domingo, 27 de novembro de 2016

'FICAI ATENTOS AO SENHOR QUE VEM!'

Páginas do Evangelho - Primeiro Domingo do Advento 


Hoje começa um novo ano litúrgico da Santa Igreja com o Tempo do Advento, período em que os cristãos são conclamados a viver em plenitude as graças da expectativa, da conversão e da esperança, à espera do Senhor Que Vem. O Ano Litúrgico 2016-2017 é o Ano A, no qual os exemplos e ensinamentos de Jesus Cristo são proclamados a cada domingo pelas leituras do Evangelho de São Mateus.

E o novo ano litúrgico começa com Jesus exortando a vigilância aos filhos de Deus: 'Ficai atentos, porque não sabeis em que dia virá o Senhor' (Mt 24, 42). Do alto do Monte das Oliveiras e à vista de Jerusalém, Jesus vai alertar os seus discípulos sobre a necessidade de se permanecer vigilantes, na oração e na confiança de uma vida de plenitude cristã, diante das coisas do mundo, que passam e repassam no cotidiano de nossas vidas. Vigilância que se impõe naqueles tempos, na vida futura da Igreja, nos remotos tempos da história: 'Pois nos dias, antes do dilúvio, todos comiam e bebiam, casavam-se e davam-se em casamento, até o dia em que Noé entrou na arca. E eles nada perceberam, até que veio o dilúvio e arrastou a todos. Assim acontecerá também na vinda do Filho do Homem' (Mt 24, 38-39).

São palavras de salvação, porque a única coisa realmente importante para o homem é a salvação eterna de sua alma. Tudo o mais é efêmero e sem sentido. No fim dos tempos ou no fim de nossa vida, o Juízo Final ou o Juízo Particular vai nos pedir contas essencialmente da nossa vigilância filial à Santa Vontade de Deus, no cumprimento de nossas ações cristãs, no acervo das graças recebidas, na inquietude do coração humano ao encontro do Pai.

Vigiar significa essencialmente não pecar, não ofender a Santidade de Deus com as misérias e as fragilidades humanas, não conspurcar a Infinita Pureza da alma que nos foi legada um dia com a lama dos prazeres, frivolidades e maldades de uma vida profanada pelos valores do mundo. Porque haverá o dia do juízo, no qual os homens serão levados ou deixados para trás: ''Por isso, também vós ficai preparados! Porque, na hora em que menos pensais, o Filho do Homem virá' (Mt 24, 44). Vigiar é estar preparado para que sejam santos todos os dias de nossa vida para que Deus escolha, dentre eles, o mais belo, para receber de volta as almas vigilantes que Ele próprio desenhou para a eternidade. 

sábado, 26 de novembro de 2016

26 DE NOVEMBRO - SÃO LEONARDO DE PORTO MAURÍCIO

(São Leonardo de Porto Maurício: 1676 - 1751)

São Leonardo, o grande missionário do século XVIII proclamado pelo Papa Pio XI patrono dos sacerdotes consagrados às missões católicas, nasceu em Porto Maurício, perto de Gênova na Itália, a 20 de dezembro de 1676. Entrou para a Ordem Franciscana, no Convento de São Boaventura, ordenando-se padre aos 26 anos, dedicando, então, toda a sua vida, à salvação das almas por meio de pureza singular, penitências, orações e extremada caridade. Foi um grande apóstolo da ação missionária e do santo exercício da Via-Sacra, destacando-se ainda por ser um exímio pregador e autor de uma grande coleção de escritos católicos. São Leonardo de Porto Maurício faleceu no mesmo Convento de São Boaventura, em Roma, em 26 de novembro de 1751. Foi canonizado pelo Papa Pio IX em 29 de junho de 1867.



EXCERTO DA OBRA 'AS EXCELÊNCIAS DA SANTA MISSA' DE SÃO LEONARDO DE PORTO MAURÍCIO
                                          (conforme a edição romana de 1737, dedicada ao Papa Clemente XII)

Sabeis o que é, na realidade, a Santa Missa? É o sol da cristandade, a alma da Fé, o centro da religião Católica apostólica com a sede em Roma, a que tendem todos os seus ritos, todas as suas cerimônias, todos os seus sacramentos. É, em uma palavra, a essência de tudo o que há de bom e de belo na Igreja de Deus. 

Só o Sacrifício que temos em nossa santa religião, que é a Santa Missa, é um sacrifício santo, perfeito, e, em todo sentido, completo: por ele, cada fiel honra dignamente a Deus, reconhecendo, ao mesmo tempo, o próprio nada e o supremo domínio de Deus. Davi o chama: Sacrifício de Justiça ('sacrificium justitiae'); tanto porque contém o Justo dos justos e o Santo dos santos, ou, melhor a própria Justiça e Santidade, como porque santifica as almas pela infusão das graças e abundância dos dons que lhes confere. 

