sábado, 21 de setembro de 2024

O VERDADEIRO LIVRO DA VIDA ETERNA


O SERVO: Senhor, creio que ninguém sabe realmente quantos benefícios podem ser emanados da Vossa Paixão, e quão imensos são os frutos que nela se podem encontrar, desde que alguém estiver disposto a dedicar-lhe espaço e tempo.

Que caminho seguro é o da vossa paixão, que conduz o homem pelo caminho da verdade até ao cume mais alto de toda a perfeição!

Como tinhas razão, bendito Paulo, luz exaltada entre todas as estrelas do céu, quando falaste! Tu, embora arrebatado às alturas e mergulhado nos mistérios ocultos da divindade nua, a ponto de ouvires palavras misteriosas, que nenhum homem pode pronunciar (2 Cor 12,4), abraçaste acima de tudo a paixão amantíssima de Cristo com tal amor e doçura de coração que não hesitaste em dizer: 'Julguei não dever saber coisa alguma entre vós, senão Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado' (1 Cor 2, 2).

Bendito és tu também entre todos os doutores, doce Bernardo, cuja alma foi admiravelmente iluminada pelos raios do Verbo Eterno, pois com a doce eloquência que brotava da exuberância do teu coração, pregaste e exaltaste a paixão da humanidade de Cristo, dizendo entre outras coisas: ' Irmãos, desde o início da minha conversão e como acervo dos méritos que sabia faltar-me, procurei juntar e colocar no meu peito este pequeno feixe feito de todas as angústias e amarguras do meu Senhor. Chamei sabedoria à meditação destas coisas; nelas descobri a perfeição da justiça, a plenitude da ciência, as riquezas da salvação e o tesouro dos méritos. Delas me vem a bebida salutar da amargura e o doce bálsamo da consolação. Sustentam-me na adversidade, e na prosperidade, refreiam-me; oferecem àquele que percorre a estrada real entre a alegria e a tristeza da vida presente, um guia seguro, afastando os males que o ameaçam...'

Sabedoria Eterna, de tudo o que foi dito deduzo facilmente que quem deseja grandes recompensas, a salvação eterna, uma ciência excelente e uma sabedoria superior, e quer gozar de uma alma equilibrada na adversidade e na prosperidade e estar completamente seguro contra todo o mal, deve trazer-Vos, ó meu Senhor Crucificado, diante dos olhos da sua alma onde quer que vá.

SABEDORIA ETERNA: Não penses que compreendeste a utilidade e as recompensas que isto traz. Acredita em mim, a lembrança contínua da minha amabilíssima paixão transforma um ignorante em um médico muito sábio. E não é de admirar, porque a minha Paixão é, em si mesma, um livro de vida onde tudo se encontra. Três vezes e quatro vezes bem-aventurado aquele que a tem sempre diante dos olhos e se dedica a ela! Que sabedoria e graça, que consolação e doçura, que superação de todos os vícios e que sentido da minha presença contínua ele pode obter! Escutai um exemplo disso:

Há muitos anos, um irmão pregador, no início de sua conversão, sofria horrivelmente de uma melancolia desordenada, que às vezes o incomodava tanto que só quem a tivesse experimentado poderia compreendê-la. Uma vez, sentado na sua cela depois do jantar, estava tão oprimido por esta tentação que não tinha vontade de estudar, de rezar, de fazer nada de bom, e permanecia triste na sua cela, com as mãos cruzadas no regaço, como se quisesse ao menos manter a sua cela em louvor do seu Senhor, pois sentia-se completamente incapaz de fazer qualquer outro exercício espiritual. Neste estado, privado de qualquer consolação, parecia-lhe ouvir uma voz que lhe dizia: 'Por que estás aqui sentado? Levanta-te e lembra-te de tudo o que sofri: então esquecerás toda a tua aflição'. Levantou-se imediatamente (porque compreendeu que a voz vinha do Céu) e começou a meditar na Paixão do Senhor Jesus, e sentiu-se tão liberto do seu sofrimento que nunca mais experimentou nada de semelhante.

