quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

500 ANOS DO NASCIMENTO DE SANTA TERESA DE ÁVILA (II)

SANTA TERESA DE ÁVILA (1515 - 2015)

  • Que se guardem das ocasiões.
Para que vejam a sua misericórdia e o grande bem que foi para mim não ter deixado a oração e lição, direi aqui - pois importa tanto que isto se entenda - a bateria que faz o demônio a uma alma, a fim de a ganhar, e o artifício e misericórdia com que o Senhor procura chamá-la de novo a Si, e se guardem dos perigos de que não me guardei. E sobretudo, por amor de Nosso Senhor e pelo grande amor com que nos anda atraindo para que voltemos a Ele, peço que se guardem das ocasiões; uma vez metidas nelas, não há que fiar quando tantos inimigos nos combatem e tantas fraquezas há em nós para nos defendermos  (Livro da Vida, 8.10).

  • Quem deveras ama a Deus, todo o bem ama.

Quem deveras ama a Deus, todo o bem ama, todo o bem quer, todo o bem favorece, todo o bem louva, com os bons se junta sempre e os favorece e defende; não ama senão verdades e coisa que seja digna de se amar. Pensais que é possível, a quem mui deveras ama a Deus, amar vaidades, ou riquezas, ou coisas de deleites do mundo, ou honras, ou que tenha contendas ou invejas? Não, que nem pode; e tudo, porque não pretende outra coisa senão contentar ao Amado. Andam estes morrendo para que Ele os ame, e estas dariam a vida para entender como mais Lhe hão de agradar. Que o amor de Deus, se deveras é amor, é impossível que esteja muito encoberto. Senão, olhai um São Paulo, uma Madalena: em três dias um começou a dar mostras de estar enfermo de amor: foi São Paulo. Quanto a Madalena, desde o primeiro dia; e como o deu bem a entender! Que vivam o amor: há mais e há menos; e assim se dá a conhecer conforme a força que ele tem. Se é pouco, dá-se pouco a conhecer; se é muito, muito; mas pouco ou muito, caso haja amor de Deus, sempre se conhece (Caminho da Perfeição, 40.3).

  • Toda eu me perturbei por O ver assim.

Andava pois já a minha alma cansada e, embora quisesse, não a deixavam descansar os ruins costumes que tinha. Aconteceu-me que, entrando eu um dia no oratório, vi uma imagem, que para ali trouxeram a guardar; tinham-na ido buscar para certa festa que se fazia na casa. Era a de Cristo muito chagado e tão devota que, ao por nela os olhos, toda eu me perturbei por O ver assim, porque representava bem o que passou por nós. Foi tanto o que senti por tão mal Lhe ter agradecido aquelas chagas, que o coração, me parece, se me partia e arrojei-me junto d' Ele com grandíssimo derramamento de lágrimas, suplicando-Lhe me fortalecesse de uma vez para sempre para não O ofender. 

Eu era muito devota da gloriosa Madalena e muitas, muitas vezes, pensava na sua conversão, em especial quando comungava. Como sabia de certeza que o Senhor estava ali dentro de mim, punha-me a Seus pés, parecendo-me que não eram de rejeitar as minhas lágrimas; nem mesmo sabia o que dizia, que muito fazia Ele consentindo que eu as derramasse por sua causa, pois tão depressa olvidava aquele sentimento. Encomendava-me àquela gloriosa santa para que me alcançasse perdão. Mas, esta última vez, desta imagem que digo, parece-me que me aproveitou mais, porque estava já muito desconfiada de mim e punha toda a minha confiança em Deus. Penso que Lhe disse então que não me levantaria dali até que fizesse o que Lhe suplicava. Creio certamente que me aproveitou, porque fui melhorando muito desde então  (Livro da Vida, 9.1-3).

  • Comece por não se espantar com a cruz.

Assim, torno a avisar - e ainda que o diga muitas vezes nada se perde com isso - pois importa muito: de securas, de inquietação e distraimento dos pensamentos, ninguém se deprima nem aflija. Se quer ganhar liberdade de espírito e não andar sempre atribulado, comece por não se espantar com a cruz e verá como o Senhor também lha ajuda a levar, e o contento com que anda e o proveito que tira de tudo. Porque já se vê que, se do poço não mana água, nós não lha podemos por. Verdade é que não havemos de ficar descuidados para a tirar, quando a haja; porque então já Deus quer, por este meio, multiplicar as virtudes (Livro da Vida, 11.17).

  • Lembrar o pouco que tudo dura, e como tudo é nada.

Por isto e por muitas outras coisas, avisei eu no primeiro modo de oração -na primeira água - o muito que importa começarem as almas a terem oração, indo-se desapegando de todo o gênero de contentamentos e entrarem nela determinadas única e somente a ajudarem Cristo a levar a cruz, como bons cavaleiros que, sem soldo algum, querem servir a seu Rei, pois sabem que têm a paga bem segura. E olhos postos no verdadeiro e perpétuo reino que pretendemos ganhar! Grandíssima coisa é ter-se isto sempre bem presente, em especial nos princípios. Depois vê-se mui claramente que mais preciso é esquecê-lo para poder viver; do que procurá-lo: lembrar o pouco que tudo dura, e como tudo é nada e o nada em que se há-de apreciar o descanso (Livro da Vida, 15.11).