A principal excelência do santo Sacrifício da Missa consiste em que se deve considerá-lo como essencialmente o mesmo oferecido no Calvário sobre a Cruz, com esta única diferença: que o sacrifício da Cruz foi sangrento e só se realizou uma vez e que, nessa única oblação, Jesus Cristo satisfez plenamente por todos os pecados do Mundo; enquanto que o sacrifício do altar é um sacrifício incruento, que se pode renovar uma infinidade de vezes, e que foi instituído para nos aplicar especialmente esta expiação universal que Jesus por nós cumpriu no Calvário. 

Assim o sacrifício cruento foi o meio de nossa redenção e o sacrifício incruento nos proporciona as graças da nossa redenção. Um abre-nos os tesouros dos méritos de Cristo Nosso Senhor, o outro no-los dá para os utilizarmos. Notai, portanto, que na Missa não se faz apenas uma representação, uma simples memória da Paixão e Morte do nosso Salvador; mas, num sentido realíssimo, o mesmo que se realizou outrora no Calvário aqui se realiza novamente: tanto que se pode dizer, a rigor, que em cada Santa Missa nosso Redentor morre por nós misticamente, sem morrer na realidade, estando ao mesmo tempo vivo e como imolado.

No santo dia de Natal, a Igreja nos lembra o nascimento do Salvador, mas não é verdade que Ele nasça, ainda, nesse dia. Nos dias da Ascensão e Pentecostes, comemoramos a subida do Senhor Jesus ao Céu e a vinda do Espírito Santo, sem que, de modo algum, nesses dias, o Senhor suba ainda ao Céu ou o Espírito Santo desça visivelmente à Terra. A mesma coisa, porém, não se pode dizer do mistério da Santa Missa, pois aí não é uma simples representação que se faz, mas, sim, o mesmo sacrifício oferecido sobre a Cruz, com efusão de sangue, e que se renova de modo incruento: é o mesmo corpo, o mesmo sangue, o mesmo Jesus, que se imola hoje na Santa Missa. 

Ora, dizei-me sinceramente se, quando ides à Igreja para assistir a Santa Missa, pensásseis bem que ides ao Calvário assistir à morte do Redentor, que diria alguém que vos visse ai chegar numa atitude tão pouco modesta? Se Maria Madalena fosse ao Calvário e se prostrasse aos pés da Cruz vestida, perfumada e ataviada como em seus tempos de desordem, quanto não seria censurada! E que se dirá de vós que ides à Santa Missa como se fôsseis a uma festa mundana? Que aconteceria, sobretudo se profanásseis este ato tão santo, com gestos, risadas, cochichos, encontros sacrílegos? Digo que, em qualquer tempo e lugar, a iniquidade não tem cabimento; mas os pecados que se cometem na hora da Santa Missa e na proximidade do altar, são pecados que atraem a maldição de Deus

Se não houvesse o Sol, que seria da Terra? Oh! Tudo seria trevas, horror, esterilidade e desolação. E se o Mundo não tivesse a Santa Missa, que seria de nós? Infelizes! Ficaríamos privados de todos os bens sobrecarregados de todos os males. Estaríamos expostos a todos os raios da cólera de Deus. Alguns há que se admiram, e acham que, de certo modo Deus mudou a sua maneira de governar. Antigamente Ele se nomeava de Deus dos exércitos, e falava ao povo do meio das nuvens, manejando o trovão; e de fato, era com todo o rigor da justiça que castigava os pecados. Por um único adultério, mandou passar a fio de espada vinte e cinco mil homens da tribo de Benjamim (Juiz 20,46). Por um leve pecado de orgulho de Davi em computar o povo, enviou Ele uma peste tão terrível que, em poucas horas pereceram setenta mil pessoas (II Sam. 24,15). Por um só olhar curioso e desrespeitoso dos betsamitas, fez com que cinqüenta mil deles perecessem (I Sam. 6, 19). 

E agora suporta, com paciência, não só vaidades e irreverências, mas adultérios, os mais vergonhosos, escândalos gravíssimos, e tantas blasfêmias horríveis que muitos cristãos vomitam contra Seu Nome Santíssimo. Por que assim acontece? Por que tão grande mudança de conduta? Serão as ingratidões dos homens mais escusáveis hoje do que outrora? Bem ao contrário, são muito mais culpáveis, já que os imensos benefícios de Deus se multiplicam a cada dia. 

