terça-feira, 18 de julho de 2017

CARTAS A MEU PAI (VIII)

Pai:

Estive há pouco em um retiro espiritual e busquei, no isolamento e afastamento do mundo, estar mais perto de Vós e experimentar o deleite profundo da Vossa paz. Foi neste retiro que conheci muitos dos Vossos filhos muito queridos e que, passageiros do mundo, são herdeiros ansiosamente esperados por Vós nas moradas eternas. Talvez D. tenha um melhor pressentimento disso, pois só tem este anelo por princípio e ambição. E quisera eu poder dizer a ele como é belo e majestoso o lugar que lhe está reservado na eternidade e como eu posso ver este lugar com tanta clareza como via então o seu rosto durante as orações do dia. 

Na manhã do segundo dia, ao final da manhã, D. me pediu para conversarmos sobre a oração e como ela devia ser oferecida a Deus. Na conversa com ele, Vos chamei, ó Pai, vos chamei 'apenas' de Deus. Falei a ele que Deus ouve todas as nossas orações, todas sem exceção. O problema está na oração que fazemos, quase sempre na súplica de que Deus afaste os problemas, as tentações e os males de nós. Como somos tolos em pedir isso! Por acaso Deus nos criou como criaturas inermes num paraíso terrestre, como mera passagem às eternas bem aventuranças? Não, definitivamente não. Os que plangem suas vidas nesta terra numa toada tranquila e segura são aqueles que só vão ter nesta vida a ventura etérea do que seria a verdadeira felicidade. Os eleitos da graça avançam no mundo em meio a obstáculos duríssimos e trazem a dor e o sofrimento como lastros...

Não devemos pedir apenas soluções e não problemas; não devemos pedir apenas conquistas e não desafios; não devemos pedir apenas bonanças e milagres; nós temos tudo isso que pedimos a toda hora, todos os dias, mesmo que não compreendamos ou saibamos ver as benesses de Deus. Deus nos pede a contrapartida da graça, a fuga do pecado, a perseverança do caminho, a consistência da fé. As tentações não nos são dadas para as quedas, mas para alcançarmos patamares mais elevados da graça. Deus não quer remover os nossos desafios, mas quer que nós os superemos por meio dEle. Deus faz milagres todos os dias, mas Ele quer usar a nossa matéria frágil para fazê-los e para nos tornar santos! Por acaso Jesus não usou da saliva e do pó para curar o cego? Não encheu as talhas de água para que se convertessem em vinho? E Deus não fez Moisés brandir o cajado para abrir ao meio as águas do Mar Vermelho? 

A oração não é um jogo de bate e volta impelido pela conduta humana. Ela nasce da manifestação do homem em se colocar na presença de Deus para enfrentar o desafio concreto de se ter uma vida cristã no meio do mundo. Ela implica o cumprimento decidido e perseverante da Santa Vontade de Deus em relação a nós, numa súplica não de remover, mas de superar os problemas e, particularmente as vias de pecado, por meio de nossos dons, talentos, habilidades, sabedoria. Essa é a água, a saliva, o pó, o cajado do nosso 'eu'. Com eles e, somente com eles, vamos nos libertar da cegueira, das limitações do nosso ser, dos 'mares vermelhos' que se levantam diante de nós. E, por meio deles e somente por meio deles, Deus nos conduzirá às bem aventuranças eternas e fará conosco os milagres mais extraordinários para isso. Para os incrédulos e os sábios deste mundo, Deus não tem respostas.

R.

('Cartas a Meu Pai' são textos de minha autoria e pretendem ser uma coletânea de crônicas que retratam a realidade cotidiana da vida humana entranhada com valores espirituais que, desapercebidos pelas pessoas comuns, são de inteira percepção pelo personagem R. As pessoas e os lugares, livremente designados apenas pelas suas iniciais, são absolutamente fictícios).

segunda-feira, 17 de julho de 2017

FOTO DA SEMANA

'Entretanto, virá o dia do Senhor como ladrão. Naquele dia os céus passarão com ruído, os elementos abrasados se dissolverão, e será consumida a terra com todas as obras que ela contém' (2 Pe 3, 10)

domingo, 16 de julho de 2017

A PARÁBOLA DO SEMEADOR

Páginas do Evangelho - Décimo Quinto Domingo do Tempo Comum


No Evangelho deste domingo, Jesus nos ensina a força e a eficácia da Palavra de Deus, lançada aos homens pelo semeador, imagem do apóstolo. Palavra que fecunda e irriga de graças a terra inteira, e que produz muitos frutos de salvação, pois assim diz o Senhor: 'Assim como a chuva e a neve descem do céu e para lá não voltam mais, mas vêm irrigar e fecundar a terra, e fazê-la germinar e dar semente, para o plantio e para a alimentação, assim a palavra que sair de minha boca: não voltará para mim vazia; antes, realizará tudo que for de minha vontade e produzirá os efeitos que pretendi, ao enviá-la' (Is 55, 10 - 11).

