quinta-feira, 14 de maio de 2020

POEMAS PARA REZAR (XXXIV)


DEUS PARA NÓS TE FEZ MÃE SUA!


Virgem benigna, sábia, gloriosa, 
por quem o mundo ingrato é sustentado, 
por quem livre se viu do reino escuro, 
depois de tanto tempo mal gastado, 
em vida tão incerta e perigosa; 
em ti só me confio e asseguro, 
tu és porto seguro, 
de casos da fortuna, 
tu és firme coluna;
de nossas esperanças, Virgem pia, 
tu és raio do sol do eterno dia, 
que as trevas rompe e os montes nos descobre
que o Rei profeta via, 
donde ao cego vem luz, socorro ao pobre !

Virgem cheia de graça, admirável, 
que o Verbo eterno, amando, concebeste 
no ventre virginal, templo divino,
quem não cabe nos Céus, nele escondeste 
por sobrenatural modo inefável, 
mistério só de Deus e de ti digno, 
orvalho cristalino, 
do Verbo milagroso, 
pão vivo precioso, 
que a dar-nos vida eterna, do Céu veio, 
milagre dos milagres, que do seio 
do Pai viu o extremo da humildade, 
e dele tira um meio, 
que fez preço do Céu, nossa vontade. 

Virgem, visão de paz, arca segura, 
do dilúvio geral, por Deus traçada, 
para que habite a glória em nossa terra, 
custódia da lei, santa, imaculada, 
que em mais perfeito grão mostra a doçura 
dos divinos preceitos que ela encerra, 
aurora que desterra 
a noite da alma cega, 
nuvem que os justos rega 
com água viva do divino espírito,
livro em que foi por ele o nome escrito, 
que enche o Céu, salva o mundo, o inferno rende, 
cujo preço infinito, 
mostrou, posto na Cruz, quem só o entende!  

Virgem do eterno Rei, santa cidade, 
rica, nobre, formosa, e triunfante, 
fim de toda a celeste arquitetura; 
teu muro é de fortíssimo diamante, 
espelho da católica verdade, 
por quem luz do Criador teve a criatura. 
As torres, cuja altura
só medem mãos divinas,
são de esmeraldas finas, 
donde tua esperança a Deus namora
teus passos de rubis, em que Ele mora,
a tua caridade mostram nele
por quem o Céu te adora, 
e a terra veio a ser mais alta que ele.

Virgem resplandecente, que subsiste 
dos anjos acompanhada, triunfando, 
ao tálamo em que estás sobre as estrelas, 
com resplendor eterno, sempre dando 
louvores ao Senhor, que cá pariste, 
a eles alegria, e luz a elas: 
achar o número delas, 
meter numa só gota o mar, 
pesar o fogo e o ar, 
é menos que o meu pobre engenho rudo, 
sendo nada em tratar de quem é tudo, 
só digo, dentro da alma, que te devo, 
por ter-me o espanto mudo, 
que és mais que santa, 
e dito mais não me atrevo. 

Virgem, guarda fiel do maior tesouro, 
nova revelação do Espírito Santo, 
em quem, de quem, por quem Deus nos foi dado, 
o Rei que a ti desceu te subiu tanto, 
que, à mão direita, em pé, vestida de ouro, 
te pôs, da qual Davi tinha cantado. 
Já tens a honra alcançado,
por ti profetizada, 
que bem aventurada, 
todas as gerações te chamariam; 
cá de servir-te os homens se gloriam, 
e os santos, que nos Céus com brancas vestes 
o cordeiro seguiam, 
te cantam, sem cessar, hinos celestes. 

Virgem de glória, e honra coroada, 
novo sol dos celestes horizontes, 
a quem os serafins servem de estrado 
nas cinco perenais divinas fontes, 
abertas na tua alma transformada, 
em teu filho e Senhor crucificada; 
estava represado
o mar de teus prazeres, 
em que, de seus poderes 
soltou a presa, a eterna onipotência, 
porque houvesse nos prêmios respondência, 
das bem aventuranças que louvou, 
com tão alta eloquência, 
a mulher que o Evangelho celebrou. 

Ó Virgem, por quem há tanto que porfia 
teu filho, com esta alma ingrata e morta, 
que no Céu bata, o busque, o peça, o queira; 
se Ele me houver de abrir, tu és a porta; 
se quer que o possa achar, tu és a guia; 
se dar-me bens, tu és a dispenseira, 
tu foste medianeira 
do despacho formoso,
do ladrão venturoso. 
Madalena, por ti, a graça achou; 
Paulo se converteu, Pedro chorou; 
enfim, Deus para nós te fez mãe sua, 
confiado a ti, vou, 
pois o que é meu remédio é glória tua.

(Frei Agostinho da Cruz)