deveria permanecer em retiro por sete dias, manter silêncio absoluto e, durante trinta dias, recitar três vezes ao dia o salmo Miserere, com os pés descalços e os braços estendidos em forma de cruz. Todas estas condições foram cumpridas entre 20 de novembro e 25 de dezembro, e nesse dia, após a celebração da última missa, a aparição desapareceu.
Durante esse período o espírito manifestou-se várias vezes, exortando o noviço da maneira mais urgente a rezar pelas almas do Purgatório; pois - disse ele - elas sofrem terrivelmente e são extremamente gratos àqueles que cooperam com a sua libertação. Ele acrescentou - e isso é triste relatar - que, dos cinco sacerdotes que morreram em nossa abadia, nenhum ainda havia entrado no céu, e todos sofriam ainda no Purgatório. Eu não tiro nenhuma conclusão, mas esses são os fatos'.
Esta conta, assinada pela mão do Abade Superior, é um documento histórico incontestável. Quanto à conclusão que o venerável prelado nos deixa tirar, é evidente. Vendo que um religioso está condenado ao Purgatório por setenta e sete anos, basta-nos aprender a necessidade de refletir sobre a duração do castigo futuro, tanto para sacerdotes e religiosos como para os fiéis comuns que vivem em meio à corrupção do mundo.
Uma causa muito frequente desta longa permanência do Purgatório é que muitos se privam de um grande meio estabelecido por Jesus Cristo para encurtá-lo, retardando, quando gravemente doentes, para receber os últimos sacramentos. Estes sacramentos, destinados a preparar as almas para a sua última viagem, a purificá-las dos restos do pecado e a poupá-las das penas da outra vida, exigem, para produzirem os seus efeitos, que o doente os receba com as devidas disposições. Ora, quanto mais são adiadas e as faculdades do doente se enfraquecem, mais defeituosas tornam-se essas disposições. O que eu disse? Muitas vezes acontece, em consequência desse atraso imprudente, é que o doente morra privado dessa ajuda absolutamente necessária. O resultado é que o falecido, desde que não condenado, é lançado nos abismos mais profundos do Purgatório e sobrecarregado com todo o peso de suas dívidas.
Miguel Alix nos fala de um eclesiástico que, em vez de receber prontamente a extrema unção e, com isso, dar um bom exemplo aos fiéis, foi culpado de negligência a esse respeito e foi punido com cem anos de Purgatório. Sabendo que estava gravemente doente e em perigo de morte, este pobre padre deveria ter dado a conhecer o seu estado e recorrer imediatamente aos socorros que a Mãe Igreja reserva aos seus filhos naquela hora suprema. Ele omitiu fazê-lo; ou por uma ilusão comum entre os doentes, ele não quis declarar a gravidade de sua situação ou porque estava sob a influência daquele preconceito fatal que faz com que os cristãos fracos adiem a recepção dos últimos sacramentos, ele não pediu nem pensou em recebê-los.
Mas sabemos como a morte vem às escondidas; o infeliz adiou tanto que morreu sem ter tido tempo de receber o Viático ou a Extrema Unção. Agora, Deus se agradou de fazer uso desta circunstância para dar um grande aviso aos outros. O próprio falecido veio dar a conhecer a um irmão eclesiástico que estava condenado ao Purgatório por cem anos. 'Estou sendo assim punido' - disse ele - 'por ter demorado em receber a graça da última purificação. Se eu tivesse recebido os sacramentos como deveria ter feito, teria escapado da morte pela virtude da extrema unção e teria tido tempo para fazer penitência'.
Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022
A MORTE DE DOM BOSCO
Dom Bosco no seu leito de morte (Turim, 31 de janeiro de 1888)
'Dom Bosco jazia agonizante, estirado imóvel em sua pequena cama de ferro, com os seus filhos fiéis ajoelhados ao seu redor. Era 31 de janeiro do ano de 1888.
Por volta das quinze para as duas da manhã, a agonia começou. O padre [Michele] Rua e o bispo [Giovanni] Cagliero recitaram as orações rituais. O estertor da morte durou até quinze para as cinco. Então, quando o Angelus ressoou dos sinos da nossa igreja [Maria Auxiliadora], a respiração áspera de Dom Bosco se acalmou. Meio minuto depois ele estava morto, ido para o paraíso!'
Com estas palavras simples e tocantes, o secretário Carlo Maria Viglietti, cronista-chefe dos últimos anos de Dom Bosco, encerra a crônica da última doença e morte santa do mestre.
A última doença de Dom Bosco não foi realmente uma doença nova, mas uma recorrência, com sintomas agravados e várias complicações graves, da mesma condição cardio-pulmonar crônica. Assim, quando voltou de sua cavalgada na noite de 20 de dezembro de 1887, e foi para a cama para nunca mais deixá-la, Dom Bosco entrou no último e fatal episódio da doença que o atormentava desde 1846, talvez rastreável até aos seus dias de estudante.
A grave doença de 1846 deveu-se a uma condição brônquica-pulmonar. A bronquite degenerou em pneumonia brônquica. Assim, quando Dom Bosco ainda não tinha 35 anos, já havia desenvolvido uma condição do aparelho respiratório que piorava progressivamente e era causa de repetidas recaídas, entre as quais as doenças de 1871 e a de 1884 foram as mais graves.
Sintomas semelhantes acompanharam a doença final de 1887-88. A essa altura, a oxigenação do sangue na rede alveolar dos pulmões estava tão reduzida que as funções de outros órgãos vitais também foram seriamente afetadas. Esta era a condição de Dom Bosco quando foi colocado na cama em 20 de dezembro de 1887... agora era apenas questão de tempo.
Dom Bosco adormeceu no Senhor às 4h45min da manhã de terça-feira, 31 de janeiro de 1888. Morreu como tinha vivido, em união com Cristo crucificado, invocando a intercessão de Maria, em oração de entrega total a Deus.
A paciente resistência de Dom Bosco à dor excruciante é uma das características mais marcantes da história de seus últimos anos, e mais especialmente de seus últimos dias. 'Faça-se a santa vontade de Deus a meu respeito' foi uma das orações de Dom Bosco mais repetidas. E não apenas este grande e santo homem suportou sua dor; ele fez pouco disso. Ele encontrou forças dentro de si mesmo para disfarçar a sua dor com inteligência e brincadeiras alegres e testemunhou a dissolução do seu corpo com humor e graça.
(Excertos da obra 'Don Bosco: History and Spirit', de Arthur Lenti, 2010)
domingo, 13 de fevereiro de 2022
EVANGELHO DO DOMINGO
'É feliz quem a Deus se confia!' (Sl 1)
13/02/2022 - Sexto Domingo do Tempo Comum
12. O SERMÃO DA MONTANHA
O chamado 'Sermão da Montanha', conjunto de proposições expostas por Jesus naquele tempo a uma 'grande multidão de gente de toda a Judeia e de Jerusalém, do litoral de Tiro e Sidônia' (Lc 6, 17) contempla, de forma admirável, a síntese do Evangelho e da doutrina cristã como legado do Reino dos Céus aos homens de todos os tempos.
O primado desta herança aos homens de todos os tempos se impôs quando o Senhor, diante da enorme multidão, volveu o seu olhar divino aos Apóstolos, antes de proferir as bem-aventuranças que expressam os preceitos e as virtudes que nos santificam e nos tornam herdeiros do Reino dos Céus. Na prática do amor e na busca da perfeição cristã, eis o legado de nossa santificação: 'Bendito o homem que confia no Senhor, cuja esperança é o Senhor' (Jr 17, 7).
Essa via de santidade é expressa pelo Senhor sempre em termos da sua concepção oposta: 'Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus!' (Lc 6, 20) versus 'Mas ai de vós, os ricos, porque tendes já a vossa consolação' (Lc 6, 24). 'Bem-aventurados os que agora tendes fome, porque sereis saciados (Lc 6, 21) versus 'Ai de vós os que estais saciados, porque vireis a ter fome' (Lc 6, 25). 'Bem-aventurados vós, que agora chorais, porque havereis de rir!' (Lc 6, 21) versus 'Ai de vós, que agora rides, porque tereis luto e lágrimas!' (Lc 6, 25). 'Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem, vos expulsarem, vos insultarem e amaldiçoarem o vosso nome, por causa do Filho do Homem!' (Lc 6, 22) versus 'Ai de vós quando todos vos elogiam!' (Lc 6, 26).
