quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

O SONO DO MENINO JESUS

I. O sono de Jesus Menino foi demasiadamente breve e doloroso. Servia-lhe de berço uma manjedoura, a palha de colchão e de travesseiro. Assim o sono de Jesus foi muitas vezes interrompido pela dureza daquela caminha excessivamente dura e molesta, e pelo rigor do frio que reinava na gruta. De vez em quando, porém, a natureza sucumbia à necessidade e o Menino querido adormecia. Mas o sono de Jesus foi muito diferente do das outras crianças. O sono destas é útil à conservação da vida; não, porém, quanto às operações da alma, porque esta, privada do uso dos sentidos, fica reduzida à inatividade. Não foi assim o sono de Jesus Cristo: Ego dormio et cor meum vigilat. O Corpo repousava; velava, porém, a Alma, que em Jesus era unida à Pessoa do Verbo, que não podia dormir nem ficar dominada pela inatividade dos sentidos.

Dormia, pois, o Santo Menino, mas enquanto dormia, pensava em todos os padecimentos que teria de sofrer por nosso amor, no correr de toda a sua vida e na hora da sua morte. Pensava nos trabalhos pelos quais havia de passar no Egito e em Nazaré, levando uma vida extremamente pobre e desprezada. Pensava particularmente nos açoites, nos espinhos, nas injúrias, na agonia e na morte desolada, que afinal devia padecer sobre a Cruz. Tudo isso Jesus oferecia ao Pai Eterno enquanto estava dormindo, a fim de obter para nós o perdão e a salvação. Assim nosso Salvador, durante o sono, estava merecendo por nós, reconciliava conosco o seu Pai e nos alcançava graças.

Roguemos agora a Jesus que, pelos merecimentos do seu sono santo, nos livre do sono mortal dos pecadores, que dormem miseravelmente na morte do pecado, esquecidos de Deus e do seu amor. Peçamos-lhe que nos dê, ao contrário, o sono feliz da sagrada Esposa, da qual dizia: 'Eu vos conjuro... que não perturbeis à minha amada o seu descanso, nem a façais despertar, até que ela mesma queira'. É este o sono que Deus dá às almas suas diletas e que, no dizer de São Basílio, não é senão o supremo olvido de todas as coisas - summa verum omnium oblivio. Então a alma abandona todas as coisas terrestres, para só pensar em Deus e nos interesses da glória divina.

II. Ó meu querido e Santo Menino, Vós estais dormindo, mas esse vosso sono como me abrasa em amor! Para nós o sono é figura da morte; mas em Vós é símbolo de vida eterna porque, enquanto repousais, estais merecendo para mim a eterna salvação. Estais dormindo, porém o vosso coração não dorme, senão pensa em padecer e morrer por mim. Durante o vosso sono rogais por mim e me impetrais de Deus o descanso eterno do Paraíso. Mas enquanto não me levardes, como espero, para repousar junto de Vós no Céu, quero que repouseis sempre em minha alma.

Houve um tempo, ó meu Deus, em que Vos expulsei da minha alma. Vós, porém, tanto batestes à porta do meu coração, ora por meio do temor, ora com graças especiais, ora com convites amorosos, que tenho a esperança de que já entrastes nele. Assim espero, porque sinto em mim uma grande confiança de que já me perdoastes. Sinto também uma grande aversão e arrependimento das ofensas que vos tenho feito; um arrependimento que me causa grande dor, mas uma dor pacífica, uma dor que me consola e me faz esperar que a vossa bondade já me perdoou. Graças Vos dou, ó meu Jesus, e peço-vos que não vos aparteis mais da minha alma. Sei que Vós não vos apartareis de mim enquanto eu não vos repelir. 

É esta exatamente a graça que vos peço e que, com vosso auxílio, espero pedir-vos sempre: não permitais que vos torne a repelir de meu coração. Fazei que eu me esqueça de todas as coisas, a fim de só pensar em Vós, que sempre pensastes em mim e na minha salvação. Fazei que vos ame sempre nesta vida, a fim de que a minha alma, expirando unida convosco e em vossos braços, possa repousar eternamente em Vós sem receio de jamais vos perder. Ó Maria, assisti-me na minha vida, assisti-me na hora da minha morte, para que Jesus sempre repouse em mim e eu repouse sempre em Jesus. 

