sábado, 17 de agosto de 2013

LÁGRIMAS DAS ALMAS

Em função das contestações impostas pela Reforma, o Concílio de Trento ratificou formalmente a existência do Purgatório como dogma de fé por meio de um decreto promulgado em 1580. A partir de então, teve início na Igreja uma intensa propagação pelas práticas de oração destinadas ao sufrágio das almas do Purgatório. Uma destas devoções, de uso bastante generalizado, eram os folhetos volantes, impressos e afixados às paredes das igrejas, para devoção pública e divulgação de jaculatórias, orações e indulgências pelas almas do Purgatório. 

O exemplar abaixo é um folheto do século XVIII, de 25 cm x 35cm, impresso em Coimbra em 1740, na oficina de Luis Seco Ferreyra. Com o título: 'Lágrimas das Almas', apresenta uma imagem do Purgatório e a transcrição latina do Livro de Jó. Seguem-se o assunto do folheto 'alegre e bem divertida Irmandade, erigida e novamente levantada' e o texto propriamente dito, com os objetivos e proposições da citada irmandade.


É interessante destacar as duas proposições constantes da introdução do texto. Na primeira, fala-se em transladar as almas do Purgatório para o Céu, 'que não custa mais do que bolir com os beiços'.  A segunda refere-se à dupla vantagem àqueles que praticarem estas devoções: prémio no Tribunal Divino e intercessores no Paraíso para as súplicas temporaes e espirituaes. E esta segunda proposição é complementada pela seguinte informação: 'como consta de hum pequeno Livrinho de pouco custo com o titulo Grito das Almas, que faz compungir o mais duro coração, ainda que seja de bronze'. 

Esse 'pequeno livrinho' refere-se à obra 'Gritos das Almas no Purgatório e os Meios para os Aplacar' (publicado em 1689) do sacerdote e teólogo espanhol Jose Boneta y Laplana (1638 - 1714). A tradução portuguesa do livro foi feita pelo Pe. Manuel de Coimbra (primeira edição em 1702). O excerto abaixo constitui uma tradução adaptada pelo autor do blog relativo às penas que levam ao Purgatório, no caso a profanação do silêncio nas igrejas católicas:

EXCERTO: A PROFANAÇÃO DO SILÊNCIO NAS IGREJAS 

'Uma vez conhecidos os meios devidos para interceder pelas almas do Purgatório, é preciso cuidar agora das culpas que conduzem a ele. E falarei somente de dois deles, por serem os que mais se cometem nessa vida e os que mais se lamentam naquele lugar. 

A primeira é a irreverência nas Igrejas: há que se admirar que um santo bispo como São Severino tenha ficado retido por um ano no Purgatório por ouvir na Igreja as respostas que lhe traziam os que o serviam; mais digno de assombro ainda é o testemunho de uma alma que aparecia frequentemente a uma Serva de Deus e que, ao ser indagada sobre alguma coisa dentro da Igreja, a alma lhe respondeu: 'Não se pode falar na Igreja, depois vos tornarei a ver, e então vos direi'. Sobre isso, o Pe. Joseph Pavía escreve (pag. 61): 'Confesso que me confundiu esta noticia, considerando que quem falava era uma alma e por ordem de Deus, sobre algo que havia de ser bom e santo e da forma como se falava, não por meio de vozes que soassem como as nossas, mas por locução interna, linguagem velada do coração, e ainda assim, a alma se absteve de responder pela reverência devida ao templo'. 

Veja-se que eco farão na outra vida as desentoadas vozes e inquietações com que os cristãos se movem na Igreja. Se um bispo e santo, só por dar-se ouvir nela esteve um ano ardendo no Purgatório; que tempos não esperam ou teme estar aqueles que não só falam, mas falam alto ou que não só falam, mas se movem e escandalizam? Até quando se pode chegar a temeridade humana e a paciência divina?

Dois infiéis, conta o Padre Almenara, vieram à Espanha com o propósito de explorar nossa Lei e ver se lhes agradava admiti-la. Entraram em uma Igreja, viram o que faziam os cristãos dentro dela, falavam uns e riam outros, e todos estavam divertidos que retornaram à sua seita, dizendo: 'Que fiéis são estes que, com tal desatenção, assistem na casa de seu Deus? Que Deus é este, que se padece ao ver os que o adoram virem à sua própria casa  fazer-lhe pouco caso e diante dele? Isto é sinal de que nem nele há justiça, nem neles fé; vamo-nos daqui, e tornemos aos nossos cultos, onde Deus é mais venerado que o deles'. 

