sexta-feira, 14 de julho de 2017

AS SETE COLUNAS DA IGREJA DOMÉSTICA (VII)

'A Sabedoria edificou sua casa, talhou sete colunas' (Pv 9, 1)

SÉTIMA COLUNA: A ALEGRIA

A alegria nunca deve propriamente sair de casa, pois é como a delicada flagrância que paira sobre montes e vales, feita da luz do sol e do aroma das flores. A alegria é a luz do sol na menor das choupanas. Tudo brilha à sua luz. Casa sem alegria pode-se chamar de 'prisão'. Com a alegria tudo respira liberdade e luz, flagrância e força.

'Da árvore da vida a força sacrossanta,
Doce prazer de dar e bondade que encanta.
Tudo aceita animosa e a tudo renuncia,
Sente-se forte e livre e feliz a alegria!'
(R. Bern.)

Pode acaso a alegria faltar em casa? Não deve ser como na Igreja, onde os tons jubilosos não se desvanecem de todo, nem sequer no dia de Finados e na Sexta-feira da Paixão? Mesmo por entre lágrimas ela sabe cantar ainda o jubiloso Benedictus e o exultante Magnificat. Houve uma vez um tempo e não está muito longe, em que a alegria fixara residência no círculo da família.

Ela acompanhava ao trabalho cada um dos membros da família, com eles se sentava à mesa e no meio deles permanecia, quando, à noite, voltavam do trabalho e conversavam à luz do candeeiro. Era esta a sua hora como um eixo harmonioso do dia e tanto mais belo e harmonioso, quanto mais árduo e penoso fora o trabalho do dia. Como isso elevava o espírito de família e o sentimento da união familiar! Como moços e velhos aguardavam ansiosos aquelas noites em que se reunia a família em torno da mesa e, sobretudo nos domingos e dias santos, que eram sempre dias de festa de sol para a família! Acima de tudo estava nesses dias certamente o culto divino.

Da vida de Hermam von Mallinckrodt sabe-se que toda a família assistia junta ao ofício divino da paróquia. Na volta para a casa, conversavam pais e filhos regularmente sobre as ideias do sermão de domingo e depois era uma alegria geral até que, à noite, uma leitura comum de qualquer livro religioso encerrava o dia. Assim o faziam nos tempos antigos milhares de famílias católicas... A alegria, o espírito familiar prendiam ao lar moços e velhos. O centro - o sol, em torno do qual tudo se movia, o imã que tudo atraia a si, era a mãe. Dela emanava sobre todas as coisas uma luz áurea, de modo que o marido e os filhos esqueciam a taverna e os amigos e as filhas em parte alguma gostavam tanto de estar como no lar, junto da mãe.

A cerimônia de certas festas e acontecimentos domésticos tornava mais profundo o doce encanto do lar paterno: batizado, comunhão das crianças, aniversários, festa onomástica, especialmente da mãe, eram dias luminosos e alegres no decorrer do ano. Festas da Igreja, como Páscoa, Pentecostes, Advento, com seus maravilhosos cânticos, o mês de Maria, São João, Santo Antônio e São Pedro e, sobretudo a bela e querida festa de Natal não eram menos do que o ponto de partida de muitas alegrias domésticas. Como florzinhas no campo, brotavam por toda a parte e, por moços e velhos, eram colhidas com prazer.

Além disso, havia sempre ocasião para enriquecer-nos de conhecimentos e por em prática certas outras habilidades. As flores e plantas do mato e do campo tornavam-se-nos familiares e, mesmo para o mundo das estrelas, o dedo materno dirigia as nossas vistas. Explicava-nos o percurso dos planetas e muitas constelações da abóbada celeste nos indicava, contando também em partes as lendas populares a respeito. Certamente o ensino materno não provinha de ciência e cálculo astronômico; ela nada sabia de análise espectral e dos métodos delicados para exame dos corpos celestes; mas nós lhe devemos, ao lado dos primeiros conhecimentos de astronomia, a predileção pelo céu estrelado e, o que é de mais valor, aquela liberdade de espírito que se afasta da fria e ímpia divinização da natureza, prostrando-nos ao contrário em adoração diante do poder criador de Deus, que em parte alguma se mostra mais brilhante que nas maravilhas da noite e no curso dos astros.

Tudo isso acabou? Definitiva e irremediavelmente? É verdade que a indústria, a vida de ganância moderna, o espírito do materialismo, que com ela se insinuou, feriu profundamente a vida familiar. A horrível carência de moradias aumentou a miséria. A alegria quer espaço, tempo e sol e também um lugar para o recreio das crianças. Em escuras alcovas e estreitas mansardas, em casernas sem ar e sem luz, tem de desvanecer-se. Mais ainda, porém, que tudo nos prejudicou a moderna avidez de prazeres. Sobretudo a mocidade é arrebatada ao lar pelos divertimentos. Há muito que a distração e o recreio não vêm mais, como repouso necessário após o trabalho, mas para muitos são o alvo e o fim do trabalho. Para poder gozar o mais possível, trabalham, esforçam-se durante a semana e sacrificam por fim a alegria e a felicidade da família.

Os 'estabelecimentos de diversões', gente interessada no negócio, providenciam para que não se tenha descanso. Sempre novas sensações açoitam os nervos, embriagam os homens, para que 'se inebriem do desejo imoderado do gozo e no gozo de novo se consumam de desejos veementes'. As reuniões de sociedades e a fúria dos esportes fazem o resto para que o espírito de família não medre mais e a felicidade familiar se despedace.

Se carece haver associações, jamais entretanto devem tornar-se coveiros da vida de família. Acaso são nossas associações católicas sempre isentas desta censura? Em lugar de todos os preparativos 'de um sucesso extraordinário', despertai em vossos consórcios o senso da verdadeira alegria, ajudai-os a conseguir a verdadeira formação do caráter da alma, num tempo sem espiritualidade como o atual. Isso seria proveitoso à vida de família. 

Pois afinal é na verdade um pequeno sacrifício de renúncia e domínio sobre si mesmo, um único cigarro que não se fuma ou um salário que se põe intacto sobre a mesa familiar têm mais valor que uma dúzia inteira de festas estrondosas, vale também mais que uma bola de futebol atirada à altura de uma torre ou um canal atravessado a nado. Como os homens são caprichosos! Procuramos alegria como a mariposa busca a luz! Somente muitas vezes a procuramos onde ela não se acha: nos prazeres pagos da cidade, nos lugares enfumaçados, perfumados, para onde nos atraem os cartazes berrantes e a música estridente do jazz-band. Quem quer alegrias reais, tem de sair dos muros da cidade e da supercultura e voltar ao doce caminho do lar, ao seio livre da natureza criada por Deus e da família, pois do contrário anda no caminho errado e não as encontra.

