quarta-feira, 11 de setembro de 2013

GALERIA DE ARTE SACRA (VII)

A arte da azulejaria do século XVII em Portugal caracterizou-se pela produção seriada, mediante a formação de conjuntos que derivavam da repetição de um módulo comum, chamados padrões. Os revestimentos eram organizados segundo regras elementares que expressavam a definição de ritmos regulares verticais e horizontais, sublinhados por elementos secundários, as barras e cercaduras. Essa relativa simplicidade na produção e na aplicação permitia uma grande intensidade decorativa, com os azulejos a moldarem-se aos vários planos do suporte arquitetônico, num revestimento contínuo que se articulavam com as restantes artes decorativas. Azulejos especiais (muitos deles em arte sacra) decoravam espaços importantes entre os mosaicos gerais, como estes indicados nos exemplos abaixo.

(Daniel na Cova dos Leões)


(Nossa Senhora com o Menino Jesus)

(Jesus Crucificado)

(O Nascimento da Virgem)

(Nossa senhora da Conceição)

(São Miguel)

(A Partida do Filho Pródigo)

(Nossa Senhora, São José e o Menino Jesus)

(O sacrifício de Isaac)

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

REVELAÇÕES DE DEUS PAI (I)

Todos os sofrimentos que o homem suporta ou pode suportar nesta vida são insuficientes para satisfazer a menor culpa. Sendo Eu um bem infinito, a ofensa cometida contra Mim pede satisfação infinita. Desejo que o compreendas: os males desta existência não são punições, mas correção ao filho que ofende. Assim, a satisfação se dá pelo amor, pelo arrependimento e pelo desprezo do pecado. 

Esse arrependimento é aceito em lugar da culpa e do reato [pena devida à culpa do pecado], não pela virtude dos sofrimentos padecidos, mas pela infinitude do amor. Foi como ensinou Paulo, ao afirmar: 'Se eu falasse a língua dos anjos, adivinhasse o futuro, partilhasse os meus bens com os pobres, e entregasse meu corpo às chamas, mas não tivesse a caridade, tudo isso nada valeria' (1 Cor. 3,3). O glorioso apóstolo fez ver que os gestos finitos são insuficientes para punir ou satisfazer, sem a força da caridade. 

Como percebes, as mortificações são coisas finitas e como tais hão de ser praticadas. São meios, não finalidades. Filha, fiz-te ver que a culpa não é reparada neste mundo pelo sofrimento, suportados unicamente como sofrimento, mas sim pelos sofrimentos aceitos com amor, com desejo, com interna contrição. Não basta a força da mortificação; impõe-se o anseio da alma. O mesmo acontece aliás com a caridade e qualquer outra virtude, que somente possuem valor e produzem a vida em Meu Filho Jesus Cristo Crucificado, isto é, na medida em que a pessoa d'Ele recebe o amor e virtuosamente segue as suas pegadas. Somente assim [as virtudes] adquirem valor. 

As mortificações satisfazem pela culpa na feliz comunhão do amor, adquirida na contemplação da Minha bondade. Satisfazem graças à dor e à contrição quando praticadas no auto-conhecimento e na consciência das culpas pessoais. Este conhecimento de si gera desprezo pelo mal, pela sensualidade, induz o homem a julgar-se merecedor de castigos e indigno de recompensa. Assim, é pela contrição interior, pelo amor paciente e pela humildade, considerando-se merecedora de castigos e não de prêmios, que a pessoa oferece reparação. 

O caminho para atingir o conhecimento verdadeiro e a experiência do Meu Ser - Vida eterna que Sou - é este: nunca abandone o auto-conhecimento! Ao desceres para o vale da humildade, reconhecer-Me-ás em ti, e de tal conhecimento receberás tudo aquilo de que necessitas. Nenhuma virtude tem valor sem a caridade, no entanto é a humildade que forma e nutre a caridade. Conhecendo-te, tu te humilharás ao perceber que, por ti mesma, nada és. Verás que o teu ser procede de Mim, que vos amei, a ti e aos outros, antes de virdes à existência. Além disso, quando quis recriar-vos na graça, com inefável amor, Eu vos lavei e vos concedi uma vida nova no Sangue do Meu Filho Unigênito; n'Aquele Sangue derramado num grande incêndio de amor. Para quem destrói em si o egoísmo, é no auto-conhecimento que tal Sangue manifesta a Verdade. Não existe outro meio. Por meio dele, o homem em inexprimível amor conhece-Me e sofre. Não com um sofrimento angustiante, aflitivo e árido, mas com uma dor que alimenta interiormente. 

Ao conhecer a verdade, a alma sofrerá terrivelmente, pois toma consciência dos próprios pecados e vê a cega ingratidão humana. Nenhuma dor sofreria, se não amasse. Logo que tu e Meus servidores conhecerdes a Minha verdade, através daquele caminho, tereis que sofrer tribulações, ofensas e desprezos por palavras e ações, até a morte. Tudo isto, para glória e louvor do Meu nome. Sim, padecerás, sofrerás, tu e Meus servidores; portanto, armai-vos de muita paciência, arrependimento de vossos pecados e de amor à virtude, para glória e louvor de Meu nome. Agindo assim, aceitarei a reparação das culpas tuas e dos demais servidores. 

Pela força do amor e caridade, vossos sofrimentos serão suficientes para satisfação e reparação por vós mesmos e pelos demais. Pessoalmente, recebereis o fruto da vida; serão canceladas as manchas dos vossos pecados; já não Me recordarei de que Me ofendestes. Quando aos outros, graças ao vosso amor, concederei o perdão em conformidade com as suas disposições. Por consideração aos pedidos dos Meus servidores, terei paciência com eles, iluminá-los-ei, suscitarei o remorso, farei que sintam o gosto pela virtude, que provem prazer na amizade de Meus servidores. 

Algumas vezes, permitirei que o mundo lhes mostre a sua face e experimentarão numerosas e diferentes impressões. Quero que percebam a instabilidade do mundo e elevem os seus desejos em direção à pátria eterna. Assim e com outros expedientes invisíveis aos olhos, inenarráveis para a língua e imperceptíveis ao coração - pois são inúmeros os caminhos e recursos que Me sirvo, unicamente por amor, Eu os convido à graça, desejoso que Minha verdade se realize neles. A tais pessoas, porém, não é dada a remissão do reato*. Elas não se encontram pessoalmente dispostas a acolher, mediante uma caridade perfeita, o Meu amor e o amor dos Meus servidores. Eles não sentem dor nem contrição perfeita dos pecados cometidos; sua caridade e contrição são imperfeitas. Eis o motivo porque não alcançam a remissão da pena, como daqueles que falei antes, mas somente o perdão da culpa. 

