quinta-feira, 2 de novembro de 2017

SOBRE A NATUREZA DA MORTE


Penso que é útil inquirir sobre a natureza da morte, se deve ser classificada como coisa boa ou má. Se for considerada isoladamente, sem dúvida, deve ser contada como coisa má, porque tudo que for oposto a vida não pode ser coisa boa. Mais ainda, como diz o sábio: 'Deus criou o ser humano incorruptível e o fez à imagem de sua própria natureza: foi por inveja do diabo que a morte entrou no mundo, e experimentam-na os que são do seu partido' (Sb 2,24). Com estas palavras, São Pedro concorda quando diz: 'Pois como o pecado entrou no mundo por um só homem e, através do pecado, a morte; e a morte passou para todos os homens, porque todos pecaram' (Rm 5,12). Se Deus não fez a morte, certamente ela não pode ser boa, porque tudo que Deus fez é bom, de acordo com as palavras do Gênesis: 'E Deus viu tudo quanto havia feito e achou que era muito bom' (Gn 1,31a).

Embora a morte não possa ser considerada como um bem em si mesma, a sabedoria de Deus a temperou como se assim fosse, pois através da morte recebemos muitas graças. Davi exclama: 'É preciosa aos olhos do Senhor a morte dos seus fiéis' (Sl 116, 14) e a Igreja assim proclama na liturgia acerca de Jesus: 'Quem por sua morte destruiu nossa morte, e pela sua ressurreição reconquistou a vida'. Agora, a morte que destruiu a morte e reconquistou a vida não pode ser outra coisa que muito boa. Portanto, senão toda morte pode ser dita boa, pelo menos algumas o são. Por isso Santo Ambrósio não hesitou em escrever um livro intitulado 'Sobre as vantagens da morte', no qual ele claramente prova que a morte, embora produzida pelo pecado, possui vantagens peculiares.

Há ainda outra razão que prova que a morte, mesmo sendo um mal em si mesma, pode, pela graça do Senhor, produzir muitas bençãos. Em primeiro lugar, há esta grande benção, a morte põe um fim às misérias da vida. Jó eloquentemente reclama dos males do seu estado atual: 'O homem nascido da mulher vive pouco tempo e é cheio de muitas misérias; é como uma flor que germina e logo fenece, uma sombra que foge sem parar' (Jó 14,1-2). E o Livro de Eclesiastes diz: 'E julguei os mortos, que estão mortos, mais felizes que os vivos que ainda estão em vida, e mais feliz que uns e outros o aborto que não chegou à existência, aquele que não viu o mal que se comete debaixo do sol' (Ecle 4, 2-3). E ainda se encontra: 'Penosa ocupação foi dada a todos os mortais e pesado jugo oprime os filhos de Adão, desde o dia em que saem do ventre de sua mãe até o dia da volta para a mãe comum: objeto de suas reflexões e temor do seu coração é a descoberta do que os espera, o dia do seu fim' (Eclo 40,1-2). O Apóstolo também fala sobre as misérias da vida: 'Infeliz que eu sou! Quem me libertará deste corpo de morte?' (Rm 7,24)

Destes testemunhos encontrados nas Sagradas Escrituras fica claro que a morte tem uma grande vantagem: nos livrar dos problemas desta vida. Mas ela ainda possui uma mais alta vantagem, porque é o portão de saída de uma prisão e entrada no Paraíso. Isto foi revelado por Nosso Senhor a São João, quando por sua fé encontrava-se exilado na ilha de Patmos: 'Eu ouvi uma voz do céu, que dizia: Escreve: Felizes os mortos que doravante morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, descansem dos seus trabalhos, pois as suas obras os seguem' (Ap 14,13).

Realmente abençoada é a morte dos santos que, por ordem do Rei Eterno, liberta as suas almas da prisão da carne e as conduz aos reinos celestiais, onde as almas dos justos repousam de todos os seus trabalhos, e como recompensa de todos os seus bons trabalhos, recebem a coroa da glória. Para as almas no purgatório, a morte também não é pouco benefício, pois as livra do medo da morte e dá certeza de um dia virem a possuir a felicidade eterna. Até para os pecadores, a morte representa uma vantagem: faz com que deixem de pecar, prevenindo-os de aumentar ainda mais suas punições. Por conta destas excelentes vantagens, a morte para os homens bons não parece terrível, ao contrário, é fruto do amor de Deus. São Paulo assegura: 'Porque para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro' (Fl 1,21) e na Primeira Epístola aos Tessalonicenses, afirma: 'Irmãos, não queremos que ignoreis coisa alguma a respeito dos mortos, para que não vos entristeçais, como os outros homens que não têm esperança' (1Ts 4,13).