Jesus se coloca em uma barca, às margens do mar da Galileia e fala à multidão, reunida na praia, por meio de uma parábola: 'Ouvi, portanto, a parábola do semeador' (Mt 13, 8). A Palavra de Deus é um tesouro de bênçãos e graças, que somente se revela na luz do Cristo, na pureza de uma consciência devotada às coisas do Alto, no despojamento do eu e na entrega ao discernimento espiritual de ver, ouvir e entender as coisas de Deus com o coração (profecia de Isaías). Os mistérios do Reino dos Céus são revelados apenas aos pequeninos, aos puros de coração, aos Filhos da Luz.

Jesus é o Semeador; a Palavra de Deus feita Carne, Sangue e Revelação. As sementes da graça devem ser acolhidas, endossadas, vividas, transmitidas, compartilhadas. Almas de apóstolo, eis a síntese da nossa fé cristã, pois também somos semeadores da Palavra de Deus: 'A verdade sai de minha boca, minha palavra jamais será revogada: todo joelho deve dobrar-se diante de mim, toda língua deve jurar por mim' (Is 45,23). 

A Palavra de Deus é semente lançada ao mundo para se tornar fruto de salvação. No coração enrijecido dos que renegam o Cristo, a semente é vã pois foi lançada em terra estéril, à beira do caminho. Há sementes que morrem sem germinar entre pedras ou entre espinhos, sem encontrar raízes ou luz, sufocadas pelas paixões do mundo, estancadas por qualquer revés, entregues à própria sorte de suas enormes fragilidades. As sementes que dão fruto são aquelas acolhidas na terra fértil do coração humilde e da alma temente a Deus, regadas e cuidadas com zelo e perseverança, firmadas em raízes profundas e alimentadas pela luz do Cristo. Sementes da graça que vão produzir frutos em abundância: 'Um dá cem, outro sessenta e outro trinta' (Mt 13, 23).

sábado, 15 de julho de 2017

GLÓRIAS DE MARIA: MÃE E FORMOSURA DO CARMELO


No dia 16 de julho de 1251, São Simão Stock suplicava a intercessão de Nossa Senhora  para resolver problemas da Ordem Carmelita quando teve uma visão da Virgem que, trazendo o Escapulário nas mãos, lhe disse as seguintes palavras:

"Filho diletíssimo, recebe o Escapulário da tua Ordem, sinal especial de minha amizade fraterna, privilégio para ti e todos os carmelitas. Aqueles que morrerem com este Escapulário não padecerão o fogo do Inferno. É sinal de salvação, amparo e proteção nos perigos, e aliança de paz para sempre". 


Imposição e Uso do Escapulário

- Qualquer padre pode fazer a bênção e imposição do Escapulário à pessoa.

2 - A bênção e a imposição valem para toda a vida e, portanto, basta receber o Escapulário uma única vez.

- Quando o Escapulário se desgastar, basta substituí-lo por um novo.

- Mesmo quando alguém tiver a infelicidade de deixar de usá-lo durante algum tempo, pode simplesmente retomar o seu uso, não sendo necessária outra bênção.

5 - Uma vez recebido, o Escapulário deve ser usado em todas as ocasiões (inclusive ao dormir), preferencialmente no pescoço.

6 - Em casos de necessidade de retirada do Escapulário, como no caso de doenças e/ou internações em hospitais, a promessa de Nossa Senhora se mantém, como se a pessoa o estivesse usando.

7 - Mesmo um leigo pode fazer a imposição do Escapulário a uma pessoa em risco de morte, bastando recitar uma oração a Nossa Senhora e colocar na pessoa um escapulário já bento por algum sacerdote.

8 - O Escapulário pode ser substituído por uma medalha que tenha, de um lado, o Sagrado Coração de Jesus e, do outro, uma imagem de Nossa Senhora (por autorização do Papa São Pio X).
Oração a Nossa Senhora do Carmo
     Ó Virgem do Carmo e mãe amorosa de todos os fiéis, mas especialmente dos que vestem vosso sagrado Escapulário, em cujo número tenho a dita de ser incluído, intercedei por mim ante o trono do Altíssimo. 