Todos os pecados são cometidos através do próximo, no sentido de que eles são a ausência da caridade, que é a forma de todas as virtudes. No mesmo sentido, o egoísmo, que é a negação do amor pelo próximo, constitui-se razão e fundamento do todo mal. Ele é a raiz dos escândalos, do ódio, da maldade, dos prejuízos causados aos outros. Diante disto, o cristão luta e se opõe a sensualidade, com empenho a submete à razão e procura descobrir em si mesmo a grandeza de Minha bondade. Inúmeros são os favores que lhe faço. Ao reconhecer que gratuitamente o retirei das trevas e o transferi para a verdadeira sabedoria, no auto-conhecimento ele se humilha. Assim consciente da Minha benevolência, o homem Me ama direta e indiretamente. Diretamente, não pensando em si mesmo ou em interesses pessoais; indiretamente através da prática da virtude. 

Toda virtude é concebida no íntimo do homem por amor a Mim; fora do ódio ao pecado e do amor à virtude, não existe maneira de Me agradar e de se chegar até Mim. Depois de ter concebido interiormente a virtude, a pessoa a pratica no próximo. Aliás, tal modo de agir é a única prova de que alguém possui realmente uma virtude. Quem Me ama, procura ser útil ao próximo. Nem poderia ser de outra maneira, dado que o amor por Mim, e pelo próximo são uma só coisa. Tanto alguém ama o próximo, quanto Me ama, pois de Mim se origina o amor do outro. O próximo, eis o meio que vos dei, para praticardes e manifestardes a virtude que existe em vós. 

Como nada podeis fazer de útil para Mim, deveis ser de utilidade ao homem. Muitos são os dons, graças, virtudes e favores espirituais ou corporais, que concedi aos homens. Corporais, são aqueles necessários à vida humana. Dei-os diversificadamente, isto é, não os coloquei todos em cada pessoa, para que fôsseis obrigados a vos auxiliar mutuamente. Poderia ter criado os indivíduos, dotando-os de todo o necessário, seja na alma como no corpo; mas preferi que um necessitasse do outro, que fôsseis administradores Meus no uso das graças e benefícios recebidos. 

Desta forma, querendo ou não, o homem haveria de praticar a caridade, muito embora não seja meritória a benevolência não realizada por Meu amor. Como vês, a fim de que os homens exercitassem o amor, fi-los Meus administradores e os coloquei em diferentes estados de vida, em diferentes posições. Isto vos mostra como existem muitas mansões em Minha casa, e como nada mais desejo que o amor. O amor por Mim se consuma no amor pelo próximo; quem ama o próximo já observou a Lei. Quem Me ama, pratica todo o bem possível, em seu estado de vida para o benefício dos outros. 

Qual árvore de muitos galhos, a caridade possui numerosos filhos. Como as árvores recebem a vida de suas raízes enterradas no solo, assim a caridade se nutre da humildade, e o discernimento é um dos filhos ou rebentos da caridade. Não existindo esse solo da humildade, o discernimento não seria verdadeiramente uma virtude nem produziria frutos de vida. A humildade brota do auto-conhecimento e o discernimento, consiste num real conhecimento de si e de Mim, que faz o homem dar a cada um o que lhe pertence. O discernimento é uma luz que dissolve a escuridão, afasta a ignorância e alimenta as virtudes, bem como as ações externas que conduzem à virtude. O discernimento enfim, ao fundamentar-se no humilde auto-conhecimento, conduz à luta contra os pecados pessoais. 

... A alma é uma árvore nascida para o amor; sem ele não vive. Privada do amor divino da caridade, não produz fruto de vida, mas de morte. O cerne dessa árvore é a paciência. Esta virtude constituí o sinal externo de que Eu estou numa alma e ela em Mim... O que desejo do homem, como frutos de ação, é que prove suas virtudes na hora oportuna. 'Sou Aquele que gosta de poucas palavras e de muitas ações'. Só o amor produz e revela a virtude! 

... Do pecado original, que contraís através do pai e da mãe na concepção, restou-vos somente uma cicatriz. Ela é apagada, embora não completamente, pelo batismo, ao qual o Sangue de Cristo concedeu a virtude de infundir a vida da graça. Quando alguém é batizado, imediatamente cancela-se o pecado original e infundi-se a graça; a inclinação para o pecado, descrita antes como uma cicatriz, fica enfraquecida e submetida ao controle da pessoa. É assim que, pelo batismo, o homem dispõe-se a receber e aumentar a graça de si mesmo. O resultado, para mais ou para menos, depende do seu esforço em servir-Me com amor e anseio. 

Embora possuindo a graça batismal, a pessoa pode encaminhar-se livremente para o bem ou para o mal. É ao atingir o uso da razão que praticará o bem ou o mal, conforme o livre arbítrio de sua vontade. Aliás, tão grande é a liberdade humana, e de tal modo ficou fortalecida pelo precioso Sangue de Cristo, que demônio ou criatura alguma, pode obrigar alguém à menor culpa, contra o seu parecer. Acabou-se a escravidão; o homem ficou livre. Agora, ele pode dominar a sensualidade, e chegar à meta para qual foi criado... 

Muito já Me devia a humanidade. Dera-lhe o ser, ao criar o homem à Minha imagem e semelhança. Então ele possuía a obrigação de dar-Me glória. Recusou-se a fazê-lo, glorificou-se a si mesmo, não aceitou a obediência por Mim imposta, tornou-se Meu inimigo. Então, com humilhação destruí sua soberba. Humilhei-Me (em Cristo), assumi vossa natureza, libertei-vos da escravidão do demônio, tornei-vos livre. O tesouro do Sangue, pelo qual a humanidade foi recriada, ficou sendo uma dívida. Entendes pois, como depois da Redenção, o homem tem maior obrigação para Comigo. Devem-Me glória e louvor. Uma dívida de amor para Comigo e o próximo, que é paga quando as pessoas seguem as pegadas do Meu Filho Unigênito, Palavra Encarnada, mediante as práticas das virtudes interiores... 

... Ninguém escapará de Minhas Mãos: 'Sou aquele que Sou' (Ex 3.14) e vós, vós não possuís a razão do próprio ser. Sois aquele que Eu fiz. Criei tudo o que participa do ser; somente o pecado não procede de Mim, porque é negação. Por não estar em Mim, o pecado não merece amor. Quem o faz, ofende toda criação e odeia-Me. O homem tem obrigações de Me querer bem. Sou imensamente bom, dei-lhe o ser, numa chama de caridade. Todavia, os maus fogem de Mim. Mas, por justiça ou misericórdia, ninguém escapa das Minhas Mãos. 