Vivia há algum tempo atrás uma senhora muita santa, chamada Catarina Adorna, de Gênova. Era tão inflamada pelo amor de Cristo, que entre tantos ardentes desejos, o que mais solicitava era ser 'dissolvida' e, então, partir para o seu Amado. Apaixonada pela morte, como era, sempre afirmava ser a mais bela e adorável coisa, reclamando apenas que a morte fugia dela que a desejava, mas encontrava a outros que dela fugiam. Por estas considerações podemos concluir que a morte, quando produzida pelo pecado, é coisa ruim; mas, pela graça de Cristo que sofreu a morte por nossa causa, tornou-se de muitas maneiras saudável, amável e desejável.

(Excertos da obra 'A Arte de Morrer Bem', de São Roberto Belarmino)

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

01 DE NOVEMBRO - DIA DE TODOS OS SANTOS


"Vi uma grande multidão que ninguém podia contar, de todas as nações, tribos, povos e línguas. Estavam de pé diante do Trono e diante do Cordeiro, de vestes brancas e palmas na mão."

LADAINHA DE TODOS OS SANTOS

Senhor, tende piedade de nós.
Jesus Cristo, tende piedade de nós. 
Senhor, tende piedade de nós. 
Jesus Cristo, ouvi-nos. 
Jesus Cristo, atendei-nos. 
Deus pai do céu, tende piedade de nós.
Deus filho, redentor do mundo, tende piedade de nós. 
Deus Espírito Santo, tende piedade de nós. 
Santíssima Trindade, que sois um só Deus, tende piedade de nós. 
Santa Maria, rogai por nós. 
Santa Mãe de Deus, rogai por nós. 
Santa Virgem das virgens, rogai por nós. 
São Miguel, rogai por nós. 
São Gabriel, rogai por nós. 
São Rafael, rogai por nós. 
Todos os santos Anjos e Arcanjos, rogai por nós. 
Todos as santas ordens de Espíritos bem-aventurados, rogai por nós. 
São João Batista, rogai por nós. 
São José, rogai por nós. 
Todos os santos patriarcas e profetas, rogai por nós. 


São Pedro, rogai por nós. 
São Paulo, rogai por nós. 
Santo André, rogai por nós. 
São Thiago (Maior), rogai por nós.


São João, rogai por nós. 
São Tomé, rogai por nós. 
São Thiago (Menor), rogai por nós. 
São Felipe, rogai por nós. 


São Bartolomeu, rogai por nós. 
São Mateus, rogai por nós. 
São Simão, rogai por nós. 
São Tadeu, rogai por nós. 


São Matias, rogai por nós. 
São Barnabé, rogai por nós. 
São Lucas, rogai por nós. 
São Marcos, rogai por nós. 

Todos os santos apóstolos e evangelistas, rogai por nós. 
Todos os santos discípulos do Senhor, rogai por nós. 
Todos os santos inocentes, rogai por nós. 


Santo Estêvão, rogai por nós. 
São Lourenço, rogai por nós. 

São Vicente, rogai por nós. 
Santos Fabiano e Sebastião, rogai por nós. 
Santos João e Paulo, rogai por nós.
Santos Cosme e Damião, rogai por nós. 
Santos Gervásio e Protásio, rogai por nós. 
Todos os santos Mártires, rogai por nós. 


São Silvestre, rogai por nós. 
São Gregório, rogai por nós. 
Santo Ambrósio, rogai por nós.
Santo Agostinho, rogai por nós. 

São Jerônimo, rogai por nós. 
São Martim, rogai por nós. 
São Nicolau, rogai por nós. 
Todos os santos pontífices e confessores, rogai por nós. 
Todos os santos doutores, rogai por nós. 
Santo Antônio, rogai por nós. 
São Bento, rogai por nós. 
São Bernardo, rogai por nós. 
São Domingos, rogai por nós. 
São Francisco, rogai por nós.
Todos os santos sacerdotes e levitas, rogai por nós. 
Todos os santos Monges e eremitas, rogai por nós. 
Santa Maria Madalena, rogai por nós. 