(Excertos da obra 'Meditações para todos os dias do ano', de Santo Afonso Maria de Ligório)

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

PALAVRAS DA SALVAÇÃO


'Aqueles que amam a Deus, vivem sempre satisfeitos, porque todo o seu prazer é cumprir a divina vontade, mesmo nas coisas que lhe são desagradáveis tanto que as inquietações se mudam em deleites, pelo pensamento de que, aceitando-as voluntaria­mente, agradam ao seu amado Senhor. E com efeito, que maior felicidade pode o homem expe­rimentar, do que o cumprimento de seus desejos? Então, quando se deseja o que Deus quer, tem cada um tudo quanto deseja, pois que (exceto o pecado) tudo quanto suceder no mundo é pela vontade de Deus'.

(Santo Afonso Maria de Ligório)

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

O DOM DA INTELIGÊNCIA

O sexto dom do Espírito Santo faz a alma entrar em uma via superior a que ela se encontrava até aqui. Os cinco primeiros dons tendem todos para a ação. O Temor de Deus remete o homem ao seu lugar humilhando-o, a Piedade abre seu coração às afeições divinas, a Ciência ensina-o a discernir entre a via da salvação e a via da perdição, a Fortaleza o arma para o combate e o Conselho dirige o homem em seus pensamentos e em suas obras; agora, então, ele pode agir e seguir pela estrada, com a esperança de chegar ao termo. 

Mas a bondade do Espírito divino lhe reserva ainda outros favores, fazendo-lhe desfrutar desde este mundo, de um antegozo da felicidade que lhe reserva na outra vida. Este será o meio de fortalecer sua marcha, de animar sua coragem e de recompensar seus esforços. A via da contemplação lhe será, de agora em diante, aberta e o Espírito divino nela o introduzirá por meio da inteligência. Muitas pessoas, talvez, se inquietem com a palavra contemplação, persuadidas erradamente de que as condições para isso só poderão ser encontradas na rara condição de uma vida passada no recolhimento e longe do contato dos homens. É um grave e perigoso erro que, muitas vezes, freia o impulso das almas. 

A contemplação é o estado para o qual é chamado, em certa medida, toda alma que procura a Deus. Não consiste nos fenômenos pelos quais o Espírito Santo gosta de manifestar em algumas pessoas privilegiadas e que são destinados a provar a realidade da vida sobrenatural. Ela é, simplesmente, uma relação mais íntima que se estabelece entre Deus e a alma que lhe é fiel na ação; se esta alma não põe obstáculos, são-lhe reservados dois favores, entre os quais, o primeiro é o dom de inteligência, que consiste na iluminação do espírito esclarecido desde então por uma luz superior. Esta luz não retira a fé, mas clareia os olhos da alma, fortificando-os e dando-lhes uma visão mais extensa sobre as coisas divinas. Muitas nuvens provenientes da fraqueza e da grosseria da alma ainda não iniciada, se desvanecem. 

A beleza cheia de encantos dos mistérios, a qual era vagamente sentida, se revela; inefáveis harmonias que nem eram suspeitadas, aparecem. Não é a visão face a face, reservada para o dia eterno; mas já não é mais aquela fraca luminosidade que dirigia seus passos. Um conjunto de analogias e de concordâncias mostram-se sucessivamente aos olhos do espírito, trazendo uma certeza cheia de doçura. A alma se dilata com essas claridades que enriquecem a Fé, aumentam a Esperança e desdobram o Amor. Tudo parece novo; e quando a alma olha para trás, compara e vê claramente que a verdade, sempre a mesma, agora é alcançada por ela de maneira incomparavelmente mais completa. A leitura dos Evangelhos a impressiona mais; encontra um sabor nas palavras do Salvador desconhecido para ela até então. Compreende melhor o fim a que Ele se propôs instituindo os sacramentos. A santa Liturgia a emociona por suas fórmulas tão augustas e seus ritos tão profundos. A leitura da vida dos santos a atrai, nada a espanta nos seus sentimentos e nos seus atos; aprecia seus escritos mais do que quaisquer outros e sente um aumento de bem estar espiritual, tratando com esses amigos de Deus. 