Com efeito, os caminhos da vida eterna não se conformam aos atalhos do mundo. Como Filhos de Deus, somos, desde agora, peregrinos do Céu mergulhados nas penumbras da fé e nas vertigens das realidades humanas, na certeza confiante do eterno reencontro: 'Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus' (Lc 6, 23).
sábado, 12 de fevereiro de 2022
OS GRANDES DOCUMENTOS DA IGREJA (IV)
Carta Encíclica HAERENT ANIMO [04 de agosto de 1908]
Papa Pio X (1903 - 1914)
exortação ao clero católico
Preâmbulo
1. Trazemos profundamente gravadas em nossa almas as palavras tremendas do apóstolo dos gentios ao se dirigir aos hebreus (13, 17), lembrando-lhes o dever da obediência aos superiores, e dizendo-lhes com todo o peso de sua autoridade: Ipsi enim pervigilant quasi rationem pro animabus vestris reddituri. Este aviso, não há dúvida, dirige-se a quantos tenham na Igreja autoridade mas, de modo particular, a nós, que, não obstante a nossa insuficiência, fomos chamados por Deus para ocupar o primeiro lugar na hierarquia eclesiástica. Eis porque, noite e dia preocupado com a nossa responsabilidade, temos sempre nosso pensamento e esforços voltados para tudo o que possa garantir, salvaguardar e favorecer o progresso do rebanho do Senhor. Uma coisa sobremaneira nos preocupa: ter, nas Ordens Sagradas, homens que estejam perfeitamente à altura desta missão. Pois estamos convencidos de que isso, sobretudo, nos dá motivos para as melhores e mais confiantes esperanças para o bem da Religião. Eis por que, desde nossa elevação ao Soberano Pontificado, embora bem patentes nos fossem os grandes méritos do clero considerado em geral, julgamos nosso dever exortar instantemente aos nossos veneráveis Irmãos, os Bispos do Orbe Católico, para que empreguem todos os seus cuidados e máxima solicitude em formar o Cristo naqueles que têm por missão formar também o Cristo nos outros. Bem conhecemos a solicitude com que muitos Antístites têm desempenhado essa missão. Sabemos com que vigilância e zelo procuram assiduamente formar o clero na virtude. E queremos não só louvá-los, como também publicamente agradecer-lhes.
2. Felicitamo-nos, é certo, vendo que numerosos padres, inflamados, pelo zelo de seus bispos, de um santo ardor, fazem em si reviver ou crescer a graça de Deus que receberam no dia da ordenação sacerdotal. Todavia, temos ainda a lamentar que alguns outros, em países diversos, não procedam como deviam, de modo a oferecer ao povo cristão, que os contempla como num espelho, o modelo de vida a praticar e um exemplo a seguir. A estes, sobretudo, queremos, por esta carta, abrir nosso coração, que como um coração de pai, à vista do filho doente, palpita de um amor angustiado. E inspirado por este amor, juntamos as nossas exortações às dos bispos. E se elas têm por fim principal trazer a melhores sentimentos os transviados e os tíbios, desejamos todavia que sejam um incentivo também para os outros. Mostramos o caminho que deve cada um esforçar-se por seguir com ardor sempre maior, para que seja, em verdade, segundo a bela expressão do Apóstolo, um homo Dei (1 Tm 6, 11) e corresponda às legítimas esperanças da Igreja.
3. Nada diremos que vos não seja conhecido ou que seja novidade para alguém. Diremos o que é preciso lembrar a todos. E Deus nos dá esperança de que a nossa palavra não deixará de produzir frutos abundantes. E vos rogamos então insistentemente: Renovamini spiritu menus vestrae, et indulte novum hominem qui secundum Deum creatus est in justitia, et sanctitate veritatis (Ef 4, 23-24). A realização deste voto é o mais belo e o mais agradável presente que possais nos oferecer neste quinquagésimo aniversário de nosso sacerdócio. Quanto a nós, quando recordamos sob o olhar de Deus, in animo contato et spiritu humilitatis (Dn 3, 39), os anos já passados de nosso sacerdócio, parece-nos que a dor de aí encontrar o que é muito humano o expiaremos, de certo modo, fazendo por nossas advertências e conselhos, ut ambuletis digne Deo per omnia placentes (Cl 1, 10). Com esta exortação não defendemos tão só vossos interesses. Defendemos também os interesses comuns das nações católicas, porque estes não se separam daquelas. Com efeito. É tal a condição do padre que não pode ser ele bom ou mau só para si. Ao invés, o seu procedimento e maneira de viver são para o povo de importância capital. Que grande dom e precioso é um padre verdadeiramente bom!
I. SANTIDADE DO PADRE
Necessidade da Santidade Sacerdotal
4. Começamos, pois, a nossa exortação, filhos caríssimos, por vos excitar à santidade de vida que requer a vossa dignidade. Efetivamente, quem exerce o sacerdócio, não para si o exerce, mas para os outros também: Omnis namque Pontifex ex hominibus assumptus pro hominibus constituitur in iis quae sunt ad Deum (Hb 5, 1). O próprio Jesus Cristo manifestou o mesmo pensamento quando, para dar a entender em que consiste a ação sacerdotal, comparava os padres ao sal e à luz. O padre é, portanto, a luz do mundo e o sal da terra. Ninguém, sem dúvida, ignora que o padre desempenha a sua missão sobretudo quando prega a verdade cristã. Porém, este mistério não se torna quase inútil, quando ele não apoia com o exemplo o que ensina de viva voz? Os que o escutam poderão dizer injuriosamente, é verdade, mas não de todo sem razão: Confitentur se nosse Deum, factis autem negant (Tt 1, 16). E depois acabariam recusando os ensinamentos do padre, cujas luzes seriam para eles de nenhum proveito. Eis porque o próprio Cristo, feito modelo dos padres, ensinou primeiro com o exemplo e depois com a palavra: Coepit Jesus facere et docere (At 1, 1).
5. O padre, que não faz caso da santidade de vida, também não poderá ser, de maneira alguma, o sal da terra. É impossível que o que está corrompido e contaminado seja fator de conservação. Onde falta a santidade, inevitavelmente se introduz a corrupção. Eis por que, insistindo na comparação, Cristo chama a tais padres sal infatuatum, quod ad nihilum valet ultra nisi ut mittatur foras, e desde então: Conculcetur ab hominibus (Mt 5, 13).
6. Tanto mais patentes e mais certas são estas verdades, quando desempenhamos as funções sacerdotais, não em nosso nome, mas em nome de Jesus Cristo. Diz o Apóstolo: Sic nos existimet homo ut ministros Christi, et dispensatores mysteriorum Dei (1 Cor 4, 1), pro Christo ergo legatione fungimur (2 Cor 5, 20). E é por isto, justamente, que o próprio Cristo nos coloca entre os seus amigos e não entre os seus servos: Jam non dicam vos servos... Vos autem dixi amicos, quia omnia quaecumque audivi a Patre meo, nota feci vobis... Elegi vos et posui vos ut eatis et fructum afferatis (Jo 15, 15-16). Havemos, portanto, de desempenhar o papel de Cristo. A missão que nos deu, temos de cumpri-la, levando em conta o fim que Ele nos propôs. E como é próprio de uma verdadeira amizade estarem de acordo os amigos no querer ou não querer uma coisa, estamos obrigados, como amigos, a pôr de acordo o nosso modo de sentir com o de Jesus Cristo, que é sanctus, innocens, impollutus (Hb 7, 26). Já que por ele fomos enviados, devemos conquistar o espírito dos homens à sua doutrina e à sua lei. E é claro que devemos começar por nós mesmos, observando-as primeiro. Já que participamos do poder de Cristo para livrar as almas dos laços do pecado, tudo devemos fazer para nos preservarmos do pecado. Porém, acima de tudo como ministros do sacrifício por excelência, perpetuamente renovado pela salvação do mundo, devemos pôr-nos no estado de espírito com que o próprio Cristo, Hóstia Imaculada, se ofereceu a Deus no altar da cruz. Porque, se outrora, quando tudo eram apenas aparências e figuras, se exigia tão grande santidade dos padres, qual não será hoje nossa obrigação quando a vítima é Cristo! Poderá ser puro demais quem oferece um tal sacrifício? Não seria preciso que fosse mais imaculada que o raio de sol a mão que divide esta carne, a boca que se enche deste fogo espiritual, a língua que se enrubesce de um sangue tão tremendo? (S. Joan. Chrisost., Hom. LXXXII in Mt, n. 5).