Santa Águeda, rogai por nós. 
Santa Lúcia, rogai por nós. 
Santa Inês, rogai por nós. 
Santa Cecília, rogai por nós. 
Santa Anastásia, rogai por nós. 

Todas as santas virgens e viúvas, rogai por nós. 
Todos os santos e santas de Deus, intercedei por nós. 
Sêde propício, perdoai-nos Senhor. 
Sêde propício, ouvi-nos Senhor. 
De todo o mal, livrai-nos Senhor. 
De todo o pecado, livrai-nos Senhor. 
De vossa ira, livrai-nos Senhor. 
Da morte repentina e imprevista, livrai-nos Senhor. 
Das ciladas do demônio, livrai-nos Senhor. 
De toda a ira, ódio e má vontade, livrai-nos Senhor. 
Do espírito da fornicação, livrai-nos Senhor. 
Do raio e da tempestade, livrai-nos Senhor. 
Do flagelo do terremoto, livrai-nos Senhor. 
Da peste da fome e da guerra, livrai-nos Senhor. 
Da morte eterna, livrai-nos Senhor. 
Pelo mistério de vossa santa encarnação, livrai-nos Senhor. 
Pela vossa vinda, livrai-nos Senhor. 
Pelo vosso nascimento, livrai-nos Senhor. 
Por vosso batismo e santo jejum, livrai-nos Senhor. 
Por vossa cruz e paixão, livrai-nos Senhor.
Por vossa morte e sepultura, livrai-nos Senhor. 
Por vossa santa ressurreição, livrai-nos Senhor. 
Por vossa admirável ascensão, livrai-nos Senhor. 
Pela vinda do Espírito Santo Consolador, livrai-nos Senhor. 
No dia do juízo, livrai-nos Senhor. 

Pecadores que somos, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos perdoeis, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que useis de indulgência conosco, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis conduzir-nos à verdadeira penitência, nós vos rogamos: ouvi-nos.
Que nos digneis reagir e conservar a vossa santa igreja, nós vos rogamos: ouvi-nos.
Que nos digneis conservar a vossa santa religião, o Sumo Pontífice e a todos as ordens da hierarquia eclesiástica, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis humilhar os inimigos da igreja, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis conceder a verdadeira paz e concórdia entre os reis e príncipes cristãos, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis conceder a paz e a união a todo o povo cristão, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis chamar à unidade da Igreja, a todos os que estão alheios a ela, para iluminar todos os infiéis com a luz do Evangelho, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que vos digneis confortar-nos e conservar-nos em vosso santo serviço, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que levanteis nossos corações a desejar as coisas celestiais, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis retribuir, com os bens eternos a todos os nossos benfeitores, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que livreis da morte eterna nossas almas e as de nossos irmãos, parentes e benfeitores, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis dar e conservar os frutos da terra, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Que nos digneis conceder o eterno descanso a todos os fiéis defuntos, nós vos rogamos: ouvi-nos.
Que nos digneis atender-nos, nós vos rogamos: ouvi-nos. 
Filho de Deus, nós vos rogamos: ouvi-nos. 

Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, perdoai-nos, Senhor. 
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, ouvi-nos, Senhor. 
Cordeiro de Deus que tirais os pecados do mundo, tende piedade de nós. 
Jesus Cristo, ouvi-nos. 
Jesus Cristo, atendei-nos. 
Senhor, tende piedade de nós. 
Jesus Cristo, tende piedade de nós. 
Senhor, tende piedade de nós. 

Pai nosso... (silêncio) 
E não nos deixeis cair em tentação. Mas livrai-nos do mal. Amém.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

BREVIÁRIO DIGITAL - ILUSTRAÇÕES DE NADAL (VIII)

