segunda-feira, 18 de agosto de 2014

AS GRANDES HERESIAS: PELAGIANISMO

O Pelagianismo consiste em uma abordagem herética da autêntica fé cristã, surgida por volta do Século IV, que admitia que a graça é inerente à capacidade natural do homem. Nesta concepção, o homem possui uma capacidade natural de viver uma vida santa e sem pecado e merecer a felicidade eterna ao exercer a sua livre vontade. Os três principais expoentes do Pelagianismo foram Pelágio (um monge de origem provavelmente irlandesa, do qual se tem pouquíssimas referências, considerando o 'pai' desta heresia), Celéstio e Juliano de Eclano. Pelágio e seus adeptos estavam convencidos de que a capacidade de natureza humana, portanto, a sua liberdade e a sua tendência para o bem, constituem a forma fundamental da graça e, assim, seriam verdadeiros os seguintes princípios:

1. Adão havia sido criado mortal e teria morrido, quer houvesse pecado ou não; 

2. O pecado de Adão prejudicara apenas a si mesmo, e não a toda a raça humana; 

3. Os recém-nascidos estão naquele estado no qual Adão estava antes da sua queda; 

4. Nem pela morte e pecado de Adão a totalidade da raça humana perece, nem pela ressurreição de Cristo a totalidade da raça ressurge; 

5. A Lei leva ao reino dos céus da mesma forma que o Evangelho; 

6. Mesmo antes da vinda do Senhor existiram homens sem pecado.

Ou seja, o Pelagianismo nega o pecado original e, consequentemente, a necessidade do batismo. O homem teria herdado de Adão apenas o mau exemplo da desobediência, mas não o pecado. A graça nos teria sido imposta no ato de nossa criação e a salvação pode prescindir da graça divina. O homem, pelas seus próprios dons e virtudes, e força de vontade, é capaz de salvar a si próprio, por meio do livre arbítrio e da observância da lei moral. Assim, como Adão foi um mau exemplo, Jesus Cristo é apenas um bom exemplo que o homem deve seguir, assim como Moisés; ou seja, todo o trabalho salvífico de redenção de Cristo consiste basicamente na doutrina dos seus ensinamentos e na sua atuação como modelo de virtude. Em síntese, a crença minimiza a função da graça divina e exalta o poder e a liberdade humana no propósito da salvação eterna.

A inconsistência das proposições pelagianistas foi exposta e e combatida por Santo Agostinho, tendo sido condenada formalmente pela Igreja nas disposições do Concílio de Cartago (418):
  • Quem disser que a graça de Deus, pela qual o homem recebe a justificação por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo, só vale para a remissão dos pecados já cometidos, mas não como ajuda para não cometê-los – seja anátema;
  • Quem disser que a graça de Deus por Jesus Cristo Nosso Senhor só nos ajuda a não pecar, porque por ela nos é revelado e manifestado o sentido dos preceitos para sabermos o que devemos desejar, o que evitar, mas que por ela não nos é dado amar também e fazer o que sabemos que deve ser feito – seja anátema;
  • Quem disser que a graça da justificação nos é dada para que mais facilmente possamos cumprir, pela graça, o que com o livre-arbítrio nos é mandado fazer, como se, ainda que não nos fosse dada a graça, pudéssemos sem ela, embora não facilmente, mas pudéssemos cumprir os mandamentos de Deus – seja anátema: 'Sem Mim nada podeis fazer' (Jo 15, 15).  
Cerca de um século depois, na região da Gália, atual França, João Cassiano introduziu uma nova vertente a esta heresia, afirmando que a graça de Deus auxilia no momento de se vencer o pecado, mas que a iniciativa precisa ser sempre do homem, negando, assim, a ação primordial da salvação como obra de Deus. Tais princípios contradizem os conceitos da autêntica doutrina católica relativos à 'graça suficiente' (a graça que nos é dada por Deus para encontrar o caminho da santificação) e à 'graça eficaz' (aquela que o homem deve buscar por vontade própria para a sua plena santificação). Esta variante herética ficou conhecida como 'semipelagianismo' e foi condenada formalmente pela Igreja por meio do II Sínodo de Orange, iniciado em 12 de julho de 526.