sábado, 20 de maio de 2023

OS GRANDES SINAIS PRECURSORES DO JUÍZO FINAL (III)

 

Erunt sigma in sole et luna et stellis 

'Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas' (Lc 21, 25)

Introdução

Esses sinais serão para os iníquos uma fonte de medo, angústia e pavor; mas, para os bons, uma fonte de alegria e exultação. Todos os cristãos católicos acreditam que, em seu segundo advento, Jesus Cristo virá como o Juiz dos vivos e dos mortos a este mundo; mas ninguém sabe o dia de sua vinda. No entanto, o mundo poderá aprender que o dia do julgamento está próximo pelos sinais que o próprio Cristo anunciou como precursores do último dia. O primeiro sinal, ou seja, o reinado do Anticristo, e o que temos a aprender com isso, já foi explanado. Passo agora a falar dos outros sinais.

Plano de Discurso

Haverá sinais terríveis nos céus e em todos os elementos. Estas e suas causas explicarei na primeira parte. Esses sinais serão para os iníquos uma fonte de medo, angústia e pavor; mas para os bons, uma fonte de alegria e exultação. Isso eu mostrarei na segunda parte. Pecadores, se desejais que o último dia não seja motivo de pavor para vós, convertei-vos! Cristãos fieis! Regozijai-vos se agora tiverdes que passar pelos tempos de tribulação! Esta deverá ser a conclusão. Ajudai-nos, ó justo Juiz, a cumpri-la pela vossa graça, que Vos pedimos pela intercessão de Maria e dos nossos santos anjos da guarda.

Primeira Parte

Quando aqueles três anos e meio do reinado do terrível perseguidor Anticristo tiverem expirado, então, diz Nosso Senhor no Evangelho de São Mateus - 'Imediatamente após a tribulação daqueles dias, o sol escurecerá e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e os poderes do céu serão abalados'¹. Assinale a palavra 'imediatamente'. Não devemos entender por isso que, no momento em que o Anticristo for precipitado no abismo, esses sinais serão visíveis. Não; pois, de acordo com os exegetas, a misericórdia de Deus concederá uma pausa de alguns meses, ou, como dizem alguns, de alguns anos, para que aqueles que foram pervertidos pelo Anticristo tenham tempo de se arrepender, pois será um tempo em que quase o mundo inteiro retornará a Cristo após a terrível apostasia. 

Mas, quando finalmente chegar a hora do julgamento geral, 'Haverá sinais no sol, e na lua e nas estrelas e, sobre a terra, angústia das nações, por causa da confusão do bramido do mar e das ondas'². O sol será privado do seu brilho e o dia tornar-se-á noite, tal como a escuridão se apossou do Egito: 'Houve uma escuridão terrível em toda a terra do Egito por três dias. Ninguém via um ao outro; e ninguém se levantou do lugar onde estava'³. A lua, de cor vermelho-sangue, aparecerá como um fantasma pavoroso à noite e as estrelas cairão do céu; não, rigorosamente falando, em termos das estrelas que Deus colocou no firmamento, pois onde poderiam cair? Não na Terra, porque, segundo os astrônomos, a menor estrela é muito maior que a Terra. Mas as estrelas esconder-se-ão como se tivessem realmente caído do firmamento e, ao mesmo tempo, um vapor incandescente de estrelas precipitar-se-á sobre o globo terrestre, como se o quisesse incendiar totalmente.

Todos os elementos serão perturbados; o ar ressoará com terríveis tempestades e trovões; o mar e todas as águas serão movimentadas por ondas poderosas subindo e descendo; a terra será abalada e quase dilacerada por terremotos que engolirão cidades inteiras, enquanto o fogo explodirá com grande estrondo nas montanhas e cavernas. Em uma palavra, as engrenagens do grande relógio do mundo estarão todas quebradas e desconjuntadas, como nos fala Luis de la Puente [teólogo espanhol - 1554/1624], como sinal de que a última hora do julgamento está próxima, e tal será o medo, a angústia, a aflição e o pavor dos homens, e o rugido e estertor das feras, que ninguém saberá para onde se virar ou o que fazer. Daí aquela velha expressão para distinguir o mau tempo: 'é como se fosse o último dia'.