A verdadeira razão desta clemência espantosa é a Santa Missa, pela qual esta grande Vítima, que se chama Jesus, se oferece ao Eterno Pai. Eis aí o sol da Santa Igreja que dissipa as nuvens e torna sereno o céu. Eis aí o arco-íris que detém os raios da Divina Justiça. Creio para mim que, não fosse a Santa Missa, o Mundo estaria já no abismo, incapaz de suportar o imenso fardo de suas iniquidades. A Santa Missa é o poderoso sustentáculo que lhe permite subsistir. Conclui-se, de tudo isto, quanto este divino Sacrifício é necessário; assim então, sabei aproveitá-lo o máximo que for possível. Para isto, quando participamos da Santa Missa, devemos imitar Afonso de Albuquerque. Achando-se, com sua frota, em perigo de naufragar numa horrível tempestade, teve uma inspiração: tomou nos braços uma criança que viajava em sua nau, e, elevando-a ao alto, exclamou: “Se todos somos pecadores, esta criaturinha é certamente sem mácula, Ah! Senhor por amor deste inocente compadecei-vos dos culpados!” Acreditareis? A vista dessa criança inocente agradou tanto a Deus, que Ele acalmou o mar e devolveu a alegria àqueles infelizes, gelados já pelo terror da morte certa. 

Ainda que a excelência e a necessidade da Santa Missa não fossem para vós bastante ponderáveis, como poderíeis deixar de apreciar a magna utilidade que ela proporciona aos vivos e falecidos, aos justos e aos pecadores, para a vida e para a morte, e mesmo para depois da morte? Imaginai que sois aquele devedor do Evangelho, cuja dívida se elevara à enorme quantia de dez mil talentos. Chamado a prestar contas humilha-se, implora e pede adiamento para satisfazer completamente o débito: 'Tem paciência comigo, que tudo de pagarei' (Mt 18, 26).  Aí está o que deveis fazer, vós que tendes com a Justiça divina não uma, mas mil dívidas. Deveis humilhar-vos e suplicar tempo bastante para assistir à Santa Missa; e ficai certos de que estas Santas Missas saldarão completamente todas as vossas obrigações. 

São Tomás de Aquino, o Doutor angélico, nos ensina quais são as dívidas que temos com Deus. Ele diz que há especialmente quatro. Todas as quatro ilimitadas. A primeira é de adorar, louvar e honrar este Deus de majestade infinita e digno de infinitos louvores e homenagens. A segunda é dar-Lhe satisfação pelos pecados que cometemos. A terceira, render-Lhe graças pelos benefícios recebidos. A quarta, implorar-Lhe, como fonte de todas as graças. Ora, como é possível que pobres criaturas como nós, que nada possuímos, nem mesmo o ar que respiramos, possam jamais satisfazer obrigações tão grandes? Consolemo-nos, pois aqui está um meio facílimo. Façamos o possível para participar de muitas Missas e com a máxima devoção; mandemos celebrá-la também o mais que pudermos: e, se bem que nossas dívidas sejam enormes e inumeráveis, não há dúvida de que, com o tesouro contido na Santa Missa, poderemos solvê-las inteiramente. 

São Leonardo de Porto Maurício, rogai por nós!

QUESTÕES SOBRE AS TENTAÇÕES E O PECADO (III)


Questão 25: Pode Deus nos tentar?

'Que ninguém, ao ser tentado, diga: ‘É Deus quem me tenta’, porque Deus não pode ser tentado para o mal, nem tentar ninguém' (Tg 1, 13).  Este versículo nos ensina duas coisas: a primeira é que Deus não pode ser tentado. Por que o que pode oferecer a tentação a Deus que Ele já não tenha? Que benefício, que prazer ou satisfação que se pode oferecer que Ele já não possua? Em Deus, a tentação é metafisicamente impossível, pois esta não tem nada a oferecer. A segunda coisa que o versículo nos ensina é que Deus não tenta a ninguém. Deus é bom e, por isso, não pode nunca tentar para o mal. Deus só pode conduzir ao bem, nunca nos apresentando o mal como bem ou nos induzindo ao erro. Se Deus não pode ser tentado, por que o diabo tentou Jesus? Porque foi Deus feito homem que podia ser tentado. Assim como também é impossível para Deus sofrer, ainda que Deus encarnado pudesse sofrer.

Questão 26: Por que Deus permite a tentação?

Se Deus não nos tenta, por que permite a tentação? Encontramos a resposta no seguinte versículo: 'Considerai que é suma alegria, meus irmãos, quando passais por diversas provações, sabendo que a prova da vossa fé produz a paciência' (Tg 1, 2-3) Sem a tentação, não existiria essa constância na virtude que resiste uma e outra vez contra toda a tentação sedutora. Em outras palavras, há determinados tipos de virtudes que jamais poderiam existir sem uma resistência às tentações. E mais, quanto mais dura for a prova, maior a luz da virtude ao superar a tentação.

