sábado, 18 de março de 2023

SOBRE UMA ROSEIRA E OS SEUS ESPINHOS

'Um dia do ano de 1847, depois de ter meditado sobre o caminho para fazer o bem aos jovens, a Rainha do Céu apareceu-me e levou-me a um jardim encantador. Havia uma longa portada ladeada e envolvida por rosas. Trepadeiras carregadas de folhas e flores envolviam e adornavam as colunas, subindo e cruzando-se para formar um dossel gracioso.

Após a entrada, podia-se ver um belo caminho sobre o qual, até onde a vista alcançava, estendia-se um delicioso jardim suspenso, cercado e coberto de maravilhosas roseiras em plena floração. O chão inteiro estava coberto de rosas. A bem-aventurada Virgem Maria me disse: 'Tire os sapatos'. E quando eu os tirei, ele acrescentou: 'Caminhe sob o jardim suspenso: é o caminho que você deve seguir'.

Eu gostei de ter que tirar os sapatos para não ter que pisar naquelas lindas rosas. Comecei a andar e imediatamente notei que as rosas escondiam espinhos muito afiados que faziam meus pés sangrarem. Então eu tive que parar depois de alguns passos e voltar. 'Sapatos são necessários aqui' – disse à minha guia –  'Certamente' – respondeu ela – 'bons sapatos são necessários'. Calcei os sapatos e voltei a caminhar, agora junto com outros companheiros que apareceram naquele momento, pedindo para caminhar comigo.

Eles me seguiram sob o jardim suspenso, que era incrivelmente bonito. Mas, à medida que avançávamos, a passagem tornava-se mais estreita e baixa. Muitos ramos dependurados pareciam como pontas afiadas; outros avançavam perpendicularmente à passagem. Ramos saíam dos troncos das roseiras, avançando em todas as direções, formando uma densa vegetação que envolvia por completo a estreita passagem. 

Tudo estava coberto de rosas e eu não via nada além de rosas por toda parte: rosas em cima, rosas nas laterais, rosas sob meus pés. Continuei avançando, embora sentisse cada vez mais os efeitos de tantos espinhos escondidos sob as rosas. Meus pés ficaram enredados nos ramos espalhados pelo chão e se encheram de arranhões. Uma ramagem transversal bloqueou o meu caminho e tive que me abaixar para contorná-la, machucando as minhas mãos e todo o meu corpo. Todas as rosas escondiam uma quantidade enorme de espinhos. Apesar de tudo, encorajado por Nossa Senhora, continuei o meu caminho embora muitos espinhos me machucassem terrivelmente.

Aqueles que me acompanhavam e eram muitos, ao me ver passando por aquele jardim suspenso, diziam: 'Dom Bosco caminha sobre rosas! Tudo está indo bem!' Eles não percebiam como os espinhos feriam o meu pobre corpo. Muitos seminaristas, sacerdotes, leigos, por mim convidados, dedicaram-se a seguir-me com alegria, pela beleza das flores; mas quando perceberam que tinham que andar sobre os espinhos e que estes o machucavam por toda parte, começaram a gritar: 'Fomos enganados!' E eu lhes respondi: 'Quem quiser caminhar suavemente sobre estas rosas, sem sofrer mal algum, que volte e que outros me sigam!'.

Muitos voltaram atrás. Depois de caminhar uma boa distância, virei-me para dar uma olhada nos meus companheiros. Que pena senti por perceber que muitos deles já não estavam comigo e que outros tantos tinham desistido da jornada. Voltei para chamá-los, mas foi inútil; sequer me ouviram. Então comecei a chorar: é possível que eu tenha que trilhar este caminho sozinho? Mas logo encontrei conforto. Vi um grande número de sacerdotes, clérigos e leigos vindo ao meu encontro, e que me diziam: 'Somos teus companheiros, estamos prontos para seguir contigo". Colocando-me à frente daquele grupo, retomei o caminho. Mais alguns desanimaram e pararam, mas a grande maioria segui em frente comigo.

Depois de passar pela roseira espinhosa, deparei-me com um jardim belíssimo. Os que vieram comigo estavam cansados, pálidos e muito feridos. Então uma leve brisa se levantou e, ao seu sopro, todos ficaram curados. Outro vento soprou e, como num passe de mágica, me vi cercado por um imenso número de jovens e clérigos, leigos, curas e também padres que começaram a trabalhar comigo orientando aqueles jovens. Reconheci vários pela fisionomia, mas não todos.

Enquanto isso, tendo alcançado um lugar mais elevado no jardim, encontrei-me diante de um edifício monumental, impressionante pela magnificência de sua arte. Atravessei a soleira e entrei em uma sala muito espaçosa cuja riqueza não poderia ser igualada por nenhum palácio deste mundo. Tudo estava coberto e enfeitado por rosas muito frescas e sem espinhos que exalavam um aroma muito suave. Então a Santíssima Virgem, que havia sido minha guia, perguntou-me: 'Você sabe o que significa o que você vê agora e o que você passou antes?' - 'Não' - respondi - 'imploro que me explique'.

Então ela me disse: 'Você deve saber que o caminho que você percorreu, entre rosas e espinhos, significa o trabalho que você deve realizar em favor dos jovens. Você terá que percorrer um caminho de mortificação. Os espinhos no chão significam os afetos sensíveis e as simpatias humanas que buscam desviar o educador do seu verdadeiro propósito, e o ferem e o detêm em sua missão, impedindo-o de caminhar e obter coroas para a vida eterna.

As rosas são os símbolos de caridade ardente que devem ser a sua marca e a de todos os seus colaboradores. Os outros espinhos significam as dificuldades, os sofrimentos e as tribulações que o aguardam na sua caminhada. Mas não desanime. Com caridade e mortificação, tudo superareis e alcançareis finalmente a sua meta - as rosas sem espinhos. Assim que a Mãe de Deus acabou de falar, acordei e me encontrei em meu quarto.

Este sonho de Dom Bosco repetiu-se também nos anos de 1848 e 1856. Depois de o ter contado, o santo acrescentou: 'Os que desanimaram ao sentir os espinhos foram os meus primeiros colaboradores. Os que me seguiram são os salesianos e os que colaboram com as nossas obras educativas, para os quais os esperam grandes recompensas e ajudas do Céu' Coragem meus amigos: espinhos de sofrimento nos esperam, mas também as rosas das recompensas eternas'.

(Dos Sonhos de Dom Bosco)