A quem não atemorizam as grandes consequências deste abuso? Para sua correção, não basta apenas não só ferir a Deus, mas também a sua fé, afrontando-a diante de estranhos. E ainda que a Espanha se jacte de ser a mais fiel dentre as nações, é nisto a mais delinquente, causa sem dúvida de seus poucos progressos, e de suas muitas ruínas. 

Contudo, há quem não se atreva a parar na rua e falar com uma mulher estranha, por temer que o vejam, e não se perturba em falar em uma Igreja, sem temer a Deus que o está vendo. Oh cegueira sacrílega! Não se lê, nem se sabe, que a mais perdida mulher do mundo tenha-se atrevido a cometer adultério à vista e em presença de seu esposo; e a alma de um cristão atreve-se a ofender ao seu Esposo Cristo na Igreja à sua vista: Fecerunt (queixa-se por Zacarias). Oh queira sua Divina Majestade dar-nos luz, para que avivemos a fé de sua presença na Igreja, e nela estejamos como no Céu; pois é de fé, que não tem o Céu, nem mais Cristo, nem mais de Cristo, o que mais se deve ter em qualquer templo com a Presença do Sacrário'. 

(Excertos da obra Gritos del Purgatorio y Medios para Acallarlos, Pe. Jose Boneta y Laplana , Saragoça, 1689; Cap.VII, p.214 - 216)

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

SANTOS E MÁRTIRES (I)

São Maximiliano Maria Kolbe

 

São Maximiliano Maria Kolbe (08/01/1894 - 14/08/1941)

Quando tinha apenas 10 anos, Raimundo Kolbe recebeu uma dura repreensão de sua mãe: 'Se aos dez anos você é tão mau menino, briguento e malcriado, como será mais tarde?' Estas palavras doeram fundo na alma da criança e, muito perturbado por tal admoestação, prostrou-se aflito diante da imagem de Nossa Senhora: 'Que vai acontecer comigo?' A Mãe de Deus apresentou-se, então, diante dele, trazendo nas mãos duas coroas, uma branca e outra vermelha e lhe perguntou, sorrindo, qual delas ele escolhia para a sua vida. O pequeno escolheu as duas. A coroa branca lhe assegurou a castidade; a coroa vermelha lhe outorgou a glória do martírio. Assim nascem os santos, assim se forjam os mártires.

Assumindo a sua vocação religiosa, decidiu ser capuchinho franciscano com o nome de Maximiliano e fez os solenes votos do sacerdócio em 01 de novembro de 1914, acrescentando o nome de Maria aos seu nome religioso. Quase 40 anos após a visão da Santa Virgem, ele receberia a coroa do martírio. Em fevereiro de 1941, o padre Kolbe foi levado à prisão de Pawiak, em Varsóvia para interrogatório, tornando-se em seguida o prisioneiro de número 16670 do campo de concentração de Auschwitz durante a II Grande Guerra Mundial. Mais do que nunca, exerceu ali o seu apostolado de oração e pela conversão daqueles condenados. No final de julho de 1941, foi transferido para o Bloco 14 do campo, cujos prisioneiros faziam trabalhos agrícolas. Numa dada oportunidade, ocorreu a fuga de um deles e, como castigo, dez outros foram sorteados para morrer de fome e de sede num abrigo subterrâneo. 

O sargento Franciszek Gajowniczek do exército polonês foi um dos dez escolhidos e suplicou pela sua vida, por ser pai de uma família ainda de pequenos. Padre Kolbe se ofereceu para substitui-lo no 'bunker da morte' e assim foi feito. Desnudos, os dez homens padeceram o suplício da fome e da sede no subterrâneo confinado. Pe. Kolbe lhes deu toda a assistência espiritual possível neste período de martírio. Ao final de três semanas, 4 ainda estavam vivos e receberam, então, injeções letais de ácido muriático. Era o dia 14 de agosto de 1941, véspera da Festa da Assunção de Nossa Senhora. Pe. Kolbe foi o último a morrer. Sua festa religiosa é celebrada em 14 de agosto. Foi canonizado pelo papa João Paulo II em 10 de outubro de 1982.