Isto nos leva a pensar no seguinte: Deus poderia ter confrontado os demônios de modo que eles nunca pudessem interferir na história humana. Porém, Deus sabia que os demônios, se de um lado seriam causas de males, por outro lado ofereceriam ocasiões de bens muito maiores e da manifestação de virtudes muito mais valiosas. De certo modo, poderíamos dizer que Deus aceitou a possibilidade da escuridão no mundo pois isso permitia a manifestação de uma luz muito mais pura e brilhante. Do contrário, bastaria uma simples ordem de Deus para que nem sequer um demônio pudesse ter entrado em contato com um ser humano. Assim, se Deus permitiu tal contato, é porque sabia que disso resultaria bens muito maiores.

Questão 27: O que é a morte eterna? 

Um espírito (assim como uma alma) é indestrutível, não se deteriora, não se desgasta, não se subdivide. O espírito não pode morrer. Cometa os pecados que cometer, seguirá existindo e, por mais que queira morrer, a vida não o abandonará. O que se quer dizer com as expressões 'pecado mortal', 'morte eterna' e similares, é que a vida sobrenatural de um espírito ou de uma alma não pode morrer. O pecado mortal acaba com a vida sobrenatural. O espírito continua existindo, porém com uma vida meramente natural. A vontade e a inteligência, com todas as suas potências, continuam operando, mas sem a vida da graça.

O espírito desprovido da graça é como um cadáver. Esta expressão pode parecer algo exagerada, mas é precisa. O espírito que peca mortalmente é como um cadáver inanimado, sem a graça santificante. Passa a viver então apenas para a natureza e por sua natureza, uma vez privado da graça sobrenatural. E desde o momento em que a graça tenha deixado de vivificar um espírito, ocorre com ele o mesmo que com um corpo que não está mais animado por uma alma, ou seja, começa a sua deterioração.

Assim como um corpo começa a se decompor, assim um espírito começa a se corromper à medida que sua vontade vai cedendo. São muitos os homens que vivem apenas para a natureza do seu ser, esquecendo completamente a vida sobrenatural que Deus lhes concederia com prazer. O nível de deterioração varia muito conforme a pessoa. Mas, se pudéssemos acessar a alguns destes espíritos, veríamos que se tratam de verdadeiros cadáveres que exalam um mau odor exatamente como o de um cadáver em decomposição há muito tempo.

Questão 28: Como é o processo que leva à morte eterna? 

'Cada um é tentado pela sua própria paixão, pela qual é atraído e seduzido. A paixão, depois de conceber, dá à luz ao pecado e o pecado, quando consumado, gera a morte' (Tg 1, 14 -15).  O apóstolo São Tiago, em dois versículos descreve, com uma incrível profundidade, do princípio ao fim o processo que leva à morte da alma. O pecado não se produz por si mesmo e nem por um golpe repentino que se abate subitamente diante de nós sem que tenhamos culpa; há todo um processo, tal como descrito pelo apóstolo. A tradução do grego desses dois versículos deve ser muito cuidadosa para não se perder as nuances presentes nos verbos. O processo descrito é o seguinte:


A imagem de uma mulher gestando uma criança em seu ventre durante meses é a imagem da pessoa que gesta a iniquidade em seu interior. Certamente o pecado se manifesta em um determinado momento; um segundo antes não havia pecado e, um segundo depois, sim. Uma vez ocorrido o pecado, dá-se à luz ao pecado, porque antes terá havido uma gestação dele. E tal como no mundo animal, quanto maior for a gestação, maior será o rebento que se dá à luz. Assim também no mundo espiritual, quanto maior o pecado, maior o período necessário de sua gestação para que se manifeste. Aqui está a resposta à pergunta que tantos se fazem de como é possível que tal pessoa possa ter sido capaz de cometer tal ou qual barbaridade. Nenhuma barbárie moral aparece sem um processo prévio, que ocorre oculto aos olhos dos demais, mas que vai se desenvolvendo livremente no interior de tal pessoa. 

O apóstolo usa esta expressão 'dar à luz' porque verdadeiramente o pecado experimentara antes da 'gestação' uma 'concepção'. A sedução e a vontade atuam como  o espermatozoide e o óvulo. A paixão trata de abrir caminho e penetrar na vontade. Se esta se contrapõe, a sedução prostra-se estéril sem produzir nada. Uma vez cerrada a vontade, nem milhares ou milhões de espermatozoides lograrão penetrar no íntimo da vontade. Mas, se a vontade acolher a sedução, ocorre a concepção do pecado. Ainda assim, o pecado pode ser ainda eliminado. Não sendo eliminado, põe-se a reproduzir.


