quinta-feira, 18 de maio de 2017

'NADA, ABSOLUTAMENTE NADA, PREFIRAM A CRISTO'

Antes de tudo, quando quiseres realizar algo de bom, pede a Deus com oração muito insistente que seja plenamente realizado por Ele. Pois já tendo se dignado contar-nos entre o número de seus filhos, que Ele nunca venha a se entristecer por causa de nossas más ações. Assim, devemos em todo tempo por a seu serviço os bens que nos concedeu, para não acontecer que, como Pai irado, venha a deserdar seus filhos; ou também, qual Senhor temível, irritado com os nossos pecados, nos entregue ao castigo eterno, como péssimos servos que não O quiseram seguir para a glória.

Levantemo-nos, enfim, pois a Escritura nos desperta dizendo: 'Já é hora de levantarmos do sono' (Rm 13,11). Com os olhos abertos para a luz deífica e os ouvidos atentos, ouçamos a exortação que a voz divina nos dirige todos os dias: 'Oxalá, ouvísseis hoje a sua voz: não fecheis os corações' (Sl 94,8) e ainda: 'Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às Igrejas' (Ap 2,7). E o que diz Ele? 'Meus filhos, vinde agora e escutai-me: vou ensinar-vos o temor do Senhor' (Sl 33,12). 'Correi, enquanto tendes a luz da vida, para que as trevas não vos alcancem' (Jo 12,35).

Procurando o Senhor o seu operário, na multidão do povo ao qual dirige estas palavras, diz ainda: 'Qual o homem que não ama sua vida, procurando ser feliz todos os dias?' (Sl 33,13). E se tu, ao ouvires este convite, responderes: 'Eu', Deus te dirá: 'Se queres possuir a verdadeira e perpétua vida, afasta a tua língua da maldade e teus lábios de palavras mentirosas. Evita o mal e faze o bem, procura a paz e vai com ela em seu caminho' (Sl 33,14-15). E quando fizeres isto, então meus olhos estarão sobre ti e meus ouvidos atentos às tuas preces; e antes mesmo que me invoques, eu te direi: 'Eis-me aqui' (Is 58,9).

Que há de mais doce para nós, caríssimos irmãos, do que esta voz do Senhor que nos convida? Vede como o Senhor, na sua bondade, nos mostra o caminho da vida! Cingidos, pois, os nossos rins com a fé e a prática das boas ações, guiados pelo Evangelho, trilhemos os seus caminhos, a fim de merecermos ver Aquele que nos chama ao seu reino (1Ts 2,12). Se queremos habitar na tenda real do acampamento desse reino, é preciso correr pelo caminho das boas ações; de outra forma, nunca chegaremos lá.

Assim como há um zelo mau de amargura, que afasta de Deus e conduz ao inferno, assim também há um zelo bom, que nos separa dos vícios e conduz a Deus. É este zelo que os monges devem por em prática com amor ferventíssimo, isto é, antecipando-se uns aos outros em atenções recíprocas (Rm 12,10). Tolerem pacientissimamente as suas fraquezas, físicas ou morais; rivalizem em prestar mútua obediência; ninguém procure o que julga útil para si, mas sobretudo o que o é para o outro; ponham em ação castamente a caridade fraterna; temam a Deus com amor; amem o seu abade com sincera e humilde caridade; nada, absolutamente nada, prefiram a Cristo; e que Ele nos conduza a todos para a vida eterna.

(Das Regras de São Bento)

quarta-feira, 17 de maio de 2017

UMA IGREJA: SANTA, CATÓLICA E APOSTÓLICA

Ungidos pela fé, somos obrigados a acreditar e manter que a Igreja é única, santa, católica e também apostólica. Nós acreditamos com firmeza e confessamos com simplicidade que fora dela não há salvação, nem remissão dos pecados, como declara o Esposo no Cântico: 'Uma só é minha pomba sem defeito. Uma só a preferida pela mãe que a gerou' (Ct 6,9). Ela representa o único corpo místico, cuja cabeça é Cristo e Deus é a cabeça de Cristo. Nela existe 'um só Senhor, uma só fé e um só batismo' (Ef 4,5). De fato, apenas uma foi a arca de Noé na época do dilúvio; prefigurando uma única Igreja; encerrada com 'um côvado' (Gn 6,16), teve um único piloto e um único chefe: Noé. Como lemos, tudo o que existia fora dela, sobre a terra, foi destruído.