Rodeada de deveres de toda natureza, a chama divina guia essa alma para satisfazer a cada um deles. As diversas virtudes que deve praticar conciliam-se em sua conduta; uma nunca é sacrificada pela outra, porque vê a harmonia que deve reinar entre elas. Está longe do escrúpulo como do relaxamento e sempre atenta para logo reparar os danos que pôde cometer. Algumas vezes, o próprio Espírito a instrui por uma palavra interior que, quando ouvida, ilumina sua situação com uma nova luz. De agora em diante, o mundo e seus vãos equívocos, são tomados por aquilo que são e a alma se purifica do resto de vínculos e complacências que ainda poderia conservar por eles. Aquilo que só tem grandeza e beleza segundo a natureza parece insignificante e miserável para esses olhos que o Espírito Santo abriu para as grandezas e belezas divinas e eternas. Só uma coisa redime a seus olhos esse mundo exterior que ilude o homem carnal: é que a criatura visível, que possui a marca da beleza de Deus, é susceptível de servir à glória de seu Autor. A alma aprende a fazer uso dela com ação de graças, tornando-a sobrenatural, glorificando Àquele que imprimiu as marcas de sua beleza nessa multidão de seres, que muitas vezes servem apenas para a perdição do homem, mas que são dadas para se tornarem degraus que o conduzem a Deus. 

O dom da inteligência derrama também na alma o conhecimento de sua própria via. Faz com que ela compreenda o quanto são sábios e misericordiosos os desígnios do alto que, muitas vezes, a quebra e a transporta para onde não contava ir. Vê que se ela fosse senhora de si mesma, para dispor de sua existência, teria perdido o seu fim e que Deus nele a fez chegar, escondendo primeiramente os desígnios de sua paternal sabedoria. Agora ela está feliz, pois goza da paz e seu coração não cabe de ações de graças para agradecer a Deus que a conduziu ao termo sem consultá-la. Se acontecer de ser chamada para dar conselhos, para exercer uma direção por dever ou por motivo de caridade, pode-se confiar nela; o dom de inteligência a esclarece para os outros como para ela própria. 

No entanto não se intromete, dando lições àqueles que não lhe pedem; mas se é interrogada, responde e suas respostas são luminosas como a chama que a ilumina. Este é o dom de inteligência, verdadeira luz da alma cristã e que se faz sentir nela em proporção à sua fidelidade aos outros dons. Este dom se conserva pela humildade, moderação dos desejos e recolhimento interior. Uma conduta dissipada detém o seu desenvolvimento e pode mesmo abafá-lo. Essa alma fiel pode se conservar recolhida mesmo em uma vida ocupada e cheia de deveres, e até no meio de distrações obrigadas às quais a alma se presta sem se prender. Que ela seja simples a seus próprios olhos e o que Deus esconde aos soberbos e revela aos pequenos lhe será manifestado e nela permanecerá. 

Não há dúvida de que tal dom seja um imenso socorro para a salvação e a santificação da alma. Devemos implorá-lo ao divino Espírito com todo ardor de nossos desejos, convencidos de que o atingiremos mais seguramente pelo impulso do nosso coração do que pelo esforço de nosso espírito. Na verdade é na inteligência que se derrama a luz divina, objeto desse dom; mas sua efusão provém, sobretudo, da vontade aquecida pelo fogo da caridade, segundo a palavra de Isaías: 'Crede, e tereis a inteligência'. Vamos nos dirigir ao Espírito Santo nos servindo das palavras de Davi, dizendo: 'Abri nossos olhos e contemplaremos as maravilhas dos vossos preceitos; dai-nos a inteligência e teremos a vida'. Instruídos pelo Apóstolo, manifestaremos nosso pedido de maneira ainda mais insistente, nos apropriando da oração que ele dirige ao Pai celeste em favor dos fiéis de Éfeso, quando implora 'o espírito da sabedoria e da revelação pelo qual se conhece a Deus, os olhos iluminados do coração que descobrem o objeto de nossa esperança e as riquezas da gloriosa herança que Deus preparou para seus santos'.