O pecado dá origem a novos pecados, se reproduz, aumentando em quantidade e transmutando-se qualitativamente em faltas piores. Se o primeiro pecado incorpora um processo prévio, o pecado gestado que permanece inicia também um novo processo, processo que leva à morte: a morte da alma. E a morte da alma resulta na morte eterna. A alma invadida pelo pecado é como uma alma morta, pois não possui nenhuma vida sobrenatural dentro de si. E se a alma morta decide permanecer neste estado de corrupção até o fim, isso implica a morte eterna e a condenação.


Conhecer tudo isso nos leva a dar mais valor à ação sobrenatural da graça divina que, em qualquer momento deste processo (desde que não tenha conduzido à morte eterna), pode vivificar a alma. O perdão de Deus não é somente perdão, mas vivificação. E se isso vale para o pecado e para as paixões, vale também, só que ao contrário, para a graça e para as virtudes. A vida em Cristo é um processo, uma vida que está sempre em gestação.

(Excertos da obra 'Summa Daemoniaca', do Pe. Jose Antonio Fortea, tradução do autor do blog)

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

OS SOFRIMENTOS DO PURGATÓRIO (VI - Final)


6º sofrimento — Incerteza do Tempo a Sofrer no Purgatório

'Um homem', dizia o padre Felix, 'gemia, há tempos, numa prisão célebre. Certo dia, cansado de sofrer, concebeu a ideia de livrar-se. Nessa época existia uma senhora de elevada posses, que tinha poder bastante para quebrar as algemas do preso e pôr termo aos seus sofrimentos. Eis aqui, reza a história, em que termos eloquentes o mísero lhe dirigiu sua sú­plica: 'Senhora, a 25 do corrente de 1760, faz cem mil horas que eu peno, e ainda me restam duzentas mil a sofrer...'. Não sei que despacho teve esta petição. O coração desta mulher teve a dureza de resistir a esta eloquência? Não sei, mas parece-me impossível dizer mais em tão poucas palavras! Há cem mil horas que sofro, tenho ainda que sofrer duzentas mil!

Há cem mil horas... Portanto, ele as tinha contado! Sim, como vós podeis contar, uma a uma, as pancadas de um relógio durante uma noite longa e triste em que o sofrimento vos faz perder o sono. Ora, se é assim com os presos da terra, que dizer desses encarcerados do mundo invisível (o Purgatório)? Quem nos dirá o que é para esses padecentes de além mundo a passagem de seu prazo de tormento? A duração para nós não é o tempo que passa, é o que sentimos passar; e a lentidão dessa passagem cresce para os que sofrem, na proporção de sua an­gústia. É isto o que, em relação às almas do Purgatório, dá a extensão de longos dias aos minutos, a de anos inteiros aos dias, e aos anos a de séculos que parece nunca se acabarem!

Um religioso, aparecendo depois de morto, a um de seus Irmãos, lhe revelou que três dias passados no Purgatório lhe haviam parecido mais longos do que cente­nas de anos. Outro, havendo experimentado numa visão o suplício do Purgatório, desde as matinas somente até a aurora, persuadiu-se de que sofria há mais de um século. Um homem, que fazia desprezo das penas do Purgatório, viu aparecerem-lhe dois moços que rapidamente o transpor­taram a esse triste lugar; depois de um quarto de hora de sofrimento, ele já cla­mava: 'Retirai-me, retirai-me, há tanto tempo que eu sofro'.

Assim os encarce­rados do Purgatório, muito mais do que os presos da terra, contam essas horas intermináveis que tanto custam a passar e que o suplício parece tornar eternas! Se, ao menos, soubessem essas almas a hora do resgate, poderiam dizer: depois de tantos mil e mil minutos, meu suplí­cio terminará e eu subirei ao Céu! Mas não. Sabem perfeitamente — e é tal a es­perança e o amor de Deus, vivo e ar­dente em seus corações, que, dizem os teólogos, distinguem o Purgatório do Inferno — sabem com certeza que há de soar a hora do seu livramento; mas quando soará essa hora suspirada?

Ignoram-no, e até o momento marcado por Deus, parece-lhes ouvir cada vez que perguntam: 'Quando será?' uma voz terrí­vel que lhes respondem: 'Ainda não! Ainda há muito que expiar!' Este pensamento deve atuar em nós para continuarmos sempre em nossas ora­ções pelos mortos. 'Eu temo', diz São Fran­cisco de Sales, 'temo o bom conceito que meus amigos têm feito de mim; enten­dendo que eu já estou no Céu, sem querer me deixarão ficar no Purgatório'.