... Eis Meu plano: criar o homem à Minha imagem e semelhança para que alcançasse a vida eterna, participasse do Meu Ser, experimentasse Minha suma, eterna e doce bondade. O pecado veio impedir-lhe de atingir essa meta. O homem deixava de realizar o Meu plano, pois a culpa lhe fechara o Céu e a porta da Minha misericórdia. O pecado fez germinar na humanidade espinhos e sofrimentos, tribulações* numerosas, rebelião interna. Ao revoltar-se contra Mim o homem criava a rebelião dentro de si. Em conseqüência da perda do estado de inocência, a carne se revoltou contra o espírito. Imediatamente brotou um rio tempestuoso, cujas ondas continuam a açoitar a humanidade. São as misérias e males provenientes do próprio homem, do demônio e do mundo. Nele todos se afogavam; ninguém mais, graças a virtudes pessoais, atingia a vida eterna. Para remediar tantos males, construí a Ponte no Meu Filho, que permitiria a travessia do rio sem perigo de afogar-se. O rio é o proceloso mar desta tenebrosa vida...

... Quero que contemples a Ponte de Meu Filho, que vejas sua grandiosidade. Ela se estende do céu à terra, pois nela a 'terra' da vossa natureza humana está unida à divindade sublime, graças à encarnação que realizei no homem. Todos vós deveis passar por esta Ponte, louvando-Me através do trabalho pela salvação dos homens e tolerando muitas dificuldades, a exemplo do Meu doce e amoroso Verbo Encarnado. Não há outro modo de chegar até Mim. 

... Cada pessoa tem uma vinha, a vinha da própria alma. Nela trabalha com a vontade pessoal, livre, durante o tempo desta vida. Acabado este tempo nenhum outro trabalho será realizado, seja para o bem, seja para o mal. 

... Começareis por purificar-vos com a contrição interior, desapegando-vos de tudo e desejando a virtude. Sem esta predisposição, exigida na medida de vossas possibilidades como ramos unidos à Videira, que é Meu Filho (Jo 15,1), nada recebereis. Dizia Meu Filho: 'Eu sou a videira verdadeira e vós os ramos; Meu Pai é o agricultor' (Jo 15,5). Sim, Eu Sou o agricultor, de Mim se originam todos os seres. Tenho um poder incalculável, pelo qual governo o universo; nada Me escapa. Fui Eu o agricultor que plantou a verdadeira vinha, Cristo, no chão da humanidade, para que vós, unidos a Ele, possais frutificar. Quem não produzir ações santas e boas, será cortado da videira; e secará. Separado, perderá a vida da graça e irá para o fogo eterno...

Sabes que os mandamentos da Lei se reduzem a dois sem eles, nenhum outro é observado. São: amar-Me sobre todas as coisas e amar o próximo como a ti mesma. Eis o começo, o meio e o fim dos mandamentos da lei. Todavia esses 'dois' não se 'reúnem' em Mim sem os 'três', isto é, sem a unificação das três faculdades da alma: a memória, a inteligência e a vontade. A memória há de recordar-se dos Meus beneficios e da Minha bondade; a inteligência pensará no amor inefável* revelado em Cristo, pois Ele se oferece como objeto de reflexão, para manifestar a chama do Meu amor; a vontade unindo-se às faculdades anteriores, Me amará e desejará como seu fim. 

O coração humano, ao ser atraído pelo amor, leva consigo todas as faculdades da alma: quando são harmonizadas e reunidas, tais faculdades, todas as ações humanas - corporais ou espirituais - ficam-Me agradáveis, pois unem-se a Mim na caridade. Foi exatamente para isso que Meu Filho se elevou na cruz, trilhando o caminho do amor cruciante. Ao dizer, 'Quando Eu for elevado, atrairei a Mim todas as coisas', ele queria significar: quando o coração humano e as faculdades forem atraídas, todas as demais faculdades e suas ações o serão... 

É muita estreita a união dessas três faculdades. Quando uma delas Me ofende, as outras também o fazem. Como disse, uma apresenta à outra o bem ou o mal, conforme agrada ao livre arbítrio. O livre arbítrio se acha na vontade e a move como quer, em conformidade ou não com a razão. Possuis a razão, sempre unida a Mim, a menos que o livre arbítrio a afaste mediante o amor desordenado, e tende em vós uma lei perversa, que luta contra o espírito. Ensinou o apóstolo Paulo em sua carta, C1 3,5, a mortificar o corpo e a destruir a vontade própria, ou seja, refrear o corpo mortificando a carne, quando ela se opõe ao espírito. Tendes, então, duas partes em vós mesmos: a sensualidade e a razão. 

A sensualidade foi dada como servidora, a fim de que as virtudes sejam exercidas e provadas através do corpo. O homem é livre, já que Meu Filho o libertou com Seu Sangue. Ninguém pode dominar a pessoa humana quanto a vontade, pois ela possui o livre arbítrio. Este se identifica com a vontade, concorda com ela. Fica, pois, o livre arbítrio entre a sensualidade, e a razão, e inclina-se ora de um lado ora de outro, conforme preferir... 

Quando a pessoa tenta livremente reunir as três faculdades, memória, inteligência e vontade, em Mim, na maneira explicada, todas as atividades espirituais e corporais humanas ficam unificadas. O livre arbítrio se afasta da sensualidade, tende para o lado da razão. Ninguém pode vir a Mim, senão por meio de Cristo. Esta a razão pela qual fiz d'Ele uma Ponte de três degraus. Esses três degraus representam os três estados espirituais do homem. 

O pavimento desta ponte é feito de pedras, a fim de que a chuva [da justiça divina] não retenha o caminhante. 'Pedras' são as virtudes verdadeiras e reais. Antes da Paixão do Meu Filho, elas ainda não tinham sido assentadas, motivo pelo qual os antigos não atingiam o céu, mesmo que vivessem piedosamente. O Paraíso ainda não fora aberto com a chave do Sangue, e a chuva da justiça divina impedia a caminhada. Quando aquelas pedras foram assentadas no Corpo do Meu Filho - por Mim comparado a uma ponte - foram embebidas, amalgamadas, e assentadas com sangue. Em outras palavras: o sangue (humano) foi misturado com a cal da divindade e fortemente queimado no calor da caridade. 

Tais pedras foram postas em Cristo por Mim, mas é n'Ele que toda virtude é comprovada e vivificada. Fora de Jesus ninguém possui a vida da graça. Ocorre estar n'Ele, trilhar suas estradas, viver Sua mensagem. Somente Ele faz crescer as virtudes, somente Ele as constrói como pedras vivas, cimentando-as com o próprio Sangue. Nele, todos os fiéis caminham na liberdade, sem o medo da justiça divina, pois vão cobertos pela misericórdia, descida do céu no dia da encarnação. Foi a chave do Sangue de Cristo que abriu o céu. Portanto, esta ponte é ladrilhada; e seu telhado é a misericórdia. 

