quinta-feira, 25 de abril de 2013

POR QUE OS BONS DEVEM SOFRER?

Como membro da sociedade e cidadão de seu país, você deve se juntar com as demais pessoas para a reparação e satisfação requeridas pela Divina Justiça para os pecados públicos e nacionais cometidos na comunidade em que você vive. Por pecados públicos e nacionais, entendemos alguns pecados de natureza mais grave que são cometidos em escala tão grande e por tantas pessoas em uma comunidade, seja uma cidade, província ou nação inteira, que eles são atribuídos à comunidade como um todo e não somente àquele ou a esse indivíduo. 

Pecados desse tipo são: apostasia da fé, irreligião e esquecimento de Deus; educação sem Deus da juventude; profanação do nome de Deus, imprecações, blasfêmias e perjúrios; profanação do domingo; modas imodestas e escandalosas; artes, literatura e divertimentos imorais; divórcio e adultérios sancionados por lei iníquas do Estado; desonestidade, injustiça e opressão dos pobres, assassinatos e suicídio de raças; e, finalmente, orgias selvagens de grande imoralidade e licença sem freio que periodicamente desgraçam as festividades públicas e celebrações, ou que ocorrem em bailes, danças, banquetes e eventos similares. 

Deus é extremamente paciente e tolera por muito tempo, e não inflige castigos gerais de bom grado, mesmo que sejam muito merecidos por uma comunidade. Ele prefere, na verdade, que seus filhos que o ofendem busquem o perdão por meio do arrependimento e conversão oportuna. Ele esperou cem anos antes de mandar o dilúvio, que havia encarregado Noé de anunciar; Ele permitiu que 40 anos transcorressem entre a previsão feita por Nosso Senhor da destruição vindoura de Jerusalém e o cumprimento da profecia pelos romanos no ano 70; Ele poupou a cidade de Nínive integralmente porque seus habitantes imediatamente deixaram de pecar e se apressaram a fazer penitência com a pregação de Jonas. Deus age dessa maneira ainda agora. Ele frequentemente espera um longo tempo antes de infligir às cidades e às nações pecaminosas os castigos mais pesados que pedem as suas múltiplas iniquidades. Ele deseja poupá-las e tenta, portanto, em primeiro lugar, de todas as maneiras, chamá-los ao dever, à conversão e ao arrependimento. 

Mas se, apesar desses atrasos, elas obstinadamente recusarem a entrar em si e deixar o pecado; se continuarem em sua maldade, às vezes até pecando mais arrojadamente porque suas más ações não foram punidas imediatamente, então deve chegar a hora na qual a medida da iniquidade foi completada até o transbordamento. Essa hora marcará o início de alguma intervenção geral que cairá pesadamente sobre a comunidade culpada como uma punição justa de suas longamente continuadas transgressões à Santa Lei de Deus – enchentes destrutivas ou tempestades, conflagrações, terremotos; períodos de escassez ou fome; epidemias e pestilências; e, especialmente, os horrores de rebeliões e revoluções,  guerras civis e internacionais. A justiça divina usa esses males para a punição e correção do povo pecador da mesma maneira que um sábio pai de família usa a vara para o castigo e a emenda de seu filho teimoso. 

Nem é sempre necessário que Deus mande esse castigo para os pecados públicos como Ele enviou o dilúvio e a destruição de Jerusalém. Há muitos pecados que contêm em si mesmos as sementes de um futuro sofrimento público, como a semente do carvalho contém a gigantesca árvore. Se esses pecados prevalecerem por um tempo suficientemente longo, sem freio e sem arrependimento, eles devem produzir condições tais na ordem social de forma que tornem inevitáveis certas calamidades. Tome-se o caso, por exemplo, do pecado da educação sem Deus, ou seja, sem religião. Onde tal sistema for adotado, os seguintes resultados deverão ocorrer: depois de duas ou três gerações, o conhecimento de Deus desaparecerá mais ou menos completamente entre o povo; o sentido do certo e do errado será perdido; o bem será chamado mal, e o mal, bem; não haverá respeito à lei moral; a depravação da juventude crescerá mais e mais; a desonestidade e a corrupção prevalecerão nos negócios, nos tribunais, nos legisladores e no próprio governo; tributos serão sonegados ou desaparecerão nos bolsos de inescrupulosos; grandes despesas serão necessárias para manter o número crescente de asilos, tribunais juvenis, reformatórios e prisões; não haverá segurança para honrar a propriedade e a vida; as relações entre o capital e o trabalho serão pressionadas até o máximo, de maneira que a violência e o derramamento de sangue serão inevitáveis; a vida familiar será perturbada pelo adultério, divórcio e amor livre; rivalidades nacionais, invejas e ódios, provocados pela cobiça comercial crescerão cada vez mais intensamente, até que levem a guerras internacionais com miséria indescritível para milhões. As nações que semeiam vento colhem tempestade.