Nós veneramos esta Igreja como única, pois o Senhor disse pela boca do profeta: 'Salva minha vida da espada, meu único ser, da pata do cão' (Sl 21,21). Ao mesmo tempo que Ele pediu pela alma - ou seja, pela cabeça - também pediu pelo corpo, porque chamou o seu corpo como único, isto é, a Igreja, por causa da unidade da Igreja no seu esposo, na fé, nos sacramentos e na caridade. Ela é a veste sem costura (Jo 19,23) do Salvador, que não foi dividida, mas tirada à sorte. Por isso, esta Igreja, una e única, tem um só corpo e uma só cabeça, e não duas como um monstro: é Cristo e Pedro, vigário de Cristo, e o sucessor de Pedro, conforme o que disse o Senhor ao próprio Pedro: 'Apascenta as minhas ovelhas' (Jo 21,17). Disse minhas em geral e não esta ou aquela em particular, de forma que se subentende que todas lhe foram confiadas. Assim, se os gregos ou outros dizem que não foram confiados a Pedro e aos seus sucessores, é necessário que reconheçam que não fazem parte das ovelhas de Cristo pois o Senhor disse no evangelho de São João: 'Há um só rebanho e um só Pastor' (Jo 10,16).

As palavras do Evangelho nos ensinam: esta potência comporta duas espadas, todas as duas estão em poder da Igreja: a espada espiritual e a espada temporal. Mas esta última deve ser usada para a Igreja enquanto que a primeira deve ser usada pela Igreja. A espiritual deve ser manuseada pela mão do padre; o temporal, pela mão dos reis e cavaleiros, com o consenso e segundo a vontade do padre. Uma espada deve estar subordinada à outra; a autoridade temporal deve ser submissa à autoridade espiritual.

De acordo com o Beato Dionísio, é uma lei divina que as coisas mais simples alcancem as mais altas por intermediários. Então, de acordo com a ordem do universo, as coisas não foram consideradas como iguais, mas ordenadas das menores para maiores, das inferiores para superiores. Devemos reconhecer nitidamente que os poderes espirituais ultrapassam os temporais em dignidade e nobreza, pois as coisas espirituais ultrapassam as temporais. Isto vemos claramente pelo pagamento, bendição e consagração do dízimo; também pela cerimônia de aceitação do poder e governo do mundo. 

Pela verdade atestamos que o poder espiritual pode estabelecer o poder terrestre e julgá-lo se este não for bom. Ora, se o poder terrestre se desvia, será julgado pelo poder espiritual. Se o poder espiritual inferior se desvia, será julgado pelo poder superior. Mas, se o poder superior se desvia, somente Deus poderá julgá-lo e não o homem. Assim testemunha o apóstolo: 'O homem espiritual julga a respeito de tudo e por ninguém é julgado' (1Cor 2,15).

Esta autoridade, ainda que tenha sido dada a um homem e por ele seja exercida, não é humana, mas de Deus. Foi dada a Pedro pela boca de Deus e fundada para ele e seus sucessores Naquele que ele, a rocha, confessou, quando o Senhor disse a Pedro: 'Tudo o que ligares...' (Mt 16,19). Assim, quem resiste a este poder determinado por Deus 'resiste à ordem de Deus' (Rm 13,2), a menos que não esteja imaginando dois princípios, como fez Manes, opinião que julgamos falsa e herética, já que, conforme Moisés, não é 'nos princípios', mas 'no princípio Deus criou o céu e a terra' (Gn 1,1). 