O SERVO: Eterna Sabedoria, Vós que conheceis todos os corações, sabeis, sem dúvida, que não há nada mais desejável para mim do que sentir a Vossa mais amarga paixão com mais veemência do que os outros homens, e de tal modo que dos meus olhos corra noite e dia uma fonte de lágrimas. E por isso me queixo amargamente a Vós, porque a Vossa Paixão não pode penetrar a cada momento profundamente na minha alma e não posso meditá-la com tanta devoção como Vós mereceis, amadíssimo Senhor. Ensinai-me como me devo comportar.

ETERNA SABEDORIA: A meditação da minha Paixão não deve ser supérflua, mas deve ser feita com amor íntimo do coração e com reflexão sincera. Caso contrário, o coração não sentirá mais devoção do que o paladar sente por um alimento doce, mas não mastigado. E se, apesar de recordares a angústia e a dor inefáveis que ela me causou, não conseguires recordar a minha paixão com os olhos umedecidos, fá-lo ao menos com um espírito alegre pelos imensos bens que dela recebes. Se também não o podes fazer, se não podes meditá-la nem com alegria nem com lágrimas, então medita-a com o coração seco em louvor de Mim, porque assim me fazes um dom mais agradável do que se te derretesses todo por causa das lágrimas e da doçura, pois assim ages por amor à virtude e não em busca de ti mesmo.

E para que a minha Paixão penetre cada vez mais profundamente no teu coração, ouve o que te vou dizer. Se um grande pecador tiver de cumprir na fornalha ardente do terrível Purgatório as penas que aqui não pagou, tudo o que tiver de pagar pode ser expiado e apagado pela memória da minha Paixão. E, na verdade, essa pobre alma poderá refugiar-se e agarrar-se de tal modo ao ilustre tesouro da minha Paixão que, mesmo que tenha de sofrer mil anos os tormentos do Purgatório, num instante ficará livre de todas as culpas e penas e, saindo do Purgatório, voará livre para o Céu.

O SERVO: Senhor, mostrai-me como isto pode ser; como eu gostaria de conquistar assim o tesouro da vossa Paixão!

SABEDORIA ETERNA: Isso deve ser feito da seguinte forma:

1. com o coração contrito, que o homem examine e pese com seriedade e frequência a gravidade e a quantidade de seus grandes pecados, pois com eles ofendeu tão irreverentemente os olhos de seu Pai celeste.

2. Em seguida, que ele considere suas obras de penitência como nada, pois elas são apenas uma gota no oceano em comparação com os seus pecados.

3. Que considere a admirável imensidão da minha Expiação, pois uma pequena gota do precioso sangue que corre abundantemente pelo meu corpo bastaria para apagar os pecados de mil mundos; embora se beneficie tanto da minha Expiação quanto se conforme a mim por compaixão.

4. Finalmente, ele deve humilde e sinceramente submergir e fixar a pequenez de sua expiação na infinitude da minha.

Em suma, nem os matemáticos, nem os sábios, nem todos os mestres juntos são capazes de enumerar a imensidão dos bens que ficam escondidos na meditação assídua da minha Paixão.

O SERVO: Assim sendo, Senhor, peço-Vos que ponhais fim a tudo o que me tem afastado de Vós e me introduzais profundamente nas riquezas ocultas da Vossa amadíssima Paixão.

(Excertos da obra 'O Livro da Sabedoria Eterna', do Beato Henrique Suso)

sexta-feira, 20 de setembro de 2024

TESOURO DE EXEMPLOS (371/375)

 

371. ENORME PERDA

Nero, antes de ser imperador, numa noite de jogo perdeu um milhão de sestércios. Sua mãe mandou por sobre uma mesa uma quantia igual em moedas e disse-lhe: 'Vê o que perdeste, o que te custou uma só noite de jogo!' Ao ver aquilo, Nero concebeu grande horror àquela espécie de jogo.