E qual é o significado de tudo isso, meus queridos irmãos? Para 'que fim essa grande perturbação e consternação de todas as criaturas?' Primeiro, diz Abulensis [Alonso Tostado, bispo de Ávila, 1410/1455], é um sinal de compaixão, como se fosse um desmaio e agonia de toda a natureza às vésperas da destruição do mundo. Quando o chefe de família está à beira da morte, toda a família fica perturbada e confusa; a esposa chora e arranca os cabelos em agonia de dor; as crianças dão vazão à sua tristeza em gritos ruidosos; os parentes choram; os servos correm de um lado para o outro suspirando e gemendo; o dobre de finados toca as suas tristes notas na torre da igreja; amigos e vizinhos vestidos de luto chegam para o funeral. Tudo se consome em dor e lamentação. Assim será quando o fim do mundo se aproximar e a raça humana - o chefe desta família deste mundo - estiver dando os seus últimos suspiros; toda a natureza será tomada de medo e consternação; o céu perderá seus luminares e se revestirá com o traje negro da noite; os elementos devem, por assim dizer, chorar e ficar desorientados enquanto a atmosfera ressoando com trovões e furacões violentos será analogamente como o dobre de finados pelo mundo moribundo.

Além disso, esses sinais mostrarão a grande ira e o desagrado de Deus Todo Poderoso em relação aos homens pecadores. Os céus agora anunciam a glória de Deus, como diz o Profeta Davi: 'Os céus manifestam a glória de Deus, e o firmamento declara a obra de suas mãos'⁴. 'E então' - diz Barradius [Sebastião Barradas, teólogo português, 1543/1615] - 'eles declaram a ira de Deus contra os ímpios'⁵. Pois Deus fará com que todas as criaturas se levantem contra os pecadores; fazendo com que as estrelas percam a sua luz, Ele irá, por assim dizer, fechar as janelas pelas quais qualquer luz poderia penetrar na terra, para que Ele possa ferir o homem no escuro e sem misericórdia, como Isaías profetiza: 'Eis que virá o dia do Senhor, dia implacável, de furor e de cólera ardente, para reduzir a terra a um deserto, e dela exterminar os pecadores. Nem as estrelas do céu, nem suas constelações brilhantes, farão resplandecer sua luz; o sol se obscurecerá desde o nascer, e a lua já não enviará sua luz'. Punirei o mundo por seus crimes, e os pecadores por suas maldades. Abaterei o orgulho dos arrogantes e humilharei a arrogância dos poderosos'⁶.  'A lua vai corar de vergonha e o sol vai se empalidecer'⁷ 'porque' - acrescenta o Cardeal Hugo [cardeal dominicano francês, Hugo de Saint-Cher, 1200/1263]- 'eles serviram a tais mestres'⁸, mestres que foram tão ingratos ao seu Criador. Ora, segundo São Paulo, as criaturas servem aos pecadores contra a sua vontade e como que por força e necessidade: 'Porque a criatura foi sujeita à vaidade, não voluntariamente'; portanto, gemem sob o jugo de sua escravidão e suspiram pelo dia em que serão libertados dela, 'pois sabemos que toda criatura não para de gemer e dar à luz até hoje'⁹. O sol, a lua e as estrelas gemem e lastimam por ter que dar a sua luz aos homens para ser utilizada indevidamente por eles para ofender e insultar a Deus; a terra, o fogo, a água e o ar imploram, por assim dizer, ao Deus Todo Poderoso que os libertem da servidão aos homens pecadores. 