Por isso, declaramos, dizemos, definimos e pronunciamos que é absolutamente necessário à salvação de toda criatura humana estar sujeita ao romano pontífice.

Dada no Vaticano, no oitavo ano de nosso pontificado [18 de novembro de 1302]

Bula Unan Sanctum, Papa Bonifácio VIII (1294 - 1303)

terça-feira, 16 de maio de 2017

10 FATOS SOBRE A VIDA DE NOSSA SENHORA


1. A Bíblia apresenta diversos casos de concepção de filhos de pais em idade avançada como, por exemplo: Abraão e Sara; o nascimento de João Batista; Ana, que era estéril, deu à luz a Samuel na velhice. Assim também se deu o nascimento de Maria Santíssima, ou seja, quando Ana e Joaquim já estavam ambos em idade bem avançada.

2. A Igreja celebra o dia dos santos sempre no dia correspondente à sua morte (eventualmente com adaptações devido a coincidências de datas), pois representa o dia do nascimento deles para a glória celeste. Entre as três exceções de se tomar a data do nascimento temporal e não a data da morte como referência, estão o nascimento de Jesus (25 de dezembro), o nascimento de João Batista (24 de junho) por ser o Precursor e o nascimento de Maria Santíssima (8 de setembro).

3. Embora a data litúrgica de comemoração do nascimento da Virgem Santíssima pela Igreja seja 8 de setembro, o mês de maio tem sido devotado à Virgem como 'mês de Maria' desde o século XIII. A Festa da Apresentação de Maria no templo é comemorada no dia 21 de novembro.

4. A Tradição atesta que Nossa Senhora, a exemplo de muitas outras jovens da sua época, viveu boa parte de sua tenra juventude (dos 10 aos 14 ou 16 anos segundo algumas fontes e, até desde os 3 anos de idade, segundo outras) no Templo de Jerusalém, em uma vida de intensa oração, trabalho manual, aprendizado de hinos e cânticos religiosos e, principalmente, de estudo dos Livros Sagrados.

5. Nossa Senhora falava o aramaico como língua materna, corrente em sua época e localização e, em função dos seus estudos no Templo de Jerusalém, provavelmente também dominava o hebraico e até mesmo podia ter conhecimento básico de outras línguas.

6. A Anunciação do Anjo e o Fiat de Maria Santíssima constitui o diálogo mais importante para a salvação do gênero humano e foi consumado em 5 frases e 55 palavras. As únicas coisas deste evento que se podem afirmar como factíveis é que o diálogo ocorreu enquanto Maria estava em recolhimento e oração, provavelmente reclusa em um ambiente qualquer da casa onde então vivia em Nazaré (morada anterior àquela que iria mais tarde compartilhar com José e, depois, também com Jesus).

7. Nossa Senhora entoou o Magnificat na sua visita a Santa Isabel, trazendo Jesus Cristo no sacrário virginal do seu ventre, em aramaico (o hino devocional tem 102 palavras em grego, 89 em latim e 105 em português).

8. A Igreja comemora no dia 2 de fevereiro a Festa da Apresentação de Jesus no Templo e a Festa de Purificação de Nossa Senhora, eventos que normalmente ocorriam associados para o rebento e sua mãe; a criança para ser consagrada a Deus e a mãe, para se purificar do parto, fato que a tornava 'impura' conforme os preceitos da Lei de Moisés (evidentemente Nossa Senhora não teria porque ser 'purificada' mas, em obediência restrita às leis vigentes, se submeteu inteiramente à prescrição).

9. É Nossa Senhora, medianeira das graças divinas, que fez brotar o primeiro milagre conhecido da vida pública de Jesus nas Bodas de Caná. Após quase dois meses de separação do seu Filho (neste período, Jesus se fizera batizar por João Batista no rio Jordão e jejuara durante 40 dias e 40 noites no deserto), Nossa Senhora abandona o seu escondimento e se revela para nós, co-herdeiros da graça divina, como a onipotência suplicante: 'Fazei tudo o que Ele vos disser'.