'Não tenham medo de amar demasiado a Imaculada; jamais poderemos igualar o amor que teve por Ela o próprio Jesus: e imitar Jesus é nossa santificação. Quanto mais pertençamos à Imaculada, tanto melhor compreenderemos e amaremos o Coração de Jesus, Deus Pai, a Santíssima Trindade'.


(o 'bunker da morte')

Mas o que aconteceu com Gajowniczek - o homem que Padre Kolbe salvou? Depois da guerra, retornou à sua cidade natal, reencontrando a sua esposa. Seus dois filhos tinham sido mortos durante a guerra. Todos os anos, no dia 14 de agosto, ele retornou à Auschwitz e divulgou durante toda a vida o ato heroico do Pe. Kolbe. Morreu aos 95 anos, em 13 de março de 1995, em Brzeg, na Polônia, quase 54 anos depois de ter sido salvo da morte por São Maximiliano Kolbe. 


(Franciszek Gajowniczek)


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

GLÓRIAS DE MARIA: ASSUNÇÃO AO CÉU


A Assunção de Maria - Palma Vecchio (1512 - 1514)

"Pronunciamos, declaramos e de­finimos ser dogma de revelação divina que a Imaculada Mãe de Deus sempre Virgem Maria, cumprido o curso de sua vida terrena, foi assunta em corpo e alma à Glória celeste”.

                            (Papa Pio XII, na Constituição Dogmática  Munificentissimus Deus, de 1º de novembro de 1950)


A solenidade da Assunção da Virgem Maria existe desde os primórdios do catolicismo e, desde então, tem sido transmitida pela tradição oral e escrita da Igreja. Trata-se de um dos grandes e dos maiores mistérios de Deus, envolto por acontecimentos tão extraordinários que desafiam toda interpretação humana: 

1. Nossa Senhora NÃO PRECISAVA morrer, uma vez que era isenta do pecado original;

2. Nossa senhora QUIS MORRER para se assemelhar em tudo ao seu Filho, pela aceitação de sua condição humana mortal e para mostrar que a morte cristã é apenas uma passagem para a Vida Eterna;  

3. Nossa Senhora NÃO PODIA passar pela podridão natural da carne tendo sido o Sacrário Vivo do próprio Deus;

4. A morte de Nossa Senhora foi breve (é chamada de 'Dormição') e ela foi assunta ao Céu em corpo e alma;

5. Aquela que gerou em si a vida terrena do Filho de Deus foi recebida por Ele na glória eterna;

6. Nossa Senhora foi assunta ao Céu pelo poder de Deus; a ASSUNÇÃO difere assim da ASCENSÃO de Jesus, uma vez que Nosso Senhor subiu ao Céu pelo seu próprio poder.


Louvor a Ti, Filha de Deus Pai,
Louvor a Ti, Mãe do Filho de Deus,
Louvor a Ti, Esposa do Espírito Santo,
Louvor a Ti, Maria, Tabernáculo da Santíssima Trindade!

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

VISÕES DA VIDA MONÁSTICA

O monacato surgiu no século terceiro com Santo Antão Abade e São Basílio. Com ele e por meio dele, a Igreja construiu, no transcurso de gerações, os próprios alicerces da civilização cristã. A bem da verdade, a vocação monástica é a vocação de todo ser humano, pois se trata essencialmente de se buscar a Deus e o louvor de Deus. A clausura não significa uma separação do mundo mas uma comunhão com o mundo, por meio de uma vida de oração amparada por um profundo recolhimento interior.














terça-feira, 13 de agosto de 2013

A FÉ EXPLICADA (X)


O JUÍZO PARTICULAR E A RESSURREIÇÃO DOS MORTOS

A vida é o tempo de cada homem na terra. E a única coisa certa da vida, como se diz sempre, é a morte. É um momento singular, espantoso, impossível de ser caracterizado com absoluta certeza. Não basta o coração não bater, não basta constatar que já não existe a respiração, não basta a dormição dos sentidos. Por isso, a absolvição e a unção dos enfermos podem ser aplicados mesmo após a morte aparente. Nós simplesmente não sabemos exatamente quando a alma abandona o corpo pelo qual se manifestava. A morte é a separação do corpo e da alma. Com o rigor mortis ou o início da coagulação do sangue, podemos ter certeza que a pessoa realmente morreu. E os homens morrem uma só vez (Heb 9, 27).