Isso acontecerá no fim do mundo, quando todas as criaturas serão elevadas e libertadas da escravidão, e então, como um único e poderoso exército, avançarão em bloco contra os ímpios para envergonhá-los, como lemos no Livro da Sabedoria: 'E seu zelo vai armá-los, cada criatura empunhará uma armadura para enfrentar os seus inimigos ... e o mundo inteiro lutará com Ele contra os insensatos'¹⁰. O sol declarará guerra, como Tamerlão [conquistador mongol do século XIV, 1336 /1405] fazia antigamente, com uma bandeira negra estendida; a lua tingida de sangue e as estrelas desordenadas e fora do seu curso começarão a batalha. Elas dirão que deram a sua bela luz gratuitamente e por tanto tempo aos pecadores que não eram dignos dela; que marcaram para eles as horas, dias, semanas, meses e anos; pela regularidade dos seus movimentos, foram exemplos da constância e obediência que deviam a Deus, mas que os homens pecadores preferiram seguir as sugestões do demônio, os prazeres da carne, os costumes e as regras de um mundo pervertido, em vez de obedecer à lei do seu Criador e também porque amaram mais as trevas do que a luz; e que, portanto, eis chegado o tempo do fim do servilismo em que, de agora em diante, serão para as infelizes criaturas apenas uma fonte de medo e de terror.

Da mesma forma, os quatro elementos reunidos entrarão em batalha contra os pecadores. O ar - que lhes deu fôlego e voz, para que pudessem respirar e falar; que permitiram as chuvas benéficas; no qual as aves cruzavam para seu deleite e nutrição - vai se projetar sobre eles por todos os lados, destruindo as construções pela violência de ventos contrários, arrancando as árvores pela raiz, explodindo em tempestades de granizo para matar os animais do campo, infestadas de trovões e relâmpagos e cenário de terríveis aparições, como nunca foram vistas nem mesmo no Egito no tempo do faraó perseguidor e nem em Jerusalém quando foi destruída, que encherão de pavor e consternação aos pecadores, com uma palavra de condenação: 'pois estenderam a mão contra Deus e desafiaram o Todo Poderoso'¹¹. 

A água que fornecia aos pecadores bebida, sal e peixes para a sua alimentação e que os servia como via de transporte de um país para outro na exploração dos seus negócios, ultrapassaria então os seus limites e inundaria a terra adjacente por toda parte; cheia de furor e em vergalhões contra os ímpios, pronto para engoli-los como fez com Jonas: 'Tenha vergonha, ó Sidon, pois o mar fala'¹². Os mares e as águas, vergados por ondas impetuosas, então dirão: 'Tenha vergonha, ó cristão, envergonhe-se de que nós, que não temos o entendimento de você, por quem Deus não morreu como morreu por você; que não temos castigo eterno a temer nem recompensas eternas a esperar como você - envergonhe-se de que ficamos por seis mil anos obedientes ao Criador e não nos movemos nem por um grão de areia além dos limites que Ele traçou para nós, mas sempre permanecemos nos domínios dos seus desígnios; enquanto você, ao contrário, dotado de razão e benefícios incontáveis, seduzido pela esperança do céu e pleno do temor de se perder no inferno, muitas vezes e deliberadamente transgrediu os mandamentos de Deus e chafurdou em um mar de vícios! Tenha vergonha de ser superado por uma coisa tão menor quanto nós, na obediência a Deus!'. Ó Deus Todo-Poderoso, as ondas clamarão ao subirem em direção ao céu, para mostrar a vossa justiça contra os pecadores e, como eles desprezaram viver no oceano da vossa misericórdia e buscar a vossa salvação! Deixai-os agora afundar no profundo abismo da vossa justiça e sentir o peso do vosso braço vingador! 