10. Embora não se tenha nenhum registro formal ou consistente da morte ou dormição de Nossa Senhora, pode-se afirmar que a morte a acolheu para que ela pudesse ser igual ao Filho em tudo, até na morte. Maria Santíssima morreu no amor, morreu por amor mas, sobretudo, morreu de amor. Morrendo no amor, Maria morreu como Mãe dos homens. Morrendo por amor, ela morreu como Rainha dos mártires. Morrendo de amor, ela morreu como Mãe de Deus. É a única 'causa mortis' que lhe poderia convir e separar sua alma que atingiu os píncaros da graça divina do seu corpo terreno. 

(Texto do autor do blog com base na obra 'A História da Vida de Nossa Senhora', de Antônio Maia) 

segunda-feira, 15 de maio de 2017

AS SETE COLUNAS DA IGREJA DOMÉSTICA (I)

'A Sabedoria edificou sua casa, talhou sete colunas' (Pv 9, 1)

PRIMEIRA COLUNA: A FÉ E A CONFIANÇA EM DEUS

À luz da fé, os pais veem a sua dignidade. Deus os uniu como cooperadores do Altíssimo na obra da criação e, assim, devem ser na terra os seus representantes perante os jovens filhos dos homens. Sobre a cabeça lhes brilha a coroa que a mão de Deus lhes impôs, como diz tão belamente Leo Sternberg na poesia 'Após a morte!', dedicada à sua saudosa mãe:

'Quero ver minha mãe, uma vez ainda!
Então a morte veio descobrir-lhe o semblante...
- Mas como? Uma coroa cintilante a fronte lhe cingia? E eu, cego, não a via? Uma coroa de ouro no cabelo tinha?
- Não sabias então que era rainha?' 

Sim, é verdade! Os pais - Deus os fez como reis. Dotou-os de um direito divino e, por uma lei própria, lhes protege a autoridade: 'Honrarás pai e mãe!' À luz da fé, o matrimônio se reveste de dignidade e santidade. Ela garante a fidelidade dos esposos até a morte; com força sobrenatural sustém a família e ergue-a do pó da terra e da esfera terrena ao periélio divino. Eis o triunfo da família: a santa fé!

Com a fé ela vence tudo, mesmo o mais penoso sofrimento e a mais dura provação. Mas é preciso renová-la sempre. Há homens que esperam da fé despropósitos. Em sua opinião, deveria haver uma espécie de polícia de segurança contra toda a infelicidade, até contra suas próprias tolices e as misérias de que são culpados! Uma religião assim, sem sexta-feira da Paixão! Se, entretanto, os atinge uma infelicidade ou qualquer dor dessa espécie, o Senhor Deus é simplesmente despachado e a fé, como um lastro sem valor, é jogada ao mar.

Como poderia haver também um Deus bondoso, que permite contrariedades? Querem sempre somente céu sereno, nuvens jamais! ... Assim é, de fato. Um triste papel é reservado para Deus. Fazem-no de criado, que só pode ser regido pelos desejos e as vistas curtas do patrão, exatamente como aquele general romano, que atirava sumariamente seus deuses ao mar, quando estes não lhe faziam a vontade. 

Deus não é o nosso servo obediente, que tem de esperar e aguardar pacientemente atrás da porta os nossos acenos, até que o mandemos entrar: temos de segui-lo; Ele jamais nos prometeu afastar de nós todo o mal, nem mesmo ao mais piedoso casal e à família mais temente a Deus. Ao contrário, as palavras de Cristo hão de ressoar e permanecer em nós sempre integralmente: 'Quem quiser ser meu discípulo, tome a sua cruz e me siga!'

