quinta-feira, 24 de outubro de 2024

TRATADO SOBRE A HUMILDADE (XII)

58. Não devemos ser demasiado afoitos em nos lisonjear por possuir alguma virtude especial. A nossa castidade pode ser o resultado da falta de oportunidades ou de tentações; do mesmo modo, a nossa paciência pode proceder de um temperamento tranquilo ou mesmo ser ditada pela sabedoria mundana e não pela virtude cristã. Devemos estudar bem esta doutrina, de que as verdadeiras virtudes cristãs 'não nascem do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus' [Jo 1,13], isto é, que elas não são obra nem dos desejos, nem das paixões, nem da razão do homem, mas procedem de Deus como seu primeiro princípio, e retornam a Deus como seu último fim. 

Este conhecimento é necessário para nós, para que não nos imaginemos virtuosos quando não o somos, nem nos julguemos melhores do que os outros quando os vemos cair em algum pecado. Devemos sempre aprender lições de humildade com as faltas dos outros, e dizer: 'se eu me encontrasse nas mesmas circunstâncias e tivesse tido a mesma tentação, talvez me tivesse saído pior'. Se Deus não permite que grandes tentações me assaltem, é porque conhece a minha fraqueza e que eu sucumbiria a elas; com olhos de compaixão, Ele vê o que eu sou, 'um homem fraco' [Sb 9,5]. E se não caio em pecado, não é por minha própria virtude, mas pela graça de Deus. Permaneço, pois, na humildade, e isso é vantajoso para mim porque, se na minha soberba me considero maior do que os outros, Deus me abandona e me deixa cair, e me humilha naquilo que eu desejaria me exaltar. Escutai o conselho de Santo Agostinho: 'Atrevo-me a dizer que é proveitoso que os soberbos caiam, para que sejam humilhados por aquilo pelo que se exaltaram' [Serm. liii, de Verb. Dom.].

('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)