Capítulo XXVIII
As Longas Penas de Expiação no Purgatório - Lord Stourton - Santa Lidwina e a Alma Tomada pelos Pecados da Luxúria
Dissemos que o valor total da dívida dos sofrimentos do Purgatório provém de todas as faltas não expiadas na terra, mas principalmente dos pecados mortais não remidos à sua culpa. Assim, aqueles homens que passam a vida inteira em estado habitual de pecado mortal e que atrasam a sua conversão até quase à morte, supondo que Deus lhes conceda essa graça excepcional, terão que sofrer os mais terríveis castigos.
O exemplo de Lord Stourton dá-nos bons motivos para reflexão. Lord Stourton, um nobre inglês, era católico de coração mas, para manter a sua posição na corte, frequentava regularmente os ritos protestantes. Ele até acolheu um sacerdote católico em sua própria casa, ao preço dos maiores perigos, com o propósito de fazer uso do seu ministério para se reconciliar com Deus na hora de sua morte. Entretanto, ele sofreu um acidente repentino e, como muitas vezes acontece em tais casos, por um justo decreto de Deus, não teve tempo de realizar o seu desejo de conversão tardia. No entanto, a Divina Misericórdia, levando em consideração o que ele havia feito em favor da Igreja Católica tão perseguida na Inglaterra, concedeu-lhe a graça da contrição perfeita e, consequentemente, garantiu a sua salvação. Mas teve que pagar muito caro por sua negligência culposa. Anos se passaram. Sua viúva casou novamente e teve filhos. E é uma de suas filhas, Lady Arundel, que relata este fato como testemunha ocular:
'Um dia minha mãe pediu a F. Cornelius, um jesuíta de grande prestígio e que mais tarde morreu mártir (foi traído por um servo da família Arundel e executado em Dorchester em 1594), que rezasse uma missa em intenção da alma de Lord Stourton, seu primeiro marido. Ele assim o fez e, enquanto estava no altar, entre a Consagração e a Memento pelos mortos, parou por um longo tempo como se estivesse absorto em oração. Depois da missa, numa exortação que dirigiu aos presentes, contou-lhes uma visão que acabara de ter durante o Santo Sacrifício. Ele tinha visto uma imensa floresta que se estendia à sua frente, mas inteiramente em chamas, formando uma fornalha imensa. No meio dela, estava o nobre falecido, soltando gritos terríveis, lamentando a vida culpada que levara no mundo e na corte. Após ter feito uma confissão completa de suas faltas, o infeliz a terminou com estas palavras, que a Sagrada Escritura coloca na boca de Jó: 'Tem piedade de mim! Tenham piedade de mim, pelo menos vocês meus amigos, pois a mão do Senhor me tocou'. E então desapareceu. Enquanto relatava isso, F. Cornelius derramou muitas lágrimas, e todos nós, membros da família, ao número de vinte e quatro pessoas, choramos também. De repente, enquanto o padre ainda falava, percebemos na parede contra a qual o altar estava o que parecia ser o reflexo de brasas acesas'. Tal é o relato de Dorothy, Lady Arundel, como pode ser lido na 'História da Inglaterra', por Daniel.
Santa Lidwina também viu no Purgatório uma alma que sofreu longas penas por pecados mortais não suficientemente expiados na terra. O incidente é assim relatado na vida da santa. Um homem que, por muito tempo foi escravo do demônio da impureza, finalmente teve a felicidade de se converter. Confessou os seus pecados com grande contrição, mas, impedido pela morte, não teve tempo de expiar com justa penitência seus numerosos pecados. Lidwina, que o conhecia bem, rezou muito pela sua alma. Doze anos depois de sua morte ela ainda continuava a rezar na sua intenção, quando, em um de seus êxtases, foi levada ao Purgatório por seu anjo guardião e então ouviu uma voz triste saindo de um poço profundo. 'É a alma daquele homem' - disse o anjo - 'por quem você tem rezado com tanto fervor e constância'.
Ela ficou surpresa ao encontrá-lo nas profundezas do Purgatório doze anos após a sua morte. O anjo, vendo-a tão afetada, perguntou se ela estava disposta a sofrer algo em favor de sua libertação. 'De todo o meu coração' - respondeu a donzela caridosa. A partir desse momento, passou a sofrer novas dores e tormentos assustadores, que pareciam superar a força da resistência humana. No entanto, ela os suportou com tanta coragem, sustentada por uma caridade mais forte que a morte, que agradou a Deus enviar-lhe finalmente alívio. Ela então respirou como quem tivesse sido trazida novamente à vida e, ao mesmo tempo, viu aquela alma, pela qual tanto sofrera, sair do abismo, branca como a neve, e voar para o Céu.
Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)