Primeiramente a sexta-feira da Paixão, depois então a Páscoa! À frente de todos, que carregam a cruz, segue Ele próprio, o inocente Filho de Deus e, com profunda mágoa, a Mãe Dolorosa. Mais de uma vez tive de lembrar isso a algum pobre mortal desanimado e alquebrado, sob o peso da cruz, para revigorar-lhe o ânimo abatido. O cristianismo e a graça de Deus não afastam o sofrimento. Por que seria assim? Acaso o sol dourado afasta da natureza as tempestades? Elas têm de vir, para que a vida não morra. Assim vem também o sofrimento. Por causa do céu, este impõe-se como necessário. Deve ser a escada, pela qual subimos ao céu; o fogo que separa o ouro da escória.

O matrimônio especialmente há de ser sempre - como diz, na sua linguagem original, o célebre Abraão de Santa Clara - uma procissão, na qual vão decerto os estandartes, mas com a cruz sempre à frente. Que mal há nisso? Para quem, com fé firme e filial confiança, se abandona ao Deus fiel e bondoso, todas as coisas se tornam um bem. Tudo o que lhe sucede, mesmo de adverso, é parte do magnífico tapete que a mão de Deus tece com fios claros e outros escuros.

E, com a fé, consola-nos a confiança filial, com que em todas as necessidades e aflições nos atiramos nas mãos paternais de Deus, tendo em si algo de muito honroso para Nosso Senhor e que nos traz muita felicidade. Força-o a nos ajudar. Ou acaso 'poderias dar uma pedra ao teu amigo, que está passando necessidade e que te pede pão e, em lugar de um peixe, um escorpião?' 'E mesmo que uma mãe esquecesse o filho, eu não poderia te esquecer! - diz Nosso Senhor...

O cristão sabe ... que há somente um Pai no céu que tem um coração amante e bondoso, que palpita por ele. 'Nem um só fio de cabelo cai de vossa cabeça, sem que Ele o saiba' e, mais, 'Não valeis mais que os pássaros do céu e os lírios do campo que vosso Pai celeste alimenta e veste a todos?' A confiança em Deus guarda e eleva também a família. Concorre para o cumprimento consciencioso e fiel do dever conjugal, dissipa as dúvidas e torna-se o esteio e amparo em toda a aflição. É uma coluna firme. Para homens sem fé e sem confiança, o matrimônio facilmente se torna uma grande carga; a vida torna-se uma cruz, sob a qual mais cedo ou mais tarde caem aniquilados.

...

Numa casa encontrei sobre uma porta uma ferradura, em outra, vi na parede um trevo de quatro folhas; em outra ainda, até mesmo um porco de madeira. Tudo isso deve trazer felicidade. Mas o que tem isso com a felicidade, é absolutamente impossível de saber: em compensação, porém, há outra coisa, que traz certamente a felicidade a uma casa: é o sinal de nossa santa fé, a cruz e a oração em comum diante do crucifixo: 'Onde dois ou três estão reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles' – disse o Senhor. Esta palavra de bênção parece quase valer mais para aqueles que, no lar, fazem a oração familiar aos pés da cruz.

(Excertos da obra 'As colunas de tua Casa - um Plano para a Felicidade da Família', do Vigário José Sommer, 1938, com revisão do texto pelo autor do blog)

domingo, 14 de maio de 2017

'EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA'

Páginas do Evangelho - Quinto Domingo da Páscoa


Jesus inicia o Evangelho deste Quinto Domingo da Páscoa manifestando o poder de sua Divindade e da autêntica fé cristã: 'Não se perturbe o vosso coração. Tendes fé em Deus, tendes fé em mim também' (Jo 14, 1). Sim, a medida do nosso amor é a confiança em Deus e nos desígnios da Providência Divina. Que nada além desta disposição interior, de colocar tudo nas mãos de Deus, seja o nosso conforto e consolação. Deus governa todas as coisas e sabe, muito além de nós mesmos, como nos levar a uma mais perfeita santificação. Ele nos cumula de bênçãos e graças, nos chama a cada nova situação, nos clama pela nossa confiança quando aparentemente nos abandona.