De Cananaea

61. Evangelho (Mt 15, Mc 7): A mulher cananeia

Sanat IESVS surdum & mutum

62. Evangelho (Mc 7): Jesus cura um surdo-mudo

Transfiguratio Christi

63. Evangelho (Mt 17, Mc 9, Lc 9): A Transfiguração de Jesus 

Villicus accusatur

64. Evangelho (Lc 16): O administrador infiel

De oue centesima, & decima drachma perdita

65. Evangelho (Mt 18, Lc 15): A dracma perdida

De Prodigo Adolescente

66. Evangelho (Lc 15): O filho pródigo

 Profundit omnia Prodigus Adolescens

67. Evangelho (Lc 15): O filho pródigo perde tudo

Fit subulcus

68. Evangelho (Lc 15): O filho pródigo torna-se um cuidador de porcos

Accipit illum pater benignissime

69. Evangelho (Lc 15): O filho pródigo é recebido pelo pai misericordioso 

Docet humilitatem discipulos, & correctionem fraternam

70. Evangelho (Mt 18, Mc 9, Lc 9): A humildade e a correção fraterna

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

DAS COISAS DO MUNDO

🔺 Desejaria exortar-vos a deixar tudo, mas não me atrevo. Se não podeis deixar as coisas do mundo, fazei uso delas de tal modo que não vos prendam a ele, possuindo os bens terrenos sem deixar que vos possuam. Tudo o que possuís esteja sob o domínio do vosso espírito, para que não fiqueis presos pelo amor das coisas terrenas, sendo por elas dominados.

🔺 Usemos as coisas temporais, mas desejemos as eternas. As coisas temporais sejam simples ajuda para a caminhada, mas as eternas, o termo do vosso peregrinar. Tudo o que se passa neste mundo seja considerado como acessório. Que o olhar do nosso espírito se volte para frente, fixando-nos firmemente nos bens futuros que esperamos alcançar.

🔺 Extirpemos radicalmente os vícios, não só das nossas ações mas também dos pensamentos. Que o prazer da carne, o ardor da cobiça e o fogo da ambição não nos afastem da Ceia do Senhor!

🔺 Até as coisas boas que realizamos no mundo, não nos apeguemos a elas, de modo que as coisas agradáveis sirvam ao nosso corpo sem prejudicar o nosso coração.

🔺 Por isso, irmãos, não ousamos dizer-vos que deixeis tudo. Entretanto, se o quiserdes, mesmo possuindo-as, deixareis todas as coisas se tiverdes o coração voltado para o alto. Pois quem põe a serviço da vida todas as coisas necessárias, sem ser por elas dominado, usa do mundo como se dele não usasse. 

🔺Tais coisas estão ao seu serviço, mas sem perturbar o propósito de quem aspira às do alto. Os que assim procedem têm à sua disposição tudo o que é terreno, não como objeto de sua ambição, mas de sua utilidade. Por conseguinte, nada detenha o desejo do vosso espírito, nenhuma afeição vos prenda a este mundo.

🔺 Se amarmos o que é bom, deleite-se o nosso espírito com bens ainda melhores, isto é, os bens celestes. Se tememos o mal, ponhamos diante dos olhos os males eternos. Desse modo, contemplando na eternidade o que mais devemos amar e o que mais devemos temer, não nos deixaremos prender ao que existe na terra.

🔺 Para assim procedermos, contamos com o auxílio do Mediador entre Deus e os homens. Por meio dele logo obteremos tudo, se amarmos realmente aquele que, sendo Deus, vive e reina com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

(Das Homilias sobre os Evangelhos, de São Gregório Magno)

domingo, 29 de outubro de 2017

OS DOIS GRANDES MANDAMENTOS

Páginas do Evangelho - Trigésimo Domingo do Tempo Comum


Eis chegada agora a vez dos fariseus tramarem contra Jesus, após os tentadores de primeira hora, os saduceus, aos quais 'Jesus tinha feito calar' (Mt 22, 34). Cientes das manifestações anteriores das sábias palavras do Senhor e testemunhas de suas respostas demolidoras diante da perfídia e tentativas de manipulação dos saduceus, era preciso adotar desta vez estratégias mais elaboradas e mais ardilosas para induzir Jesus à contradição ou à suspeição da sua observância a algum preceito fundamental da lei judaica.

E, cingidos de todos os cuidados pela astúcia e pela malícia, reuniram-se em grupo, definiram-se pela pergunta mais ardilosa e escolheram 'um deles' (Mt 22, 35) para fazê-la, provavelmente aquele que fosse capaz de apresentar a questão aparentemente de forma mais sincera e espontânea possível: 'Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?' (Mt 22, 36). E, diante a insincera indagação do homem fragilizado pelo pecado, a sabedoria divina vai pronunciar que, é no amor a Deus, traduzido em dois grandes mandamentos, que está contida toda a Lei e toda glória humana.

'Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento!' (Mt 22, 37). O amor de Deus não contempla divisões, parcelas, frações... impõe-se como a perfeição do todo, na manifestação plena de todos os sentidos e de todos os afetos humanos; não permite partilhas ou ressalvas, é o todo em tudo que fazemos, é tudo em todas as coisas que possuímos. De todo coração, de toda a alma, de todo o entendimento constitui a percepção da plenitude sem concessões de natureza alguma, a síntese de que o amor de Deus só pode ser emanado a partir de todas as forças da vontade humana, de toda a potência da alma entregue e disposta a cumprir, como meta única e definitiva, a Santa Vontade de Deus.

O pleno cumprimento da Vontade de Deus exige o amor incondicional ao próximo: ‘Amarás ao teu próximo como a ti mesmo’ (Mt 22, 38). Amor ao próximo no amor de Deus: a face do irmão refletida no espelho de nossa alma, pois o amor sem medidas tem como princípio a caridade. Nas palavras de Jesus ao Doutor da Lei, afloram os dois grandes mandamentos que constituem a síntese da perfeição do amor que, nascido do coração humano, eleva-se sem máculas e em plenitude até o Coração de Deus. 

sábado, 28 de outubro de 2017

FOTO DA SEMANA

EXERCÍCIOS DO AMOR DIVINO A JESUS (Parte IV)

34 exercícios de amor a Jesus, propostos por São João Eudes, em honra e devoção aos 34 anos de sua vida; um ano no ventre de Maria e 33 de sua vida nesta terra.



PARTE IV

29. Ó amigo querido da minha alma e alma do meu amor, quão triste, quão lamentável e digno de se chorar com lágrimas de sangue, é ver-Vos tão pouco amado e isto até por aqueles que fazem a profissão no Vosso nome! Coisa estranha, nada é passível de tanto amor quanto Vós e parece que não há nada neste mundo menos amado do que Vós. Muitos são os que amam o Vosso Paraíso e as consolações e deleites do Vosso amor - mas ai - talvez um em mil seja capaz de Vos amar pura e desinteressadamente como único anelo de amor! Ó Jesus, meu único anelo de amor, somente busco a Vós, somente a Vós desejo e quero Vos amar sem almejar interesses pessoais ou satisfações, nem as consolações e deleites de quem apenas procura Vosso afeto, mas porque sois infinitamente digno de ser amado por serdes quem sois, sem concessão alguma a quaisquer outras considerações.

30. Quando é que eu Vos amarei, ó Jesus, com tal pureza que possa dizer de verdade: 'Meu Jesus é meu Tudo, nada mais me importa; só Ele me basta e nada quero além dEle, que todo o meu amor seja dado somente para Ele e nada para mim. Não, isso não, não são as alegrias do Vosso reino, nem as consolações e deleites que o Vosso amor me inspiram que me fazem buscar a Vós; somente ao Senhor dos Céus e Deus de toda consolação é a quem tendem todos os anelos do meu coração. E ainda que isso possa ofender Vossa bondade infinita, pensar que seria possível a Vós não me outorgar jamais consolo algum ou qualquer recompensa de glória pelo meu amor, ainda assim eu Vos haveria de amar por serdes infinitamente digno de todo o meu afeto e devoção. Não desejo nada mais do que Vos amar e Vos amar sempre e cada vez mais!'

Ó Jesus, instaurai esses sentimentos e disposições no meu coração e nos corações de todos os homens, particularmente naqueles que mais conheceis e naqueles aos quais Vos ouso pedir de maneira muito especial. Ó Rei dos corações, tomai-os para Vós, são Vossos; todos estes pobres corações foram criados para amar-Vos e anseiam agora viver a não ser de amor por Vós. Aceitai essa minha oferta, aniquilando nestes corações tudo o que se opõe ao Vosso santo amor e incendiando-os com as chamas ardorosas do Vosso amor divino!