No momento exato da morte, no instante singular em que a alma abandona o corpo, ela é julgada por Deus e tem o veredito definitivo do seu destino eterno. Este evento, o mais terrível e o mais importante da história de qualquer homem, é o chamado Juízo Particular. A alma não tem 'que ir a algum lugar' e nem 'esperar um tempo' para se ver como Deus a vê e ser julgada, simplesmente porque espaço e tempo não existem mais. Por isso, no instante da morte, a alma livre do corpo humano se projeta no Céu, no Inferno ou no Purgatório, ou seja, para a Visão Beatífica, para a condenação eterna ou para a purificação final dos eleitos do Pai.

Não há ressurreição da carne após a morte. De todos os homens falecidos, de todas as histórias de vidas que se acabaram, a Igreja fala apenas e tão somente de suas almas e postula a crença na 'gloriosa manifestação de nosso Senhor Jesus Cristo que há de vir' como essencialmente distinta em relação à condição humana imediatamente após a morte. E, ainda mais, a Igreja reconhece a magnitude desse mistério na Assunção de Nossa Senhora, em que a glorificação corporal da Virgem Santíssima constituiu, por um extraordinário desígnio divino, uma antecipação da glorificação que está destinada a todos os demais eleitos de Deus.

A ressurreição da carne é o triunfo ou a danação do ser humano em sua totalidade, corpo e alma. A felicidade eterna é recompensa do triunfo conjunto do corpo e da alma do homem pela sua salvação; a danação eterna é a impenitência final do corpo e da alma que se condenaram juntas. Este momento em que as almas e os corpos se reencontram para a eternidade é um evento que não se aplica a um homem em particular mas a humanidade como um todo. Então, somente poderá ocorrer ao final do mundo, ao final da história universal, e mediante um Juízo Universal aplicado a todos os homens de todos os tempos, em contraposição ao Juízo Particular aplicado a cada homem que existiu. 

Neste último dia (Jo 6, 39-40.44.54;11,24), não haverá mais mundo, nem humanidade, nem tempo. Apenas a eternidade e a consumação dos séculos para os homens, em corpo e alma, santificados na glória de Deus ou condenados à separação eterna de Deus. Nas palavras das Sagradas Escrituras:

'Assim como todos morrem em Adão, em Cristo todos receberão a vida. Cada um, porém, em sua ordem: como primícias, Cristo; depois, aqueles que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda. A seguir, haverá o fim, quando Ele entregar o reino a Deus Pai, depois de ter destruído todo Principado, toda Autoridade, todo Poder' (1Cor 15,22-24). 

'Em verdade, em verdade, eu vos digo: vem a hora – e é agora – em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem, viverão… Não vos admireis com isto: vem a hora em que todos os que repousam nos sepulcros ouvirão a voz do Filho do homem e sairão: os que tiverem feito o bem, para uma ressurreição de vida; os que tiverem cometido o mal, para uma ressurreição de condenação' (Jo 5,25.28s). 

'Quando o Senhor, ao sinal dado, à voz do arcanjo e ao som da trombeta divina, descer do céu, então os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro; em seguida, nós, os vivos que estivermos lá, seremos arrebatados com eles nas nuvens para o encontro com o Senhor nos ares' (1Ts 4,16s).

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

O INFERNO E AS PORTAS DO INFERNO (FINAL)


VIII - Quinta Porta do Inferno - A Má Educação dos Filhos

Quantos pais se perdem e perdem a seus filhos porque não os educam no temor e amor de Deus, não cumprindo os cinco deveres principais que lhes impõe a paternidade: o amor, a correção, a instrução, a vigilância e o bom exemplo. 