(Excertos da obra 'Mês das Almas do Purgatório', do Monsenhor José Basílio Pereira, 1943)


Oração pelas Almas do Purgatório

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Senhor, preparai e fortalecei nossos corações com a abundância de vossa graça, a fim de que, penetrando, em espírito de fé, caridade e compaixão, nas tristes prisões do Purgatório, possamos levar aos fieis que nele sofrem os tesouros de su­frágios que dão alívio aos seus padecimentos, glória à vossa divina Majestade, con­solação e paz às nossas almas.

V. Vinde, Senhor, em meu auxílio.
R. Deus, acudi em meu socorro.
V. Dai às almas o repouso, Senhor.
R. E da luz eterna o esplendor.
V. Descansem em paz.
R. Amém.

Ó Jesus, abandonado de todos e até de vossos apóstolos no Jardim de Getsêmani, dignai-vos lançar os olhos de misericórdia sobre as almas do Purgatório, em particular sobre as que não recebem orações nem consolações e que, pelo decurso do tempo ou efeito de irreligiosidade e negligência, estão esquecidas; fazei que participem das orações, santos sacrifícios, boas obras, cujo mérito não pôde ser aplicado àqueles por quem a Igreja os oferta. Ah! Senhor, não terei eu abandonado, em um criminoso esquecimento, almas que tenham jus ao meu reconhecimento, sejam de parentes, de amigos ou de benfeitores? 

Quero de ora em diante reparar tão grande ingratidão. Se conhecesse algum meio eficaz, por mais penoso que me fosse, empregá-lo-ia para aliviar essas pobres almas sem proteção no meio de um oceano de sofrimentos. Entretanto, eu me proponho fazer todos os sacrifícios que puder, e todo bem que fizer ofereço-vos à vossa glória pelas almas do Purgatório. Em consideração de nossa fé e esperança em vós, em consideração, principalmente, da agonia mortal e cruel abandono que sofrestes: dignai-vos, ó Jesus, remir-lhes as penas que ainda têm de sofrer, a fim de que pos­sam ter livre entrada no reino eterno a que aspiram e onde celebrarão a grandeza ine­fável de um Deus que não desampara ninguém. Amém.

'CONSERVEM NO CORAÇÃO O TESOURO DA VIRTUDE...'

A primeira artimanha do demônio consiste em persuadi-los de que o serviço de Deus exige uma vida triste, sem nenhum divertimento ou prazer. Mas isto não é verdade, meus caros jovens. Eu vou lhes indicar um plano de vida cristã que poderá mantê-los alegres e contentes, fazendo-os conhecer quais são os verdadeiros divertimentos e prazeres para que vocês possam exclamar como o santo profeta Davi: 'Sirvamos ao Senhor na santa alegria'.

A segunda artimanha do demônio consiste em fazê-los conceber a falsa esperança de uma longa vida que permite converter-se na velhice ou na hora da morte. Prestem atenção, meus caros jovens, muitos se deixaram prender por esta mentira. Quem nos garante que chegaremos à velhice? Mas a vida e a morte estão entre as mãos de Deus que dispõe de tudo a seu bel-prazer.

E mesmo se Deus lhes concedesse uma longa vida, escutai, entretanto, sua advertência: 'o caminho do homem começa na juventude, ele o segue na velhice até a morte'. Ou seja, se jovens começamos uma vida exemplar, seremos exemplares na idade adulta, nossa morte será santa e nos fará entrar na felicidade eterna. Se, pelo contrário, os vícios começam a nos dominar desde a juventude, é muito provável que eles nos manterão em escravidão por toda a nossa vida, até a morte. Triste prelúdio a uma eternidade terrível.

Para que esta infelicidade não lhes aconteça, eu lhes apresento um método de vida alegre e fácil, mas que lhes bastará para se tornarem a consolação de seus pais, a honra de pátria de vocês, bom cidadãos da terra, em seguida felizes habitantes do céu.

Meus caros jovens, eu os amo de todo o meu coração e basta-me que vocês sejam jovens para que eu os ame extraordinariamente. Eu lhes garanto que vocês encontrarão livros que lhes foram dirigidos pelas pessoas mais virtuosas e sábias em muitos pontos, mas, dificilmente, vocês poderão encontrar alguém que os ame mais do que eu, em Jesus Cristo, e lhes deseja mais a felicidade.