7. Com muita razão, São Carlos Borromeu insistia muito neste ponto nas alocuções ao seu clero: 'Se nos lembrássemos, caríssimos irmãos, de tudo quanto Deus Nosso Senhor depositou de grande e de santo em nossas mãos, que força não teria este pensamento para nos levar a uma vida bem digna e verdadeiramente eclesiástica! Haverá alguma coisa que não tenha o Senhor depositado em nossas mãos depois que nelas depositou seu Filho único, coeterno, igual a Ele? Pôs em minhas mãos todos os tesouros, os seus sacramentos e suas graças. Colocou as almas, o que Ele tem de mais caro, as almas que no seu Amor as preferiu à sua própria vida e as remiu com o seu sangue. Pôs na minha mão o céu com o poder de abri-lo ou de fechá-lo aos outros. Poderia eu ser tão ingrato e, depois de tantos favores e de tanto amor, pecar contra Ele? Hei de lhe faltar com o respeito? Manchar um corpo que é dele? Desonrar esta dignidade, esta vida consagrada ao seu serviço?'
8. Esta santidade de vida, sobre a qual ainda é bom insistir, é objeto de grandes e incessantes preocupações da parte da Igreja. Uma ideia presidiu à instituição dos seminários: os que aí se educam, para ingressarem nas fileiras do clero, não há dúvida, hão de ser instruídos nas letras e nas ciências, mas é mister que sejam ao mesmo tempo bem formados, desde os mais tenros anos, em tudo quanto diz respeito à piedade. E a Igreja, com solicitude maternal, aproveita depois a ocasião em que faz os candidatos subir degrau por degrau, e em largos intervalos, para então prodigalizar em cada etapa as exortações à santidade. É tão doce recordá-las! Desde que nos alistamos na milícia sagrada, quis ela que tomássemos este compromisso formal: Dominus pars hereditatis meae et calicis mei, tu es qui restitues hereditatem meam mihi (Sl 15, 5). Por estas palavras, diz São Jerônimo, o clérigo é adversário de que todo aquele que é a parte do Senhor ou de quem o Senhor é a herança, deve ser tal que possua o Senhor e seja possuído por Ele (Ep. III, ad Nepotianum, n. 5).
9. No momento em que nos eleva ao subdiaconato, que linguagem tão grave é a que nos dirige! Iterum atque iterum considerare debetis attente quod onus hodie ultro appetitis... quod si hunc ordinem susceperitis, amplius non licebit a proposito resilire, sed Deo... perpetuo famulari et castitatem, illo adjuvante, servare oportebit. E para terminar: Si usque nunc fuistis tardi ad Ecclesiam, amodo debetis esse assidui; si usque nunc somnolenti, amodo vigiles... Si usque nunc inhonesti, amodo casti... videte cujus ministerium vobis traditur! Depois, na ocasião em que recebemos o diaconato, a Igreja eleva a Deus por nós esta oração pela boca do bispo: Abundet in eis totius forma virtutis, auctoritas modesta, pudor constans, innocentiae puritas, et spiritualis observantia disciplinae. In moribus eorum praecepta tua futgeant, ut suae castitatis exemplo imitationem sanctam plebs acquirat. O que, porém, mais nos comove ainda são as advertências que ela nos dirige no momento em que nos confere a ordenação sacerdotal: Cum magno timore ad tantum gradum ascendendum est, ac providendum ut caelestis sapientia, probi mores et diuturna justitiae observatio ad id electos commendet... Sit odor vitae vestrae delectamentum Ecclesiae Christi, ut praedicatione ac exemplo aedificetis domum, idest familiam Dei. De todas estas lembranças a mais premente está nesta gravíssima recomendação: Imitamini quod tractatis - a que corresponde o preceito de São Paulo - ut exhibeamus omnem hominem perfectum in Christo Jesu.
10. Tal é o pensamento da Igreja sobre a vida do padre. E ninguém poderia se admirar da unanimidade dos santos Padres e Doutores todos, quando ensinam sobre este ponto uma doutrina que talvez alguns queiram tachar de exagerada. Entretanto, se a examinarmos seriamente, veremos que nada existe de mais verdadeiro nem de mais justo. Eis em resumo o seu pensamento: entre o padre e um homem honesto qualquer, deve haver tanta diferença como do céu para a terra. E o padre deve ter cuidado para que a sua virtude seja isenta de toda censura, não só em matéria grave, como também em matéria leve. O Concilio de Trento nada mais faz senão recordar o julgamento destas autoridades tão veneráveis, quando adverte os clérigos a que fujam até das mais leves faltas, levia etiam delida, quae in ipsis maxima essent (Sess. XXII, de reform. c. I). E se, com efeito, não são, em si, graves, há de se levar em conta a qualidade de quem as comete, pois a eles, bem mais do que aos edifícios de nossos templos, se aplica esta palavra: Domum tuam decet sanctitudo (Sl 92, 5).
Exigências da Santidade Sacerdotal
11. Examinemos, pois, em que consiste esta santidade, cuja falta no padre seria a maior desgraça. A ignorância ou erro nesta matéria seria gravemente perigoso. Há os que pensam e até ensinam que o mérito do padre está em se dedicar inteiramente ao serviço do próximo. E, por isto, não dão importância às virtudes que contribuem para a santificação pessoal, que chamam por isto mesmo virtudes passivas. E julgam que devem consagrar todas as suas forças e todo zelo em cultivar e praticar as virtudes ativas. Esta doutrina é singularmente errônea e perniciosa. É dela que nosso predecessor de feliz memória escreveu com muita sabedoria: 'Pretender que as virtudes cristãs variem com as épocas é esquecer as palavras do Apóstolo: Quos praescivit et praedestinavit conformes fieri imaginis Filii sui (Rm 8, 29). O mestre e modelo de toda santidade é Cristo. E quem quiser entrar na mansão dos bem-aventurados, por ele se deve regular. Ora, Cristo não muda no decorrer dos séculos. É o mesmo ontem e hoje, heri et hodie; ipse et in saecula (Hb 13, 8). Aos homens de todas as idades dirige-se esta palavra: Discite a me quia mitis sum et humilis corde. Por nós e para todos os tempos Cristo se mostrou obediente até à morte: factus obediens usque ad mortem (Fp 2, 8). Vale para todos os tempos a sentença do Apóstolo: Qui sunt Christi, carnem suam crucifixerunt cum vitiis et concupiscentiis (Gl 5, 24)' [Epist. Testem benevolentiae, ao arcebispo de Baltimore, 22 de Janeiro de 1899].
12. Tais ensinamentos, não há dúvida, dirigem-se a todos os fiéis, mas imediatamente aos padres. A eles se aplica especialmente o que o nosso predecessor, no seu zelo apostólico, acrescentava: 'Prouvera a Deus, tivéssemos agora maior número de homens fiéis à prática das virtudes, à imitação dos santos dos séculos passados. E pela humanidade, obediência e abstinência, fossem todos poderosos em obras e em palavras para maior proveito da religião e da civilização'. Convém notar aqui que este pontífice tão prudente fez, e com direito, menção especial da renúncia, que, na linguagem evangélica, se chama abnegação de si mesmo. Porque, sobretudo nesta virtude, caríssimos, é que estão a força, o poder e a eficácia de todo ministério sacerdotal. E do negligenciá-la provém tudo o que no modo de proceder do padre costuma ofender os olhos e as almas dos fiéis. Com efeito, se há padres que não se envergonham de trabalhar com as vistas só no interesse e no lucro; que se metem em negócios seculares e procuram ser os primeiros sempre, desprezando os outros; que se apegam à carne e ao sangue e querem agradar aos homens e contam com as palavras persuasivas da sabedoria humana; é porque se esqueceram do preceito de Cristo e recusaram a condição por Ele imposta: si quis vult post me venire abneget semetipsum (Mt 16, 24).