(Excertos da obra 'As colunas de tua Casa - um Plano para a Felicidade da Família', do Vigário José Sommer, 1938, com revisão do texto pelo autor do blog)

quinta-feira, 13 de julho de 2017

100 ANOS DE FÁTIMA - TERCEIRA APARIÇÃO

Fátima é o acontecimento sobrenatural mais extraordinário de Nossa Senhora e a mais profética das aparições modernas (que incluíram a visão do inferno, 'terceiro segredo', consagração aos Primeiros Cinco Sábados, orações ensinadas por Nossa Senhora às crianças, consagração da Rússiamilagre do sol e as aparições do Anjo de Portugal), constituindo a proclamação definitiva das mensagens prévias dadas pela Mãe de Deus em Lourdes e La Salette. Por Fátima, o mundo poderá chegar à plena restauração da fé e da vida em Deus, conformando o paraíso na terra. Por Fátima, a humanidade será redimida e salva, pelo triunfo do Coração Imaculado de Maria. Se os homens esquecerem as glórias de Maria em Fátima e os tesouros da graça, serão também esquecidos por Deus.

'por fim, o meu Imaculado Coração triunfará'


FÁTIMA EM FATOS E FOTOS (VII)

31. Como se deu a terceira aparição de Nossa Senhora?

A terceira aparição de Nossa Senhora, no início da tarde de 13 de julho de 1917, ocorreu de forma similar às duas primeiras, mas na presença de uma multidão muito maior que as anteriores, estimada desta vez em mais de duas mil pessoas. No centro da multidão e diante da azinheira, as três crianças rezavam o terço e olhavam ansiosas o céu em direção ao nascente. O pai de Francisco e Jacinta, Manuel Marto, encontrava-se ao lado das crianças desde o início da aparição e é dele o testemunho de ter visto uma espécie de nuvem de fumo se debruçar sobre a azinheira no momento em que Lúcia alertou a multidão para que se tirassem os chapéus ante a chegada de Nossa Senhora.

32. Como foi o diálogo de Lúcia com Nossa Senhora nesta terceira aparição?

Assim como na segunda aparição, assim que viu Nossa Senhora, Lúcia perguntou:

– Vossemecê que me quer? 
– Quero que venhais aqui no dia 13 do mês que vem; que continueis a rezar o terço todos os dias em honra de Nossa Senhora do Rosário, para obter a paz do mundo e o fim da guerra porque só Ela lhes poderá valer.
–  Queria pedir-lhe para nos dizer quem é e para fazer um milagre com que todos acreditem que Vossemecê nos aparece.
– Continueis a vir aqui todos os meses. Em outubro direi quem sou, o que quero e farei um milagre que todos hão de ver para acreditarem.

Lúcia fez então uma série de pedidos em intenções pela cura ou conversão de algumas pessoas, ao que Nossa Senhora responde que os pedidos deverão ser atendidos no prazo de um ano, mas insiste sempre na oração do terço, principalmente em família. No final deste diálogo de pedidos de intenções, Nossa Senhora, com expressão muito séria, diz à Lúcia:

– Sacrificai-vos pelos pecadores e dizei muitas vezes e em especial sempre que fizerdes algum sacrifício: 'Ó Jesus, é por vosso amor, pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria'.

Ao dizer estas últimas palavras, abriu de novo as mãos, como nos dois meses passados; o reflexo da luz que espargiam de suas mãos parecia penetrar a terra. Na sequência, as três crianças experimentaram a visão do inferno, assim descrita pelas palavras de Lúcia:

Vimos como um mar de fogo. Mergulhados nesse fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras ou bronzeadas com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas que delas mesmas saiam, juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das faúlhas nos grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizavam e faziam estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa... [Lúcia, Quarta Memória]

Suspensa a visão aterradora do inferno e estremecidos de medo, as crianças volveram imediatamente os olhos para Nossa Senhora em busca de conforto que, as contemplando com imensa ternura, revelou à Lúcia um longo testemunho:

– Vistes o inferno para onde vão as almas dos pobres pecadores. Para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao Meu Imaculado Coração. Se fizerem o que Eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar. Mas se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. 

Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre. Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia ao Meu Imaculado Coração e a Comunhão Reparadora dos Primeiros Sábados. Se atenderem aos meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz. Se não, espalhará os seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Por fim o Meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-Me-á a Rússia que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz. Em Portugal conservar-se-á sempre o dogma da fé , etc.

Isto não o digais a ninguém. Ao Francisco, sim, podeis dizê-lo. Quando rezardes o terço, dizei depois de cada mistério: 'Ó meu Jesus, perdoai-nos e livrai-nos do fogo do inferno, levai as almas todas para o Céu, principalmente aquelas que mais precisarem'

Seguiu-se um instante de silêncio, quebrado então por Lúcia:

– Vossemecê não me quer mais nada?
– Não, hoje não te quero mais nada.

E como de costume, Nossa Senhora começou a elevar-se em direção ao nascente até desaparecer na imensa distância do firmamento [Lúcia, Quarta Memória].

33. O que constitui os chamados Primeiro Segredo e Segundo Segredo de Fátima?


Do conjunto de mensagens que Nossa Senhora e Mãe de Deus revelou ao mundo em Fátima, as revelações feitas nesta terceira aparição foram sistematizadas em três partes distintas, numa abordagem que ficou mundialmente conhecida como Segredo de Fátima. As duas primeiras partes do Segredo foram formalmente reveladas por Lúcia em 1941, nas suas Terceira e Quarta Memórias e são as seguintes: 

(i) Primeiro Segredo: a perda eterna das almas e a visão do inferno 

Nossa Senhora, após ensinar às crianças uma oração pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos, abriu as mãos e o reflexo dos raios de luz, que delas emanavam, pareceu penetrar a terra, revelando as visões do Inferno e do espantoso número de almas que são condenadas à danação eterna pela submissão ao pecado, assim descritas nas terríveis palavras de Lúcia: 

'... e vimos como que um mar de fogo: mergulhados neste fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras, ou bronzeadas, com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas, que delas mesmo saíam juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das fagulhas nos grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizavam e faziam estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa...' 

(foto dos três videntes na tarde de 13/07/1917, após a visão do inferno)

(ii) Segundo Segredo: castigos universais e os meios para evitá-los

A segunda parte do Segredo, revelada às crianças na sequência imediata da visão do Inferno, consiste no anúncio do advento de grandes castigos para a humanidade, caso os homens não se convertessem e, principalmente, os meios de salvação colocados à disposição de todos e capazes de reorientar e modificar completamente as perspectivas previstas para as futuras gerações: a oração do Rosário, a prática dos Cinco Primeiros Sábados, a Devoção ao Imaculado de Maria e, de forma muito particular, a Consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria, fato que, uma vez não ocorrendo, implicaria que os erros da Rússia seriam espalhados pelo mundo inteiro, levando inclusive ao aniquilamento de algumas nações.