372. A MÃO COM QUE JURARA

Rodolfo da Suécia jurara fidelidade ao imperador Henrique IV. Rebelou-se, violando o seu juramento, e na batalha de Merseburgo sofreu a amputação da mão direita por parte de Godofredo de Bouillon. Rodolfo, agonizando, contemplava a mão truncada e exclamou: 'E' a mão com que eu tinha jurado fidelidade ao meu imperador!'

373. MARTÍRIO DE SÃO CANUTO

São Canuto, rei da Dinamarca, ordenara que em seu reino se pagasse o dízimo à Igreja, como era de justiça. Um tal Blancon excitou o povo, o qual, indignado contra o soberano, deu-lhe morte cruel. Deus enviou sobre a Dinamarca uma terrível carestia, enquanto que nos povos vizinhos havia abundância de tudo. Êsse castigo não cessou enquanto o povo não reconheceu o seu crime e pediu perdão a Deus.

374. NÃO MURMURAR

Santo Agostinho não admitia que, em sua presença, se murmurasse ou ofendesse a honra do próximo. Razão por que mandou por sobre a sua mesa esta inscrição: 'A esta mesa não se assente quem fala mal do ausente'.

375. NÃO TINHA O NECESSÁRIO

Apresentou-se ao missionário um velho chinês, que lhe pediu que mandasse construir uma igreja em sua vila. Respondeu-lhe o missionário que não era possível por não dispor dos meios necessários.
➖ Eu vos ajudarei - disse o chinês.
➖ Sim; mas seriam necessários cerca de dois mil escudos - respondeu o missionário ao ver a aparência tão pobre de seu interlocutor.
➖Eu os tenho e estão à vossa disposição - disse o velho - porque há quarenta anos que penso na necessidade de uma igreja e, gastando apenas o necessário, para comer e vestir, consegui economizar essa soma. Um belíssimo exemplo de um pagão convertido.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

quinta-feira, 19 de setembro de 2024

A BÍBLIA EXPLICADA (XXVII) - AS GENEALOGIAS BÍBLICAS


A pré-história do Gênesis narra pouquíssimos episódios anteriores a Abraão; destes, o dilúvio constitui o ponto central. Para preencher as duas lacunas existentes entre os primeiros homens e o dilúvio, e depois entre este evento e Abraão, o autor sagrado cita duas genealogias. A primeira, desde o primeiro homem (Adão) até o símbolo da humanidade renovada (Noé), conta dez nomes. A segunda, desde Sem, filho de Noé, até Abraão, tronco principal da comunidade hebraica, conta outros dez nomes (Gn 5,1-32; 11,10-32). Tudo isto tem, certamente algo de convencional e lançou os estudiosos à pesquisa de qual fosse o critério dos antigos ao tecer tais genealogias. Tais pesquisas permitem-nos chegar às seguintes conclusões:

1. A genealogia é um gênero literário que tem a finalidade de documentar a pertinência de um indivíduo a um determinado grupo familiar. Sua importância é máxima nas sociedades de estrutura patriarcal, porque é pela genealogia que o indivíduo recebe os seus direitos. Enquanto, nas sociedades mais complexas, como as atuais, o indivíduo tem determinados direitos por ser cidadão de um determinado estado, na patriarcal - como aquela dos pastores nômades — o indivíduo tem, pelo contrário, seus direitos certos enquanto filho ou descendente de um determinado trono. Daí a necessidade de um documento, oral ou escrito, que faça conhecer-lhe a genealogia.

2. Em tal documento genealógico podiam faltar elos intermediários para fins de brevidade e praticidade. Este fato é muito bem caracterizado. São Mateus (Mt 1,8), na genealogia de Jesus escreve: 'Jorão gerou Ozias'; ora, entre Jorão e Ozias acham-se omitidos os reis Ocozias, Joás e Amasias (cf Reis 9, 16; 11, 2-21; 14, 1). O tempo que os hebreus permaneceram no Egito, segundo o Êxodo (Ex 12, 40) foi de 430 anos; pois bem, na genealogia de Moisés, dada pelo mesmo livro (Ex 6,14-), entre Levi, entrado no Egito com seu pai Jacó, e Moisés, o condutor dos israelitas que saíam do Egito, há apenas dois elos intermediários: Levi, Cahat, Amram, Moisés. E assim poderiam ser citados muitos outros exemplos semelhantes a este.