13. Embora já tivéssemos insistido muito nas exortações precedentes, ainda o fazemos para vos dizer que, afinal de contas, o padre não só por ele tem a obrigação de levar uma vida santa, mas porque é o operário que Cristo veio contratar para a sua vinha: exiit conducere in vineam suam (Mt 20, 1). A ele cabe arrancar a má erva, semear a que é útil e vigiar para que o homem inimigo não venha semear o joio e a má semente. Por isto deve o padre ter cuidado para que o zelo mal-entendido da sua perfeição interior não o leve a omitir os deveres do ministério em serviço do próximo. E assim sendo, como pastor por exemplo, deve pregar a palavra de Deus, ouvir confissões, assistir os enfermos, sobretudo os moribundos, dar instrução religiosa aos ignorantes, consolar os aflitos, reconduzir ao rebanho as ovelhas desgarradas, enfim, imitar em tudo a Cristo, qui pertransiit benefaciendo et sanando omnes oppressos a diabolo (At 10, 38).
14. E isto fazendo, tenha sempre em mente a grave advertência de São Paulo: neque qui plantai est aliquid neque qui rigat; sed qui incrementam dat, Deus (1 Cor 3, 7). Pode acontecer que tenhamos de semear entre lágrimas. Que sejamos obrigados a dispender um trabalho enorme, para garantir o que semeamos. A germinação, entretanto, e a produção da colheita esperada só dependem de Deus e do auxílio onipotente. Outra consideração de grande importância: os homens não passam de instrumentos de que Deus se serve para a salvação das almas. É preciso, então, que sejam eles aptos para que Deus os possa manejar. E por que há de ser assim? Poderá alguém pensar que nossas qualidades naturais ou adquiridas fazem com que Deus seja levado a aproveitar o nosso concurso para a extensão da sua glória? Absolutamente! Quae stulta sunt mundi elegit Deus ut confundat sapientes: et infirma mundi elegit Deus ut confundat fortia: et ignobilia mundi, et contemptibilia elegit Deus, et ea quae non sunt, ut ea quae sunt destrueret (1 Cor 1, 27-28).
15. Só uma coisa, na verdade, é capaz de realizar a união do homem com Deus; só uma coisa faz o homem agradável a Deus e o torna ministro menos indigno da sua misericórdia: a santidade de vida e de costumes. Se faltar ao padre esta santidade, que outra coisa não é senão a ciência supereminente de Jesus Cristo, falta-lhe tudo. Porque, sem a santidade, a própria ciência (e envidamos esforços para desenvolvê-la entre o clero), as habilidades e talentos, por mais úteis que possam ser à Igreja e aos indivíduos, quase sempre têm sido uma fonte de lamentáveis prejuízos. Ao contrário, suponhamos um homem profundamente santo. Fosse o último de todos. Quantas obras maravilhosas não pode empreender e realizar para a salvação do povo de Deus! Testemunhos não faltam e muitos neste ponto, e em todos os tempos. Prova brilhante a temos e não longe de nós, em João Batista Vianney, esse modelo de pastor de almas a quem tivemos a felicidade de conferir as honras da beatificação. Unicamente a santidade nos pode fazer tais como o exige a nossa vocação, isto é, homens crucificados para o mundo e para os quais o mundo está crucificado; homens, cujo modo de proceder se inspira numa vida nova, e que, segundo o conselho do Apóstolo, se mostram verdadeiros ministros de Deus in laboribus, in vigiliis, in jejuniis, in castitate, in scientia, in longanimitate, in suavitate, in Spiritu Sancto, in caritate non fida, in verbo veritatis (2 Cor 6, 5-), homens que só aspiram aos bens celestes e trabalham com todas as forças para conduzir os outros aos mesmos.
II. MEIOS DE ADQUIRIR A SANTIDADE
Oração
16. Ninguém o ignora, a santidade de vida é fruto de nossa vontade, enquanto a esta a graça divina ajuda e fortifica. Eis por que Deus providencia para que jamais nos falte o auxílio da graça, com a condição de a querermos. Este auxílio, antes de tudo, o asseguramos pela nossa aplicação à oração. Entre a oração e a santidade é tão necessária a dependência, que uma não pode existir, de maneira alguma, sem a outra. São João Crisóstomo diz e com uma verdade absoluta: 'a meu ver, é simplesmente impossível viver na virtude sem o auxílio da oração' (De Precatione, orat. I). Santo Agostinho com muita penetração conclui: 'A ciência da virtude é a ciência da oração: Vere novit recte vivere qui recte novit orare (Hom. IV ex 50). Estes ensinamentos, o próprio Cristo no-los inculcou firmemente por exortações frequentes e sobretudo pelo exemplo. Com efeito, para orar retirava-se no deserto ou subia as montanhas. Passava as noites todo absorvido na oração. Ia ao templo frequentemente.
E ainda mesmo em presença das multidões que se acotovelavam em torno dele, orava publicamente com os olhos levantados para o céu. Finalmente, pregado na cruz e já nas
dores da morte, dirigiu ainda, com soluços e lágrimas, súplicas ao Pai.
17. Estejamos absolutamente certos de que o padre que quiser ser fiel à dignidade
do seu meio e da sua missão, deve ter em grande estima a oração e nela se aplicar! Muitas
vezes, no entanto, é de lamentar-se que rezem mais por hábito que com fervor e recitem
com tanto relaxamento o ofício nas horas de obrigação ou se contentem apenas com
algumas breves orações, sem que mais pensem em consagrar a Deus outro momento do
dia em piedosas orações. O padre, mais ainda que qualquer outro, deve obedecer ao preceito
de Cristo: Oportet semper orare (Lc 18, 1), preceito que São Paulo instantemente
recomendava: Orationi instate vigilantes in ea in gratiarum actione (Cl 4, 2); sine
intermissione orate (1 Tes 5, 17). E para a alma que deseja a sua própria santificação e a
salvação do próximo, quantas ocasiões durante o dia precisa para se elevar a Deus. As angústias
íntimas, a violência e obstinação das tentações, a falta de virtude, o insucesso ou a esterilidade
das obras, os pecados e negligências sem número, enfim, o temor dos juízos de Deus, tudo,
tudo, nos excita vivamente a chorar na presença do Senhor, e, depois de obtido o socorro
divino, enriquecermo-nos com os méritos tão fáceis. E não só por nossa causa devemos
chorar. Em face deste dilúvio de crimes que dia a dia se espalha e se estende por toda parte,
a nós, sobretudo, cabe implorar e obter a divina clemência. A nós importa rogar
instantemente a Cristo que, na sua imensa bondade, nos prodigalize todas as suas graças
no Admirável Sacramento: Parce, Domine, parce populo tuo!
18. De grande importância é reservar cada dia um tempo determinado para a
meditação das verdades eternas. Nenhum padre poderá se dispensar disto sem incorrer na
grave censura de negligente e sem prejuízo para sua alma. O Abade São Bernardo,
escrevendo ao Papa Eugênio III, que fora seu discípulo e veio a ser Pontífice de Roma, o
advertia franca e insistentemente que nunca poderia deixar passar um dia sem meditar as
coisas divinas, fossem quais fossem a multiplicidade e importância das ocupações inerentes
ao supremo apostolado. E justificava esta recomendação enumerando com muita sabedoria
as vantagens deste exercício: 'A meditação purifica a fonte donde jorra, isto é, o espírito.