Há pais que não amam os filhos como deviam amá-los. Certos homens não merecem o belo título de pais. Desperdiçam no jogo, na bebida, na devassidão o dinheiro que ganham, deixando faltar aos filhos o estrito necessário. Pais monstruosos, piores que os irracionais, que sabem passar fome para dar de comer a seus filhos. Há mães que amam aos filhos, mas só a parte material, o corpo. Quanto à alma, pouco ou nada se ocupam dela. Adiam o batismo semanas e meses, deixando o filho entregue a Satanás e em perigo de morrer pagão. Quantas almas perdidas e quantas outras estragadas para sempre. Quanto mais Satanás se demora no coração do filho, mais o estraga. Toda a preocupação, todos os cuidados para com o corpo, até o luxo, até as modas mais indecentes, e quase nada para a alma.

Que será daquela filha a quem a mãe procura inspirar só vaidade, a quem fala só de beleza, a quem enfeita como uma divindade? Será uma moça vaidosa, orgulhosa. Ai do moço que a tomar por esposa, porque será uma esposa leviana, exigente, cuja paixão do luxo nada poderá satisfazer. Será daqui a pouco a desavença, a suspeita, a briga, o abandono, a ruína do lar. Quantos pais, quantas mães mormente perdem a si mesmos porque não cumprem o dever da correção. O homem nasce inclinado ao vício, diz a Escritura. No coração da criança madrugam os maus instintos. Bem cedo é preciso reprimi-los, corrigir os filhos, dai a pouco será tarde, impossível.

Como corrigir? À força de gritos e descomposturas? Isso só serve para ensinar tudo quanto há de palavras feias. À força de pancadas? Isso avilta e embrutece. Em primeiro lugar é preciso avisar: 'Meu filho, não faças isso, não andes em tal companhia, não convém, não pode ser, não consinto.' Às vezes este aviso será suficiente. Em caso de reincidência na mesma falta, é necessário repreender energicamente e ameaçar e, enfim, no caso de nova reincidência, castigar severamente. Até quando os pais têm obrigação de corrigir os filhos? Não se esqueçam que, enquanto filhos, não há grandes, nem velhos, não há filhos de barba branca. O filho, enquanto tiver filho, sempre será pai, e ai do pai que não avisa, repreende e corrige seu filho, e ai do filho que não atende às justas recomendações de seu pai.

Cedo também deve começar a instrução, porque tudo depende do começo, tudo depende pois, principalmente, da mãe. Feliz, mil vezes feliz, quem teve uma mãe cristã e piedosa. Tal a mãe de São Luís, rei da França. Tendo nos braços seu filhinho, dizia: 'Meu filho, eu te amo muito, mas tu tens no céu um Pai, uma Mãe que te amam ainda mais; cuidado, não faças nada que possa ofendê-los, não cometas pecado. Antes quisera ver-te agora mesmo morrer em meus braços, que ver-te mais tarde, rei da França, cometer um só pecado mortal.' Mãe, o coração dessa criança, vosso filho, é um papel branco em que podeis escrever o que quiserdes. Gravai nele ódio ao pecado, amor a Deus, devoção a Maria Santíssima.

Ensinai e mandai ensinar-lhe o catecismo. É uma obrigação gravíssima. A mãe que não manda seu filho ao catecismo, onde é possível, é indigna de absolvição. Meninos e meninas de dez, doze anos, moços e moças que nunca apreenderam uma palavra de catecismo, nada sabem de religião e de suas obrigações, e por isso não se confessam, não comungam, vivem no pecado, é o que encontramos todos os dias. Os culpados são os pais. Quantas moças põem o pé no inferno no dia em que casam, porque assumem uma obrigação que são incapazes de cumprir, ensinar aos filhos a amarem e servirem a Deus. Que responsabilidade e como poderão salvar-se? Perdem a si e a seus filhos.

Mandai vossos filhos à escola, para que aprendam pelo menos a ler e escrever. Depois do pecado a coisa mais triste e funesta é a ignorância. Mas, cuidado! Vede bem que escola, que colégio, que mestres. Há escolas e colégios sem religião. Dali sairão vossos filhos sem fé e sem costumes. Não faltam as escolas e os colégios católicos. Vigilância neste ponto. Vigilância em todos os sentidos. O maior bem que os pais podem deixar a seus filhos não são muitas riquezas, terras, dinheiro, mas a inocência e os bons costumes. Por isso seu grande empenho deve ser conservar-lhes este tesouro. Tarefa difícil em um mundo em que tudo é escândalo; só com uma grande vigilância. Os pais devem trazer os filhos presos debaixo de seus olhos. Sem esta sentinela de vista não escapam à corrupção. Vigilância, pais e mães, que vossos filhos não vejam nunca nada, nem em casa nem fora de casa, nem de dia nem de noite, nada capaz de ofender a inocência. 

