segunda-feira, 23 de outubro de 2017

O PENSAMENTO VIVO DE BERNANOS (II)

Desconfio da minha imaginação, da minha revolta; a indignação nunca salvou ninguém, mas arruinou provavelmente muitas almas, e todas as orgias de simonia na Roma do século XVI não teriam beneficiado o diabo se não tivessem conseguido este golpe único de atirar Lutero no desespero, e com esse monge indomável, dois terços da dolorosa cristandade. Lutero e os seus desesperaram da Igreja, e quem desespera da Igreja, curiosamente, desespera do homem mais tarde ou mais cedo. Vendo assim, o protestantismo parece-me um compromisso com o desespero ... Ora é um fato que não se reforma nada na Igreja por meios ordinários. Quem pretende reformar a Igreja com esses meios, pelos mesmos meios que reformam uma sociedade temporal, não só fracassa no seu empreendimento, como inevitavelmente acaba fora da Igreja... antes mesmo que alguém se preocupa em exclui-lo... torna-se seu inimigo quase inconscientemente. (…) Não se reforma a Igreja senão sofrendo por ela, não se reforma a Igreja visível senão sofrendo pela Igreja invisível. Não se reforma os vícios da Igreja senão dando o exemplo das suas virtudes heroicas. É possível que São Francisco de Assis não tenha sido menos revoltado do que Lutero pela libertinagem e a simonia dos prelados. É uma certeza que ele sofreu mais cruelmente, devido à sua natureza bem diferente da do monge de Weimar. Mas ele não desafiou a iniquidade… ele entregou-se à pobreza... em vez de tentar arrancar à Igreja os bens mal adquiridos, ele a cumulou de tesouros invisíveis, e sob a mão suave deste mendigo, o ouro e a luxúria começaram a florescer como um jardim de primavera... A Igreja não precisa de críticos, mas de artistas... A Igreja não precisa de reformadores, mas de santos.