Regula as afeições, dirige os atos, corrige os exageros, governa os costumes, põe
honestidade e ordem na vida: enfim, ela dá a ciência das coisas divinas e também das coisas
humanas. Determina ela o que é confuso, coíbe o que está relaxado, ajunta o que está
disperso, perscruta o oculto, procura o que é verdadeiro, examina o que se parece com a
verdade, descobre o que é disfarçado e enganador. Prevê e regula o que se há de fazer,
reconsidera o que está feito, a fim de que nada fique no espírito que não seja corrigido ou
tenha necessidade de correção. Ela é que nos dias maus pressente a adversidade e a torna
facilmente suportável, quando é mister sofrê-la. São dois bens dos quais o primeiro pertence
à força, outro à prudência' (De Consid., 1. 1, c. 7). Estes serviços que a meditação está
destinada a nos prestar, nos servem de lição e aviso: mostram-nos quanto ela nos é, sobre
todos os pontos de vista, não só útil, para a salvação, mas até necessária.
19. Porque, embora sejam veneráveis e augustas as funções do sacerdócio,
acontece, entretanto, que ao exercê-las os que as desempenham vão perdendo, com o
tempo, algo daquele religioso respeito que elas exigem. E a diminuição gradual de seu fervor
os coloca facilmente no plano inclinado da tibieza e no desgosto das coisas mais santas. E
a isto ajuntai a necessidade que tem o padre de passar a vida, por assim dizer, no meio de
uma sociedade má (in medio nationis pravae); de sorte que, muitas vezes, até exercendo a caridade pastoral, há de temer as insídias ocultas da infernal serpente. É para se admirar
que até almas religiosas se manchem ao contato com a poeira do mundo? Daí a grave
necessidade que tem o padre de, cada dia, voltar à contemplação das verdades eternas, a
fim de que, por esta renovação constante de vigor, fortifique o espírito e a vontade contra as
seduções do mundo.
20. E além do mais, é mister que tenha o padre uma certa facilidade para se elevar e
tender para as coisas do céu, porque é seu dever rigoroso prová-las para as ensinar e
inculcar aos outros. E de tal modo deve colocar a sua vida acima dos interesses humanos,
que todas as obras do seu santo ministério se façam segundo Deus e sob a inspiração e
direção da fé. Ora, o que sobretudo estabelece e sustenta o padre neste estado de alma,
nesta união, por assim dizer, natural com Deus, é a prática tutelar da meditação cotidiana.
Para todo homem que reflete, é isto de tal modo evidente que inútil é insistir mais.
21. Para se achar a lamentável confirmação destas verdades, certamente basta
observar a vida dos padres que pouca importância dão ou se aborrecem da meditação das
coisas eternas. Vede: são homens nos quais o sensus Christi, este preciosíssimo bem, já
quase desapareceu. Sempre voltados para as coisas da terra, seguem as suas vaidades,
andam à cata de frivolidades, são espíritos superficiais. Desempenham as funções sagradas
com relaxamento, com frieza e até mesmo indignamente. Quando acabaram outrora de
receber a unção sacerdotal, preparavam-se cuidadosamente para a recitação do Ofício
Divino. Não queriam parecer estes homens que tentam a Deus. Escolhiam para a oração o
tempo mais propício e o lugar mais recolhido. Procuravam penetrar o sentido das palavras
divinas. Com o salmista, louvavam, gemiam, alegravam-se e expandiam sua alma na
oração. Como eles mudaram depois disto! Ademais, quase nada conservam daquela
piedade viva que lhes inspiravam os mistérios divinos. Como os tabernáculos outrora lhe
eram queridos! Era uma festa para seus corações acharem-se à mesa do Senhor e a ele
atraírem um número cada vez maior de almas piedosas. Antes da missa, como sentiam
necessidade de pureza! Que orações não lhes saíam da alma fervorosa! Durante a
celebração da missa, que respeito na observância integral destas belas e augustas
cerimônias! Que expansões afetuosas na ação de graças! E como no povo felizmente se
difundia o bom odor de Cristo! Rememoramini, recordai-vos, filhos
diletos, rememoramini... pristinos dies! (Hb 10, 32). Então, a vossa alma se abrasava,
nutrida com o ardor da santa meditação.
22. Os que sentem muito pesado este recogitare corde (Jr 12, 11) ou o negligenciam,
já não podem mais dissimular a pobreza que disto resulta para a sua alma. Costumam se
desculpar, pretextando que se lançaram sem reserva no turbilhão do ministério, a fim de
prestarem toda espécie de serviços ao próximo. Erro lamentável! Pela falta do hábito de
conversar com Deus, quando eles falam de Deus aos homens ou lhes dão conselhos para
a prática da vida cristã, falta-lhes o sopro divino, e a palavra evangélica neles parece quase
morta. Sua voz tão elogiada, por mais habilidade e eloquência que tenha, não será jamais
esta voz do Bom Pastor que as ovelhas escutam com proveito. Ressoa e se perde no vácuo.
E muitas vezes é um mau exemplo que importa em desdouro para a religião e detrimento
para os bons. E isto vale também para os outros campos da sua atividade. Aqui, também,
nenhum resultado sério, durável, porque falta o orvalho celeste, que só a oração do que se
humilha, oratio humiliantis se (Ecli 25, 2) atrai com abundância.
23. E aqui não podemos deixar de lamentar amargamente os que, levados por
novidades perniciosas, ousam sustentar uma opinião oposta à nossa, considerando como
perdido o tempo consagrado à oração e à meditação. Cegueira funesta! Prouvera Deus se
examinassem eles seriamente e com lealdade, e reconhecessem afinal até onde chegarão
com esta negligência e desprezo da oração, porque daí é que procedem o orgulho e a
obstinação, daí estes frutos amargos que nosso coração paterno nem quer lembrar e até
quisera absolutamente esquecer. Queira Deus ouvir os nossos votos e lançar sobre os
transviados um olhar misericordioso e neles difundir com abundância o espírito da graça e
da oração, para que chorem os seus erros, e voltem ao caminho que cometeram o erro de
abandonar, e nele andem com mais prudência! Como outrora o Apóstolo (Fp 1, 8), também
nós tomamos Deus por testemunha do quanto os amamos no Coração de Jesus Cristo!
24. Neles, portanto, e em todos vós, filhos caríssimos, fique profundamente gravada
a nossa exortação, que outra não é senão a de Nosso Senhor Jesus Cristo: Videte, vigilate
et orate (Mc 13, 83). Que cada um empregue todo o seu esforço e todo zelo em meditar
piedosamente e, com grande confiança, repita muitas vezes: Domine, doce nos orare (Lc 11,
1). Há uma razão especial e de grande importância, que nos deve levar à meditação: é o
grande poder de conselho e de virtude que nela encontramos e que nos é tão útil para a boa
direção das almas, obra de todas a mais difícil. Vem a propósito, e merece bem ser
lembrada aqui, essa alocução pastoral de São Carlos: 'Compreendei, meus irmãos, que nada
é tão necessário aos eclesiásticos como a oração mental. Deve ela preceder, acompanhar
e seguir a todas as nossas ações. Psallam - diz o Profeta - et intelligam (Sl 100, 2). Cantarei
e entenderei. Administrais os sacramentos? Meditai no que estais fazendo. Celebrais a
Missa? Meditai no que ofereceis. Recitais o Ofício? Meditai no que dizeis e a quem falais.
Dirigis as almas? Pensai no sangue que as purificou' (Ex orationib. ad clerum). É, pois, com
muita razão que a Igreja nos convida a repetir muitas vezes estes pensamentos de
Davi: Beatas vir qui in lege Domini meditatur; voluntas ejus permanet die ac nocte; omnia
quaecumque faciet semper prosperabuntur. Acrescentamos, para excitar o nosso zelo, um
derradeiro motivo e que vale bem por todos os demais. Se o padre é chamado um outro
Cristo, e o é verdadeiramente em virtude do poder que lhe é comunicado, não deve, pois,
em todo o seu modo de proceder ser e parecer conforme ao seu modelo? Summum igitur
studium nostrum sit in vita Jesu Christi meditari (Imit. de Cr., I, 1).