Possui também uma despensa, constituída pela hierarquia da Santa Igreja, que conserva e distribui o Pão da Vida e o Sangue. Assim, Minhas criaturas, viandantes e peregrinas, não fraquejam de cansaço na viagem. Para isto ordenei que vos fosse dado o Corpo e o Sangue do Meu Filho, Homem Deus...Disse Jesus: 'Eu sou o caminho, a verdade, e a vida; quem vai por Mim não caminha nas trevas, mas na luz' (Jo, 8,12). Quem vai por tal caminho é filho da verdade, atravessa a ponte e chega até Mim, verdade eterna, oceano de paz. 

Quem não trilha esse caminho, vai pela estrada inferior, no rio do pecado. É uma estrada sem pedras, feita somente de água, inconsistente; por sobre ela ninguém vai sem afundar. É o caminho dos prazeres e das altas posições, daqueles cujo amor não repousa em Mim e nas virtudes, mas no apego desordenado ao que é humano e passageiro. Tais pessoas são como a água sempre a escorrer. À semelhança daquelas realidades, vão passando. Eles acham que são as coisas criadas, objeto de seu amor, que se vão; na realidade, também eles caminham continuamente em direção à morte. Bem que gostariam de deter-se, reter na vida as coisas que amam. Seriam felizes se as coisas não passassem. Perdem-nas todavia, seja por causa da morte, seja pelos acontecimentos com que faço, escapar-lhes das mão, os bens deste mundo... 

... Com o retorno de Meu Filho ao céu, enviei o Mestre, o Espírito Santo. Ele veio no Meu poder, na sabedoria do Filho, e na própria clemência. É uma só coisa Comigo e o Filho. Por sua vinda fortaleceu o Caminho - mensagem deixada no mundo por Jesus. O Espírito Santo é qual mãe a nutrir no Divino Amor. Ele liberta o homem, torna-o dono de si, isento da escravidão e do egoísmo. A chama da Minha caridade (o Espírito Santo) não sobrevive junto ao egoísmo.... 

... Assim, todos os homens, recebem luzes para conhecer a verdade. Basta que cada um o queira, que não destrua a luz da razão, pelo egoísmo desordenado. A mensagem de Jesus é verdadeira e ficou no mundo qual pequena barca para retirar os pecadores do rio do pecado e conduzi-los ao porto da salvação. Primeiro, coloquei Meu Filho como Ponte - Pessoa, a conviver com os homens; após Sua morte, ficou a Ponte - mensagem possuindo Meu poder, a sabedoria do Filho e o amor do Espírito. O poder fortifica os caminhantes, a sabedoria ilumina e ajuda a reconhecer a Verdade, o Espírito Santo infunde o amor que aperfeiçoa, que destrói o egoísmo e conserva no homem o apego ao bem... 

O Verbo encarnado, Meu Filho único e ponte de glória, deu aos homens vida e grandeza. Eram escravos do demônio e Ele os libertou. Para que cumprisse tal missão, tornei-O servo; para cobrir a desobediência de Adão exigi que obedecesse; para confundir o orgulho, humilhou-se até a morte na cruz. Por Sua morte, destruiu o pecado. No intuito de livrar a humanidade da morte eterna, fez do Seu Corpo uma bigorna. No entanto os pecadores desprezam Seu Sangue, pisoteiam-No com um amor desordenado. Esta é a injustiça, este o julgamento falso a respeito do qual o mundo é e será repreendido até o dia do juízo final. Tal repreensão começou quando enviei o Espírito Santo sobre os apóstolos. São três as repreensões: a voz da Igreja, o Juízo Particular e o Juízo Final.

(Revelações de Deus Pai à Santa Catarina de Sena)

domingo, 8 de setembro de 2013

'QUEM NÃO CARREGA SUA CRUZ...'

Páginas do Evangelho - Vigésimo Terceiro Domingo do Tempo Comum 


Na essência do amor a Deus vivido em plenitude, está o abandono aos valores do mundo e às glórias humanas. No desapego aos valores materiais, no desprendimento aos moldes terrenos de vidas tangidas meramente pelas relações humanas, ainda que louváveis e boas em si, a alma se liberta do lastro e das amarras das felicidades transitórias dessa vida para a impulsão definitiva para a felicidade eterna do Céu. 

As palavras de Jesus no Evangelho de hoje são duras: 'Se alguém vem a mim, mas não se desapega de seu pai e sua mãe, sua mulher e seus filhos, seus irmãos e suas irmãs e até da sua própria vida, não pode ser meu discípulo' (Lc 14, 26). Pois é preciso servir primeiro a Deus e depois aos homens; e porque é preciso estar sem lastros humanos para servir a Deus sobre todas as coisas, é preciso superar relações humanas ainda que fraternas; porque sendo o amor divino o itinerário da eternidade, é preciso vivê-lo em patamares além das dimensões seguras e sensíveis dos amores humanos mais belos, que ligam pai e filho, mãe e filha, irmãos e irmãs, pais e esposos. Eis a essência desse amor sem medidas: por tudo de lado, até a própria vida, para seguir Jesus Cristo e o Evangelho.

Esta dimensão de renúncia e despojamento completo não é fácil, não é simples, não é desprovida de sacrifício: 'Quem não carrega sua cruz e não caminha atrás de mim, não pode ser meu discípulo' (Lc 14, 27). Sim, é preciso carregar a cruz: cruz que se torna pesada quando tolhida à terra pelos afazeres e lastros dos apegos humanos; cruz que se torna um jugo suave quando levada pela alma do discípulo incensado do mais puro amor de Deus. Per crucem ad lucem: é pela cruz que se chega à luz.

Jesus vai revelar em seguida, por meio de duas curtas parábolas, que, uma vez conhecidas as dificuldades de superação dos nossos apegos aos valores humanos, o propósito de renúncia ao mundo exige planejamento, prudência e perseverança: 'Com efeito: qual de vós, querendo construir uma torre, não se senta primeiro e calcula os gastos, para ver se tem o suficiente para terminar?' (Lc 14, 28). 'Ou ainda: qual o rei que ao sair para guerrear com outro, não se senta primeiro e examina bem se com dez mil homens poderá enfrentar o outro que marcha contra ele com vinte mil?' (Lc 14, 31). Não se constrói uma torre ou se participa de uma guerra, sem armas, ferramentas ou projetos solidamente firmados. O que dizer, portanto, em relação à nossa caminhada de vida interior e espiritual que tem como medida a própria eternidade?

sábado, 7 de setembro de 2013

AS DOZE COROAS DE GLÓRIA DA SANTA MISSA

1) Na hora de nossa morte, cada Missa ouvida com devoção será o nosso maior consolo.