          Obtende-me que, depois de uma vida verdadeiramente cristã, expire revestido deste santo hábito e, livrando-me do fogo do inferno, conforme prometestes, mereça sair quanto antes, por vossa intercessão poderosa, das chamas do Purgatório.

        Ó Virgem dulcíssima, dissestes que o Escapulário é a defesa nos perigos, sinal do vosso entranhado amor e laço de aliança sempiterna entre Vós e os vossos filhos. Fazei, pois, Mãe amorosíssima, que ele me una perpetuamente a Vós e livre para sempre minha alma do pecado. 

       Em prova do meu reconhecimento e fidelidade, ofereço-me todo a Vós, consagrando-Vos neste dia os meus olhos, meus ouvidos, minha boca, meu coração e todo o meu ser. E porque Vos pertenço inteiramente, guardai-me e defendei-me como filho e servidor vosso. Amém.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

AS SETE COLUNAS DA IGREJA DOMÉSTICA (VII)

'A Sabedoria edificou sua casa, talhou sete colunas' (Pv 9, 1)

SÉTIMA COLUNA: A ALEGRIA

A alegria nunca deve propriamente sair de casa, pois é como a delicada flagrância que paira sobre montes e vales, feita da luz do sol e do aroma das flores. A alegria é a luz do sol na menor das choupanas. Tudo brilha à sua luz. Casa sem alegria pode-se chamar de 'prisão'. Com a alegria tudo respira liberdade e luz, flagrância e força.

'Da árvore da vida a força sacrossanta,
Doce prazer de dar e bondade que encanta.
Tudo aceita animosa e a tudo renuncia,
Sente-se forte e livre e feliz a alegria!'
(R. Bern.)

Pode acaso a alegria faltar em casa? Não deve ser como na Igreja, onde os tons jubilosos não se desvanecem de todo, nem sequer no dia de Finados e na Sexta-feira da Paixão? Mesmo por entre lágrimas ela sabe cantar ainda o jubiloso Benedictus e o exultante Magnificat. Houve uma vez um tempo e não está muito longe, em que a alegria fixara residência no círculo da família.

Ela acompanhava ao trabalho cada um dos membros da família, com eles se sentava à mesa e no meio deles permanecia, quando, à noite, voltavam do trabalho e conversavam à luz do candeeiro. Era esta a sua hora como um eixo harmonioso do dia e tanto mais belo e harmonioso, quanto mais árduo e penoso fora o trabalho do dia. Como isso elevava o espírito de família e o sentimento da união familiar! Como moços e velhos aguardavam ansiosos aquelas noites em que se reunia a família em torno da mesa e, sobretudo nos domingos e dias santos, que eram sempre dias de festa de sol para a família! Acima de tudo estava nesses dias certamente o culto divino.

Da vida de Hermam von Mallinckrodt sabe-se que toda a família assistia junta ao ofício divino da paróquia. Na volta para a casa, conversavam pais e filhos regularmente sobre as ideias do sermão de domingo e depois era uma alegria geral até que, à noite, uma leitura comum de qualquer livro religioso encerrava o dia. Assim o faziam nos tempos antigos milhares de famílias católicas... A alegria, o espírito familiar prendiam ao lar moços e velhos. O centro - o sol, em torno do qual tudo se movia, o imã que tudo atraia a si, era a mãe. Dela emanava sobre todas as coisas uma luz áurea, de modo que o marido e os filhos esqueciam a taverna e os amigos e as filhas em parte alguma gostavam tanto de estar como no lar, junto da mãe.

A cerimônia de certas festas e acontecimentos domésticos tornava mais profundo o doce encanto do lar paterno: batizado, comunhão das crianças, aniversários, festa onomástica, especialmente da mãe, eram dias luminosos e alegres no decorrer do ano. Festas da Igreja, como Páscoa, Pentecostes, Advento, com seus maravilhosos cânticos, o mês de Maria, São João, Santo Antônio e São Pedro e, sobretudo a bela e querida festa de Natal não eram menos do que o ponto de partida de muitas alegrias domésticas. Como florzinhas no campo, brotavam por toda a parte e, por moços e velhos, eram colhidas com prazer.