Leitura Espiritual
25. Há de juntar o padre à meditação cotidiana das coisas divinas a leitura dos livros
piedosos, sobretudo dos que foram divinamente inspirados. É o que São Paulo ordenava a
Timóteo: Attende lectioni (1 Tm 4, 13). Assim também São Jerônimo instruía a Nepociano
sobre a vida sacerdotal e lhe inculcava: 'Nunca deixes a leitura dos Livros Santos'. E dava a
seguinte razão: 'Aprende o que deves ensinar, adquire a verdadeira doutrina que tem sido
ensinada, para que estejas em condições de exortar segundo a sã doutrina e refutar os que
a contradizem'. Quanto aproveitam, em verdade, os padres constantemente fiéis a esta
prática! Com que sabor pregam o Cristo! Em vez de lisonjas ao espírito e adulações ao
coração dos seus ouvintes, como os arrastam a se tornarem melhores e os fazem levantar
os desejos para as coisas do céu!
26. E por um outro motivo, ainda, caros filhos, para vosso interesse pessoal, o
preceito do mesmo São Jerônimo: Semper in manu tua sacra sit lectio pode vos ser de resultados fecundos. Quem não sabe a influência enorme, que, sobre o espírito de um
amigo, exerce uma voz amiga que o adverte francamente, o ajuda e aconselha, o repreende,
o levanta e o afasta do erro? Beatus qui invenit amicum verum (Ecli 25, 12)... qui autem
invenit illum, invenit thesaurum (Ib 6, 14). Ora, devemos pôr os livros piedosos no número
dos nossos amigos verdadeiramente fiéis, porque nos chamam eles severamente ao
cumprimento de nossos deveres e das prescrições da verdadeira disciplina. Despertam no
coração as vozes do céu já adormecidas. Sacodem o torpor de nossas boas resoluções.
Não nos deixam adormecer numa tranquilidade enganadora. Reprovam nossas afeições
secretas quando são elas pouco recomendáveis. Descobrem aos imprudentes os perigos
que os esperam muitas vezes. Prestam-nos todos estes bons ofícios e com uma tão discreta
benevolência, que não somente amigos, mas ainda vêm a ser os melhores dentre os
melhores amigos. Temo-los quando os quisermos, sempre ao nosso lado, prontos a cada
momento para nos ajudarem nas necessidades de nossas almas. Deles a voz nunca é dura,
os conselhos sempre desinteressados, e a palavra nunca tímida ou mentirosa.
27. Inúmeros e notáveis exemplos demonstram a eficácia muito salutar dos livros
piedosos. Entretanto ela aparece sobremaneira no exemplo da conversão de Santo
Agostinho, porque foi para ele o ponto de partida dos seus méritos imensos na Igreja: 'Toma
e lê, toma e lê. Eu tomei (as Epístolas do Apóstolo São Paulo) abri e li em silêncio...
Dissiparam-se todas as trevas de minhas dúvidas, como se a luz que dá a paz invadisse o
meu espírito' (Conf. L. VIII, c. 12). Ao contrário, porém, ai! frequentemente em nossos dias,
quantos membros do clero se deixam pouco a pouco invadir pelas trevas da dúvida e
seguem os caminhos perversos do século! A causa é sobretudo esta: preferem aos livros
piedosos e divinos toda sorte de outros livros, e uma multidão de jornais que espalham em
profusão o erro subtil e a corrupção. Vigiai-vos, filhos caríssimos. Não vos fieis na vossa
idade adulta ou avançada. Não abuseis, com a esperança ilusória de que podereis servir
melhor ao bem comum. Ficai nos limites traçados pelas leis da Igreja ou reconhecidos pela
prudência e amor que deveis a vós mesmos. Porque, quem já uma vez deixou o seu espírito
se impregnar destes venenos, raramente escapará das consequências desastrosas do mal,
cujo germe a ele já se incorporou.
Exame de Consciência
28. Ainda mais. O padre tirará maior proveito das leituras piedosas e da meditação
das coisas celestes, se procurar seriamente descobrir até que ponto faz ele passar à prática
da vida as suas leituras e meditações. Nada melhor, a esse respeito, que o conselho de São João Crisóstomo, principalmente aos padres: 'Cada dia, ao se aproximar a noite, antes que
chegue o sono, faze o exame da tua consciência, pede que te preste contas e, se tiveste
maus desejos durante o dia, fere-os, arranca-os e faze deles penitência' (Expos, in Ps 4, n.
8). Este exercício é muito oportuno e fecundo para a virtude cristã. Os mais sábios mestres
da vida espiritual o provam excelentemente e com as melhores razões e com suas
exortações. Há na regra de São Bernardo uma passagem que nos comprazemos em citar:
Como um investigador diligente da pureza da alma, submete tua vida a um exame
cotidiano; indaga com cuidado no que ganhaste ou no que perdeste; aplica-te em
conhecer-te a ti mesmo; põe sob teus olhos todas as tuas faltas; coloca-te em face de ti
mesmo como em face de outrem e, neste estado, bate no teu peito (Meditationes piissimae,
c. V, De quotidiano sui ipsius examine).
29. Seria uma vergonha, se, na verdade, neste ponto se verificasse a palavra de
Cristo: os filhos do século são mais prudentes que os filhos da luz: Filii hujus saeculi,
prudentiores filii lucis (Lc 16, 8). Vede, pois, com que dedicação se ocupam eles dos seus
negócios. Como dão balanço em suas despesas e receitas! Com que atenção, com que rigor
fazem suas contas! Como se afligem com as perdas e tratam vivamente de repará-las!
Quanto a nós, que, talvez, nos abrasamos no desejo de chegar às honras, aumentar nosso
patrimônio, alcançar unicamente o renome e a glória pela nossa ciência, tratamos com
moleza e desgosto o mais importante e o mais difícil de todos os negócios, isto é: a aquisição
da santidade. Apenas de tempos em tempos nos recolhemos para examinar a nossa alma,
e esta é quase como uma terra inculta, como a vinha do preguiçoso da qual está escrito: Per
agrum hominis pigri transivi, et per vineam viri stulti; et ecce totam repleverant urticae et
operierunt superficiem ejus spinae; et maceria lapidum destructa erat (Pv 24, 30-31).
30. Esta situação se agrava pelo fato de que os maus exemplos, que põem sempre
em perigo a própria virtude do padre, vão se multiplicando em torno dele; de sorte que deve
ele redobrar cada dia a vigilância e os generosos esforços. Ora, está provado pela
experiência que todo aquele que se entrega frequentemente a um exame severo dos seus
pensamentos, das suas palavras e ações, tem mais força para detestar e fugir do mal, e ao
mesmo tempo mais zelo e ardor para fazer o bem. Outro fato de experiência é este: quem
recusa comparecer diante deste tribunal, onde a justiça se assenta como juiz e onde a
consciência ao mesmo tempo é acusada e a acusadora, se expõe geralmente a
inconveniências e danos. Em vão procurais nele a circunspecção, tão apreciada num cristão
e que lhe faz evitar as mais pequeninas faltas; a delicadeza de alma que convém de modo
todo particular ao padre, e que se assusta com a mais leve ofensa de Deus. Ainda mais.
Esta incúria, este abandono de si mesmo, vem a tal ponto se agravar que lhe faz até mesmo
negligenciar o Sacramento da Penitência, pelo qual Cristo, da maneira mais eficaz, supriu,
na sua misericórdia insigne, a fraqueza humana.
31. Não se poderia negar e é para deplorar amargamente: Não é raro que um homem
encontre acentos inflamados para afastar os outros do pecado, e não tema, entretanto, para
si coisa semelhante, e se endureça nas suas faltas. Exorta os outros a que não se demorem
em se purificar pelo rito sacramental das manchas da alma, enquanto ele mesmo neste ponto
é de uma tal indolência, que espera meses inteiros para o fazer. Derrama óleo e vinho
salutares nas chagas de outros, e fica ele mesmo ferido à margem do caminho sem se
preocupar em fazer um apelo à mão de um confrade que o socorra e que está, por assim
dizer, ao seu lado! Ai como daí já resultaram e ainda hoje resultam, aqui e acolá,
indignidades diante de Deus e da Igreja, males para o povo cristão e o sacerdócio!