Mas quantos pais, diz um santo, têm mais cuidado com seus animais, suas criações, que com seus filhos! Quantos pais deixam seus filhos andarem aonde e com quem querem, quantas mães deixam meninos e meninas brincarem longe de seus olhos. Quantas crianças saem de casa inocentes e voltam culpados; quantos moços e moças acham sua perdição em noites de festas, de volta por estradas escuras e desertas! Quantos desastres! Pais e mães, onde andam vossos filhos e filhas; que casa, que pessoas, que divertimentos frequentam? Examinai vossa consciência, condenai-vos, antes que Deus a examine e vos condene.

Se é um grande pecado dos pais não afastarem os filhos do pecado, é um crime enorme levá-los ao pecado pelo mau exemplo. Tal pai, tal filho; tal mãe, tal filha. Filho de peixe sabe nadar, diz o adágio. Nada mais eficazmente funesto que o mau exemplo dos pais. Os pais não rezam, o pai não se confessa, a mãe não vai à missa aos domingos, os filhos hão de fatalmente imitar seu procedimento. 'Por que rezar?' disse um dia uma menina à sua professora 'eu nunca vejo papai nem mamãe rezarem'. Que dizer dos pais que oferecem aos filhos o espetáculo positivo do vício e do pecado, pais que se embriagam, brigam, blasfemam; certas mães cuja vida é o pecado... os filhos o sabem e se envergonham, o que não os impedirá de, mais tarde, trilharem o mesmo caminho.

'Ai do homem' disse Jesus Cristo 'que dá escândalo, isso é, dá mau exemplo'; por conseguinte, mil vezes ai dos pais que escandalizam seus filhos: 'seria melhor lhes amarrar ao pescoço uma pedra e serem lançados ao mar.' 'Maldito seja meu pai' disse um condenado à morte, à hora de subir ao cadafalso, 'a ele é que devo a minha desgraça; nunca me ensinou meus deveres para com Deus e os homens, deixou-me frequentar más companhias, deu-me em tudo o mau exemplo'. Faz horror pensar que no inferno muitos filhos amaldiçoam os pais e muitos pais aos filhos, porque foram uns para outros causadores de sua condenação. Pais e mães, amai a vossos filhos com amor cristão, educai-os no amor e temor de Deus, afastai-os do mal e dai-lhes em tudo o bom exemplo, e vossos filhos vos darão gosto, neste mundo serão vossa consolação e no outro a vossa coroa.

IX - Sexta Porta do Inferno - O Protestantismo

O protestantismo é inimigo jurado da nossa Santa Religião. Nega os dogmas mais santos: o Santo Sacrifício da Missa, a Confissão, a Comunhão, a maior parte dos sacramentos, a existência do purgatório, a instituição divina da Igreja, a autoridade do papa, a legitimidade do culto dos santos. Neste particular vai até a caluniar aos católicos, dizendo que adoram os santos, as imagens. Não, mil vezes não! Não adoramos os santos. Adoramos só a Deus. Quanto aos santos, nós os honramos, pedimos sua proteção junto de Deus. Honramos as imagens como sendo os retratos dos santos. Que mal haverá nisso? Não podemos honrar o retrato de um pai, de uma mãe, de um benfeitor, colocá-lo em nossa sala, no lugar de honra? Se Deus, outrora, proibiu aos judeus que tivessem imagens, é porque os judeus habitavam no meio de idólatras e estavam expostos a cair na idolatria. Foi uma medida disciplinar e passageira. Aliás, o mesmo Deus deu ordem a Moisés que adornasse a arca com imagens de anjos. Se os protestantes não têm outra coisa que nos exprobrar, calem-se; esta acusação cobre-os de ridículo.