34. O que se pode inferir sobre a terceira parte do Segredo de Fátima? 

A terceira parte do segredo, escrita por Lúcia em janeiro de 1944, nunca foi inserida no contexto de suas memórias publicadas. Mas a última frase das mensagens reveladas é bastante singular: 'Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé, etc...'. Este etc... sugere que o texto da terceira parte do Segredo estaria a seguir (lembrando que a segunda parte sucedeu imediatamente a revelação da primeira parte). Mas a própria frase parece desconectada do contexto anterior, pois a referência específica (situação em Portugal) confronta com o texto prévio (dimensão universal dos castigos), de forma que pode se interpretar esta frase já no contexto da terceira parte do Segredo.

Se em Portugal o dogma da fé será mantido (e se esta afirmativa assume um caráter de tal relevância que mereça uma menção especial na mensagem), é razoável deduzir que este fato – a perda da fé – atingirá dimensões inconcebíveis no âmbito da história humana e terá proporções mundiais. Nesta concepção, a terceira parte da mensagem referir-se-ia à questão de uma apostasia generalizada e sem paralelo na história da humanidade. Uma crise de fé de tal relevância deveria estar intimamente relacionada a uma gravíssima crise da própria Igreja de Cristo e isto explicaria a não divulgação pública desta terceira e última parte do Segredo. 

A terceira parte do segredo constitui essencialmente, portanto, a revelação de uma profunda crise de fé e crise da Igreja, com a perda substancial da Verdade revelada, substituída por um sem número de doutrinas heréticas no campo dogmático e da moral e implementação de falsas liturgias, com profundo impacto nos valores do cristianismo autêntico e concessões crescentes ao permissivismo moral, ao agnosticismo e ao ateísmo. 


35. Que correlação interliga diretamente os Três Segredos de Fátima?

Na própria mensagem de Fátima, o Segredo aparece como três partes distintas de um todo, ou seja, existe uma relação direta e comum interligando as três partes do Segredo em uma única mensagem. Numa síntese geral, o primeiro segredo teve como foco a salvação pessoal do homem; o segundo segredo teve como foco a salvação da humanidade e o terceiro segredo teve por foco a salvação da cristandade, da própria fé cristã, da própria Igreja.

Neste contexto, a crise de fé e a apostasia universal (terceira parte do Segredo) seriam os fatores de condenação ao Inferno de um grande número de almas (primeira parte) e a causa fundamental para a sucessão de castigos que se abateriam sobre o mundo (segunda parte). Desta forma, a terceira parte constituiria, na verdade, a causa dos eventos descritos nas primeiras duas partes reveladas (perda das almas, representada nas aparições pela Visão do Inferno e os castigos universais, caso não se concretizassem a conversão dos homens). Para evitar e desfazer esta sincronia de males e tragédias, os meios disponibilizados por Nossa Senhora seriam, então, o Santo Rosário, a Consagração dos Cinco Primeiros Sábados e a Devoção ao Imaculado Coração de Maria.

terça-feira, 11 de julho de 2017

A CONTRIÇÃO PERFEITA É A CHAVE DE OURO DO CÉU

Como se obtém a contrição perfeita

Põe-te diante de um crucifixo, na igreja ou na casa de tua habitação, ou senão imagina que o tens diante de ti, e, chorando de compaixão à vista das feridas do Senhor, pensa uns momentos com fervor: Quem é este que está pendente da Cruz e sofrendo nela? — É Jesus, meu Deus e Salvador. O que sofre? — As mais terríveis dores no corpo, tem-no ensanguentado e coberto de feridas; a alma, tem-na lacerada pelas dores e afrontas. Por que sofre tudo isso? — Pelos pecados dos homens e também pelos meus pecados; em meio de suas amarguradas dores, também pensa em mim, também sofre por mim, também quer expiar os meus pecados.

Entretanto, deixa que o sangue redentor do Salvador, quente ainda, caia sobre ti, gota a gota, e pergunta a ti mesmo como tens correspondido ao teu Salvador, tão atormentado por ti. Pensa um momento, recorda teus pecados, e esquece-te, se quiseres, do Céu, do inferno, e arrepende-te principalmente porque são eles que a tão miserando estado reduziram o teu Salvador; promete-lhe que não tornarás a crucificá-Lo com mais pecados e, por fim, reza, pausadamente e com fervor, acompanhando com sentimento interno, as palavras de alguma fórmula da contrição.

Mas é possível alcançar com facilidade a contrição perfeita? 

Antes de tudo, é verdade que, para a contrição perfeita, se requer mais do que para a imperfeita, que é a de que se necessita para a Confissão. Contudo, porém, ajudado com a graça de Deus, pode qualquer um alcançar a contrição perfeita, bastando que deveras a deseje, porque a verdadeira contrição está na vontade e não no sentimento. Tudo se reduz a termos o devido motivo de arrependimento, quer dizer, que nos arrependamos porque amamos a Deus sobre todas as coisas e, por seu amor, detestamos os nossos pecados; nisto, e não na duração ou intensidade da dor, está a contrição perfeita. 

Digo isto, porque muitas vezes se confunde a contrição perfeita com certa contrição que há, altíssima e sublime, não se advertindo que a contrição perfeita tem seus graus e degraus, e que, para que o seja, não é necessário que chegue à contrição altíssima e firmíssima de São Pedro, de Madalena, de São Luiz Gonzaga e de outros santos: muito bom seria isso, mas não é necessário; um grau mais baixo de contrição perfeita e verdadeira basta para perdoar os pecados. 

Além disso, advertirás uma coisa, que me parece te animará e te dará confiança para poderes alcançar a contrição perfeita. Antes de Jesus Cristo, na Lei antiga, por espaço de 4.000 anos, foi a contrição perfeita o único meio que tiveram os homens para alcançarem o perdão dos pecados e entrarem no Céu. E hoje mesmo a milhões e milhões de pagãos e hereges que só e unicamente pela contrição perfeita, podem sair do pecado. Portanto, se é verdade, como é, que Deus não quer a morte do pecador, parece natural que não haja exigido para a contrição perfeita ato demasiadamente difícil, mas antes que esteja ao alcance de todos. 

Pois, se podem alcançar a perfeita contrição tantos e tantos que vivem e morrem afastados, é verdade que sem culpa sua, da corrente da graça e da Igreja Católica, ser-te-á isto a ti difícil, a ti, que tens a grande dita de ser cristão e católico, a ti, que tens muito mais graças e estás mais instruído do que eles? E ainda te digo mais: muitas vezes, sem o saber ou sem o pensar, tens realmente contrição perfeita; quando, por exemplo, ouves piedosamente a santa Missa, quando fazes com devoção a Via-Sacra, quando meditas com fervor diante de uma imagem de Jesus Crucificado ou do Sagrado Coração, ou assistes à pregação da palavra divina. 

Além disso, muitas vezes pode-se exprimir com poucas palavras o amor mais ardente e a mais profunda contrição, atendendo só ao sentido e ao motivo (o amor de Deus). Por exemplo, com estas jaculatórias: 'Deus meu e meu tudo!'; 'Meu Jesus, misericórdia!'; 'Ó meu Deus, amo-Vos sobre todas as coisas!'; 'Meu Deus, compadecei-Vos de mim pecador!', etc.

Que efeitos produz a contrição perfeita? 