32. E nós, caríssimos filhos, ao pensar, por dever de consciência, nestas coisas tão
tristes, temos a alma toda cheia de amargura e nossa voz se expande gemendo. Infeliz do
padre que desconhece a sua posição e que mancha por suas infidelidades o nome do Deus
Santo, a quem ele deve ser consagrado! Nada mais triste que a corrupção dos melhores: 'Sublime é a dignidade dos padres, mas profunda é a sua queda, se pecam; alegramo-nos
com a sua elevação, mas trememos pela sua queda. Há menos alegria por ter sido elevado,
que tristeza por ter caído das alturas' (S. Hierom. in Ezech., 1. XXIII, c. 44, v. 30). Infeliz,
pois, do padre que, esquecido de si mesmo, perde o zelo da oração, despreza o alimento
das leituras piedosas, que jamais se volta para si mesmo para escutar a voz acusadora da
sua consciência! Nem as feridas de sua alma que se vão envenenando, nem os gemidos da Madre Igreja, tocarão o desgraçado, até que o firam estas ameaças terríveis: Excaeca cor
populi hujus et aures ejus aggrava; et oculos ejus claude: ne forte videat oculis suis, et
auribus suis audiat et corde suo intelligat, et convertatur, et sanem eum (Is 6, 10).
33. Que o Deus rico em misericórdia afaste de vós, filhos caríssimos, este augúrio
triste. Sim, o pedimos a este Deus que vê o nosso coração e que o sabe isento de amargura
para quem quer que seja, mas cheio de um amor de pastor e de pai para com todos. Quae
est enim nostra spes, aut gaudium, aut corona gloriae? nonne vos ante Dominum nostrum
Jesum Christum? (1 Tes 2, 19).
34. Mas todos, onde quer que estejais, vedes que dias maus a Igreja deve hoje viver
por um oculto desígnio de Deus! Considerai e meditai como é santo o dever a que estais
obrigados, pois, honrados com tão alta dignidade, deveis esforçar-vos para estar sempre
com a Igreja e assisti-la nas suas provações e sofrimentos. O clero, hoje mais do que nunca,
tem necessidade de uma virtude não medíocre, de uma virtude absolutamente exemplar,
ardente, ativa, inteiramente disposta, enfim, a fazer grandes coisas e a sofrer muito por
Cristo. E nada há que peçamos tanto a Deus e que desejemos com mais ardor a todos e a
cada um de vós.
35. Em vós, portanto, brilhe com resplendor inalterável a castidade, que é mais belo
ornamento de nossa ordem sacerdotal. Pela beleza desta virtude, o padre se torna
semelhante aos anjos e aparece também mais digno da veneração do povo cristão e produz
frutos santos em maior abundância. Fortifique-se e sempre se desenvolva entre os padres
o respeito e obediência que prometeram solenemente àqueles que o Espírito Santo
estabeleceu para governar a Igreja. Sobretudo, que de coração e de espírito se apeguem
pelos laços de fidelidade, cada dia mais estreitados, às obrigações de respeito e de
submissão que, com toda justiça, se devem à Santa Sé Apostólica. Reine em todos vós
uma caridade que não busca os próprios interesses, a fim de que reprimais os aguilhões da
inveja, a ambição e a cobiça que seduzem os homens. Vossos esforços, numa fraterna
emulação, sejam para o acréscimo da glória divina.
36. A grande multidão dos doentes, cegos, coxos, paralíticos, multidão tão infeliz,
espera o benefício de vossa caridade. Esperam-nos sobretudo estas legiões da juventude,
esperança querida da sociedade e da religião, hoje assediada por todos os lados pela
corrupção e a mentira. Aplicai-vos com ardor não só a ensinar o catecismo. Mas, de novo,
instantemente e mais do que nunca vo-lo recomendamos, procurai merecer de todos a
confiança por todos os meios que vos sugerirem o vosso zelo e a vossa prudência. Assistir,
proteger, curar, pacificar; em tudo isto não tenhais outro desejo, outra sede, senão ganhar
ou conservar as almas para Jesus Cristo. Oh! com que ardor, com que atividade e com que
audácia os inimigos trabalham e se agitam para perdição de uma imensa multidão de almas!
37. Sobretudo é por esta caridade tão grande que a Igreja Católica goza de renome e
se gloria de seu clero. Este clero anuncia a paz cristã, leva a civilização aos povos selvagens.
Por seu apostolado laborioso, não raro fecundado com a efusão de sangue, se estende cada
vez o reinado de Cristo entre estes e a fé cristã brilha e resplandece em novos triunfos. E,
caríssimos filhos, se aos serviços prestados pela vossa caridade correspondem com a
inveja, a injúria e a calúnia, como acontece muitas vezes, não vos deixeis abater pela
tristeza, não vos canseis de fazer o bem (2 Tes 2, 13). Tende diante dos olhos estas
falanges de homens tão notáveis pelo seu número como pelos méritos, e que, à imitação dos apóstolos, no meio dos mais cruéis opróbrios suportados pelo nome de Cristo, ibant
gaudentes, maledicti benedicebant, porque somos nós filhos e irmãos dos santos cujos
nomes resplandecem no livro da vida e dos quais celebra a Igreja os méritos: non inferamus
crimen gloriae nostrae (1 Mac 9, 10).
III. MEIOS DE RENOVAÇÃO ESPIRITUAL
38. Quando o espírito da graça sacerdotal for renovado e desenvolvido em todos os
membros do clero, as outras reformas, sejam quais forem, que projetamos, serão, com o
auxílio de Deus, muito mais eficazes. Por isto pareceu-nos bem acrescentar ao que já
dissemos atrás alguns conselhos práticos sobre os meios de conservar e sustentar esta
graça.
Retiro Anual
39. Em primeiro lugar, há um exercício conhecido e recomendado por todos, mas que
nem todos igualmente praticam: é o retiro, durante o qual a alma se entrega aos exercícios
chamados espirituais. Deve ser feito quanto possível cada ano ou privadamente ou, o que
seria preferível, em comum. Este segundo modo ordinariamente é mais fecundo em
resultados. Tudo, segundo as prescrições episcopais. Nós mesmos já fizemos sentir as
vantagens desta prática quando tomamos, na mesma ordem de ideias, certas decisões
relativas à disciplina do clero romano.
Retiro Mensal
40. Não será de menor proveito para as almas, que um retiro deste gênero se faça
cada mês durante algumas horas, em particular ou em comum. Sentimo-nos felizes em
atestar que este uso já foi introduzido em diversos lugares pela iniciativa dos bispos, e que,
muitas vezes, este mesmo exercício foi presidido por eles.
Associações Sacerdotais
41. Temos também em mente recomendar as associações em que os padres, como
é conveniente a irmãos, se unam por laços particularmente bem estreitos, com a aprovação
e sob a direção da autoridade episcopal. Convém, certamente, que se agrupem em
associações, já para se garantirem mutuamente os recursos na desgraça, já para a defesa
da integridade da sua honra e das suas funções contra os artifícios do inimigo, já por
qualquer outra razão semelhante. Entretanto, importa bem mais que se associem, tendo em
vista o desenvolvimento e cultura da ciência sagrada, visando sobretudo aplicar-se com um
fervor cada vez maior aos deveres da sua santa vocação, e melhor trabalhar pela salvação
das almas, pondo em comum ideias e esforços. Os anais da Igreja atestam que nas épocas
em que os padres daqui e dali viviam em comum, este gênero de associações foi mais
fecundo e de mais felizes resultados. Por que não se poderia restabelecer em nossos dias
algo de semelhante, levando em conta a diversidade dos países e das funções? Não se terá
pois o direito de esperar para a felicidade da Igreja as mesmas vantagens de outrora?
