IV
A segunda razão do Sinal da Cruz ter sido dado aos homens é a de nos tirarmos da ignorância, pois é um livro sagrado que nos instrui. Todas as ciências, teologia, filosofia, sociologia, política, história, estão reduzidas nestas três palavras: 'criação, redenção, glorificação' — de modo insubstituível, são para o gênero humano mais necessárias que o pão para nutrir-se e mais que o ar para respirar. Só elas bastam para orientar a vida inteira. Orientam as alegrias, as tristezas, os pensamentos, as palavras, as ações, os sentimentos. Sendo assim, a simples razão diz que Deus devia estabelecer um meio fácil, permanente e universal que desse a todos este conhecimento fundamental. Não devia, porém, dá-lo de uma só vez e de passagem; devia renová-lo constantemente, assim como se renova a cada instante o ar que respiramos.
Que sábio se encarregaria deste ensino indispensável?
São Paulo, Santo Agostinho, São Tomás?
Ou outro gênio qualquer do Oriente ou do Ocidente?
Não.
Estes morreram; e seria necessário algo que não morresse.
Estes habitaram um lugar determinado e seria necessário algo que estivesse em toda a parte.
Estes falaram línguas que nem todos compreendem e seria necessário algo que falasse uma língua inteligível a
todos. O que seria pois este algo? É o Sinal da Cruz.
Ele e só ele satisfaz a todas as condições exigidas: não morre:
está em toda a parte e é por todos entendido.
Um instante lhe basta para dar uma lição, como lhe
basta um instante para todos o compreenderem.
Mas seria verdade que o Sinal da Cruz repete e ensina como convém as três grandes palavras: 'criação, redenção, glorificação'? Sim.
E não só as repete e ensina, mas explica-as com
uma autoridade, profundidade e lucidez que só a ele pertencem.
Repete-as com autoridade porque, sendo divino em
sua origem, vem do próprio Deus.
Repete-as com profundidade e lucidez porque se explica nos termos seguintes:
Quando levas a mão à tua fronte, dizendo — 'Em
Nome' — o Sinal da Cruz te ensina a indivisível Unidade
da Essência Divina. Dizendo — 'do Pai' — novo e imenso raio de luz
penetra na tua inteligência.
O Sinal da Cruz te diz que há um Ser, Pai de todos
os Pais, princípio eterno da existência de todas as criaturas, celestes e terrestres, visíveis e invisíveis. Dizendo — 'e do Filho' — o Sinal te diz que o Pai dos Pais tem um Filho semelhante a Ele.
Fazendo-te levar a mão ao peito, quando assim o pronuncias, ele te diz que este Filho eterno de Deus se fez Homem no seio de uma Virgem para resgatar a
humanidade. 'E do Espírito Santo' — esta palavra completa o ensino do Sinal da Cruz. Tu sabes agora que há um Deus, Uno na essência e Trino em
Pessoas. Se a Primeira Pessoa necessariamente é Poder, a segunda é necessariamente a Sabedoria e a terceira é necessariamente o Amor.
Este amor, completando a obra do Pai Criador e do Filho Redentor, santifica o
homem e o conduz à glória. Pronunciando o nome do Espírito Santo, tens formada a Cruz e não só conheces o Redentor, mas também
o instrumento da Redenção.
Será possível ensinar com tão poucas palavras, com mais eloquência e em linguagem mais inteligível, os três grandes dogmas:
— 'criação, redenção, glorificação' — eixos do mundo moral e princípios geradores da inteligência humana?
Ser criado, ser remido, ser destinado à glória eterna, eis o princípio e todo o futuro do homem. Graças ao uso tão frequente do Sinal da Cruz em todas as classes da sociedade, tanto nas cidades e como nas
aldeias, o mundo católico dos primeiros séculos e da Idade Média conservou, em grau até então desconhecido, o conhecimento da Ciência Divina, mãe de todas as ciências
e mestra da vida.
O mundo
moderno abandonou o Sinal da Cruz e, desde esse tempo,
não mais teve a seu lado um Monitor que lhe avivasse, a
cada instante, os três grandes dogmas indispensáveis à
vida moral. Por isso, ao olvidar o Sinal da Cruz, 'criação, redenção, glorificação', essas três Verdades fundamentais
são para ele como se não existissem. O mundo de hoje só conhece e adora
o deus-eu,
o deus-comércio,
o deus-dinheiro,
o deus-ventre, o deus-prazer ou a deusa-indústria,
a deusa-política e a deusa-volúpia.
Por serem meios de satisfazer a todos os seus maus
desejos, ele conhece e adora as ciências da matéria:
— a química, a física, a mecânica, a dinâmica, os sulfatos, os nitratos e os carbonatos.
Eis aqui as divindades destes séculos e o seu
culto.
Eis aqui a teologia, a filosofia, a política, a moral, a vida do mundo moderno, com seus egoísmos e vícios! Progredindo assim, breve estará bem a par dos contemporâneos de Noé, destinados a morrer nas águas
do dilúvio.
Para aqueles também consistia-lhes toda a ciência em conhecer e adorar os deuses do mundo moderno: comer, beber, edificar, comprar, vender e casar cada um, a si e aos outros, animados de todas estas más tendências que não faltam ao mundo atual!
O Sinal da Cruz é um livro que nos educa e nos eleva. Sob tal ponto de vista, podes agora julgar se era sem razão que nossos pais constantemente faziam o Sinal da Cruz. E se deve à ignorância, uma ignorância muito deplorável do mundo atual, o abandono do Sinal da Cruz. Qual é esta ignorância? A chamada 'indigência do espírito', que procede da fraqueza em praticar a virtude e repelir o mal. E por que existe tal fraqueza? Porque o homem atual despreza os meios de obter a graça e de torná-la eficaz. O primeiro, o mais pronto, o mais comum e o mais fácil destes meios é a oração. E, de todas as orações, a mais fácil, a mais pronta, a mais comum e talvez, a mais poderosa, é o Sinal da Cruz.
(Excertos adaptados da obra 'O Sinal da Cruz', do Monsenhor Gaume, 1862)