Efeitos verdadeiramente admiráveis! Se és pecador, perdoa-te imediatamente os pecados e isto de cada vez e ainda antes de receberes o sacramento da Confissão; necessário é, porém, que tenhas vontade de confessá-los mais tarde (vontade esta que já está incluída na contrição perfeita). E este efeito é produzido pela contrição perfeita e verdadeira não só em perigo de morte, mas sempre e quando a excitamos no coração; de modo que o pecador, ao mesmo tempo que lhe são remidas as penas do inferno, recobra os méritos passados e, de inimigo de Deus, se faz seu filho e herdeiro do Céu. 

Se és justo, a contrição perfeita assegura-te e aumenta-te o estado de graça, apaga-te os pecados veniais que, pelo ato de contrição de caridade, detestaste; perdoa-te, sobretudo, as penas dos pecados, firmando e robustecendo-te no verdadeiro e sólido amor de Deus. Tais são as maravilhas que o amor e a misericórdia de Deus obram na alma do cristão pela contrição perfeita. Tão grandes são que, talvez, te pareçam incríveis; tratando-se do perigo de morte, já terás ouvido que se devem pedir a contrição e a dor; mas que também, em tempo de saúde e em qualquer tempo, a contrição perfeita obre tais maravilhas, mal te atreverás a acreditá-lo.

Será, pois, certa e segura esta doutrina da contrição perfeita? 

Digo-te que é tão firme e tão segura como a própria palavra de Deus. No Concilio ecumênico de Trento, onde a Igreja declarou e explicou os principais ensinamentos divinos que já eram correntes nela e eram combatidos por muitos hereges, diz-se na Sessão 14, cap. 4: 'A contrição perfeita, a contrição que procede do amor de Deus, justifica o homem e reconcilia-o com Deus ainda antes de receber o sacramento da Confissão'. Como o Concilio não diz que isto seja só em tempo de necessidade e em perigo de morte, segue-se que a contrição perfeita produz sempre este efeito. 

E, para o afirmar, apoia-se a Igreja na palavra e ensino de Jesus Cristo, que diz entre outras coisas: 'Se alguém me ama (e isto só o faz o que tem verdadeira contrição no coração), meu Pai o amará e Nós viremos a ele e faremos nele morada' (I Jo 14,23). Para que, porém, Deus possa habitar na alma, é preciso que o pecado tenha desaparecido; logo, o apagar o pecado é um dos efeitos da contrição perfeita, da contrição de caridade. Assim também o tem declarado sempre a Igreja infalível, chegando a condenar como herege, Baio, por dizer o contrário. O mesmo ensinam os Santos Padres e Doutores sagrados sem exceção e o mesmo confirma a razão, porque se, como já disse, tão grandes efeitos produzia a verdadeira contrição no Antigo Testamento, quando ainda imperava a lei do temor, quanto maior produzirá no Novo, em que impera a lei do amor!

Se a contrição perfeita destrói os pecados por que é necessário confessá-los depois? 

Sim, é verdade; a contrição perfeita faz o mesmo que a Confissão, faz com que desapareçam da alma os pecados; não o faz, porém, com independência do sacramento da Confissão, porque é necessário ter vontade de confessar mais tarde os pecados destruídos ou apagados pela contrição perfeita. E isto porque é lei de Jesus Cristo que se confessem todos os pecados, pelo menos todos os mortais, e esta lei, de forma alguma, se pode mudar. Verdade é que, se alguém não quisesse depois confessar os pecados que lhe foram perdoados pela contrição perfeita, não os contrairia novamente; mas é certo que perderia de novo o estado de graça, precisamente por faltar à obrigação de confessá-los.

É preciso confessar os pecados logo depois da contrição de caridade? 

A rigor, não é necessário; porém, de todo o coração, aconselho-te e recomendo-te que o faças; assim estarás mais seguro de ter alcançado o perdão e conseguirás, por sua vez, as grandes graças que traz consigo o sacramento da Confissão e que se chamam graças sacramentais. Talvez que alguém, tentado pelo demônio, vendo os grandes efeitos da contrição perfeita, diga: 'Pois se é tão fácil alcançar o perdão dos pecados com a contrição perfeita, já não preciso mais me confessar; peco quanto quiser, arrependo-me depois com contrição perfeita, e estou pronto. Não é assim?'

Não, de forma alguma; porque quem assim pensa não tem nem sombra de contrição. Não ama a Deus sobre todas as coisas logo que não queira em tudo e por tudo romper com o pecado mortal, nem trata seriamente de emendar a sua vida, coisa que tanto se requer para a Confissão como para a contrição perfeita; em uma palavra, falta-lhe boa vontade e, faltando-lhe esta, faltar-lhe-á a graça de Deus, sem a qual a contrição perfeita é absolutamente impossível. Poderá enganar-se a si mesmo, jamais, porém, enganará a Deus Nosso Senhor. 

Aquele que tem contrição perfeita, está inteiramente resolvido a romper com o pecado mortal; receberá logo que possa e com mais fervor do que dantes, os santos sacramentos, e com a sua boa vontade, ajudada da graça de Deus, conservar-se-á livre de pecado e se firmará mais e mais no feliz estado de filho de Deus. A quem, de modo especial, a contrição perfeita auxilia, é aos que leal e sinceramente querem adquirir e conservar o estado de graça e, sobretudo, aos que pecam por costume, isto é, aos que, ainda que tenham boa vontade, a força dos maus hábitos e a própria fraqueza os fazem cair de vez em quando; porém, de forma alguma, a contrição perfeita ajuda aos que se acolhem a ela para pecarem mais à vontade. 

E estes convertem o celestial remédio do perfeito arrependimento em narcótico fatal e em infernal veneno. Não sejas, pois, destes, leitor amado; não consintas, incauto, que graça tão preciosa como a contrição perfeita te sirva para o mal, senão para o bem, já que tão grandes bens produz na alma do cristão.

Por que é tão importante a contrição perfeita em vida? 

Porque não existe bem tão precioso quanto o estado de graça! A graça não adorna somente a alma, mas invade-a e penetra-a toda, e transforma-a em uma nova criatura, em filha de Deus e herdeira do céu. Além disso, faz com que todas as obras e trabalhos do cristão sejam meritórios para o Céu; a graça é a varinha mágica que tudo converte em ouro, porém em ouro de méritos celestiais. Pelo contrário, que triste é o estado do cristão que jaz em pecado! Todos os seus trabalhos, todas as suas orações, todas as suas boas obras ficam inúteis e sem mérito para o Céu; é inimigo de Deus e, no momento em que o tênue fio da vida se parta, cairá precipitado no inferno. 

Não será, pois, importante e necessário o estado de graça para o cristão? Pois, se o perdeste, podes recuperá-lo, principalmente de duas maneiras: (i) pela Confissão; (ii) pela contrição perfeita. A Confissão é o meio adequado e ordinário para alcançar a graça santificante. Como este meio, porém, nem sempre está ao nosso alcance, Deus deu-nos outro extraordinário, que é a contrição perfeita. Imagina que, um dia, tens a imensa desgraça de cometer um pecado mortal. Quando, passada a agitação do dia, vem o sossego da noite, a tua consciência angustiada levanta-se e clama com voz poderosa. 