3. A omissão de nomes podia provir do propósito de se obter números simbólicos - como as três séries de 14 nomes na genealogia de Jesus em Mateus (Mt 1,17) - ou números, de outro modo, capazes de se fixar de memória.

4. A palavra gerar, em genealogia, é de significado quase tão amplo quanto a palavra filho, que indica uma pertinência genealógica ainda que muito remota (como o Messias filho de Davi) e, algumas vezes, apenas de direito. Há realmente eqüivalência entre geração e transmissão de direitos. Assim, na genealogia de Jesus, São Mateus escreve: 'Salatiel gerou Zorobabel', concordando com o fato de ser Zorobabel chamado, em outro lugar da Bíblia (Ag 1,1), filho de Salatiel. Mas, na realidade, sabemos de 1 Crônicas (1 Cr 3,19) que Zorobabel é filho de Fadaías, irmão de Salatiel.

5. A genealogia pode ter sido usada para resumir um período histórico, como por exemplo, as genealogias apresentadas no início das 1 Crônicas e no Evangelho de São Mateus; mas não pode absolutamente servir para criar uma cronologia.

Considerando esclarecidos estes pontos, ao examinar as duas genealogias dos patriarcas, anterior e posterior ao dilúvio, devemos concluir que:

1. O autor evidentemente pretende demonstrar, pelas duas genealogias, que Noé é o herdeiro legítimo das promessas feitas a Adão e dos seus ditamess humanos e, pela mesma razão que Abraão, além de ser herdeiro das promessas precedentes, é herdeiro das bênçãos dadas a Sem.

Para este fim, segundo alguns intérpretes, não teria sido necessário nem conhecer as duas séries de nomes pela Revelação, nem entrar a fundo no valor objetivo de tais documentos, mas teria bastado ao autor sagrado introduzir, imutadas, as sequências genealógicas transmitidas pela tradição e, provavelmente já escritas (cf Gn 5,1: 'este é o livro das gerações de Adão...'). Isto é, tratar-se-ia de uma citação , não implícita mas, certamente, explicita, que citaria documentos então conhecidos de todos.

Que o autor não tenha pretendido assumir a responsabilidade dos números indicadores das idades dos Patriarcas ante e pós-diluvianos concluir-se-ia do fato que, enquanto nestas duas listas genealógicas considera comum o gerar em idade pluricentenária, logo depois, na história de Abraão, sublinha insistentemente (Gn 17,17; 18,1) o caráter milagroso do nascimento de Isaac de um pai centenário e de uma mãe nonagenária.

2. O número das gerações - 10 antes do dilúvio e 10 depois do dilúvio - faz pensar numa simplificação sistemática: 10 são os dedos da mão, e 10 é a base do sistema decimal: é muito conveniente pois para fixação da memória. Além disto, desde o inicio do segundo milênio, mesmo os súmeros registraram, pelo menos segundo alguns recenseamentos, os nomes de dez soberanos que precederam o dilúvio.

3. A introdução de números simbólicos em algumas genealogias faz-nos supor que mesmo os outros dados que indicam as idades dos Patriarcas das duas séries, correspondem a um cálculo não objetivo, porém artificioso ou simbólico. A idade de Enoque (365 anos como os dias de um ano solar) e de Lameque (777 anos) dão algum indicio a respeito. Assim, a soma dos anos de vida dos Patriarcas desde Sem a Lameque (Abraão está fora da série) dá 2996, o que, com a única diferença de uma unidade, é igual a (300 x 9) + (30 x 9) + (3 x 9) e que resulta 333 anos em média para cada um. Um processo como este para atingir a um total intencional encontra-se nas várias sequências babilônicas dos dez reis antidiluvianos que reinam cada um dez milhares de anos. 