Ó, meu Salvador, atraí-os a Vós, cativai-os com os Vossas graças, prendei-os ao Vosso Coração e enterrai-os nele para que se façam pertencer ao número daqueles de quem está escrito no Livro da Vida: Vivent corda eorum in saeculum saeculum -  Seus corações viverão pelos séculos dos séculos (Sl 21, 27), ou seja, seus corações viverão no amor divino e amarão para sempre o Deus do amor e da vida. Ah! Quão felizes esses corações que, por toda a eternidade, não farão nada além de amar, louvar e adorar o adorável e amabilíssimo Coração de Jesus! Bendito seja Aquele que os criou para ser glorificado e amado por eles pelos séculos dos séculos!

31. Ó Deus da minha vida e do meu coração, sempre estais em contínuo exercício de amor para comigo, revestindo-me de Vossa graça e de todas as coisas criadas no céu e na terra para me desvelar o amor que me dedicais, como testemunhado por um dos Vossos servos mais ardorosos, Santo Agostinho: coelum, terra e omnia quae in eis sunt non cessant mihi dicere, ut amem Dominum Deum meum - Que o céu, a terra e todos os seus seres não cessem de me alertarem para amar meu Senhor e meu Deus!

Assim, que tudo o que meus ouvidos ouvem, o que os meus olhos vêem, o que os meus outros sentidos sentem ou pressentem; tudo o que a minha memória, a minha inteligência e a minha vontade possam conhecer e desejar; todos os seres visíveis e invisíveis da ordem da natureza, da graça ou da glória; todas as graças recebidas de Vós, ó meu Deus; todos os Vossos anjos e santos, juntamente com os bons exemplos de suas virtudes e ações louváveis; todas as maravilhas que Vós realizastes em Vossa Mãe Santíssima; todas as perfeições de Vossa essência e divina Pessoa; todos os atributos e mistérios de Vossa divindade e de Vossa humanidade; todas as Vossas graças e virtudes; todos os Vossos pensamentos, palavras, ações e sofrimentos; todos os Vossos passos sobre esta terra; todas as gotas de Vosso Sangue derramado; todas as chagas do Vosso corpo; em uma palavra, tudo que existe na ordem da criação e das coisas incriadas, neste tempo e na eternidade, tudo isso, repito, seja como muitas vozes que proclamem sem cessar, ó meu Jesus, a Vossa infinita bondade e invoquem o Vosso amor por mim e me instruam a Vos amar em igual medida: Amo te, amo te; dilige me, quia ipse prior dilexi te. Dilige Dominum Deum tuum ex toto corde tuo, ex tota anima tua et ex totis viribus tuis - Eu Vos amo, eu Vos amo; amai-me também pois Vos amei primeiro. Amai ao Vosso Senhor e Vosso Deus de todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças!

Ah, meu Senhor e meu Deus, quão bom sois Vós e quão maravilhoso é o Vosso amor por mim! Vós me amais e me procurais ansiosamente, com tanto empenho e dedicação, como se tivésseis necessidade de mim, como se eu tivesse algum valor e como se eu pudesse ser de certa forma algo indispensável. Ansiais tomar-me para Vós e temeis perder-me como a um tesouro inestimável, cuja perda ou posse implicasse a perda da própria felicidade; sondais a minha amizade com a insistência de quem só almejasse isso e na expectativa de que Vossa alegria e glória dependessem do meu afeto e do meu amor; o que mais poderíeis fazer para dispor-me? Ó meu Jesus adorado, ó bondade infinita, eu me desfaço nos abismos insondáveis do Vosso amor! Ó bondade excelsa, como podeis ser tão pouco amado e adorado e tão ofendido e perseguido por aqueles a quem amais com paixão infinita?

Ó coração humano tão endurecido, que não se dobra de ternura diante de tantas vozes suplicantes e amorosas! Quanta frieza tens, que não te inflamam tantas chamas do divino amor! Que fazer, meu Salvador? Como resistir a tantas graças de Vossa bondade infinita? O que devo dizer? O que devo responder ao apelo de tantas vozes que me conclamam a amar-Vos? Minha resposta não poderia ser distinta da resposta do Príncipe dos Vossos Apóstolos: 'Amo te, amo te!' - Eu Vos amo, eu Vos amo! Mas, em vez de responder-Vos assim - ó dor imensa, ó vergonha indescritível -  clamei contra Vós como os ímpios judeus, associando a eles a voz dos meus pecados: Tolle, tolle; crucifige eum (Jo 19, 15) - Fora com Ele, fora com Ele; crucifica-O! Todos os meus pecados, toda a minha ingratidão, as minhas inclinações perversas, meu orgulho e meu amor próprio, minha própria vontade e meus outros vícios, todos os meus maus pensamentos, palavras e ações repreensíveis, todo o mau uso que fiz dos meus sentidos corporais e das faculdades e poderes da minha alma, todo o mal que acalentou guarida em meu ser, são outras tantas vozes delirantes que gritam incessantemente contra Vós: Tolle, tolle; crucifige eum  - Fora com Ele, fora com Ele; crucifica-O!