Confessar-se agora... não é possível. Como remediar este estado? Pois olha, Deus põe em tuas mãos a chave de ouro que te vai abrir as portas do Céu; arrepende-te de teus pecados por verdadeiro amor de Deus, protesta-lhe firmemente não tornar a cometê-los, promete confessá-los quanto antes, e podes acreditar que estás reconciliado com Deus; deita-te tranquilo. Porém, se o cristão não conhece nem pratica a contrição perfeita, que triste estado o da alma! Em pecado mortal se deita e se levanta, e assim vive dois, três, quatro meses e mais, até a confissão seguinte. 

E talvez que, neste estado, continue por anos inteiros, sem que a profunda noite do pecado seja interrompida, nem um momento sequer, na sua alma pelos raios do sol da graça depois da Confissão. Triste estado! Viver quase sempre em pecado, inimigo de Deus, sem mérito para o Céu e em perigo de eterna condenação! Mais; quando alguém, antes de receber um sacramento, por exemplo, o da Confirmação, o do Matrimonio, se lembra de um pecado grave não perdoado, pode, pela contrição perfeita, fazer-se digno de receber o sacramento. Somente para a Comunhão, isso não basta; é necessária a Confissão. 

Também para o cristão que está em estado de graça, é importante o uso frequente da contrição perfeita. Antes de tudo, nunca podemos estar completamente seguros de que estamos em estado de graça. Porém, esta segurança aumenta e se confirma com cada ato de verdadeira contrição perfeita. Sucede, além disso, que alguém tenha dúvida sobre se consentiu em alguma tentação; estas dúvidas acovardam e desalentam a alma no caminho da virtude. Que há a fazer nestes casos? Examinar se consentimos ou não? Isso de nada aproveita. Excita-te à contrição perfeita e fica tranquilo. 

Porém, ainda que tivéssemos toda a certeza possível de que estamos em graça, que preciosa não é a contrição perfeita! Por cada ato de contrição perfeita, aumentamos este estado de graça na alma, e cada grau de graça vale mais do que todas as riquezas do mundo. Por cada ato de contrição perfeita e caridade, destroem-se os pecados veniais e as faltas que mancham a alma, e esta fica cada vez mais formosa diante de Deus. Por cada ato de contrição perfeita, são perdoadas as penas temporais dos pecados.

Por que é tão importante a contrição perfeita na morte? 

É importante sobretudo em perigo de morte repentina. Houve um grande incêndio numa cidade, e neste pereceram centenas de pessoas. Entre muitas que gemiam no pátio de uma casa, via-se um menino de doze anos que, de joelhos, pedia em voz alta a graça da contrição; explicou depois porque o fazia e suplicou que orassem com ele em voz alta. Talvez que, por seu intermédio, muitos daqueles infelizes se salvassem para sempre. Perigos como este sem conta te cercam e, quando menos o penses, podes ser vítima de uma desgraça repentina: podes, por exemplo, cair de uma árvore; podes ser atropelado por um carro na rua; podes ser surpreendido de noite, pelo fogo, na tua habitação; podes colocar mal o pé em uma escada; pode ser que, enquanto trabalhas, te falte repentinamente os sentidos e caias... levam-te moribundo à casa, vão a correr chamar o sacerdote; este, porém, tarda em chegar, e urge tanto!

Que fazer? Excita-te em seguida à contrição perfeita, arrepende-te por amor e gratidão para com Deus, e Jesus Cristo paciente salvar-te-á por toda a eternidade; a contrição perfeita terá sido para ti a chave do Céu no último momento e no último e supremo transe para a alma e para o corpo. Com isto, não desejo que alguém se aventure a deixar tudo para o último momento, à mercê de um ato de contrição perfeita, julgando ficar já por isso livre de pecado, pois é muito duvidoso que a contrição perfeita possa servir aos que têm pecado à sua sombra. 

O que deixo dito vale, antes de tudo e sobretudo, para os que têm boa vontade. Porém, haverá tempo em tais circunstâncias, para fazer um ato de contrição perfeita? Com a ajuda de Deus, sim; porque, para a contrição perfeita não se requer muito tempo, sobretudo quando antes, em tempo de saúde, nos temos exercitado nela; em um momento a podemos excitar e penetrar na alma. E como, em casos tão extraordinários, tem mais eficácia a graça de Deus, e o espírito, mais atividade no transe tremendo da morte, dos momentos se fazem horas. 

Lembra-te de que falo por experiência própria. Uma vez, a 20 de julho de 1886, estive em grande e terrível perigo de morte, seria coisa de oito ou dez segundos, o espaço para meio Pai-Nosso. Pois, em tão curto espaço de tempo, mil pensamentos cruzaram-se em minha mente; a minha vida inteira passou diante de minha alma, com rapidez incrível, e, atrás dela, o que seria de mim depois da minha morte; tudo isto, como disse, num espaço de tempo insignificante, o suficiente para meio Pai-Nosso. Por dita minha, porém, e grande favor de Deus, a quem rendo graças, não foi aquele momento para morte, mas sim para vida; do contrário, não teria podido escrever esta Chave de ouro. 

Pois, a primeira coisa que fiz, em tão terrível momento, foi o que, segundo o Catecismo, deve fazer todo o cristão em perigo de morte: excitar-se à contrição e recorrer a Deus pedindo-a e implorando-a a seu favor. E a verdade é que, naquela ocasião, creio que aprendi a amar e apreciar o valor da contrição perfeita; desde então tenho difundido, quanto me tem sido possível, o seu conhecimento e estima. E esta misericórdia, que podes exercitar na tua alma no último momento, podes exercitá-la também com os demais cristãos, teus irmãos. E quão triste é que, em tão apurado transe, não seja isto melhor compreendido! 

Acode muita gente, choram e gritam desordenadamente, e, sem saber que fazer, correm à procura do médico e do sacerdote, trazem todos os remédios que têm em casa e, entretanto, o enfermo agoniza, e, naqueles breves mas preciosos momentos, talvez não haja quem se compadeça da sua alma imortal e lhe proponha que faça um ato de contrição perfeita e o salve para sempre. Se te apresentar ocasião, vai com sossego e tranquilidade para o lado do moribundo ferido ou enfermo; se te for possível, põe-lhe o Crucifixo diante dos olhos e, com voz firme mas tranquila, pede-lhe que pense e repita com o coração o que tu vais rezar; e, feito isto, vai dizendo compassada e claramente o ato de contrição, ainda que te pareça que ele nada ouve nem entende. 

Com isto, terás feito uma obra sumamente boa e o moribundo te agradecerá eternamente no Céu. Sim, até mesmo a um herege, podes ajudar desta maneira em seus últimos momentos; não lhe fales, se queres, de Confissão, porém excita-o a que faça um ato de amor a Deus e a Jesus Crucificado e dize-lhe compassadamente o ato de contrição.