Note-se, além disso, que entre os samaritanos, os números destas genealogias são diferentes dos retirados do texto hebraico comum e da versão latina de São Jerônimo e exibem sinais evidentes de uma adaptação artificiosa. Esta constatação confirma a hipótese de que, entre os hebreus, aqueles números não tivessem um valor exato mas, por outro lado, demonstra também que eles não foram fielmente transmitidos de maneira que, certamente, é impossível basear-nos sobre eles para descobrir o principio artístico ou simbólico que presidia a sua escolha Com isto não se pretende negar que aqueles antigos, em circunstâncias particularmente favoráveis, pudessem ter vida longa, porém apenas realçar que os números do texto bíblico satisfazem provavelmente a critérios que nos escapam e que, portanto, não nos é possível tirar conclusões exatas concernentes à longevidade dos Patriarcas. Pode além disso acontecer, como se disse acima, que o autor sagrado tenha incluído em seu relato as duas genealogias apenas como citações, sem se comprometer em um juízo sobre as minúcias, apenas com a intenção de preencher 1acunas no fio histórico de sua narrativa.

4. O fato de Set ter a uma determinada idade gerado Enos (Gn 5,6) pode significar simplesmente que Set, numa determinada idade, gerou um filho de quem, depois de uma linha genealógica mais ou menos longa, nasceu Enos. O mesmo se pode dizer dos outros nomes. Nesta hipótese, os 10 nomes seriam tão somente os 10 nomes mais relevantes de uam série muito longa e não necessàriamente linear.

5. Em conclusão, as duas sequências genealógicas resumem dois períodos pré-históricos, mas não nos podem servir para fixar a duração de tais períodos e tampouco, consequentemente, a antiguidade do gênero humano. Sobre a antiguidade do homem, a Bíblia não nos favorece nenhuma conclusão.

(Excertos adaptados da obra 'Páginas Difíceis da Bíblia - Antigo Testamento', de E. Galbiati e A. Piazza)

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'Verdadeiramente, há grande recompensa em guardar os teus mandamentos. E não apenas o primeiro e máximo mandamento é de proveito para quem obedece, e não para Deus que ordena; mas também todos os outros aperfeiçoam, ornam, instruem, ilustram aquele que obedece e, por fim, o tornam bom e feliz. Se és sensato entende que foste criado para a glória de Deus e tua salvação eterna. É este o teu fim, este o centro da tua alma, este o tesouro do teu coração. Se chegares a este fim, serás feliz; se nele falhares, serás infeliz. Por conseguinte, tem por verdadeiro bem aquilo que te leva ao teu fim; e por mal, o que te separa deste fim. Prosperidade e adversidade, riqueza e indigência, saúde e doença, honras e vexames, vida e morte, nem uma delas o sábio procura por si mesmo e nem delas foge. Mas se concorrem para a glória de Deus e tua eterna felicidade, são boas e desejáveis; se as impedem, são más; e deve-se fugir delas'.

(São Roberto Belarmino)

terça-feira, 17 de setembro de 2024

POEMAS PARA REZAR (LVI)

 

NO MEIO DE MUITOS CAMINHOS

No meio de um caminho / havia um homem caído / Muitos passaram ao largo / sem socorrer o ferido / mas o bom samaritano / cuidou do desconhecido / curou-o, pagou seu repouso/ resgatou quem estava perdido...

No meio de nossos caminhos / há tantas pessoas perdidas / tantos homens que precisam/ de curar suas feridas / e tantas pessoas que passam / fingindo-se desapercebidas/ passam também pelo mundo/ deixando para trás suas vidas...

Que eu não seja águas passadas / que não mais movem moinhos / e possa levar minha presença / a tantos que andam sozinhos / e semear ainda a caridade / por entre tantos espinhos / que eu possa ser samaritano / no meio de muitos caminhos...