Além disso, havia sempre ocasião para enriquecer-nos de conhecimentos e por em prática certas outras habilidades. As flores e plantas do mato e do campo tornavam-se-nos familiares e, mesmo para o mundo das estrelas, o dedo materno dirigia as nossas vistas. Explicava-nos o percurso dos planetas e muitas constelações da abóbada celeste nos indicava, contando também em partes as lendas populares a respeito. Certamente o ensino materno não provinha de ciência e cálculo astronômico; ela nada sabia de análise espectral e dos métodos delicados para exame dos corpos celestes; mas nós lhe devemos, ao lado dos primeiros conhecimentos de astronomia, a predileção pelo céu estrelado e, o que é de mais valor, aquela liberdade de espírito que se afasta da fria e ímpia divinização da natureza, prostrando-nos ao contrário em adoração diante do poder criador de Deus, que em parte alguma se mostra mais brilhante que nas maravilhas da noite e no curso dos astros.

Tudo isso acabou? Definitiva e irremediavelmente? É verdade que a indústria, a vida de ganância moderna, o espírito do materialismo, que com ela se insinuou, feriu profundamente a vida familiar. A horrível carência de moradias aumentou a miséria. A alegria quer espaço, tempo e sol e também um lugar para o recreio das crianças. Em escuras alcovas e estreitas mansardas, em casernas sem ar e sem luz, tem de desvanecer-se. Mais ainda, porém, que tudo nos prejudicou a moderna avidez de prazeres. Sobretudo a mocidade é arrebatada ao lar pelos divertimentos. Há muito que a distração e o recreio não vêm mais, como repouso necessário após o trabalho, mas para muitos são o alvo e o fim do trabalho. Para poder gozar o mais possível, trabalham, esforçam-se durante a semana e sacrificam por fim a alegria e a felicidade da família.

Os 'estabelecimentos de diversões', gente interessada no negócio, providenciam para que não se tenha descanso. Sempre novas sensações açoitam os nervos, embriagam os homens, para que 'se inebriem do desejo imoderado do gozo e no gozo de novo se consumam de desejos veementes'. As reuniões de sociedades e a fúria dos esportes fazem o resto para que o espírito de família não medre mais e a felicidade familiar se despedace.

Se carece haver associações, jamais entretanto devem tornar-se coveiros da vida de família. Acaso são nossas associações católicas sempre isentas desta censura? Em lugar de todos os preparativos 'de um sucesso extraordinário', despertai em vossos consórcios o senso da verdadeira alegria, ajudai-os a conseguir a verdadeira formação do caráter da alma, num tempo sem espiritualidade como o atual. Isso seria proveitoso à vida de família. 

Pois afinal é na verdade um pequeno sacrifício de renúncia e domínio sobre si mesmo, um único cigarro que não se fuma ou um salário que se põe intacto sobre a mesa familiar têm mais valor que uma dúzia inteira de festas estrondosas, vale também mais que uma bola de futebol atirada à altura de uma torre ou um canal atravessado a nado. Como os homens são caprichosos! Procuramos alegria como a mariposa busca a luz! Somente muitas vezes a procuramos onde ela não se acha: nos prazeres pagos da cidade, nos lugares enfumaçados, perfumados, para onde nos atraem os cartazes berrantes e a música estridente do jazz-band. Quem quer alegrias reais, tem de sair dos muros da cidade e da supercultura e voltar ao doce caminho do lar, ao seio livre da natureza criada por Deus e da família, pois do contrário anda no caminho errado e não as encontra.

(Excertos da obra 'As colunas de tua Casa - um Plano para a Felicidade da Família', do Vigário José Sommer, 1938, com revisão do texto pelo autor do blog)

quinta-feira, 13 de julho de 2017

100 ANOS DE FÁTIMA - TERCEIRA APARIÇÃO

Fátima é o acontecimento sobrenatural mais extraordinário de Nossa Senhora e a mais profética das aparições modernas (que incluíram a visão do inferno, 'terceiro segredo', consagração aos Primeiros Cinco Sábados, orações ensinadas por Nossa Senhora às crianças, consagração da Rússiamilagre do sol e as aparições do Anjo de Portugal), constituindo a proclamação definitiva das mensagens prévias dadas pela Mãe de Deus em Lourdes e La Salette. Por Fátima, o mundo poderá chegar à plena restauração da fé e da vida em Deus, conformando o paraíso na terra. Por Fátima, a humanidade será redimida e salva, pelo triunfo do Coração Imaculado de Maria. Se os homens esquecerem as glórias de Maria em Fátima e os tesouros da graça, serão também esquecidos por Deus.