(Excertos da obra 'Os Dons do Espírito Santo', de Dom P. Gueranger)

segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

FRASES DE SENDARIUM (XX)

 

'Vinde, ó pecadores, e refugiai-vos no Coração de Cristo, onde a espada da justiça não pode entrar!' 

(Santa Gema Galgani)


Do coração compassivo de Jesus jorram as torrentes da insondável misericórdia divina, que aniquilam todas as misérias humanas e plasmam no fogo e no cadinho os herdeiros do céu. Ó Sangue e Água emanados do oceano de graças do Coração de Jesus, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro!

DOUTORES DA IGREJA (XXXVI)

  36São Gregório de Narek, Abade (†1003)

Místico Armênio

(951 - 1003)

Concessão do título: 2015 - Papa Francisco

Celebração: 27 de fevereiro (Memória Facultativa)
 
Obras e Escritos
  • Livro de Orações ou Livro de Lamentações
  • Comentário sobre o Cântico dos Cânticos
  • Homilias
  • Orações
  • Hinos

domingo, 14 de janeiro de 2024

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Eu disse: "Eis que venho, Senhor!" Com prazer faço a vossa vontade' 
(Sl 39)

Primeira Leitura (I Sm 3,3-10.19) - Segunda Leitura (1Cor 6,13-15.17-20)  -  Evangelho (Jo 1,35-42)

 14/01/2024 - Segundo Domingo do Tempo Comum 

7. APÓSTOLOS SOB A CÁTEDRA DE PEDRO


Estando naquele dia em presença de dois dos seus discípulos mais amados, João Batista vai manifestar, uma vez mais, o testemunho do Messias, aquele de quem dissera pouco antes: 'Eu não sou digno de desatar-lhe as correias das sandálias' (Jo 1, 27). A grandeza do Precursor é enfatizada por Jesus naquele que recebeu privilégios tão extraordinários para ser o profeta da revelação de tão grandes mistérios de Deus à toda a humanidade: Jesus Cristo é o Unigênito do Pai, o Filho de Deus Vivo, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. E, desta vez, dá testemunho direto dele, 'vendo Jesus passar' (Jo 1, 35): 'Eis o Cordeiro de Deus!' (Jo 1, 36).

Ao ouvir estas palavras, André e João, não vacilam um único instante e tomam a firme disposição de seguir Jesus. Seguir Jesus! Eis aí o amoroso convite de Jesus a todos os homens: assumir o jugo suave do Senhor em todos os nossos caminhos, ao longo de toda a nossa vida! Para seguir Jesus, temos que responder a pergunta dos dois discípulos que ecoa pelos tempos: 'Onde moras?' (Jo 1, 38). 'Onde moras, Jesus?' Seguir Jesus é ir onde Jesus está, para que Jesus possa morar em nós. Eis o mistério da graça que cada um deve percorrer nesta vida para a plena busca da Verdade e a contemplação definitiva do Reino de Deus.

Mas os dois discípulos fizeram ainda mais do que isso; o zelo e o fervor pelos novos ensinamentos do Messias fizeram deles os primeiros apóstolos. E a Verdade exaltada, vivida e compartilhada pela pregação humana das primícias do apostolado cristão vai chegar a ninguém menos que Simão Pedro, irmão de André, e que viria a ser a pedra angular da futura Igreja de Cristo. Pedro não vacilou também, não fez concessões e nem imposições, mas acreditou! E imediatamente foi ter com Jesus.

Jesus, que conhecia Pedro desde a eternidade e Pedro, que nascia para a eternidade, estavam juntos pela primeira vez: 'Tu és Simão, filho de João; tu serás chamado Cefas' (Jo 1, 42). Jesus estabelece neste primeiro momento, a vinculação direta entre a ação do apostolado e a pedra (Cefas) fundamental sobre a qual haveria de edificar a sua Igreja, mistério da graça muito além da possível percepção histórica daqueles homens. O apostolado é, pois, missão inerente a toda a cristandade e deve estar indissoluvelmente ligada à pedra fundamental da Igreja, como dizia Santo Ambrósio de Milão: 'Não podem ter a herança de Pedro os que não vivem sob a cátedra de Pedro'.

sábado, 13 de janeiro de 2024

SERMÕES DO CURA D'ARS (XVI)