A contrição perfeita é a chave de ouro do Céu 

Cristão leitor, deixa que, olhando-te afetuosamente e apertando-te a mão, te diga de todo o coração e com a maior insistência: dá este prazer a Deus e à tua alma: faze devotadamente todas as noites, com tuas orações, um ato de contrição perfeita. Não deixes passar noite alguma sem exame de consciência e contrição, como não deixes passar manhã alguma sem purificar a intenção. Não pecarás, é claro, se o deixares de fazer alguma vez; porém tem por bom e saudável o conselho que te dou. 

E não me digas que isso de exame de consciência e contrição é coisa própria de sacerdotes e homens perfeitos e não para ti; não te escuses com o 'não tenho tempo'; quanto tempo julgas que é necessário? Meia hora? Não. Um quarto de hora? Também não; alguns poucos minutos bastam. Não costumas recitar algumas orações antes de te deitares? Pois, em seguida à tua pequena oração, pensa uns momentos nas faltas e pecados do dia que acaba de passar, e reza, pausadamente e com fervor, diante do Crucifixo, o ato de contrição. Depois podes recolher-te tranquilo. Deste ao Senhor as boas noites, e ele te respondeu: 'Boa noite, meu filho'. Ele perdoou-te misericordiosamente os teus pecados. Que te parece? Fá-lo desde esta noite e jamais te arrependerás. 

Se, nesta vida, tiveres a imensa desgraça de cometeres um pecado mortal, não permaneças mergulhado em tão grande miséria; levanta-te pela contrição perfeita, levanta-te imediatamente, ou, o mais tarde, logo que faças as tuas orações da noite; depois não demores muito em confessar-te. Finalmente, cristão da minha alma, mais tarde ou mais cedo, terás que morrer, e se, o que não te desejo, a morte te colhesse de improviso, já sabes onde está o remédio, já sabes onde está a chave do Céu. Chama imediatamente por Deus com íntima e perfeita contrição, e, se em vida te exercitares nela gostosa e devidamente, não te faltarão então tempo, vontade e graça de Deus para teres firme contrição perfeita, e a contrição perfeita te salvará. 

Porém, se antes de morrer, tens tempo para prevenir-te e preparar-te para o caminho da eternidade, que a última coisa que na terra penses e faças, com conhecimento, seja um ato de entranhado amor a Deus, teu Criador, teu Redentor, Salvador e Juiz; um ato de sincera e perfeita contrição de todos os pecados da tua vida. Feito isto, lança-te com confiança nos braços da misericórdia divina e Deus será para ti bondoso Juiz. 

Com isto, me despeço de ti, amado leitor; vê e faze o que neste livrinho tens lido. Ama e pratica a contrição perfeita, meio esplêndido de graça que a divina misericórdia põe em tuas mãos para saíres do pecado mortal em qualquer momento, e não só em perigo de morte; meio fácil, que tão grandes efeitos produz; meio supremo e único que, em caso de necessidade, salvará a tua alma; fonte, enfim, de graças na vida e na morte — verdadeira chave de ouro do Céu.

(Excertos da obra 'A Contrição Perfeita - Uma Chave de Ouro do Céu' do Pe. J.de Driesch, 1913).

segunda-feira, 10 de julho de 2017

LUZ NAS TREVAS DA HERESIA PROTESTANTE (XVI)

A 14ª objeção* do famoso repto protestante é a de citar um texto que prove que há mais de um mediador. Tal objeção denota de novo grande ignorância da Bíblia e da significação dos termos, e visa sobretudo atacar o culto da Santíssima Virgem Maria, invocada pelos católicos sob o título de medianeira. Demos-lhe, pois, a resposta clara e bíblica.

I. Cristo Mediador 

Só há um Deus, diz São Paulo, e só há um mediador entre Deus e os homens. Esta verdade é repetida diversas vezes pelo Apóstolo (Gl 3, 20; Hb 8, 6; 9, 15; 12, 24). E este mediador é Jesus Cristo feito Homem (1 Tm 2, 5). Eis a verdade básica, que os católicos e protestantes aceitam integralmente e sem discussão. Donde vem a discordância? Unicamente pela tendência perversa dos amigos protestantes, em quererem protestar, até nos pontos onde não há possibilidade de protesto, nem sombra de razão de protesto.

Nunca a Igreja Católica admitiu outro mediador entre Deus e os homens, senão Jesus Cristo; e isso pela razão admiravelmente exposta pelo Apóstolo: Cristo nos deu um novo testamento, mas, onde há um testamento, é necessário que intervenha a morte do testador; pois o testemunho não se confirma senão quanto aos mortos (Hb 9, 16-17). Tudo isso é positivo e claro. Por que então discutir? Cristo ofereceu-se, morreu derramando seu sangue divino e por isso é o mediador do novo testamento (Hb 9, 15).

Por que os católicos invocam a Imaculada Mãe de Jesus como medianeira das graças? Eis que a palavra medianeira, aplicada à Virgem Santa, levanta e exalta a natural aversão dos protestantes à mãe de Jesus. Não havia razão para isso, pois os católicos não perturbam em nada a ordem estabelecida e não pretendem, como julgam os amigos protestantes, colocar um outro mediador ao lado de Cristo. Tal asserção denota simplesmente uma ignorância estupenda ou, então, resolução de querer protestar, seja como for. Examinemos bem, pois, a tal mediação, atribuída à Virgem Maria.

II. Maria Santíssima Medianeira

O único mediador, entre Deus e os homens, é Jesus Cristo. Note bem, amigo protestante. Os católicos colocam aqui, a Virgem Santíssima, não diretamente entre Deus e os homens, mas sim entre Cristo e os homens, o que é essencialmente diferente. A teologia católica diz: Mediatrix ad Christum mediatorem: isto é, Medianeira junto a Cristo mediador. Deste modo, Cristo fica o único mediador entre Deus e os homens; e a Virgem Maria fica uma medianeira junto a Cristo; em outros termos: o mediador principal e perfeito é Cristo; sendo Maria Santíssima uma medianeira ministerial e dispositiva. 

Neste sentido, todos os santos são intercessores, medianeiros, junto a Cristo, sendo-o a Virgem Santa, pela sua qualidade de mãe de Deus, de um modo mais excelente e eficaz. Eis a doutrina muito simples e muito lógica. Deus, o Pai e Senhor de tudo. Jesus Cristo, único mediador entre Deus e os homens. Maria Santíssima, medianeira entre Cristo e os homens, de um modo mais excelente, mas na mesma ordem do que todos os santos.

III. A dupla mediação

Tal é a mediação particular da Virgem Santíssima. Ao lado desta mediação exerce ela ainda uma mediação geral, ao lado do mediador único, que é Jesus Cristo. Maria Santíssima é Medianeira entre Jesus Cristo e os homens; ela é também Medianeira entre Deus e os homens, desta vez ao lado do seu divino Filho. Esta segunda mediação resulta da unidade da obra redentora. A obra redentora – este ponto é o eixo sobre o qual giram todas as outras obras divinas – não é simplesmente a paixão e morte do Salvador, como o pensam os protestantes, mas é o conjunto de tudo o que se refere a ela, na preparação, na execução e na aplicação. A obra redentora, nos desígnios divinos, é uma só: é a nossa salvação por Jesus Cristo.