Em seguida, confia aos discípulos que eles são herdeiros do Reino dos Céus, a pátria eterna dos bem aventurados, os que colherão com fartura os frutos das sementes de amor e confiança plantadas no Coração do Pai: 'Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, eu vos teria dito. Vou preparar um lugar para vós e, quando eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver estejais também vós' (Jo 14, 2-3). Nos mistérios insondáveis de Deus, as moradas são muitas e desiguais, sem que os eleitos padeçam dessa desigualdade pois todos serão igualmente possuidores da Visão Beatífica e serão cumulados plenamente da glória que lhes bastam.

É o próprio Jesus que nos vai abrir as portas do Céu, com a sua Paixão, Morte e Ressurreição. Ao romper as portas celestes, antes seladas pelos pecados dos homens, Jesus torna-se o rei de um reino que não é deste mundo e que tem as dimensões da eternidade. Um reino de muitas moradas, preparadas por Jesus para cada um de nós, filhos da esperança transformados em herdeiros das bem aventuranças celestes. E, assim, por meio de Jesus, chegaremos ao Pai, a habitação eterna: 'Acreditai-me: eu estou no Pai e o Pai está em mim' (Jo 14, 11).

Jesus vai ratificar esta premissa essencial da fé cristã com clareza divina: 'Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim' (Jo 14, 6). Não há outro caminho possível, não há opções de rumo, nem atalhos, nem passagens ocultas. Por isso Jesus é tão explícito ao unir, no anúncio pleno de sua divindade, os termos Caminho, Verdade e Vida. Só existe um Caminho de Verdade para a Vida Plena dos herdeiros dos Céus: seguir Jesus com confiança extremada e jubilosos na fé que abraçamos, e que nada nem ninguém nos perturbe o coração nesta caminhada de salvação para as eternas moradas de Deus. 

sábado, 13 de maio de 2017

100 ANOS DE FÁTIMA - PRIMEIRA APARIÇÃO

Fátima é o acontecimento sobrenatural mais extraordinário de Nossa Senhora e a mais profética das aparições modernas (que incluíram a visão do inferno, 'terceiro segredo', consagração aos Primeiros Cinco Sábados, orações ensinadas por Nossa Senhora às crianças, consagração da Rússia, milagre do sol e as aparições do Anjo de Portugal), constituindo a proclamação definitiva das mensagens prévias dadas pela Mãe de Deus em Lourdes e La Salette. Por Fátima, o mundo poderá chegar à plena restauração da fé e da vida em Deus, conformando o paraíso na terra. Por Fátima, a humanidade será redimida e salva, pelo triunfo do Coração Imaculado de Maria. Se os homens esquecerem as glórias de Maria em Fátima e os tesouros da graça, serão também esquecidos por Deus.

'por fim, o meu Imaculado Coração triunfará'


FÁTIMA EM FATOS E FOTOS (V)

21. Como se deu a primeira aparição de Nossa Senhora?

No dia 13 de maio de 1917, pouco depois do meio-dia de um domingo de sol luminoso, Lúcia, Jacinta e Francisco estavam brincando de 'casinha' no alto da Cova da Iria, fazendo uma paredinha de pedras no entorno de uma moita, enquanto as ovelhas pastavam mais além. De repente, pareceu-lhes envolver um lampejo na forma de um relâmpago muito próximo. Assustados, e sem se darem conta da falta de sentido de se vislumbrar um relâmpago em dia tão ensolarado, correram precipitadamente encosta abaixo, até se abrigarem sob uma grande azinheira. Mal chegaram ali, foram surpreendidos por um segundo relâmpago, que os fizeram imediatamente afastarem-se da árvore em direção ao campo aberto à frente. E foram, então, que viram Nossa Senhora pela primeira vez.