'por fim, o meu Imaculado Coração triunfará'


FÁTIMA EM FATOS E FOTOS (VII)

31. Como se deu a terceira aparição de Nossa Senhora?

A terceira aparição de Nossa Senhora, no início da tarde de 13 de julho de 1917, ocorreu de forma similar às duas primeiras, mas na presença de uma multidão muito maior que as anteriores, estimada desta vez em mais de duas mil pessoas. No centro da multidão e diante da azinheira, as três crianças rezavam o terço e olhavam ansiosas o céu em direção ao nascente. O pai de Francisco e Jacinta, Manuel Marto, encontrava-se ao lado das crianças desde o início da aparição e é dele o testemunho de ter visto uma espécie de nuvem de fumo se debruçar sobre a azinheira no momento em que Lúcia alertou a multidão para que se tirassem os chapéus ante a chegada de Nossa Senhora.

32. Como foi o diálogo de Lúcia com Nossa Senhora nesta terceira aparição?

Assim como na segunda aparição, assim que viu Nossa Senhora, Lúcia perguntou:

– Vossemecê que me quer? 
– Quero que venhais aqui no dia 13 do mês que vem; que continueis a rezar o terço todos os dias em honra de Nossa Senhora do Rosário, para obter a paz do mundo e o fim da guerra porque só Ela lhes poderá valer.
–  Queria pedir-lhe para nos dizer quem é e para fazer um milagre com que todos acreditem que Vossemecê nos aparece.
– Continueis a vir aqui todos os meses. Em outubro direi quem sou, o que quero e farei um milagre que todos hão de ver para acreditarem.

Lúcia fez então uma série de pedidos em intenções pela cura ou conversão de algumas pessoas, ao que Nossa Senhora responde que os pedidos deverão ser atendidos no prazo de um ano, mas insiste sempre na oração do terço, principalmente em família. No final deste diálogo de pedidos de intenções, Nossa Senhora, com expressão muito séria, diz à Lúcia:

– Sacrificai-vos pelos pecadores e dizei muitas vezes e em especial sempre que fizerdes algum sacrifício: 'Ó Jesus, é por vosso amor, pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria'.

Ao dizer estas últimas palavras, abriu de novo as mãos, como nos dois meses passados; o reflexo da luz que espargiam de suas mãos parecia penetrar a terra. Na sequência, as três crianças experimentaram a visão do inferno, assim descrita pelas palavras de Lúcia:

Vimos como um mar de fogo. Mergulhados nesse fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras ou bronzeadas com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas que delas mesmas saiam, juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das faúlhas nos grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizavam e faziam estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa... [Lúcia, Quarta Memória]

Suspensa a visão aterradora do inferno e estremecidos de medo, as crianças volveram imediatamente os olhos para Nossa Senhora em busca de conforto que, as contemplando com imensa ternura, revelou à Lúcia um longo testemunho:

– Vistes o inferno para onde vão as almas dos pobres pecadores. Para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao Meu Imaculado Coração. Se fizerem o que Eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar. Mas se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. 

Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre. Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia ao Meu Imaculado Coração e a Comunhão Reparadora dos Primeiros Sábados. Se atenderem aos meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz. Se não, espalhará os seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Por fim o Meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-Me-á a Rússia que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz. Em Portugal conservar-se-á sempre o dogma da fé , etc.

Isto não o digais a ninguém. Ao Francisco, sim, podeis dizê-lo. Quando rezardes o terço, dizei depois de cada mistério: 'Ó meu Jesus, perdoai-nos e livrai-nos do fogo do inferno, levai as almas todas para o Céu, principalmente aquelas que mais precisarem'

Seguiu-se um instante de silêncio, quebrado então por Lúcia:

– Vossemecê não me quer mais nada?
– Não, hoje não te quero mais nada.

E como de costume, Nossa Senhora começou a elevar-se em direção ao nascente até desaparecer na imensa distância do firmamento [Lúcia, Quarta Memória].