Estas três partes são, e devem ficar, inseparavelmente unidas, de tal modo que os elementos que constituem a primeira parte, devem encontrar-se na segunda e na terceira. Sendo certo que Maria teve a sua parte ativa, ao lado de Jesus, na obra redentora, pelo fato mesmo, ela deve ter parte na obra de nossa salvação e em todas as graças que nos são dadas, em vista do Redentor, pois tudo isso é uma única e mesma obra redentora.

E tudo isso é ligado à maternidade divina. E Maria, devendo ser a mãe de Jesus, o é necessariamente no Jesus inteiro, de Jesus como pessoa e como enviado de Deus. Pelo fato de sua cooperação na Encarnação, Maria Santíssima cooperou em nossa redenção e em nossa salvação. São estas as três partes constitutivas da obra redentora. Deste modo nós somos devedores a Maria de Jesus inteiro: é Jesus como resgate e como fonte do todas as graças.

Logo Deus, nos dando Jesus por Maria, dá-nos tudo por Maria; e ela se torna verdadeiramente associada à redenção, ou, em outros termos, co-redentora. A medianeira, ao lado de Jesus, entre Deus e os homens. Tal é a dupla mediação da Virgem Santíssima. Para refutar os erros protestantes a esse respeito, repitamos que isso não significa de modo algum que nós aceitamos um mediador ao lado do mediador único, ou que a mediação de Jesus nos parece insuficiente, ou que atribuímos qualquer coisa a Maria, fora de Jesus.

Nada de tudo isto. Maria está, ao lado de Jesus-mediador, para constituí-lo mediador perfeito, neste sentido que ela ocupa na mediação da vida a parte que Deus lhe outorgou; como Eva estava ao lado de Adão, na mediação da morte. Em ambos os sentidos aqui indicados, o nome de medianeira inclui para Maria Santíssima a dupla cooperação à obra redentora, acima exposta: cooperação pela sua ação na terra, cooperação pela sua intercessão no céu.

Estas duas mediações são universais, como é universal a mediação de Jesus, e se estendem a todas as gerações que nos são concedidas em vista de Jesus. Numa das orações da festa da medalha milagrosa, a Igreja adota integralmente esta opinião, dizendo: 'Senhor, Deus onipotente, que quisestes que recebamos todos os bens pela Mãe Imaculada de vosso Filho, concedei-nos, pelo auxílio de uma Mãe tão poderosa', etc. É o que a piedade cristã exprime neste axioma clássico: 'tudo por Jesus, nada sem Maria!'

IV. O necessário e o útil

Podíamos mostrar, com outros argumentos, a lógica e o fundamento desta mediação, dizendo que a mediação de Jesus Cristo é uma mediação necessária, e a da Virgem Santíssima, uma mediação útil. A seguinte comparação é de Carlos de Laet: podemos dizer que sem água não podemos viver: a água é, pois, necessária; porém, podemos ir buscar esta água ao longe, na fonte, como pode ser-nos transmitida por encanamento e chegar, deste modo, até dentro de casa, poupando-nos fadiga e tempo, para ir captá-la em cima dos montes. 

Tal encanamento não é necessário, porém é muito útil. Imagine-se agora que um homem venha dizer-nos: 'não vos é necessário tal encanamento; urge, pois, destruí-lo, porque necessário é só a nascente'. Que diria o meu amigo protestante a tal homem? Diria, de certo, o que o católico dirá: 'É verdade que só a água é necessária, porém o encanamento é de suma utilidade'. Eis o que ensina a Igreja Católica: só a mediação de Cristo é necessária, mas a da Virgem Santa é sumamente útil. Cristo é a nascente, a fonte; Maria Santíssima é o canal, que nos transmite a água cristalina da graça divina: Aquaeductus gratiarum, como dizem os teólogos e os santos padres.

V. Outra comparação

Suponhamos, amigo protestante, que o presidente da república governasse só a nossa pátria, auxiliado por um ministro de confiança, por cujas mãos passassem todas as nomeações e cargos inferiores. Tal ministro será, deste modo, o único mediador entre o presidente e o povo. Suponhamos que tal ministro tenha junto a si a sua própria mãe, a quem muito estima, sem que ela tome parte na direção dos negócios públicos. Um belo dia, eis que o amigo protestante precisasse de um emprego, de um favor qualquer. Que faria o amigo? 

Usaria de um pouco de diplomacia, e podendo entrar em relação com mãe do ministro, falaria com ela, para que intercedesse junto ao filho, a fim de alcançar-lhe o benefício almejado. Não seria isso lógico, natural? E podia o ministro ficar ofendido por não ter o suplicante recorrido a ele? De certo que não. Ao contrário, o pedido do amigo protestante, apresentado ao ministro pela própria mãe deste, adquiria duplo valor: o do pedido e o da intercessão.

Ainda assim fazem os católicos. Reconhecem que Deus é a fonte e o autor de todo o bem; reconhecem que Jesus Cristo é o único mediador necessário, mas reconhecem que, junto a ele, tem um valor extraordinário a sua Santíssima Mãe, e recorrem a ela como medianeira secundária de grande utilidade para que interceda por eles junto ao seu divino Filho.

VI. Conclusão

Está vendo, caro amigo protestante, que é inútil citar trechos da Bíblia, para provar uma verdade que a Igreja Católica reconhece e aceita. É inútil refutar objeções, que só existem na cabeça daqueles que a fabricam, sem indagar ou saber o que eles objetam, se existe ou tem, pelo menos, qualquer razão de existir. Que serve provar que o Sol existe, quando ninguém nega a sua existência?

Por que atribuir à Igreja Católica erros que ela não possui ou doutrinas que ela não professa? Tudo isso, de novo, mostra ou uma ignorância sem igual, ou então uma leviandade sem nome. Peço, pois, reter bem esta conclusão, que o Senhor quer provar sem que ninguém o negue: 'só há um Deus, e só há um mediador entre Deus e os homens, o qual é Jesus Cristo' (1 Tim 2, 5). Os santos, por serem amigos de Deus, são intercessores junto de Deus, porém secundariamente.

Acima de todos os santos, elevada pela sua dignidade de Mãe de Deus, está a Virgem Santíssima, verdadeira medianeira entre Jesus e os homens, medianeira entre Deus e os homens, pois o seu Filho é Deus; porém medianeira secundária, não absolutamente necessária, mas sumamente útil para nós homens. Eis porque os católicos têm em vista apresentarem-se a Jesus Cristo, acompanhados pela Virgem Santa, para, deste modo, dar mais valor às suas preces e serem mais bem acolhidos pelo único mediador necessário, isto é, Cristo Jesus, o Filho de Maria. Como isto é lógico, suave, consolador e, sobretudo, esperançoso!