Os pecados públicos e nacionais devem ser expiados neste mundo pela simples razão de que não podem ser expiados no próximo. No mundo vindouro, famílias, cidades, províncias e nações não continuarão a existir como corporação. Lá, homens e mulheres existirão apenas como indivíduos, sem estar unidos por vínculos sociais, civis, políticos e nacionais, que são necessários nesta vida para o bem-estar e a preservação da raça humana. Na eternidade, eles gozarão individualmente dos frutos de suas vidas na terra – os bons possuirão o Reino de Deus no Céu, ao passo que os perversos sofrerão por seus atos maus no fogo do Inferno, que não pode ser debelado. Mas como os pecados públicos requerem expiação pública, e como essa expiação não pode ser feita na próxima vida, fica claro que ela deve ser feita do lado de cá da sepultura.

E chegamos afinal à razão do sofrimento dos inocentes, ou seja, a explicação do porquê de que mesmo aqueles que não cometem os pecados graves que assolam um país devem se unir às outras pessoas na reparação dos pecados públicos. Muitos apostatam da fé católica e deixam de acreditar em Deus porque não acham justo o sofrimento do inocente. Mas quem é totalmente inocente? As pessoas têm uma noção errada de inocência porque não têm noção do pecado. E, na verdade, aquele que é inocente mesmo quer sofrer pelos outros. 'Por que o inocente deve sofrer?' Uma questão que termina sendo uma amarga tentação para muitas pessoas cuja fé é fraca e pouco iluminada surge em conexão com o que dissemos: por que os bons e virtuosos não são poupados nesses tempos, mas são compelidos a sofrer como os outros? Se Deus é justo, como Ele pode permitir que o inocente seja afligido com o culpado? Há várias razões pelas quais Deus permite que o bom sofra em tempos de castigo público: 

(i) É certamente justo e correto que os bons auxiliem a Deus oferecendo a reparação necessária pelos pecados públicos, porque no tempo normal eles gozam juntamente com os seus concidadãos das bênçãos da paz, tranquilidade e prosperidade nacional. Os seus interesses temporais são comuns, tanto no tempo de prosperidade quanto no da aflição;

(ii) Aqueles que são inocentes por não terem de fato tomado parte em pecados públicos não são, só por essa razão, completamente livres de culpa diante dos olhos de Deus. Muito frequentemente eles são culpados desses pecados de uma maneira indireta – de maneira acessória a eles, como se diz. Assim, eles podem ter cooperado com alguma forma de imoralidade, podem não ter protestado contra ela, podem ter negligenciado o uso de sua autoridade, ou influência, ou direito de votar, ou no impedimento de sua introdução, ou em conseguir sua remoção quando ela já estivesse introduzida, e isso tudo por meio de indiferença, respeito humano, medo de perseguição, perda de negócios ou razões semelhantes e sem valor;

(iii) Os sofrimentos dos bons têm um valor expiatório muito maior do que aqueles dos maus. Portanto, quanto mais pessoas boas puderem se juntar para fazer a expiação necessária, mais rapidamente ela será feita. Ademais, Deus é facilmente movido, em consideração pelo sofrimento dos bons, a mitigar bastante suas punições, e às vezes cessá-las completamente;

(iv) A visão do sofrimento dos bons por pecados que eles não cometeram é apta a promover a conversão e salvação dos maus, fazendo-os lembrar vivamente dos castigos mais rigorosos que a eles serão infligidos na vida futura. Se o pecado é punido de forma tão severa sobre os bons na terra, quanto mais o será sobre o pecador não arrependido na eternidade;

(v) Esses sofrimentos dão aos bons oportunidade de fazer expiação completa de seus pecados pessoais. Pois não há alguém tão santo e tão confirmado em graça que não tenha cometido alguns pecados, ao menos veniais. 'Até o justo cai sete vezes', isto é, frequentemente. Mas é uma lei imutável que todo pecado, mesmo o menor deles, deve ser expiado ou aqui ou depois, no Purgatório. Mas a expiação feita aqui é muito mais lucrativa do que a que será feita após a morte;

(vi) Suportar pacientemente o sofrimento indevido faz com que o bom se assemelhe a Jesus Cristo, que, apesar de perfeitamente inocente, tomou a si a tarefa de fazer reparação pelos nossos pecados e, com isso, abriu o Céu para nós. Se Ele não tivesse feito essa reparação, não poderíamos ser salvos. Ademais, o sofrimento inocente permite que o bom atinja os mais altos graus de graça e virtude, o que acarretará para eles um correspondente elevado grau de glória eterna no Reino dos Céus. 

(Why must I suffer, Pe. F.J. Remler, C.M., Loreto Publications, 2003).