33. O que constitui os chamados Primeiro Segredo e Segundo Segredo de Fátima?


Do conjunto de mensagens que Nossa Senhora e Mãe de Deus revelou ao mundo em Fátima, as revelações feitas nesta terceira aparição foram sistematizadas em três partes distintas, numa abordagem que ficou mundialmente conhecida como Segredo de Fátima. As duas primeiras partes do Segredo foram formalmente reveladas por Lúcia em 1941, nas suas Terceira e Quarta Memórias e são as seguintes: 

(i) Primeiro Segredo: a perda eterna das almas e a visão do inferno 

Nossa Senhora, após ensinar às crianças uma oração pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos, abriu as mãos e o reflexo dos raios de luz, que delas emanavam, pareceu penetrar a terra, revelando as visões do Inferno e do espantoso número de almas que são condenadas à danação eterna pela submissão ao pecado, assim descritas nas terríveis palavras de Lúcia: 

'... e vimos como que um mar de fogo: mergulhados neste fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras, ou bronzeadas, com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas, que delas mesmo saíam juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das fagulhas nos grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizavam e faziam estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa...' 

(foto dos três videntes na tarde de 13/07/1917, após a visão do inferno)

(ii) Segundo Segredo: castigos universais e os meios para evitá-los

A segunda parte do Segredo, revelada às crianças na sequência imediata da visão do Inferno, consiste no anúncio do advento de grandes castigos para a humanidade, caso os homens não se convertessem e, principalmente, os meios de salvação colocados à disposição de todos e capazes de reorientar e modificar completamente as perspectivas previstas para as futuras gerações: a oração do Rosário, a prática dos Cinco Primeiros Sábados, a Devoção ao Imaculado de Maria e, de forma muito particular, a Consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria, fato que, uma vez não ocorrendo, implicaria que os erros da Rússia seriam espalhados pelo mundo inteiro, levando inclusive ao aniquilamento de algumas nações.

34. O que se pode inferir sobre a terceira parte do Segredo de Fátima? 

A terceira parte do segredo, escrita por Lúcia em janeiro de 1944, nunca foi inserida no contexto de suas memórias publicadas. Mas a última frase das mensagens reveladas é bastante singular: 'Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé, etc...'. Este etc... sugere que o texto da terceira parte do Segredo estaria a seguir (lembrando que a segunda parte sucedeu imediatamente a revelação da primeira parte). Mas a própria frase parece desconectada do contexto anterior, pois a referência específica (situação em Portugal) confronta com o texto prévio (dimensão universal dos castigos), de forma que pode se interpretar esta frase já no contexto da terceira parte do Segredo.

Se em Portugal o dogma da fé será mantido (e se esta afirmativa assume um caráter de tal relevância que mereça uma menção especial na mensagem), é razoável deduzir que este fato – a perda da fé – atingirá dimensões inconcebíveis no âmbito da história humana e terá proporções mundiais. Nesta concepção, a terceira parte da mensagem referir-se-ia à questão de uma apostasia generalizada e sem paralelo na história da humanidade. Uma crise de fé de tal relevância deveria estar intimamente relacionada a uma gravíssima crise da própria Igreja de Cristo e isto explicaria a não divulgação pública desta terceira e última parte do Segredo. 

A terceira parte do segredo constitui essencialmente, portanto, a revelação de uma profunda crise de fé e crise da Igreja, com a perda substancial da Verdade revelada, substituída por um sem número de doutrinas heréticas no campo dogmático e da moral e implementação de falsas liturgias, com profundo impacto nos valores do cristianismo autêntico e concessões crescentes ao permissivismo moral, ao agnosticismo e ao ateísmo. 


35. Que correlação interliga diretamente os Três Segredos de Fátima?

Na própria mensagem de Fátima, o Segredo aparece como três partes distintas de um todo, ou seja, existe uma relação direta e comum interligando as três partes do Segredo em uma única mensagem. Numa síntese geral, o primeiro segredo teve como foco a salvação pessoal do homem; o segundo segredo teve como foco a salvação da humanidade e o terceiro segredo teve por foco a salvação da cristandade, da própria fé cristã, da própria Igreja.

Neste contexto, a crise de fé e a apostasia universal (terceira parte do Segredo) seriam os fatores de condenação ao Inferno de um grande número de almas (primeira parte) e a causa fundamental para a sucessão de castigos que se abateriam sobre o mundo (segunda parte). Desta forma, a terceira parte constituiria, na verdade, a causa dos eventos descritos nas primeiras duas partes reveladas (perda das almas, representada nas aparições pela Visão do Inferno e os castigos universais, caso não se concretizassem a conversão dos homens). Para evitar e desfazer esta sincronia de males e tragédias, os meios disponibilizados por Nossa Senhora seriam, então, o Santo Rosário, a Consagração dos Cinco Primeiros Sábados e a Devoção ao Imaculado Coração de Maria.