Ó homem ingrato, insensato e deplorável, é assim que amas Aquele que o ama com tanto amor? É assim que correspondes o amor de Quem tem por ti anseios de amor infinito? É assim que retribuis à Bondade Infinita a infinitude dos favores recebidos? Clamo o meu perdão, Senhor, perdão, a Vós suplico arrependido o meu perdão! Que a Vossa misericórdia me envolva nesta súplica de perdão. Que a Vossa Mãe Santíssima, e todos os Vossos Anjos e Santos se prostrem aos Vossos pés para interceder por mim, pecador miserável! Que todas essas vozes que me conclamam o dever e a necessidade de Vos amar em plenitude, também clamem diante do trono da Vossa realeza,  com toda a humildade, contrição e arrependimento que existiram ou hão de existir: 'Perdão, Senhor, perdão; tende misericórdia deste pobre pecador!'

Ó meu Salvador de tão grande misericórdia, eu Vos suplico, recebei e aceitai com agrado os propósitos que Vos faço de ora em diante. Ó meu Jesus tão amado, uma vez que sempre me amastes e tudo fizestes para me oferecer Vosso amor sem medidas, eu quero também corresponder ao Vosso amor com a pequenez de minhas possibilidades e recursos. E, assim, ainda que eu pudesse imaginar o impossível de não ter nenhum dever de Vos amar, eu Vos amaria com toda a minha alma e com todas as forças do meu ser.

Para este fim, se tal for do Vosso agrado, quero que todos os meus pensamentos, palavras e ações, todos os sentidos do meu corpo, todas as faculdades e potências da minha alma, as minhas respirações, as batidas do meu coração, todo fluxo de sangue em minhas veias, todos os instantes da minha vida, tudo o que foi, é e será em minha vida, mesmo os meus pecados se possível for, pelo poder da Vossa sabedoria, prover o bem do mal em favor dos que Vos amais, eu quero, repito, que tudo isso se converta em muitas outras vozes que, com todo o amor do céu e da terra, clamem sem cessar e eternamente para Vós: 'Amo te, amo te, etiam, Domine Jesu, amo te!  - Eu Vos amo, Eu Vos amo; sim Senhor Jesus, eu Vos amo! E se alguma coisa em mim, em meu corpo ou em minha alma, expressar o contrário, que seja arrancada de mim e destruída, aniquilada como pó e lançada aos ventos!

32. Ó meu Jesus, é meu desejo que tudo o que existiu, existe e há de existir, na ordem da natureza, da graça e da glória, tanto no céu como na terra e no próprio inferno, proclame sempre as mesmas palavras repetidas pelos séculos sem fim a meu favor: 'Amo te, amo te, Domine Jesu' - Eu Vos amo, Eu Vos amo, ó meu Senhor Jesus! Este é o propósito a que submeto todas as coisas que, sendo minhas, me foram dadas como meios de vos amar em plenitude, ó Deus único que habita o meu coração!

33. Desejo ainda, ó meu Jesus, que todas as potências de Vossa divindade e de Vossa santa humanidade, todos os Vossos atributos e mistérios, todas as Vossas qualidades, virtudes, pensamentos, palavras, ações e sofrimentos, todas as Vossas chagas sagradas, todas as gotas do Vosso precioso Sangue, todos os momentos da Vossa eternidade (se fosse possível dizer assim) e tudo o que é ou que tenha existido em Vosso corpo, alma e divindade, tudo sejam outras tantas vozes que proclamem sempre por mim a Vós: Amo te, amantissime Jesu, amo te, bonitas infinita, amo te ex toto corde meo, ex tota anima mea, et ex totis viribus meis, et magis atque magis amare volo - Eu Vos amo, ó amantíssimo Jesus; eu Vos amo, bondade infinita; eu Vos amo de todo o meu coração, com toda a minha alma, com todas as minhas forças e, cada vez mais, quero sempre Vos amar!