(Arcos de Pilares)

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

PROFECIAS CATÓLICAS (III)

👉 São Pio X (século XX): 'Vi um dos meus sucessores fugindo por cima dos corpos de muitos dos seus irmãos. Encontrará refúgio disfarçado em algum lugar e, depois de um curto período, terá uma morte cruel. A atual maldade do mundo é apenas o começo das iniquidades que devem ocorrer antes do fim do mundo'.

👉 Pio XII (século XX): 'Acreditamos que a hora atual é uma fase terrível dos acontecimentos preditos por Jesus Cristo. Parece que as trevas estão prestes a dominar o mundo e a humanidade será refém de uma crise suprema'.

Comentários: Depois de citar explicitamente São Pio X e Pio XII, o papa João XXIII apresentou palavras francamente contrastantes na abertura do Concílio Vaticano II: 'Sentimo-nos obrigados a discordar dos profetas da escuridão, que estão sempre a prever desastres, como se o fim do mundo estivesse próximo. Na ordem atual das coisas, a Divina Providência conduz a humanidade a uma nova ordem das relações humanas que, por esforço próprio dos homens e mesmo para além das suas próprias expectativas, se orientam para a realização dos superiores e inescrutáveis desígnios de Deus. E tudo, mesmo as diferenças humanas, conduz ao bem maior da Igreja'.

Com base nesta declaração, não podemos deixar de observar que João XXIII discordou de São Pio X e Pio XII, bem como de todas as almas santas que receberam revelações privadas anteriores. Além disso, deveríamos acreditar então que os esforços dos homens levarão, automaticamente, por assim dizer, ao cumprimento dos desígnios de Deus, mesmo que os esforços dos homens atuais não sejam visivelmente dirigidos para a maior glória de Deus. Não posso deixar de recordar uma das teses mais queridas de Teilhard de Chardin (cujos livros foram condenados pelo Santo Ofício), que equiparava o progresso humano (tecnológico ou outro) ao desenvolvimento espiritual. A última frase da passagem acima agrava ainda mais este pedaço de humanismo teilhardiano ao afirmar que mesmo as diferenças conduzem ao bem maior da Igreja. Permita-me sugerir que, desde 1962, quando este discurso foi proferido, as crescentes diferenças no seio da Igreja Católica não parecem ter feito muito bem! Karl Marx ensinou que os conflitos e as divergências funcionam sempre para o bem da causa em causa, mas não estávamos preparados para ouvir isto da boca de um papa. No entanto, para fazer justiça ao bom Papa João XXIII, devo acrescentar que este discurso de abertura foi escrito para ele pelo então Cardeal Montini.

👉 Bispo Christianos Ageda (século XII): 'No século XX, haverá guerras e conflitos que durarão muito tempo; províncias inteiras serão esvaziadas dos seus habitantes, e reinos inteiros serão lançados no caos. Em muitos lugares a terra ficará sem cultivo e haverá grandes massacres dos membros das classes mais altas. A mão direita do mundo temerá a esquerda, e o norte prevalecerá sobre o sul'.

👉 Abade Joaquim Merlin (século XIII): 'Depois de muitos e longos sofrimentos suportados pelos cristãos, e depois de uma grande efusão de sangue inocente, o Senhor dará paz e felicidade às nações desoladas. Um papa notável estará sentado no trono pontifício sob a proteção especial dos anjos. Santo e cheio de doçura, ele há de desfazer todos os erros; recuperará o Estado da Igreja e reunirá os poderes temporais exilados. Será venerado por todos e recuperará o Reino de Jerusalém. Reunirá as Igrejas do Oriente e do Ocidente. A santidade deste Pontífice benéfico será tão grande que os mais altos potentados se curvarão na sua presença. Todos os homens voltarão à Igreja primitiva, e haverá um só Pastor, uma só Lei, um só Mestre - humilde, modesto e temente a Deus. Antes de se estabelecer firme e solidamente na Santa Sé, porém, haverá inúmeras guerras e conflitos violentos durante os quais o Trono sagrado será abalado. Mas, pelo favor da misericórdia divina, movida pelas orações dos fiéis, tudo correrá tão bem que eles poderão cantar hinos de ação de graças à glória do Senhor. Para obter estes felizes resultados, tendo necessidade de um poderoso auxílio temporal, o Santo Pontífice pedirá a colaboração do generoso Rei da França'.

