terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

A LITURGIA DA SANTA MISSA (IV)

4. RITOS INICIAIS: SINAL DA CRUZ, SAUDAÇÃO, ATO PENITENCIAL E KYRIE

Sinal da Cruz

O Sinal da Cruz é litúrgico e canônico; o SACERDOTE diz: 'Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo', ao que O POVO responde: 'Amém'. O Sinal da Cruz não deve, portanto, ser rezado integralmente pelo sacerdote e por todos os fiéis. Por esta razão, é totalmente contraindicada a versão cantada do sinal da cruz, uma vez que, além de incluir outros termos absolutamente dispensáveis, a oração passa a ser compartilhada integralmente pelo sacerdote e pelos fieis, sem quaisquer distinções das respectivas partes.

Uma outra grande objeção à versão cantada: 

Em nome do Pai, em nome do Filho [...]
Para louvar e agradecer, bendizer e adorar,
te aclamar… (palmas)

Aclamar com palmas Jesus diante de sua agonia de morte no Calvário? O que estamos fazendo quando, no início da Santa Missa, ao nos prostramos diante dEle no Calvário, O saudamos com... palmas?!  

Saudação 

'A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam convosco'. Com esta oração, o celebrante conclama a presença da Santíssima Trindade junto à assembleia reunida, para que sejam celebrados dignamente os sagrados mistérios. Após a saudação, a assembleia respondendo, confirma esta proposição do celebrante: 'Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo'. É chamada de saudação apostólica, pois tem sido uma prática corrente desde os tempos da Igreja primitiva. 

Ato Penitencial 

O Ato Penitencial, iniciado sempre com o convite do sacerdote, constitui uma oração de confissão geral envolvendo toda a assembleia, incluindo o próprio celebrante. Deve ser precedida por um momento de silêncio, para que cada fiel, em contrita reflexão interior, possa implorar a Deus o perdão de suas culpas e dos seus pecados veniais, inexoravelmente ligados à nossa frágil condição humana, de forma a torná-los dignos de participação na Santa Missa e na Mesa Eucarística. Na Forma Ordinária do Rito Romano, o Ato Penitencial pode contemplar três versões:

(i) recitação do 'Confiteor' ('Confesso')


Confesso a Deus Todo-poderoso, à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem-aventurado Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado João Batista, aos santos Apóstolos Pedro e Paulo, e a todos os santos, que pequei muitas vezes por pensamentos, palavras e ações, por minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa. Por isso, peço à bem-aventurada sempre Virgem Maria, ao bem-aventurado Miguel Arcanjo, ao bem-aventurado João Batista, aos santos Apóstolos Pedro e Paulo, e a todos os santos, que oreis por mim a Deus, Nosso Senhor. Amém.

(ii) oração envolvendo o celebrante (C) e a assembleia (A):

C – Tende compaixão de nós, Senhor.
A – Porque somos pecadores.

C – Manifestai, Senhor, a vossa misericórdia.
A – E dai-nos a vossa salvação.

Nestas duas acepções, o ato é continuado com uma fórmula de absolvição em que o celebrante se inclui, para deixar claro que não se trata de um rito similar ao do sacramento da penitência: 'Deus todo-poderoso tenha compaixão de nós, perdoe os nossos pecados e nos conduza à vida eterna'. O ato é, então, concluído com o Kyrie

(iii) ato penitencial associado à oração do Kyrie (exposto a seguir), com a inserção de pequenas frases chamadas tropos. 

Em missas especiais, o ato penitencial pode ser substituído pela bênção e aspersão da água em recordação ao batismo (particularmente durante o tempo pascal) ou, por exemplo, pela imposição de cinzas (na quarta-feira de cinzas).

Kyrie 

Conjunto de três invocações à misericórdia divina que tem origem nas ladainhas de aclamações a Deus que eram feitas durante as procissões, nos primeiros tempos da Igreja, e que eram recitadas originalmente na língua grega, quando esta era a língua litúrgica oficial de Roma (antes do século IV da nossa era). No rito atual, as invocações são repetidas duas vezes (três vezes nas missas tridentinas):

C – Senhor, tende piedade de nós (Kyrie eleison em grego)
A – Senhor, tende piedade de nós (Kyrie eleison em grego)

C – Cristo, tende piedade de nós (Christe eleison em grego)
A – Cristo, tende piedade de nós (Christe eleison em grego)

C – Senhor, tende piedade de nós (Kyrie eleison em grego)
A – Senhor, tende piedade de nós (Kyrie eleison em grego)

A terceira forma do Ato Penitencial está diretamente associada à oração do Kyrie por meio da utilização dos tropos. Estas inserções podem ser bastante variáveis e adaptáveis às diferentes festas litúrgicas da Igreja, sendo várias delas propostas no Missal. Assim, por exemplo, para a época do Advento, possíveis variantes do Kyrie seriam:

Senhor, [que viestes ao mundo para nos salvar], tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

Cristo, [que continuamente nos visitais com a graça do vosso Espírito], tende piedade de nós.
Cristo, tende piedade de nós.

Senhor, [que vireis um dia para julgar as nossas obras], tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

As frases breves, indicadas entre colchetes, são os tropos, cuja finalidade é realçar ou complementar as invocações a Nosso Senhor Jesus Cristo por meio de um atributo específico adicional, particularmente referente ao perdão e à misericórdia divina. A excessiva liberdade dada à utilização dos tropos pode, evidentemente, conduzir a proposições algo inadequadas ou mesmo equivocadas.

Finalmente, é preciso enfatizar, mais uma vez, a natureza geral do tropo na possibilidade desta variante (terceira variante) do Ato Penitencial:

Senhor, [tropo], tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.

As distorções a esta variante são óbvias e, infelizmente, padrões na grande maioria das missas, que incluem 'atos penitenciais' totalmente diversos e estruturados sobre modelos completamente avessos à sistemática dos tropos. Um exemplo bem conhecido, como tantos outros, é o seguinte: 

Pelos pecados, erros passados; por divisões na tua Igreja, ó Jesus!
Senhor, piedade! Senhor, piedade! Senhor, piedade, piedade de nós! 
Quem não te aceita, quem te rejeita, pode não crer por ver cristãos que vivem mal!
Senhor, piedade! Senhor, piedade! Senhor, piedade, piedade de nós! 
Hoje, se a vida é tão ferida, deve-se à culpa, indiferença dos cristãos!
Senhor, piedade! Senhor, piedade! Senhor, piedade, piedade de nós! 

Além da livre adulteração da estrutura e, principalmente, da natureza litúrgica do Kyrie, as frases incluídas na oração não são tropos; trata-se apenas de mais um triste exemplo de como, embora de forma velada, a prática abusiva da liberdade de atuação religiosa pode descaracterizar o rigor litúrgico da magna oração da cristandade. 

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