Em suma, eu quero, ó meu Salvador, se tal for também Vosso desejo, que não haja nada em meu ser e em minha vida, nem no meu corpo, nem na minha alma, nem neste tempo, nem na eternidade, que não seja transformado em chamas ardentes de amor por Vós! E para que esses meus anseios e desejos sejam tão eficazes quanto sinceros, quero que tudo isso se faça, não com minha frágil vontade humana e natural, tão indigna de aspirar por um amor tão sublime, mas pela Vossa divina vontade, ó meu Jesus, onipotente e irresistível, que também passa a ser minha por Vossa concessão à minha mísera condição humana. Ó meu Senhor, se eu tivesse o mesmo poder que a vontade que tenho de Vos amar, tornaria realidade todos estes meus desejos e ânsias por Vosso amor. Mas, o que me cabe é tão somente desejar; o agir é Vosso domínio, porque tudo podeis e sempre satisfazeis os desejos e as vontades daqueles que Vos amam e glorificam!

Concedei-me, pois, eu Vos imploro, estes meus desejos; eu Vos suplico tudo isso pelo que sois, isto é, pela Vossa bondade e misericórdia, por tudo que amais e por todos que Vos amam no céu e na terra, e tudo para Vossa maior glória e louvor! Como Vossa vontade é a minha, e como ouso desejar tudo com a Vossa vontade, tenho a convicção absoluta em Vossa infinita bondade que todos os meus anseios serão cumpridos, de acordo com os Vossos santos desígnios e as intenções propícias à Vossa glória e realeza.

34. Ó bom Jesus, quando será que nada terei em mim que se oponha ao Vosso amor? Eu compreendo bem: isso não pode acontecer neste mundo, mas apenas no céu. Ó céu, como o desejo, pois somente então serei capaz de amar Jesus dignamente, somente então há de reinar em plenitude o amor divino, e somente então os corações poderão vibrar unicamente por amor a Deus! Ó terra, ó mundo, ó corpo, prisão escura da minha alma, quão insustentáveis sois! Ai de mim, quem me livrará desse corpo carnal e perecível? Será preciso ainda permanecer por muitos anos neste miserável exílio, nesta terra inóspita e hostil, nesses lugares de pecado e maldição?

E quando há de chegar o dia, a hora e o instante tão ansiados em que eu, finalmente, possa começar a amar perfeitamente o meu Deus e Salvador? Ah! meu Jesus, meu querido Jesus, meu amadíssimo Jesus, não poderei nunca Vos amar como mereceis! Ó Deus das misericórdias, não havereis de olhar com compaixão o meu infortúnio e não ouvireis as minhas súplicas e gemidos? Meu Senhor e meu Deus, ouvi as minhas súplicas; a Vós clamo, a Vós anseio e a Vós me ofereço por inteiro no meu amor humano; Vós bem o sabeis: ninguém mais quero nem no céu nem na terra, na vida ou na morte, pois somente Vós sois digno de todo o meu amor.

Ó Mãe de Jesus, ó anjos, santos e santas de Deus, ó criaturas de Deus! Tende piedade do meu horrível martírio; intercedei por mim diante de Jesus, para que amando-O sobre todas as coisas e com amor de plenitude, seja manifesto que nada anseio neste tempo e na eternidade que não seja tão somente o puro amor: nem o céu, nem as glórias e as belezas do Paraíso, nem os deleites das graças, mas somente e tão somente o amor de Jesus. Ó meu Jesus, este amor é a razão do meu viver e para o qual anseio desígnios da Vossa divina misericórdia para que, consumido nas chamas ardentes do puro amor, eu possa estar em breve no reino eterno do Vosso amor! 'Amém. Vinde, Senhor Jesus!' (Ap 22, 20). Vinde, minha vida; vinde minha luz, meu amor, meu tudo, vinde até mim para aniquilar tudo no meu ser que possa se opor ao império do Vosso amor. Vinde me envolver num incêndio de amor a Vós, Senhor! Vinde e atraí-me a Vós e me transporteis ao lugar onde reina o amor verdadeiro e perfeito, o lugar onde tudo é amor e amor eterno, contínuo, indefinido e invariável. Ó meu Jesus, meu Jesus, a quem amo de todo o meu coração, vinde, não tardeis!

(versão para o português do autor do blog)