 SOBRE O PODER E GLÓRIA DO SANTO NOME DE JESUS

 'humilhou-se ainda mais, tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz. Por isso, Deus o exaltou soberanamente e lhe outorgou o nome que está acima de todos os nomes' (Fp 2, 8-9)

Caríssimos no Senhor! Neste domingo, celebramos de modo especial a festa em honra do Santo Nome de Jesus, aquele nome que é, para cada cristão, o mais nobre e querido, o mais santo e o mais consolador. Ao honrar e amar o nome do nosso Salvador, mostramos o nosso respeito e amor por Aquele que tem este nome abençoado. Neste sentido, honramos e louvamos os nomes dos santos cuja memória nunca morrerá, mas será sempre honrada por Deus e pelos homens; pensamos com alegria nas suas excelsas e heroicas virtudes, na sua fé viva e inabalável, no seu amor abnegado ao próximo, no seu incansável zelo em ajudar os seus semelhantes a alcançar a verdadeira felicidade e a salvação que só provém de Deus - sim, verdadeiramente os nomes dos santos, e sobretudo o da Rainha dos Santos, e os nomes de todos os eleitos de Deus, nos são caros e os pronunciamos com reverência e amor pois, de fato, seria um pecado não o fazer.

Mas há um nome que está acima de todos os outros nomes, um nome que devemos sempre pronunciar com a maior reverência, com a maior alegria e o mais terno amor; e esse é o Nome de Jesus.  E porque todos nós guardamos, nos nossos corações, um respeito tão profundo, um amor e uma devoção tão grandes por este Nome Santíssimo? Em primeiro lugar, por causa da sua glória e excelência e, em segundo lugar, por causa do seu maravilhoso poder e abundância de graça. Façamos disto o objeto da nossa meditação no nome de Jesus: 'Que se humilhou a si mesmo, tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz. Por isso, também Deus o exaltou e lhe deu um nome que está acima de todo o nome'.

I - Amado no Senhor! Ninguém é capaz de explicar o grande mistério revelado na terra por Cristo, o Filho de Deus encarnado. Segundo a expressão do Apóstolo São Paulo, na sua carta aos colossenses, este mistério, que o Apóstolo diz ser o próprio Cristo, está escondido desde toda a eternidade em Deus. Quando, na plenitude dos tempos, foi revelado, recebeu um nome que nos mostrou distintamente, à luz da fé, o grande e maravilhoso significado da Encarnação do Filho de Deus e da nossa redenção. Deus, o Pai Eterno, quis escolher Ele mesmo o nome que o seu Filho bem-amado deveria levar sobre a Terra e Ele anunciou esse nome ao mundo por um anjo do Céu.

Com efeito, outorgado e enviado por Deus, o arcanjo Gabriel trouxe a mensagem à Santíssima Virgem Maria: 'Eis que conceberás no teu ventre e darás à luz um filho, e o seu nome será Jesus'. E o anjo disse a José: 'José, filho de Davi, não temas receber Maria, tua mulher, porque o que nela foi concebido vem do Espírito Santo. E ela dará à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos seus pecados' (Mt 1, 20-21). E, novamente, como ouvimos na Festa da Circuncisão de Nosso Senhor: 'Completados que foram os oito dias para ser circuncidado o menino, foi-lhe posto o nome de Jesus, como lhe tinha chamado o anjo, antes de ser concebido no seio materno' (Lc 2,21).

O nome de Jesus, portanto, não foi dado ao nosso Salvador por um homem ou um anjo, mas pelo próprio Deus. Este nome santíssimo estava desde toda a eternidade escondido sob o mistério da Encarnação no seio, no coração do Pai, foi revelado ao mesmo tempo com a realização deste mistério do Céu, para que nós, homens, pudéssemos exprimir de forma digna o nosso respeito e a nossa gratidão por aquilo que o Filho de Deus, na sua natureza humana, pelo seu incompreensível amor por nós, tinha feito e sofrido pela nossa salvação: 'a quem porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo de seus pecados' (Mt 1,21); mas não somente o povo eleito, mas toda a humanidade, como diz o Apóstolo São João, de modo a reunir todos os filhos de Deus dispersos, para serem feitos um só aqui na terra e um só no Céu.