Bem diante deles, sobre a copa de uma pequena azinheira, de cerca de um metro de altura, envolvida por uma esfera de luz, estava uma 'senhora vestida toda de branco, mais brilhante que o sol, espargindo luz mais clara e intensa que um copo de cristal cheio de água cristalina, atravessado pelos raios do sol mais ardente' [Lúcia dos Santos, Quarta Memória]. A luz que cobria o rosto da senhora era tão intensa que cegava a visão direta das crianças que se encontravam, então, mudas e deslumbradas, dentro do círculo de luz que emanava da aparição, a menos de dois metros de distância. 

('azinheira grande' da primeira aparição)

22. Como foi o diálogo de Lúcia com Nossa Senhora nesta primeira aparição?

Nossa Senhora se dirigiu inicialmente às crianças, com voz suave e tranquilizadora:

- Não tenhais medo. Eu não vos faço mal.

As três crianças viam Nossa Senhora, mas Francisco, embora percebendo que ela conversava com Lúcia, não a ouvia; Jacinta a via e ouvia, mas não lhe falava, enquanto Lúcia via, ouvia e falava com a Santíssima Virgem. Lúcia perguntou então:

- De onde é Vossemecê?
- Sou do Céu.
- E que é que Vossemecê quer?
- Vim para vos pedir que venhais aqui seis meses seguidos, no dia 13, a esta mesma hora. Depois vos direi quem sou e o que quero. Depois, voltarei ainda aqui uma sétima vez.

Lúcia continuou as suas perguntas:

- E eu vou para o Céu?
- Sim, vais.
- E a Jacinta?
- Também.
- E o Francisco?
- Também; mas tem que rezar muitos terços. 

Lúcia lembrou-se então de perguntar à Virgem por duas moças suas amigas que haviam falecido pouco tempo antes:

- A Maria das Neves já está no Céu?
- Sim, está.
- E a Amélia?
- Estará no Purgatório até o fim do mundo.

Neste momento, Nossa Senhora assumiu o controle do diálogo e fez um convite explícito aos pastorinhos:

- Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido, e de súplica pela conversão dos pecadores?
- Sim, queremos.
- Ide, pois, ter muito que sofrer, mas a graça de Deus será o vosso conforto.

Ao dizer estas palavras, abriu as mãos e delas saiu uma luz tão intensa que penetrou no mais íntimo das almas das crianças, 'fazendo-nos ver a nós mesmos em Deus, mais claramente do que nos vemos no melhor dos espelhos' [Lúcia dos Santos, Quarta Memória]. Por um impulso irresistível, as crianças prostraram-se de joelhos e começaram a rezar intimamente: 'Ó Santíssima Trindade, eu Vos adoro. Meu Deus, meu Deus, eu Vos amo no Santíssimo Sacramento'. Quando terminaram, Nossa Senhora lhes disse:

- Rezem o terço todos os dias, para alcançarem a paz para o mundo e o fim da guerra. 

Em seguida, começou a se elevar serenamente nos ares em direção ao nascente, até desaparecer na imensidão da distância.


23. Quais foram as reações das crianças e suas famílias diante esta primeira aparição de Nossa Senhora?

Jacinta foi tomada de tal ansiedade e contentamento que manifestou a aparição à sua mãe, assim que chegou em casa. Francisco mostrou-se muito mais reservado neste aspecto e Lúcia nada revelou em casa. Uma vez revelada, a primeira aparição de Nossa Senhora, inicialmente restrita ao domínio das duas famílias, passou a ser de conhecimento mais ou menos amplo de toda a aldeia de Aljustrel, o que levou especialmente Lúcia a ser confrontada e contestada tanto publicamente como em casa, principalmente pela mãe e pelas suas irmãs.