A terra que por tanto tempo serviu aos homens perversos para sua nutrição, roupas, moradia, remédios e prazer, suprindo-os com frutas, árvores, ervas e flores que produziu em abundância - a terra então se abrirá em mil estertores, clamando por vingança contra os pecadores por terem abusado de seus dons de maneira tão ingrata e indiferente. As feras sairão de suas cavernas e de suas tocas com uivos horríveis para perseguir estes infelizes por toda parte, enchendo-os de terror. O mundo inteiro lutará com Ele contra os insensatos; o universo pegará em armas movido pela ira de Deus contra os ímpios e os pecadores e, por meio de sua fúria, anunciará a todos o quão próximos está o dia terrível no qual o Juiz se vingará de todos os seus inimigos; aquele dia que o profeta Sofonias chama de 'o grande dia do Senhor': 'Terrível é o ruído que faz o dia do Senhor; o mais forte soltará gritos de amargura nesse dia; um dia de ira, dia de angústia e de aflição, dia de ruína e de devastação; dia de trevas e escuridão, dia de nuvens e de névoas espessas'¹³. Onde se esconderão, para encontrar conforto e consolação, quando o céu e a terra estiverem em tal desordem e unirem todas as suas forças para os atacar? Nosso Senhor já nos disse como os homens se sentirão nesse dia: 'Os homens definha­rão de medo, na expectativa dos males que devem sobrevir a toda a terra. As próprias forças dos céus serão abaladas'¹⁴. Mas isso só acontecerá com os pecadores pois, por mais terríveis que sejam os sinais que precederão o último dia, os servos de Deus encontrarão neles uma ocasião de júbilo e exultação, como veremos na Segunda Parte deste discurso.

1. Statim autem post tribulationem dierum illorum sol obscurabitur, et luna non dabit lumen suum, et stellae cadent de caelo, et virtutes caelorum commovebuntur (Mt 24,29).
2. Erunt signa in sole, et luna, et stellis, et in terris pressura gentium prae confusoe sonitus maris et fluctuum (Lc 21,25).
3. Factae sunt tenebrae horribiles in universa terra Egypti tribus diebus. Nemo vidit fratrem suum, nec movit se de loco in quo erat (Ex 10, 22-23).
4. Caeli enarrant gloriam Dei, et opera manuum ejus annuntiat firmamentum (Sl 17,2).
5. Tunc vero iram Dei, impiis annuntiabunt.
6. Ecce dies Domini veniet, crudelis, et indignationis plenus, et irae, furorisque, ad ponendam terram in solitudinem, et peccatores ejus contendondos de ea. Quoniam stellae caeli, et splendor earum, lumen suum não expansivo; obtenebratus est sol in ortu suo, et luna non splendebit in lumine suo. Et visitabo super orbis mala, et contra impios iniquitatem eorum; et quescere faciam superbian infidelium, et arrogantian fortium humiliabo (Is 8, 9-11).
7. Erubescet luna, et confundetur sol (Is 24, 23).
8. Quod talibus dominis servierunt.
9. Vanitati enim creatura subjecta est non volens. Scimus enim quod omnis creatura ingemiscit, et parturit usque adhuc (Rm 7, 20.22).
10. Accipiet armaturam zelus illius, et armabit creaturam ad ultionem inimicorum,….et pugnabit cum illo orbis terrarum contra insensatos (Sb 5, 18.21).
11. Tetendit adversus Deum manum suam, et contra Omnipotentem roboratus est (Jó 15, 25).
12. Erubesce Sidon; ait enim mare (Is 23,4).
13. Dies irae dies illa, dies tribulationis et angustiae, dies calamitatis et miseriae, dies tenebrarum et caliginis, dies nebulae et turbinis; vox diei Domini amara, tribulabitur ibi fortis (Sf  1, 14-15).
14. Arescentibus hominibus prae timore, et exspectatione, quae supervenient universo orbi (Lc 21,26).

(Excertos da obra 'Sermons on the Four Last Things' - Sermon 27, do Rev. Francis Hunolt /1694 -1746/, tradução do autor do blog)