Conservem no coração o tesouro da virtude porque, possuindo-o, vocês têm tudo, mas se o perderem, tornar-se-ão os homens mais infelizes do mundo. Que o Senhor esteja sempre com vocês e que Ele lhes conceda seguir os simples conselhos presentes, para que possam aumentar a glória de Deus e obter a salvação da alma, fim supremo para o qual fomos criados. Que o Céu lhes dê longos anos de vida feliz e que o santo temor de Deus seja sempre a grande riqueza que os cumule de bens celestes aqui e por toda a eternidade. Vivam contentes e que o Senhor esteja com vocês. Seu muito afeiçoado em Jesus Cristo.
(São João Bosco)

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

OS SOFRIMENTOS DO PURGATÓRIO (V)


5º sofrimento — O esquecimento em que caem

Ver-se esquecido na terra, esquecido por aqueles a quem se amou e que nos amaram, é uma dor pungente para o coração, mas ver-se esquecido, quando, se está no Purgatório, quando o coração é mais sensível e nada de exterior o distrai dessa ideia, deve ser um golpe ainda mais cruel. Ó como são justas as queixas que um religioso ouviu desses pobres corações abandonados!

'Ó irmãos! ó irmãos! ó amigos! Pois que há tanto tempo vos aguardamos, e vós não vindes; vos chamamos, e não respondeis; sofremos tormentos que não têm iguais, e não vos compadeceis; gememos, e não nos consolais! Ai de nós! todos os que amamos na terra com toda nossa afeição, nos aban­donaram; choramos no meio desta noite escura, e não há quem nos console. Ah! tudo se acabou, acabou-se para sempre! esqueceram-me e já nem mais uma lembrança me prende à terra!

Em toda a parte está o esquecimento: sobre minha vida inteira que nenhuma palavra lembra mais, sobre meu nome que já ninguém pronuncia, sobre meu túmulo que ninguém visita, sobre minha morte que não há mais quem chore; na terra só tenho o esquecimento em todos e em tudo! A despeito dos adeuses tão sentidos, a despeito dos protestos tão afetuosos, a despeito dos juramentos tão ardentes, eis em que dá tudo entre os vivos, no total esquecimento dos mortos. Ninguém para rezar, ninguém sequer para lembrar-se deles!'

Ninguém?! Ó vós vos enganais, al­mas queridas! Há na terra um coração que nunca esquece, um coração a toda hora disposto a vir em socorro dos mor­tos esquecidos: é o coração da Igreja Ca­tólica, coração de uma mãe! Ela pede para vós, todos os dias, o repouso, o refrigério, a luz. E nós, seus filhos, como vós: nós, vossos irmãos que tanto vos temos esquecido, queremos des­de já associar-nos a todas as suas ora­ções e a todas as suas obras!

(Excertos da obra 'Mês das Almas do Purgatório', do Monsenhor José Basílio Pereira, 1943)

Oração pelas Almas do Purgatório

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Senhor, preparai e fortalecei nossos corações com a abundância de vossa graça, a fim de que, penetrando, em espírito de fé, caridade e compaixão, nas tristes prisões do Purgatório, possamos levar aos fieis que nele sofrem os tesouros de su­frágios que dão alívio aos seus padecimentos, glória à vossa divina Majestade, con­solação e paz às nossas almas.

V. Vinde, Senhor, em meu auxílio.
R. Deus, acudi em meu socorro.
V. Dai às almas o repouso, Senhor.
R. E da luz eterna o esplendor.
V. Descansem em paz.
R. Amém.

Ó Jesus, abandonado de todos e até de vossos apóstolos no Jardim de Getsêmani, dignai-vos lançar os olhos de misericórdia sobre as almas do Purgatório, em particular sobre as que não recebem orações nem consolações e que, pelo decurso do tempo ou efeito de irreligiosidade e negligência, estão esquecidas; fazei que participem das orações, santos sacrifícios, boas obras, cujo mérito não pôde ser aplicado àqueles por quem a Igreja os oferta. Ah! Senhor, não terei eu abandonado, em um criminoso esquecimento, almas que tenham jus ao meu reconhecimento, sejam de parentes, de amigos ou de benfeitores? 

Quero de ora em diante reparar tão grande ingratidão. Se conhecesse algum meio eficaz, por mais penoso que me fosse, empregá-lo-ia para aliviar essas pobres almas sem proteção no meio de um oceano de sofrimentos. Entretanto, eu me proponho fazer todos os sacrifícios que puder, e todo bem que fizer ofereço-vos à vossa glória pelas almas do Purgatório. Em consideração de nossa fé e esperança em vós, em consideração, principalmente, da agonia mortal e cruel abandono que sofrestes: dignai-vos, ó Jesus, remir-lhes as penas que ainda têm de sofrer, a fim de que pos­sam ter livre entrada no reino eterno a que aspiram e onde celebrarão a grandeza ine­fável de um Deus que não desampara ninguém. Amém.