É inegável a existência do perigo protestante no Brasil. Não se deve, porém, temer exageradamente o protestantismo porque ele tem contra si a promessa feita por Cristo à sua Igreja e porque de sua natureza tende a se desagregar, dividir e multiplicar-se. Todas as tentativas de união serão sempre uma paródia da verdadeira união de fé. Ademais o Brasil nasceu, cresceu e vive ainda sob o bafejo santo da Igreja Católica e não quer ser ingrato às bênçãos celestes, simbolizadas pela constelação bendita do Cruzeiro do Sul. Não se deve, portanto, exagerar o perigo protestante.

Mas, doutra parte, não deve ser desprezado ou descurado. A fé, na verdade, foi prometida à Igreja e não às nações; estas, como os indivíduos, a podem perder; e não padece dúvida que o protestantismo é um sério perigo que poderá ser grave se não se empregarem os remédios aptos e convenientes. Não se devem desprezar os protestantes, porque são nossos irmãos transviados e cegos. Nem é tática bélica desprezar o inimigo, ainda que aparente fraquezas. Se não se deve exagerar nem diminuir o perigo, é preciso considerá-lo em seu justo limite. Daí a necessidade de um estudo leal e ponderado sobre as forças e elementos do protestantismo no Brasil. Quanto maior for o estudo, tanto melhor será o combate.

Devemos combater os protestantes: com grande caridade, muita paciência e ardente zelo pela sua conversão; com constante e sólida instrução do povo nas verdades reveladas; com a prática das virtudes cristãs e com a frequência dos sacramentos; advertindo os fiéis dos enganos; dando bom exemplo; com o sacrifício e orações fervorosas para que todos sejam uma só coisa (Jo 17, 22). O protestantismo foi fundado por Lutero. Quem era Lutero? Um frade que, depois de passar muitos anos no convento, deixou a vida religiosa, deixou seu hábito e... casou. Com quem? Com uma freira, chamada Catarina, que ele mesmo tirou do convento. Lutero viveu e morreu na crápula, na orgia, no escândalo. Julgai se Deus pode suscitar semelhante apóstolo para reformar a Igreja ou fundar uma nova religião. Não discutamos com protestantes, não vamos ao seu culto, nem por curiosidade. Não leiamos suas bíblias, seus folhetos. É pecado mortal ter consigo uma bíblia protestante. Tudo isso expõe nossa fé a naufragar.

X - Sétima Porta do Inferno - O Espiritismo

O espiritismo consiste em pretensas ou verdadeiras comunicações com os espíritos do outro mundo, ou as almas dos defuntos, para descobrir coisas secretas relativas a esta ou à outra vida. Digo comunicações pretensas, supostas, porque é sabido que grande número de médiuns, isso é, de pessoas de que se servem os espíritos para receberem as respostas dos espíritos ou das almas, os profissionais do espiritismo, têm sido convencidos de fraude. Noventa por cento pelo menos dos casos de comunicações espíritas são vergonhosas trapaças.

Digo, em segundo lugar, comunicações verdadeiras, porque sábios verdadeiros e conscienciosos têm verificado a verdade de certas comunicações, de sorte que forçoso é admitir que nem tudo é fraude. Por conseguinte, às vezes há espíritos que se comunicam. A questão é esta: a que espíritos devem ser atribuídas estas comunicações? Em outras palavras: quem é o espírito que se manifesta? Não são almas dos defuntos. O dogma católico admite, para as almas que passaram os umbrais da eternidade, dois estados definitivos e um intermediário, mas passageiro. Ou elas estão no inferno, ou no céu, ou no purgatório. Ora, em qualquer estado destes em que elas se achem, não está na possibilidade delas aparecerem a quem as evoca. As do inferno estão presas pela corrente da justiça divina, que fixou a sua desgraçada sorte para a eternidade e deste horrendo calabouço, de que os demônios são guardas, elas não podem sair, senão em caso muito extraordinário, por especial providência de Deus. As que estão no céu, no purgatório, estão em perfeita conformidade à vontade de Deus, e, portanto, nunca elas se manifestam senão por fins altíssimos, dignos da infinita sabedoria de Deus, como auxiliar com preces e santos sacrifícios essas almas, ou converter algum pecador. A regra geral que Deus tem estabelecido para as almas que passam desta para a outra vida é que: 'o espírito vai e não volta.'