2) Cada Missa ouvida com devoção será uma garantia segura do perdão dos nossos pecados na hora do julgamento.

3) Cada Missa ouvida com devoção abrevia a pena temporal merecida pelos nossos pecados.

4) A Missa assistida com especial devoção ao Sagrado Coração de Jesus é a maior homenagem possível a ser oferecida ao Salvador.


5) Cada Missa rezada com devoção perdoa, por intercessão de Nosso Senhor Jesus Cristo, muitas de nossas negligências e omissões.

6) Cada Missa rezada com devoção perdoa todos os pecados veniais que queremos evitar e reduz a ação do demônio sobre a nossa alma.

7) Por meio de cada Missa rezada com devoção podemos ajudar a libertar muitas almas do Purgatório.


8) Uma única Missa rezada com devoção durante a nossa vida mortal nos será de muito maior proveito que muitas outras rezadas após a nossa morte.


9) Cada Missa rezada com devoção nos preserva de muitos perigos e infortúnios e nos abreviam os tempos no Purgatório.

10) Durante cada missa, o altar é rodeado por uma multidão de anjos que assistem com zelo extremado a realização do Santo Sacrifício.


11) Por meio de cada Missa rezada com devoção, Deus vela e abençoa todas as nossas atividades humanas.

12) Cada missa rezada com devoção em honra a Deus Todo-Poderoso por meio da intercessão de algum santo ou anjo, em agradecimento a Deus pelos favores concedidos por meio dele, nos concede a graça de viver sob a especial proteção desse anjo ou santo em particular.

PRIMEIRO SÁBADO DE SETEMBRO


Mensagem de Nossa Senhora à Irmã Lúcia, vidente de Fátima: 
                                                                                                                           (Pontevedra / Espanha)

‘Olha, Minha filha, o Meu Coração cercado de espinhos que os homens ingratos a todo o momento Me cravam, com blasfêmias e ingratidões. Tu, ao menos, vê de Me consolar e diz que a todos aqueles que durante cinco meses seguidos, no primeiro sábado, se confessarem*, recebendo a Sagrada Comunhão, rezarem um Terço e Me fizerem 15 minutos de companhia, meditando nos 15 Mistérios do Rosário com o fim de Me desagravar, Eu prometo assistir-lhes à hora da morte com todas as graças necessárias para a salvação.’
* Com base em aparições posteriores, esclareceu-se que a confissão poderia não se realizar no sábado propriamente dito, mas antes, desde que feita com a intenção explícita (interiormente) de se fazê-la para fins de reparação às blasfêmias cometidas contra o Imaculado Coração de Maria no primeiro sábado seguinte.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

PORQUE HOJE É A PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS



A Grande Revelação do Sagrado Coração de Jesus foi feita a Santa Margarida Maria Alacoque  durante a oitava da festa de Corpus Christi  de 1675...

         “Eis o Coração que tanto amou os homens, que nada poupou, até se esgotar e se consumir para lhes testemunhar seu amor. Como reconhecimento, não recebo da maior parte deles senão ingratidões, pelas suas irreverências, sacrilégios, e pela tibieza e desprezo que têm para comigo na Eucaristia. Entretanto, o que Me é mais sensível é que há corações consagrados que agem assim. Por isto te peço que a primeira sexta-feira após a oitava do Santíssimo Sacramento seja dedicada a uma festa particular para  honrar Meu Coração, comungando neste dia, e O reparando pelos insultos que recebeu durante o tempo em que foi exposto sobre os altares ... Prometo-te que Meu Coração se dilatará para derramar os influxos de Seu amor divino sobre aqueles que Lhe prestarem esta honra”.


... e as doze Promessas:
  1. A minha bênção permanecerá sobre as casas em que se achar exposta e venerada a imagem de meu Sagrado Coração.
  2. Eu darei aos devotos do meu Coração todas as graças necessárias a seu estado.
  3. Estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias.
  4. Eu os consolarei em todas as suas aflições.
  5. Serei seu refúgio seguro na vida, e principalmente na hora da morte.
  6. Lançarei bênçãos abundantes sobre todos os seus trabalhos e empreendimentos.
  7. Os pecadores encontrarão em meu Coração fonte inesgotável de misericórdias.
  8. As almas tíbias se tornarão fervorosas pela prática dessa devoção.
  9. As almas fervorosas subirão em pouco tempo a uma alta perfeição.
  10. Darei aos sacerdotes que praticarem especialmente essa devoção o poder de tocar os corações mais empedernidos.
  11. As pessoas que propagarem esta devoção terão os seus nomes inscritos para sempre no meu Coração.
  12. A todos os que comungarem nas primeiras sextas-feiras de nove meses consecutivos, darei a graça da perseverança final e da salvação eterna.

    ATO DE DESAGRAVO AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS 
    (rezai-o sempre, particularmente nas primeiras sextas-feiras de cada mês)

Dulcíssimo Jesus, cuja infinita caridade para com os homens é deles tão ingratamente correspondida com esquecimentos, friezas e desprezos, eis-nos aqui prostrados, diante do vosso altar, para vos desagravarmos, com especiais homenagens, da insensibilidade tão insensata e das nefandas injúrias com que é de toda parte alvejado o vosso dulcíssimo Coração.

Reconhecendo, porém, com a mais profunda dor, que também nós, mais de uma vez, cometemos as mesmas indignidades, para nós, em primeiro lugar, imploramos a vossa misericórdia, prontos a expiar não só as nossas próprias culpas, senão também as daqueles que, errando longe do caminho da salvação, ou se obstinam na sua infidelidade, não vos querendo como pastor e guia, ou, conspurcando as promessas do batismo, renegam o jugo suave da vossa santa Lei.

De todos estes tão deploráveis crimes, Senhor, queremos nós hoje desagravar-vos, mas particularmente das licenças dos costumes e imodéstias do vestido, de tantos laços de corrupção armados à inocência, da violação dos dias santificados, das execrandas blasfêmias contra vós e vossos santos, dos insultos ao vosso vigário e a todo o vosso clero, do desprezo e das horrendas e sacrílegas profanações do Sacramento do divino Amor, e enfim, dos atentados e rebeldias oficiais das nações contra os direitos e o magistério da vossa Igreja.

Oh, se pudéssemos lavar com o próprio sangue tantas iniquidades! Entretanto, para reparar a honra divina ultrajada, vos oferecemos, juntamente com os merecimentos da Virgem Mãe, de todos os santos e almas piedosas, aquela infinita satisfação que vós oferecestes ao Eterno Pai sobre a cruz, e que não cessais de renovar todos os dias sobre os nossos altares.