'Jesus Cristo' - diz este mesmo Apóstolo - é a propiciação pelos nossos pecados, e não só pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo' (I Jo 2,2). Como diz São Paulo, Cristo Jesus é o único mediador entre Deus e os homens.  O nome de Jesus significa, portanto, Salvador, Redentor e Mediador, e lembra-nos tudo o que o Filho de Deus realizou aqui na terra para nos redimir e nos tornar eternamente felizes.  Lembra-nos toda a sua vida terrena, desde o seu nascimento até à sua morte, todos os passos que deu, os milagres que fez, todos os doentes que curou, todos os mortos que ressuscitou, os pecadores que perdoou, os sacramentos que deixou na sua Igreja; em uma palavra, tudo o que o Filho de Deus encarnado fez, e continua a fazer, não só para nos tornar felizes aqui na terra, mas também para nos tornar felizes e nos abençoar por toda a eternidade.  O nome de Jesus é, portanto, para nós, o nome mais querido e o mais glorioso.

Nosso Salvador mereceu esse nome para si mesmo. É o nome de honra, que pertence ao Filho de Deus, que morreu na cruz para salvar o mundo decaído. Esse nome é a recompensa, o preço da vitória, que Ele recebeu do seu Pai Celestial; o louvor e o renome que Ele receberá para sempre do mundo cristão agradecido. Isto nos é ensinado e proclamado pelo grande Apóstolo do povo, nas palavras mais emocionantes, quando ele diz de Cristo: 'Ele humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz. Por isso também Deus o exaltou e lhe deu um nome que está acima de todo o nome, para que em nome de Jesus se dobre todo o joelho daqueles que estão nos céus, na terra e debaixo da terra; e toda língua confesse, para a glória de Deus Pai, que Jesus Cristo é Senhor' (Fl 2, 8-11).

E eis que, como foi dito, assim aconteceu.  O nome de Jesus foi colocado sobre a cabeça do Salvador crucificado no Gólgota: Jesus Nazarenus, Rex Judoeorum - Jesus de Nazaré, Rei dos Judeus, mas agora brilha sobre o céu e a terra, para glória de Deus Filho.  Todos os anjos e santos do céu pronunciam este nome glorioso com um júbilo e um arrebatamento indescritíveis. Todos os fiéis na terra louvam o nome do seu maior benfeitor com a mais profunda reverência e intensa gratidão. As almas sofredoras do Purgatório suspiram com jubilosa esperança sempre que pensam neste Santo Nome, e o seu desejo é louvar e glorificar este Santo Nome com todos os eleitos do Céu. Quem de nós se atreveria a pronunciar este Santíssimo Nome com indiferença ou sem circunspeção? Não, ó Jesus, como poderíamos ser culpados de tal ofensa contra Vós? Com a mais profunda reverência e o mais ardente amor, conservaremos para sempre o vosso Nome Glorioso em nossos corações e o pronunciaremos com as nossas línguas; e também o invocaremos com a mais completa confiança.

II. Por esta razão, amados cristãos, escutai algumas palavras sobre o maravilhoso poder do nome de Jesus. Em primeiro lugar, é o próprio Salvador que nos assegura o maravilhoso poder do seu nome divino, pois diz dos que nele crêem: 'expulsarão os demônios em meu nome, falarão novas línguas, manusearão serpentes e, se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal; imporão as mãos aos enfermos e eles ficarão curados' (Mc 16, 17-18). Sobre o poder do seu nome, Jesus diz, ainda que toda a oração feita em seu nome será ouvida. 'Em verdade, em verdade vos digo' - diz Ele aos seus discípulos - 'se pedirdes alguma coisa ao Pai em meu Nome, Ele atenderá o vosso pedido' (Jo 14,13). Até agora não pedistes nada em meu nome, mas orai, para que possais receber, para que a vossa alegria seja perfeita. 