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

OS SOFRIMENTOS DO PURGATÓRIO (IV)


4º sofrimento — O Conhecimento dos seus Pecados

As almas no Purgatório veem as coisas de Deus diversamente de nós. Esclarecidas pela divina luz, compreendem elas o respeito, o amor, a obediência que Deus lhes merecia, e toda a felicidade, ingratidão e covardia dos pecados que cometeram. E essa fealdade e laxidão, sempre ante seus olhos, enchem-nas de tanta vergonha, que procuram, embora inutilmente, fugir das vistas de suas companheiras de tor­mento.

Essa ingratidão, sempre patente, opri­me-as de tantos remorsos, que seu coração se confrange a cada instante e sente a necessidade de sofrer para expiar tanta falta de amor. Podem comparar-se, diz um piedoso bispo, com um homem que, no meio de um calor insuportável, é envolto, comprimido, esmagado por um manto, cujo peso o ani­quila e que está como soldado a todos os seus membros.

E sob esse manto estão encerrados, como em sua morada natural, vermes que se nutrem da carne desse homem e o atormentam, mordendo-o, sem que possa expeli-los. E esse manto está roto, sujo, repugnan­te, e o infeliz é obrigado a estar com ele em presença do Ser mais santo e mais puro, que o vê e, vendo-o assim, há de experimentar um sentimento de repulsão. Que estado esse, que dor, que vergonha!

É o estado permanente, o sofrimento contínuo, a vergonha das almas do Pur­gatório à recordação de suas faltas e em presença dos anjos e do próprio Deus. A esta vergonha vem se unir o pensa­mento de que teriam podido facilmente evitar as faltas que as fazem sofrer!

Ah! dizem elas, se eu tivesse obedecido ao meu Deus naquela ocasião em que me custava tão pouco; se eu não lhe hou­vesse recusado um sacrifício que era bem leve! Se eu não proferisse aquela pala­vra que minha consciência reprovava; se eu não me tivesse descuidado de ganhar aquela indulgência tão fácil, não me veria como me vejo neste momento! Não sofreria o que sofro! Tardio arrependimento! As lágrimas não purificam mais, quando se tem deixado passar o tempo da misericórdia! Ó almas queridas, possam ao menos as vossas dores servir-nos de lição!

(Excertos da obra 'Mês das Almas do Purgatório', do Monsenhor José Basílio Pereira, 1943)


Oração pelas Almas do Purgatório

Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém.

Senhor, preparai e fortalecei nossos corações com a abundância de vossa graça, a fim de que, penetrando, em espírito de fé, caridade e compaixão, nas tristes prisões do Purgatório, possamos levar aos fieis que nele sofrem os tesouros de su­frágios que dão alívio aos seus padecimentos, glória à vossa divina Majestade, con­solação e paz às nossas almas.

V. Vinde, Senhor, em meu auxílio.
R. Deus, acudi em meu socorro.
V. Dai às almas o repouso, Senhor.
R. E da luz eterna o esplendor.
V. Descansem em paz.
R. Amém.

Ó Jesus, abandonado de todos e até de vossos apóstolos no Jardim de Getsêmani, dignai-vos lançar os olhos de misericórdia sobre as almas do Purgatório, em particular sobre as que não recebem orações nem consolações e que, pelo decurso do tempo ou efeito de irreligiosidade e negligência, estão esquecidas; fazei que participem das orações, santos sacrifícios, boas obras, cujo mérito não pôde ser aplicado àqueles por quem a Igreja os oferta. Ah! Senhor, não terei eu abandonado, em um criminoso esquecimento, almas que tenham jus ao meu reconhecimento, sejam de parentes, de amigos ou de benfeitores? 

Quero de ora em diante reparar tão grande ingratidão. Se conhecesse algum meio eficaz, por mais penoso que me fosse, empregá-lo-ia para aliviar essas pobres almas sem proteção no meio de um oceano de sofrimentos. Entretanto, eu me proponho fazer todos os sacrifícios que puder, e todo bem que fizer ofereço-vos à vossa glória pelas almas do Purgatório. Em consideração de nossa fé e esperança em vós, em consideração, principalmente, da agonia mortal e cruel abandono que sofrestes: dignai-vos, ó Jesus, remir-lhes as penas que ainda têm de sofrer, a fim de que pos­sam ter livre entrada no reino eterno a que aspiram e onde celebrarão a grandeza ine­fável de um Deus que não desampara ninguém. Amém.