Ajudai-nos, Senhor, com o auxílio da vossa graça, para que possamos, como é nosso firme propósito, com a viveza da fé, com a pureza dos costumes, com a fiel observância da lei e caridade evangélicas, reparar todos os pecados cometidos por nós e por nossos próximos, impedir, por todos os meios, novas injúrias à vossa divina Majestade e atrair ao vosso serviço o maior número possível de almas.

Recebei, ó Jesus de Infinito Amor, pelas mãos de Maria Santíssima Reparadora, a espontânea homenagem deste nosso desagravo, e concedei-nos a grande graça de perseverarmos constantes até a morte no fiel cumprimento dos nossos deveres e no vosso santo serviço, para que possamos chegar todos à Pátria bem-aventurada, onde vós, com o Pai e o Espírito Santo, viveis e reinais, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

O VÍCIO DA IRA

Primeiro Ponto: A ruína que a ira desenfreada traz para a alma

São Jerônimo diz que a ira é a porta pela qual todos os vícios entram na alma. 'Omnium vitiorum janua est iracundia'. A ira precipita os homens em ressentimentos, blasfêmias, atos de injustiça, detrações, escândalos e outras iniquidades, pois a paixão da ira escurece o entendimento e faz o homem agir como uma besta e um louco. Caligavit ab indignatione oculus meus – Jó 17:7  – Meu olho perdeu a visão, por causa da indignação. Davi disse: 'Meu olho está atribulado pela ira.' - Salmo 30:10. Por isso, segundo São Boaventura, um homem irritado é incapaz de distinguir entre o que é justo e injusto. Iratus non potest videre quod justum est, vel injustum. Em uma palavra, São Jerônimo diz que a ira priva o homem da prudência, da razão e do entendimento. Ab omni consilio deturpat, ut donee irascitur, insanire credatur. Assim, São Tiago diz: 'Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus.' - Tiago 1:20. Os atos de um homem sob a influência da ira não podem estar de acordo com a justiça divina e, consequentemente, não podem ser irrepreensíveis.

Um homem que não refreia o impulso da ira cai facilmente em ódio contra a pessoa que tenha sido ocasião de sua paixão. Segundo Santo Agostinho, o ódio nada mais é que uma raiva perseverante. Odium est ira diuturno tempore perseverans. Por isso, Santo Tomás diz que 'a ira é súbita, mas o ódio é duradouro'. Parece, então, que naquele em quem persevera a ira, o ódio também reina. Mas alguns dirão: Eu sou o chefe da casa, devo corrigir os meus filhos e servos, e, quando necessário, tenho que levantar a voz contra os distúrbios que testemunho. Digo como resposta: Uma coisa é ter ira contra um irmão, outra coisa é ficar descontente com os pecados de um irmão. Ter ira contra o pecado não é ira, mas zelo e, portanto, não somente é permitido, mas às vezes é um dever. Mas a nossa ira deve ser acompanhada pela prudência, e deve ser dirigida contra o pecado, não contra o pecador, pois se a pessoa que estamos corrigindo perceber que falamos por meio da paixão e do ódio contra ele, a correção será inútil e até mesmo perversa. Portanto, ter ira contra o pecado de um irmão é certamente legítimo. Santo Agostinho diz: 'Não está irado contra um irmão, aquele que está irado contra o pecado de um irmão'. Assim, como disse Davi, podemos estar irados sem pecar. 'Irai-vos e não queirais pecar'- Salmo 4:5. Mas, estar irado contra um irmão por causa do pecado que ele cometeu não é permitido, porque, de acordo com Santo Agostinho, não estamos autorizados a odiar os outros por causa de seus vícios. Nec propter vitia (licet) homines odisse.

O ódio traz consigo um desejo de vingança, pois, segundo Santo Tomás, a ira, quando totalmente voluntária, é acompanhada por um desejo de vingança. Ira est appetitus vindictoe. Mas talvez você diga: Se eu me ressinto de tal injúria, Deus terá piedade de mim, porque eu tenho motivos justos de ressentimento. Quem, pergunto eu, lhe disse que você tem motivos justos para buscar vingança? É você, cujo entendimento está obscurecido pelas paixões, quem diz isso. Já disse que a raiva obscurece a mente e tira a razão e o entendimento.

Enquanto durar a paixão da ira, você considerará a conduta de seu próximo como muito injusta e intolerável, mas, quando a sua ira tiver passado, você verá que o ato dele não foi tão ruim como pareceu antes. Mas, apesar de a injúria ser grave, ou mesmo muito grave, Deus não terá compaixão de você, se você procurar vingança. Não, Ele diz: 'A vingança pelos pecados não pertence a você, mas a Mim, e quando chegar o tempo, vou castigá-los como eles merecem'. 'A Mim pertence a vingança e eu lhes darei a paga a seu tempo' - Deuteronômio 32:35. Se você se ressente de uma injúria feita pelo próximo, Deus justamente infligirá vingança sobre você por todas as injúrias que você tiver feito a ele, e em particular por se vingar de um irmão, a quem Ele ordena que se perdoe. 'Aquele que quer vingar-se encontrará a vingança do Senhor.... Um homem conserva a sua ira contra outro homem, e pede a Deus remédio?.... Aquele que, sendo apenas carne, conserva rancor e pede propiciação a Deus? Quem lhe alcançará perdão por seus pecados?' - Eclesiástico 28:1,3,5. O homem, um verme feito de carne, conserva rancor e se vinga de um irmão, e depois se atreve a pedir misericórdia de Deus? E quem, acrescenta o Sagrado Escritor, pode obter o perdão para as culpas de tão ousado pecador? Diz Santo Agostinho: 'Qua fronte indulgentiam peccatorem obtinere poterit, qui praecipienti dare veniam non acquiescit'. Como aquele que não obedece à ordem de Deus de perdoar o seu próximo pode esperar obter de Deus o perdão dos seus próprios pecados?

Imploremos ao Senhor que nos preserve de ceder a qualquer paixão forte e particularmente à ira. 'Não me entregueis a uma alma sem vergonha e sem recato' - Eclesiástico 23:6. Porque aquele que se submete a tal paixão está exposto ao grande perigo de cair em um pecado grave contra Deus ou contra o próximo. Quantos, em consequência da não conterem a ira, cometeram blasfêmias horríveis contra Deus ou seus santos. Mas, ao mesmo tempo em que estamos em uma onda de indignação, Deus está armado com flagelos. O Senhor disse um dia ao profeta Jeremias: 'Que vês tu, Jeremias?' Eu respondi: 'Vejo uma vara vigilante' - Jeremias 1:11. 'Senhor, vejo uma vara vigilante a infligir punição'. O Senhor lhe perguntou de novo: 'Que vês tu?' Respondi: 'Vejo uma panela a ferver' - Jeremias 1:13. A panela a ferver é a figura de um homem inflamado de ira e ameaçado com uma vara, ou seja, com a vingança de Deus. Percebam, então, a ruína que a ira desenfreada traz ao homem. Primeiro, ela o priva da graça de Deus, e depois da vida corporal. 'A inveja e a ira abreviam os dias' - Eclesiástico 30:26. Jó diz: 'Verdadeiramente, a ira mata o insensato e a inveja mata o pequeno' - Jó 5:2. Em todos os dias da sua vida, pessoas viciadas em irar-se são infelizes, porque estão sempre em uma tempestade. Mas, passemos ao segundo ponto, no qual eu tenho muitas coisas a dizer que irão ajudá-lo a superar este vício.