42. Efetivamente não faltam associações deste gênero, munidas da aprovação dos
bispos. São tanto mais úteis quanto nelas se entra logo no começo do sacerdócio. Nós
mesmos, no tempo de nosso episcopado, encorajamos uma delas que a experiência nos
mostrou ser de muita vantagem, e ainda agora continuaremos a cercá-la bem como todas as outras
semelhantes de toda nossa benevolência. Estes esteios da piedade sacerdotal e outros
do mesmo gênero que uma prudência esclarecida sugerir aos bispos, segundo as
circunstâncias, apreciai-as, filhos caríssimos, e utilizai-as de tal maneira que, cada vez
mais, digne ambuletis vocatione qua vocati estis (Ef 4,1). Honrareis o vosso ministério e
cumprireis a vontade de Deus, que é a vossa santificação.
CONCLUSÃO
43. Tal é, efetivamente, o objeto dos nossos pensamentos e solicitudes. E eis por que,
com os olhos levantados para o céu, renovamos muitas vezes por todo o clero a mesma
súplica de Jesus Cristo: Pai Santo, santificai-os: Pater Sancte, sanctifica eos (Jo 17, 11-17).
Alegramo-nos ao pensar que um grande número de fiéis, de todas as condições, se
preocupam vivamente com o vosso bem e o da Igreja e se unem a nós nesta oração. E
também grato nos é saber que há muitas almas generosas, não somente nos claustros, mas
ainda mesmo na vida do século, que, nesta mesma intenção, não cessam de se oferecer a
Deus como vítimas santas. Que o Altíssimo aceite como um perfume suave as suas orações
puras e sublimes e não deixe de ouvir as nossas mais humildes súplicas. Que, na sua
bondade e Providência, venha em nosso auxílio, nós o pedimos e, que do Coração
Sacratíssimo de seu Amado Filho, venham sobre todo o clero tesouros de graças, de
caridade e de todas as virtudes.
44. Enfim, muito grato nos é, caros filhos, exprimir-vos de todo coração nosso
reconhecimento pelos votos de felicidade que nos oferecestes no ardor de vossa piedade
filial, pelo quinquagésimo aniversário de nosso sacerdócio, votos que, retribuindo, também
por vós os formulamos. Queremos confiá-los à Augusta Virgem Maria, Rainha dos
Apóstolos, para que se realizem com maior plenitude. Ela, na verdade, mostrou, pelo
exemplo aos apóstolos, as felizes primícias do sacerdócio, e como deviam perseverar
unânimes na oração até que fossem revestidos da virtude do Alto, E esta virtude certamente ela lhes obteve por suas orações em maior abundância. E ao mesmo tempo a incrementou
e fortificou por seus conselhos, a fim de assegurar maior fecundidade aos seus trabalhos. E, finalmente, desejamos, filhos caríssimos, que a paz de Cristo reine em vossos corações
com a alegria do Espírito Santo. E com estes votos vos damos a todos, de todo coração, a bênção apostólica.
sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022
GLÓRIAS DE MARIA - NOSSA SENHORA DE LOURDES
Em Lourdes, Nossa Senhora apareceu a Bernadette Soubirous, para confirmar o dogma de sua imaculada conceição e para ratificar os valores incomensuráveis da oração, da penitência e da verdadeira vida de devoção a Deus. Nas palavras da própria vidente, eis o relato da primeira de um total de 18 aparições:
'A primeira vez que fui à gruta, era quinta-feira, 11 de fevereiro [quinta-feira anterior à quarta-feira de cinzas]. Após o jantar, saí para recolher galhos secos [a lenha para aquecer a casa simples de sua família havia acabado, durante um período de tempo particularmente frio] com a minha irmã Toinette e uma vizinha chamada Jeanne Abadie. Após procurarmos lenha em outros lugares sem sucesso, nos deparamos com o canal do moinho. Perguntei, então a elas se queriam ver onde a água do canal se encontrava com o Gave [rio Gave]. Elas me responderam que sim. Seguimos o canal do moinho até que nos encontramos diante de uma gruta [gruta de Massabielle], não podendo mais prosseguir.
Jeanne e minha irmã tiraram rapidamente os seus tamancos e atravessaram o fluxo que não era intenso. Após atravessarem o canal, começaram a esfregar os pés, dizendo que a água estava gelada. Isso aumentou a minha preocupação [Bernadette sofria de asma e não podia se expor à friagem]. Chegou a pedir a Jeanne [maior e mais forte que ela] para levá-la nos ombros, no que não foi atendida: 'Se você não consegue vir, fique aí então!' Apanhando galhos secos ali perto, as duas se afastaram e eu as perdi de vista. Tentei ainda buscar uma passagem mais embaixo sem ter que tirar os sapatos, colocando pedras no canal, mas não consegui passar.
(gruta à época das aparições; em primeiro plano, o canal que Bernadette não conseguiu atravessar)
Então, regressei diante da gruta e comecei a tirar os sapatos, para fazer a travessia como elas fizeram. Tinha acabado de tirar a primeira meia, quando ouvi um barulho como de uma ventania. Então girei a cabeça para um lado e para o outro e não vi nada, nem nenhum movimento das folhas das árvores. Continuei a tirar os sapatos e nisso ouvi, mais uma vez, o mesmo barulho. Olhando em direção à gruta, vi um arbusto - um único arbusto encravado nas aberturas da rocha - balançando fortemente. Quase no mesmo tempo, saiu do interior da gruta uma nuvem de cor dourada e, logo depois, uma senhora, jovem e muito bonita, como eu nunca tinha visto antes, veio e se colocou na entrada da abertura, suspensa sobre uma roseira [mais tarde, instada a descrever a aparição, Bernadette a descreveu assim: 'Ela tinha a aparência de uma jovem de dezesseis ou dezessete anos e estava vestida com uma túnica branca, um véu também branco, uma cinta azul e os pés desnudos e ornados com uma rosa dourada em cada pé, ambos encobertos pelas últimas dobras do seu manto. Ela segurava na mão direita um rosário de contas brancas com uma corrente de ouro brilhando como as duas rosas em seus pés].
Sorrindo para mim, fez um sinal para que eu me aproximasse. Eu pensei estar sendo vítima de uma ilusão. Esfreguei os olhos; porém, ao olhar outra vez, ela continuava ali e, sorrindo, me deu a entender que eu não estava enganada. Tirei o meu terço do bolso e, caindo de joelhos, tentei rezá-lo. Queria fazer o sinal da cruz, mas não conseguia sequer levar a mão à testa. A senhora fez com a cabeça um sinal de aprovação e, tomando o seu próprio terço, começou a oração e, somente então, pude fazer o mesmo. Assim que fiz o sinal da cruz, desapareceu o grande medo que sentia e fiquei tranquila. Deixou-me rezar o terço sozinha, somente acompanhando as contas com os dedos, em silêncio; somente rezando oralmente o Gloria comigo, ao final de cada dezena. Ao final da recitação do terço, a senhora voltou ao interior da gruta e a nuvem dourada desapareceu com ela.
Assim que a senhora desapareceu, Jeanne e a minha irmã regressaram, encontrando-me de joelhos no mesmo lugar onde tinham me deixado, fazendo troça da minha covardia. Mergulhei os pés no canal e a água estava bem aquecida e elas aparentemente não se importaram com isso. Perguntei às duas se não haviam visto algo na gruta: 'Não'. Me disseram, então: 'Por que nos pergunta isso?' 'Ó, por nada, por nada', respondi tentando mostrar indiferença. Pensava sem parar em tudo o que tinha acabado de ver. No retorno à casa, diante da grande insistência delas, contei-lhes tudo o que acontecera, pedindo que não dissessem nada a ninguém.
À noite, em casa, durante a oração familiar, fiquei tão perturbada que comecei a chorar. Minha mãe me perguntou qual era o problema. Minha irmã começou a responder por mim e eu fui obrigada a contar os acontecimentos daquele dia. 'São ilusões' - respondeu minha mãe - 'tire essas coisas da cabeça e não volte mais à Massabielle'. Fui dormir, mas eu não conseguia tirar da memória o rosto e o sorriso doce da senhora. Era impossível acreditar que eu podia estar enganada'.
Assinar:
Postagens (Atom)