Comentários: Todas estas referências a reis, tronos e reinos pode parecer tão irremediavelmente desatualizada que o leitor pode sentir-se tentado a rejeitar todas estas profecias como fantasias. Eu o sei bem; todos nós fomos educados na convicção de que as formas populares de governo são sinônimo de progresso, e que a democracia e o progresso são inseparáveis. Por conseguinte, com base nestas premissas, pensa-se que um regresso a formas de governo não populares significa necessariamente um regresso à Idade das Trevas. Mas não devemos ser demasiado otimistas na nossa avaliação do mundo moderno. A história das civilizações passadas mostra que os governos têm sido, na sua maioria, não-populares, e ninguém negará que algumas das civilizações extintas atingiram, de fato, padrões muito elevados...  Ao rever as civilizações passadas num livro anterior que publiquei em língua francesa, dei provas de que esses períodos gozavam de uma estabilidade comparativa. Houve guerras, é certo, mas essas guerras não envolviam toda a nação e todo o povo, como acontece atualmente, mas apenas os exércitos regulares de soldados profissionais. De fato, foi Napoleão I quem primeiro introduziu o recrutamento obrigatório em grande escala, obrigando assim as outras nações europeias a seguirem o exemplo. Assim, o mito da 'soberania popular' deu rapidamente lugar à verdadeira maldição do envolvimento popular na guerra. A história mostra ainda que os períodos de governos populares foram também períodos de decadência e degenerescência e que acabaram, no caos e na anarquia, como as brilhantes civilizações que acabei de referir. Estas são lições que não devemos esquecer; e, se não as esquecermos, talvez nos ajudem a reavaliar o valor dos ensinamentos que nos foram transmitidos nos nossos tempos de escola sobre o 'progresso' moderno - ensinamentos que seguem fielmente a cartilha de uma certa filosofia judaico-maçônica.

Agora, o ponto que eu gostaria de salientar é o seguinte: a catástrofe que se aproxima será de tal magnitude que toda a nossa civilização seria destruída se não fosse a presença da Igreja. É a Igreja que salvará a civilização. E a totalidade dos erros da nossa era moderna será exposta e rejeitada por aqueles que sobreviverem, o que explica o súbito retorno a formas não-populares de governo.

👉 João de Vatiguerro (século XIII): 'Os saques, a pilhagem e a devastação dessa cidade famosíssima que é a capital e o fascínio da França terão lugar quando a Igreja e o mundo estiverem gravemente perturbados. O papa mudará de residência e a Igreja não será defendida durante vinte e cinco meses ou mais, porque, durante todo esse tempo, não haverá papa em Roma, nem imperador e nem governante na França. Mas, depois disso, um jovem príncipe cativo recuperará a Coroa dos Lírios e estenderá os seus domínios por todo o mundo. Depois de muitas tribulações, será eleito um papa entre os que sobreviveram às perseguições. Com a sua santidade, ele reformará o clero e o mundo inteiro venerará a Igreja pela sua santidade, virtude e perfeição'

Comentários: Esta é a primeira de muitas referências à destruição de Paris, que terá lugar num período em que a Igreja e o mundo estarão em caos profundo. Esta é também a primeira de muitas referências ao exílio do papa e à desocupação da Santa Sé. A França estará envolvida com uma guerra civil assassina, mas será salva pelo Príncipe - o futuro Grande Rei.