Segundo Ponto: Como devemos aplacar a ira nas ocasiões de provocação

Em primeiro lugar, é necessário saber que não é possível para a fraqueza humana, em meio a tantas ocasiões, estar totalmente livre de todo o movimento de ira. Ninguém, como diz Sêneca, pode estar totalmente isento dessa paixão. Iracundia nullum genus hominum excipit. Todos os nossos esforços devem estar direcionados para a moderação dos sentimentos de ira que brotam na alma. Como eles devem ser moderados? Pela mansidão. Essa é chamada a virtude do Cordeiro - isto é, a amada virtude de Jesus Cristo. Porque, como um cordeiro sem ira e nem mesmo queixa, Ele suportou as dores de Sua Paixão e Crucificação. 'Tal como cordeiro, ele foi levado para o matadouro; como ovelha muda diante do tosquiador, ele não abriu a boca' – Isaías 53:7. Por isso Ele nos ensinou a aprender com Sua mansidão e humildade de coração. 'Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração' - Mateus 11:29.

Oh! quão agradáveis os mansos são aos olhos de Deus, aqueles que se submetem pacificamente a todas as cruzes, infortúnios, perseguições e injúrias! Aos humildes é prometido o Reino dos Céus. 'Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra' - Mateus 5:4. Eles são chamados filhos de Deus. 'Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus' - Mateus 5:9. Alguns se gloriam de sua mansidão, mas sem qualquer fundamento, pois eles são mansos apenas com aqueles que os elogiam e lhes favorecem, mas, para os que ferem ou censuram, eles se enchem de fúria e vingança. A virtude de mansidão consiste em ser manso e pacífico com aqueles que nos odeiam e maltratam. 'Com os que odiavam a paz eu era pacífico' - Salmo 119:7.

Precisamos, como diz São Paulo, revestir-nos de entranhada misericórdia para com todos os homens, e suportar-nos uns aos outros. 'Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entranhada misericórdia, de bondade, humildade, doçura, paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem' - Colossenses 3:12-13. Você quer que outros suportem seus defeitos e perdoem suas falhas, então você deve agir da mesma maneira em relação aos outros. Assim, sempre que você receber um insulto de uma pessoa enfurecida contra você, lembre-se que 'Uma resposta branda aplaca o furor, uma palavra dura excita a cólera' - Provérbios 15:1. Um monge certa vez passou por um campo de milho, o proprietário do campo não gostou e falou-lhe em linguagem muito ofensiva e injuriosa. O monge humildemente respondeu: 'Irmão, você está certo, eu agi de maneira errada, me perdoe'. Com esta resposta, o lavrador ficou tão acalmado, que instantaneamente perdeu toda a raiva, e até quis seguir o monge e entrar na vida religiosa. O orgulhoso faz uso das humilhações que recebem para aumentar o seu orgulho, mas os humildes e os mansos transformam o desprezos e insultos oferecidos a eles em ocasião de avançar na humildade. São Bernardo diz: 'É humilde aquele que converte a humilhação em humildade'.

São João Crisóstomo diz que 'um homem de mansidão é útil para si e para os outros'. Os mansos são úteis para si mesmos, porque, de acordo com o Pe. Alvarez, o tempo de humilhação e desprezo é para eles o tempo de mérito. Assim, Jesus Cristo chama os seus discípulos de felizes por que serão injuriados e perseguidos. 'Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem e perseguirem' - Mateus 5:11. Por isso, os santos sempre desejaram ser desprezados, como Jesus Cristo foi desprezado. Os mansos são úteis para os outros, porque, como o mesmo São João Crisóstomo diz, não há nada melhor calculado para atrair outros para Deus, do que ver um cristão manso e alegre quando recebe um ferimento ou um insulto. Nihil ita conciliat Domino familiares ut quod illum vident mansuetudine jucundum. A razão disso é que a virtude se torna conhecida ao ser testada e, como o ouro é provado no fogo, a mansidão dos homens é provada na humilhação. 'Porque o ouro é provado no fogo e as pessoas escolhidas no forno da humilhação' - Eclesiástico 2:5.

'O meu nardo', diz a esposa no Cântico, 'exala o seu perfume' - Cânticos 1:11. O nardo é uma planta aromática, mas só difunde seus odores quando é rasgada ou ferida. Nesta passagem, o escritor inspirado nos dá a entender, que um homem não pode ser chamado de manso, a menos que seja conhecido por exalar o perfume de sua mansidão suportando injúrias e insultos em paz e sem raiva. Deus quer que sejamos mansos, até em relação a nós mesmos. Quando uma pessoa comete uma falha, Deus certamente deseja que ela se humilhe, se arrependa de seus pecados, com o propósito de nunca cair neles novamente, mas Ele não quer que ela fique indignada consigo mesma, dando lugar a problemas e agitações na consciência, pois, quando a alma está agitada, o homem é incapaz de fazer o bem. 'O meu coração está conturbado, a minha força me desamparou' - Salmo 37:11.

Assim, quando recebemos um insulto, devemos fazer violência a nós mesmos, a fim de aplacar a ira. Respondamos com mansidão, como recomendado acima, ou fiquemos em silêncio, e assim venceremos, como diz Santo Isidoro. 'Quamvis quis irritet, tu dissimula, quia tacendo vinces'. Mas, se você responder com a paixão, você fará mal a si e aos outros. Seria ainda pior dar uma resposta com ira a uma pessoa que o corrige. Pois São Bernardo diz: 'Medicanti irascitur qui non irascitur sagittanti'. Alguns não ficam com raiva, mas deveriam estar indignados com aqueles que ferem suas almas pela lisonja, e ficam cheios de indignação contra a pessoa que o censura para curar as suas irregularidades. Contra o homem que detesta a correção, a sentença de perdição, de acordo com o Homem Sábio, já foi pronunciada. 'Porque odiaram as instruções e não abraçaram o temor do Senhor, nem se submeteram ao meu conselho, mas desprezaram todas as minhas repreensões, comerão, pois, o fruto do seu próprio proceder e fartar-se-ão dos seus conselhos. A indocilidade dos fátuos os matará e a (falsa) prosperidade dos insensatos os destruirá' - Provérbios 1:29-32. Os insensatos contam como prosperidade estarem livres de correção, ou desprezar as advertências que recebem, mas tal prosperidade é a causa de sua ruína.