Lúcia começava a aprender, de forma quase imediata, as palavras de Nossa Senhora: 'ides ter muito que sofrer'. A busca da via da santificação pessoal, a mortificação e a conversão dos pecadores haviam de lhes impor um elevado custo de retaliações, sofrimentos e tribulações. Lúcia iria experimentar este caminho por toda uma vida. Francisco e Jacinta iriam doar precocemente as suas vidas como vítimas escolhidas por Deus.



24. Qual é a 'mensagem esquecida de Fátima'?

Certamente é o trecho desta primeira aparição que faz referência ao destino eterno de Amélia, amiga de Lúcia, então recém-falecida. Maria das Neves e Amélia eram duas amigas de Lúcia que frequentavam a sua casa 'para aprender a tecer com sua irmã mais velha' e teriam falecido pouco antes das aparições (Maria das Neves faleceu em 26/02/1917 e Amélia faleceu a 28/03/1917, ambas com 20 anos de idade). A resposta de Nossa Senhora quanto ao destino eterno de Amélia é categórico: 'Estará no Purgatório até o fim do mundo'.

São palavras duras e preocupantes quando revelam a justiça de Deus aplicada a uma jovem portuguesa que vivera apenas 20 anos, no início do século XX, em um lugar isolado e deserto, perdido nos contrafortes da Serra do Aire, descendente de um povo bom e ordeiro, católicos praticantes e devotos do terço diário. Fátima, em 1917, representava provavelmente um ambiente de extrema religiosidade e de prática corrente da moral cristã. Que pecados terríveis teriam sido cometidos por esta moça de modo a ter que pagar as penas e danos devido a eles no Purgatório até o fim do mundo? 

25. Quais são as relações entre o pecado e a justiça divina implícitas na 'mensagem esquecida de Fátima'?

A primeira questão que surge desta revelação deveria ser a de uma reflexão profunda sobre o pecado e a justiça divina. É evidente que morar em Fátima em 1917 não constituiu garantia de salvação a ninguém e que é possível que alguma alma tenha, inclusive, sido condenada eternamente. Mas isto é uma absoluta elucubração; o destino de Amélia, ao contrário, é fato, é uma revelação direta de Nossa Senhora aos homens. Qual seria a nossa reflexão sobre a justiça divina transferindo a realidade do destino eterno de Amélia à realidade dos homens e mulheres, jovens e crianças das nossas grandes e pequenas cidades, às Amélias (almas) do nosso tempo? Não deveríamos nós reavaliarmos profundamente os conceitos de misericórdia e justiça de Deus e começarmos a praticar, na vida diária de cada um, o preceito lógico de São Domingos Sávio: 'antes morrer do que pecar?'

Uma segunda questão que se apresenta refere-se ao próprio destino final de Amélia. A alma no Purgatório nada pode fazer para diminuir ou abreviar os seus sofrimentos, mas as orações daqueles que ainda vivemos na terra podem intervir profundamente nesta condição, por graça e obra da misericórdia divina. Esta interação de bens espirituais dos filhos de Deus constitui a comunhão dos santos e o tesouro da Igreja, obtido através dos méritos infinitamente satisfatórios da redenção de Cristo. 

Assim, pois, deve-se entender que Amélia estará no Purgatório até o fim do mundo se não houver quem reze por ela ou mande celebrar missas em sua intenção. E novamente, a mensagem de Fátima mostra a sua unidade perfeita ao relacionar o exemplo de Amélia com o apelo fervoroso de Nossa Senhora em outra aparição: 'Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores, que vão muitas almas para o Inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas'. Reconheçamos definitivamente o valor imponderável das orações, penitências e sofrimentos no plano salvífico de Deus. 

Todas as grandes obras de Deus, e em particular àquelas relacionadas à conversão e salvação das almas, são feitas com a dor e o sacrifício de algumas almas privilegiadas. Em Fátima, estas foram as missões específicas desempenhadas por Jacinta e Francisco Marto – as duas crianças morreram em circunstâncias extremamente sofridas e dolorosas - almas escolhidas por Deus como vítimas da expiação e reparação dos pecados de Amélia e de todos nós.