A Sagrada Escritura e as tradições da nossa Santa Igreja ensinam-nos as inúmeras vezes que o Senhor cumpriu esta sua promessa, e quão poderoso e cheio de bênçãos é o seu Santo Nome. Pedro e João, nos primeiros tempos da Igreja, subiram ao Templo para rezar. Um homem coxo de nascença estava sentado à porta do Templo e pediu uma esmola aos Apóstolos. Pedro sentiu-se possuidor de tesouros que ultrapassavam todas as riquezas da terra e, fortalecido pela promessa do Salvador, dirigiu-se ao coxo: 'Olha para nós!' Este fez isso, na esperança de receber algo deles. Mas Pedro disse-lhe: 'Não tenho ouro nem prata, mas o que tenho isso te darei: em Nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levanta-te e anda!' E o coxo levantou-se e entrou com eles no Templo para louvar a Deus.

São Paulo tinha chegado a Filipos, a capital da Macedônia. Percorreu as ruas da cidade em direção a uma casa de oração.  No caminho, encontrou uma criada que estava possuída por um espírito mau. O Santo Apóstolo teve pena da infeliz rapariga e, confiando nas promessas do Senhor, disse ao espírito mau: 'Eu te ordeno, em nome de Jesus Cristo, que saias dela!'. E o demônio saiu imediatamente de dentro dela. Quando foi entregue ao Apóstolo São João uma taça cheia de veneno; ele pronunciou o nome de Jesus sobre ela, e o veneno não lhe fez mal algum.

Dotados do poder do Santo Nome, os Apóstolos saíram para converter o mundo. Não só fizeram inúmeros milagres, mas também aqueles que acreditaram nas suas palavras fizeram milagres em nome de Jesus. Ao som deste Nome Divino, os templos dos pagãos desmoronavam-se. Perante ele, os espíritos das trevas fugiam. Por meio deste nome vitorioso, os ensinamentos de Jesus foram difundidos sobre a face da terra.  Neste nome, a Igreja desempenha a sua missão divina todos os dias até ao fim do mundo; por meio dele ensina, reza, abençoa e consagra. Mas, meus caros cristãos, cada um de nós pode experimentar em si mesmo o poder e os efeitos maravilhosos deste nome consolador.  Sim, ó alma cristã, se invocares o nome de Jesus com devoção, obterás certamente todas as coisas necessárias para a tua salvação.  Este Santíssimo Nome dar-te-á conselho nas dificuldades, coragem nos perigos, fortaleza e força nas tentações, perseverança no bem, consolação e alegria nas tribulações e nos sofrimentos. Quando os Apóstolos do Senhor foram flagelados em Jerusalém, alegraram-se por terem sido considerados dignos de sofrer a ignomínia pelo nome de Jesus.

Quanto mais devotamente reverenciarmos e invocarmos o nome de Jesus, tanto mais o nosso Salvador mostrará um amor terno e percetível para conosco.  'Meu Jesus' - exclamava Santo Agostinho - 'assim que começo a pronunciar o vosso nome, percebo uma doçura sobrenatural na minha boca e uma surpreendente mudança do coração'." 'O nome de Jesus' - diz São Bernardo - 'é como mel na boca, um som suave nos ouvidos e uma alegria para o coração'. Quão doce e consolador é o nome de Jesus, em todas as dores e sofrimentos desta vida mutável, mas é o mais doce de todos na hora da morte. Com o nome de Jesus nos lábios, os santos de Deus expiraram suas almas.  Jesus foi a sua última oração, o seu último suspiro: 'Senhor Jesus, recebe a minha alma!' Foi assim que Santo Estêvão rezou quando o estavam a apedrejar até à morte, e assim morreu no Senhor. 'Jesus, meu amor!' - assim suspirava o santo mártir Inácio, bispo de Antioquia, quando o levaram à morte, para ser despedaçado pelas feras.  Quando lhe ordenaram que negasse o nome de Jesus, respondeu, com calma e firmeza: 'Nunca deixarei de pronunciar o seu Nome. E se me pudésseis impedir de o pronunciar com a minha boca, não o poderíeis apagar do meu coração'. Confessando o Santíssimo Nome de Jesus, e pronunciando-o com todo o fervor, o santo bispo morreu a gloriosa morte de mártir.

Concedei-nos também a nós, ó Jesus, que o vosso nome seja sempre bendito para nós, enquanto vivermos, e especialmente na hora da nossa morte, a nossa consolação e a nossa esperança, e no céu a nossa eterna alegria e bem aventurança. Amém.