Quando você se deparar com uma ocasião de ira, você deve, em primeiro lugar, estar em guarda para não permitir que a ira entre em seu coração. 'Não seja fácil em te irares' - Eclesiastes 7:10. Algumas pessoas mudam de cor, e caem em uma paixão a cada contradição, e quando a raiva foi admitida, Deus sabe a que ela deve levá-los. Por isso, é necessário prever essas ocasiões em nossas meditações e orações, pois, a menos que estejamos preparados para elas, será tão difícil aplacar a ira quanto pôr um freio em um cavalo enquanto ele está fugindo.

Sempre que tivermos a infelicidade de permitir que a ira entre na alma, sejamos cuidadosos para não permitir que ela permaneça. Jesus Cristo diz a todos para se lembrarem de que se um irmão estiver ofendido com você, não se deve oferecer os dons no altar, sem primeiro se reconciliar com o próximo. 'Vai reconciliar-te primeiro com teu irmão, depois vem fazer a tua oferta' - Mateus 5:24. E aquele que tenha recebido qualquer ofensa, deve se esforçar para extirpar do seu coração não só toda a raiva, mas também todo sentimento de amargura para com as pessoas que o ofenderam. 'Toda a amargura, animosidade, cólera, clamor, maledicência, com toda espécie de malícia seja banida de entre vós' - Efésios 4:31. Enquanto a ira persistir, siga o conselho de Sêneca - 'Quando você estiver com raiva, não faça nada, não diga nada que possa ser instigado pela raiva'. Como Davi, fique em silêncio, e não fale quando você sentir que está perturbado. 'Fiquei perturbado e não falei' - Salmo 76:5.

Quantos, quando estão inflamados pela ira, dizem e fazem aquilo de que eles mais tarde, em seus momentos mais calmos, se arrependem e se desculpam dizendo que estavam transtornados pela paixão? Enquanto a ira persistir, devemos ficar em silêncio, e abster-nos de fazer ou resolver fazer qualquer coisa, pois, o que é feito no calor da paixão será, de acordo com a máxima de São Tiago, injusto. 'Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus' – Tiago 1: 20. Também é necessário se abster completamente de consultar aqueles que poderiam fomentar a nossa indignação. Davi diz: 'Ditoso o homem que não se deixou levar pelo conselho dos ímpios' – Salmo 1:1. Para aquele a quem se pede conselho, o Eclesiástico diz: 'Se assoprares a uma faísca, ela se inflamará, se cuspires sobre ela, se apagará: e uma e outra coisa saem da boca' – Eclesiástico 28:14. Quando uma pessoa está indignada por causa de alguma injúria que recebeu, você deve apagar esse fogo, exortando-o à paciência, mas, se você incentivar a vingança, você poderá acender uma grande chama. Que aquele que se sente de alguma forma inflamado pela raiva, ponha-se em guarda contra os falsos amigos, que, por uma palavra imprudente, podem ser a causa de sua perdição.

Sigamos o conselho do apóstolo: 'Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem' - Romanos 12:21. Não te deixes vencer pelo mal: não se permita ser conquistado pelo pecado. Se, pela ira, você buscar vingança ou proferir blasfêmias, você será vencido pelo pecado. Mas você dirá: eu tenho, naturalmente, um temperamento forte. Pela graça de Deus e fazendo violência a si mesmo, você será capaz de vencer essa disposição natural. Não consinta com a ira, e você dominará o calor do seu temperamento. Mas você dirá: eu não posso suportar o tratamento injusto. Em resposta eu lhe direi, em primeiro lugar, lembre-se que a ira obscurece a razão e nos impede de ver as coisas como elas são. 'Caiu fogo de cima sobre eles, e não viram mais o sol' - Salmo 57:9. Em segundo lugar, se você pagar o mal com o mal, o se inimigo terá uma vitória sobre você. Davi disse: 'Se paguei com mal aos que mo faziam, caia eu com razão debaixo dos meus inimigos, sem esperança' - Salmo 7:5. Se eu pagar o mal com o mal, serei derrotado pelos meus inimigos. 'Supere o mal com o bem'. Dê a todos os inimigos o bem em troca do mal. Jesus Cristo diz: 'Fazei bem aos que vos odeiam' - Mateus 5:44. Esta é a vingança dos santos e é chamada por São Paulino de vingança celestial. É por meio dessa vingança que você deve conquistar a vitória.

E se algum desses, de quem o profeta diz: 'O veneno de víbora está nos seus lábios' – Salmo 139: 4, perguntar a você como pode se submeter a tal injúria, responda: 'Não hei de beber o cálice que meu Pai me deu?' - João 18:11. E, em seguida, voltando-se a Deus, você dirá: 'Emudeci e não abri a minha boca, porque Tu o fizeste' - Salmo 38:10, pois é certo que cada cruz que recai sobre você, vem do Senhor. 'Os bens e os males, a vida e a morte, a pobreza e a riqueza, tudo isto vem de Deus' - Eclesiástico 11:14. Se alguém lhe tirar a sua propriedade, recupere-a se for possível, mas, se não for, diga com Jó: 'O Senhor o deu, o Senhor o tirou' - Jó 1:21. Certo filósofo, que perdeu alguns de seus bens em uma tempestade, disse: 'Perdi os meus bens, mas não perderei a minha paz'. E você dirá: perdi a minha propriedade, mas não vou perder minha alma.

Em suma, quando nos encontrarmos com cruzes, perseguições e injúrias, voltemo-nos para Deus, que nos ordena suportá-las com paciência, e assim sempre evitaremos a ira. 'Lembra-te do temor de Deus, e não te ires contra o teu próximo' - Eclesiástico 28:8. Demos uma olhada na vontade de Deus, que dispõe todas as coisas desta maneira para o nosso mérito, e assim a ira cessará. Demos uma olhada em Jesus crucificado, e não teremos coragem de reclamar. Santo Eleazar, ao ser perguntado por sua esposa, como suportava tantas injúrias, sem ceder à ira, respondeu: eu me viro para Jesus Cristo e assim preservo a minha paz. Finalmente, demos uma olhada em nossos pecados, para os quais merecemos muito mais desprezos e castigos, e nós calmamente nos submeteremos a todos os males. Santo Agostinho diz que, embora às vezes sejamos inocentes de um crime pelo qual somos perseguidos, nós somos, no entanto, culpados de outros pecados que merecem castigo maior do que aquele que estamos sofrendo. Esto non habemus peccatum, quod objicitur; habemus tamen, quod digne in nobis flagelletur.

(O Vício da Ira, de Santo Afonso Maria de Ligório)