quinta-feira, 18 de abril de 2013

TRINTA E DUAS HÓSTIAS NO CHÃO

Certa vez, poucos meses antes de sua morte, perguntaram ao Bispo Fulton Sheen, quem tinha sido a pessoa que lhe teria causado maior impacto ao longo de toda a sua vida. Teria sido o atual papa ou um anterior? Quem seria tal pessoa? Eis a sua resposta: 'A pessoa que mais me impactou não foi um papa, nem um cardeal ou outro bispo, e não era sequer um sacerdote ou freira. Foi uma pequena menina chinesa de apenas onze anos de idade'. E, em seguida, contou a seguinte história: 

'Quando os comunistas ocuparam toda a China, o ódio ao catolicismo os levou a mandar para a cadeia, quando não assassinar, todos os religiosos e religiosas, particularmente aqueles que não tinham a nacionalidade chinesa, que lá se encontravam. Um destes religiosos contou-me o que havia ocorrido na sua igreja. Ele explicou que tinha sido confinado à casa paroquial, próximo à igreja e assistiu horrorizado, de sua janela, como os comunistas entraram na igreja e se dirigiram ao altar. Enlouquecidos de ódio profanaram o sacrário, atirando o cibório ao chão e espalhando as hóstias consagradas. Como eram tempos de perseguição, o padre tinha tomado a precaução de saber exatamente quantas hóstias continha o cibório: trinta e duas.

Perpetrado o sacrilégio, os comunistas se retiraram, deixando uma sentinela de guarda para impedir quaisquer cultos na igreja. Não perceberam ou desconsideraram a presença de uma menina, de cerca de onze anos, que rezava na penumbra no fundo da igreja. A menina, depois de assistir tudo o que tinha acontecido, foi para casa. Mas, à noite, ela voltou para a igreja, evitando a sentinela comunista de plantão, mais preocupado em monitorar a casa paroquial onde se encontrava o padre do que propriamente a igreja agora vazia, com os danos causados pelos invasores e, mais importante de tudo, com as trinta e duas hóstias consagradas, jogadas e espalhados pelo chão. 

Uma vez na igreja, ela se colocou na parte de trás do templo e ficou a orar por uma hora, num ato de amor e reparação ao ódio demonstrado pelos seus irmãos de raça. Após a sua hora santa, a menina moveu-se sigilosamente até o altar, ajoelhou-se até o chão e tomou, com a língua, uma das hóstias profanadas. Nesta época, ainda não estava em vigor as atuais regras de comunhão como jejum rigoroso, não comer ou beber 12 horas antes, não tocar as espécies consagradas com as mãos. A menina retornou à igreja cada uma das noites seguintes, fazendo inicialmente a sua hora santa e, em seguida, dirigindo-se para o altar e receber com a língua, uma a uma, as hóstias do chão

Na trigésima segunda noite, depois de fazer a última comunhão, a menina tropeçou acidentalmente e o ruído alertou o sentinela de plantão. A pequena tentou fugir, mas foi perseguida pelo guarda comunista que a agarrou e a golpeou até a morte com a coronha de seu rifle. Este ato de martírio heroico foi testemunhado pelo padre, da janela do seu quarto na casa paroquial, onde era mantido recluso'.

Ao tomar ciência da história, o Bispo Sheen disse ao seu entrevistador que ficou tão chocado, que prometeu ao Senhor fazer uma hora santa de oração diante do Santíssimo Sacramento todos os dias, pelo resto de sua vida. Se aquela garotinha chinesa tinha sido capaz de testemunhar com a própria vida a presença real de Jesus no Santíssimo Sacramento, ele, como bispo, teria que fazer o mesmo. Seu único desejo desde então foi atrair o mundo ao Coração Ardente de Jesus no Santíssimo Sacramento. E continuou:

'Embora seja uma bela história, não gostamos do final. Não gostamos que o soldado comunista tenha subjugado a menina e desferido golpes mortais na sua cabeça com a coronha do rifle. E a razão fundamental para este nosso desgosto, é que, como somos corpo e alma, matéria e espírito, a preponderância normal em nós é a do corpo sobre o espírito, pelo que ansiamos um final mais feliz, mais ditoso, mais ao estilo 'hollywood' e não na tristeza da morte do protagonista, da menina chinesa anônima. O que acontece é que, dado esse apego que temos às coisas do mundo, valorizamos mais em nos manter nele, a qualquer preço, do que em valorizar a glória concedida a esta menina no seu martírio. Nossa corporalidade humana nos cega e não percebemos que a parte mais bonita desta história é justamente o seu final, o regalo da palma do martírio, que Deus concedeu à alma dessa menina chinesa, alma privilegiada de quem se fez eleita do Senhor'.