Não são as almas que se manifestam; é o demônio. A prova é que na maioria dos casos estas comunicações tendem ao erro e à falsidade, que é o caráter próprio daquele que tem por título 'pai da mentira'. Sem dúvida, há às vezes algumas verdades enunciadas, mas é para mais facilmente induzir ao erro. Assim dirão que há purgatório, mas que não há inferno; que fulano está no inferno, mas que a condenação não é eterna. Outras vezes são respostas ambíguas e contraditórias. Para um católico não pode haver dúvida, é o demônio. Acrescentemos o que em mais de uma circunstância se tem dado; e é que se algum dos circunstantes se acha munido de água benta, um crucifixo, uma medalha, o espírito ou fica mudo ou dá respostas incoerentes.

Vejamos, aliás, quais as consequências resultantes do espiritismo, para mais vermos a intervenção diabólica porque, pelos efeitos, melhor se conhece a causa. Uma das consequências que mais avultam é a loucura. É um fato notório. O diretor do Hospício dos Alienados Pedro II, no Rio, declarou, há anos passados, que sessenta e cinco por cento dos alienados eram vítimas do espiritismo. Que dizer do suicídio? Quem ignora que os tenha havido e só motivados por esta causa? Quantos desgraçados entre estes cegos a quem satanás leva pelo cabresto até esta última cegueira! Quanto às imoralidades praticadas muitas vezes em certas reuniões espíritas, delas nem convêm falar. Há outras consequências, doutra ordem mais transcendente e é que o espiritismo impele seus adeptos à heresia e ao erro. É principalmente entre os espíritas que se encontram os que negam a divindade de Jesus Cristo, da confissão, da Igreja; os que ridicularizam as práticas religiosas, aprovam o ensino ateu.

Basta! Fica claro e evidente que as pessoas que se entregam a estas práticas cometem pecado mortal não só porque desobedecem à Igreja, que as proíbe, mas também porque procuram põe-se em comunicação com o espírito das trevas, o inimigo de Deus, o que é proibido pela Sagrada Escritura: 'Entre ti não se achará... quem pergunte a um espírito divinatório nem aos mortos.' (Deut 18, 10-11). Os espíritas são hereges porque negam verdades reveladas e aderem a erros condenados, renunciando, desta forma, ao título de católicos. Estão fora da Igreja; se não renunciarem a estas práticas não se salvam.

Excertos da obra 'O Pequeno Missionário - Manual de Instruções, Orações e Cânticos' do Pe. Guilherme Vaessen, 6ª edição, Editora Vozes, 1953.

domingo, 11 de agosto de 2013

SALMO 42


 'Minha alma tem sede de Deus'

1. Do mestre de canto. Poema. Dos filhos de Coré.

2. Como a corça suspira pelas águas correntes, assim a minha alma anseia por Ti, ó meu Deus!

3. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo: quando voltarei a ver a face de Deus?

4. As lágrimas são o meu pão, noite e dia, e durante todo o dia me perguntam: 'Onde está o teu Deus?'

5. Começo a recordar as coisas e a minha alma deterre-se dentro de mim: quando eu passava, à frente do grupo, em direcção à casa de Deus, em gritos de alegria e louvor, no barulho da festa.

6. Porque te curvas, ó minha alma, gemendo dentro de mim? Espera em Deus, eu ainda O hei-de louvar: 'Salvação da minha face e meu Deus!'

7. A minha alma curva-se dentro de mim, e por isso eu me lembro de Ti, desde a terra do Jordão e do Hermon, de ti, ó pequena montanha.

8. Grita um abismo a outro abismo com o fragor das tuas cascatas; as tuas vagas todas e as tuas ondas passaram sobre mim.

9. De dia Javé envia o seu amor, e durante a noite eu vou cantar uma prece ao Deus da minha vida.

10. Vou dizer a Deus: 'Meu rochedo, porque Te esqueces de mim? Porque devo andar pesaroso sob a opressão do inimigo?'

11. Esmigalhando-me os ossos, os meus opressores insultam-me, perguntando durante todo o dia: 'Onde está o teu Deus?'

12. Porque te curvas, ó minha alma, gemendo dentro de mim? Espera em Deus, eu ainda O louvarei: 'Salvação da minha face e meu Deus!'