Aqui uma palavra de cautela: embora o Príncipe seja coroado Rei de França, e embora se diga 'que estenderá os seus domínios por todo o mundo', isto não deve ser entendido como significando que a França conquistará o mundo inteiro - e isso por duas razões diferentes: primeiro, porque este Rei será também coroado Rei de outros países europeus (e pode inclusive não ser francês). Será, de fato, Imperador da Europa, e é como tal que estenderá os seus domínios por todo o mundo. Segundo, porque 'por todo o mundo' não significa 'pelo mundo inteiro'. Seria estranho supor que um imperador europeu quisesse dominar todos os povos da Europa, África, América e Austrália. Significa, na verdade, que ele dominará e guiará várias nações em certas partes do mundo e que exercerá forte influência sobre as outras.

(Excertos da obra 'Catholic Prophecy: The Coming Chastisement', de Yves Durant)

domingo, 15 de setembro de 2024

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Andarei na presença de Deus, junto a Ele, na terra dos vivos' (Sl 114)

Primeira Leitura (Is 50,5-9a) - Segunda Leitura (Tg 2,14-18) -  Evangelho (Mc 8,27-35)

  15/09/2024 - VIGÉSIMO QUARTO DOMINGO DO TEMPO COMUM

42. 'E VÓS, QUEM DIZEIS QUE EU SOU?'


Num dado dia, na 'região da Cesareia de Felipe' (Mc 8, 27), Jesus revelou a seus discípulos a sua própria identidade divina e o legado da Cruz. Neste tesouro das grandes revelações divinas, o apóstolo Pedro será exposto a duas manifestações bastante distintas, fruto das próprias contradições humanas: num primeiro momento, dá um testemunho extraordinário de fé; num segundo momento, entretanto, é incapaz de entender a dimensão salvífica dAquele que acabara de saudar como o Messias Prometido.

Nesta ocasião, as mensagens e as pregações públicas de Jesus estavam consolidadas; os milagres e os poderes sobrenaturais do Senhor eram de conhecimento generalizado no mundo hebraico; multidões acorriam para ver e ouvir o Mestre, dominados pela falsa expectativa de encontrar um personagem mítico e um Messias dominador do mundo. Então, Jesus indaga aos seus discípulos: 'Quem dizem os homens que eu sou?' (Mc 8, 28) e, logo em seguida, 'E vós, quem dizeis que eu sou?' (Mc 8, 29). Se os homens do mundo o tomam por João Batista, por Elias ou por um dos antigos profetas, a resposta de Pedro é um primado de confissão de fé, transcrita pelo mais sintético dos evangelistas: 'Tu és o Messias' (Mc 7, 32).

Jesus é o Cristo de Deus e o seu reino não é deste mundo. Ante a confissão de Pedro, Jesus revela a sua origem e a sua missão e faz o primeiro anúncio de sua Paixão, Morte e Ressurreição: 'o Filho do Homem devia sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei; devia ser morto, e ressuscitar depois de três dias' (Mc 8, 31). E, diante da incompreensão dos apóstolos expressa na repreensão pública de Pedro, dá o testemunho da cruz pela privação do mundo: 'Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois, quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, vai salvá-la' (Mc 8, 34 - 35).

Sim, Jesus Cristo é o Messias, o Filho de Deus Vivo: Deus feito homem na eternidade de Deus. Mas a missão salvífica de Jesus há de passar não por um triunfo de epopeias mundanas, mas por um tributo de Paixão, Morte e Ressurreição; não pelo manejo da espada ou por eventos feitos de glórias humanas, mas pela humildade, perseverança e um legado de Cruz. Eis aí o legado definitivo de Jesus aos homens de sempre: a Cruz de Cristo é o caminho da salvação e da vida eterna. Tomar esta cruz, não apenas hoje ou em momentos específicos de grandes sofrimentos em nossas vidas, mas sim, todos os dias, a cada passo, em cada caminho, é a certeza de encontrá-lo na glória e da plenitude das bem-aventuranças. A Cruz de Cristo é a Porta do Céu.