* Estas 'objeções' foram propostas por 'um crente' como um desafio público ao Pe. Júlio Maria e que foi tornado público durante as festas marianas de 1928 em Manhumirim, o que levou às refutações imediatas do sacerdote, e mais tarde, mediante a inclusão de respostas mais abrangentes e detalhadas, na publicação da obra 'Luz nas Trevas - Respostas Irrefutáveis às Objeções Protestantes', ora republicada em partes neste blog.

(Excertos da obra 'Luz nas Trevas - Respostas Irrefutáveis às Objeções Protestantes', do Pe. Júlio Maria de Lombaerde)

domingo, 9 de julho de 2017

AOS MANSOS E HUMILDES DE CORAÇÃO

Páginas do Evangelho - Décimo Quarto Domingo do Tempo Comum


Deus prometeu as alegrias eternas aos que são mansos e humildes de coração: 'Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração' (Mt 11, 29). Estes serão chamados realmente de Filhos de Deus: 'Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus' (Mt 5,9). Eis a virtude da excelência cristã, chamada Virtude do Cordeiro - a amada virtude de Jesus Cristo. Porque, como um cordeiro sem ira e sem queixa alguma, Ele suportou as dores de Sua Paixão e Crucificação, como exemplo a ser seguido. Bem aventurados os que se submetem pacificamente a todas as cruzes, infortúnios, perseguições e injúrias desta vida! 

São estes os chamados 'pequeninos' por Jesus, diante os 'sábios' e 'entendidos' do mundo. O entendimento e a sabedoria, o estudo e a cultura geral, são valores essencialmente bons e agradáveis a Deus, desde que não se transformem em orgulho humano e em pilares da soberba científica. Entendimento e sabedoria são frutos da graça divina, dadas ao homem para a ascensão ao encontro da glória de Deus, e não como compartimentos ou domínios fechados da jactância humana. Deus fecha a estes o caminho das grandes revelações sobrenaturais.

Jesus chama a todos, para a conversão perfeita dos humildes de coração: 'Vinde a mim, todos vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e eu vos darei descanso' (Mt 11, 28). Chama todos a Ele, todos os que estão curvados pelas cruzes do mundo, pelos infortúnios da vida, pelo peso do pecado. As instabilidades e as misérias da vida quebrantam a nossa fé e fazem oscilar a nossa vocação cristã em meio às vertigens do mundo; a Cruz de Cristo é a luz que nos permite emergir da escuridão e das trevas do pecado.

Humildade e mansidão são os frutos da fé e da generosidade despojada daqueles que seguem a Jesus: 'Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração' (Mt 11, 29). O caminho da santificação é talhado pela prática destas virtudes e, por meio delas, encontraremos o descanso, a paz e as alegrias eternas, como pequeninos acolhidos às graças do Senhor: 'o meu jugo é suave e o meu fardo é leve' (Mt 11, 30).

sábado, 8 de julho de 2017

SOBRE A VIRTUDE DA PACIÊNCIA

Paciência é a virtude pela qual suportamos os infortúnios deste mundo com tranquilidade de espírito, para que, em razão deles, não fiquemos desnecessariamente perturbados ou entristecidos interiormente e não nos permitamos fazer nada de errado ou de inadequado. As adversidades desta vida que a paciência suporta são doenças, desterros, angústia psicológica, desgraça, escárnio, maltrato, insultos, calúnias, reprimendas, fome, sede, frio, as mortes dos pais e dos filhos, dos parentes e dos amigos, massacres e calamidades públicas, e outras coisas da mesma espécie que geralmente ocorrem todos os dias. 

A longanimidade é a parte da paciência que fortalece o espírito contra o aborrecimento ocasionado pela demora em receber algo que esperamos. Ela difere da paciência por suportar males por um longo tempo e aguardar consolação postergada por muitos dias, meses e anos. Assim Deus é chamado longânime, porque Ele tolera nossas demoras e hesitações enquanto nos convida ao arrependimento. Também a equanimidade não é uma virtude distinta da paciência, embora seja considerada especialmente voltada a moderar o aborrecimento que advém da perda de bens exteriores.

A matéria próxima com que a paciência se ocupa é a aflição da mente e a tristeza por conta dos reveses enumerados acima: essa virtude as reprime por inteiro ou então as controla tanto, que elas não excedem as exigências da reta razão. Desta forma, as principais ações da paciência são:

(i) Suportar todas as sobreditas adversidades calmamente, de bom grado, com ânimo e em ação de graças, e sem nenhuma murmuração ou queixa.
(ii) Suportar esses males mesmo não tendo culpa, e mesmo que nos sejam infligidos por aqueles que receberam muitos benefícios de nós.
(iii) Atribuir todos os nossos problemas e dificuldades unicamente à vontade Divina, não importa por intermédio de quem provenham.
(iv) Sempre que estivermos feridos ou irritados, voltarmo-nos para Jesus Crucificado como estando presente, buscando obter dEle a paciência e oferecendo a Ele tudo o que sofremos.
(v) Oferecer-se a si próprio, bem no começo de todas as manhãs, a Deus para sofrer não importa o quê, e para suscitar um desejo ardente na alma de sofrer todos os males possíveis em imitação de Cristo.

Nós temos muitas ocasiões para exercitar a paciência a quase todo momento, suportando os males e perdas que nos acometem com respeito a nossa boa reputação, vida e bens exteriores. Os sinais da paciência são:

(i) Suportar com calma as imperfeições dos outros.
(ii) Não ceder ao rancor quando maltratado pelo próximo.
(iii) Não murmurar contra as punições divinas.
(iv) Não evitar a companhia daqueles que cometem injustiça contra nós, mas antes ir ao seu encontro, ter amor por eles e por eles rezar.
(v) Em alguma enfermidade, rezar a Deus que aumente nosso sofrimento.
(vi) Manter silêncio em meio às injustiças, não se desculpar, mas entregar tudo nas mãos de Deus a exemplo de Nosso Senhor, que mesmo quando convocado a se defender preferiu permanecer em silêncio.

Agora, quem não faria tudo o que está em seu poder para exercer essa virtude com máximo cuidado, considerando a paciência e longanimidade de Deus, que não somente tolera os pecadores com benevolência, mas não cessa de cobri-los com os maiores benefícios? E a vida de Cristo e sua amaríssima paixão não proporcionam o exemplo supremo de paciência?

Nem deve ser preterido o exemplo dos santos do Antigo e do Novo Testamentos, principalmente de Jó e Tobias e dos incontáveis mártires. Ademais, quem quer que considere atentamente os inomináveis tormentos do inferno, de que tão frequentemente escapou por conta da infinita misericórdia de Deus, não considerará os aborrecimentos desta vida, não importa quão graves e dolorosos sejam, como de nenhuma importância, e até os tratará como prazeres?

Finalmente, como diz o Apóstolo, 'a paciência vos é necessária' (Hb 10,36), pois ela fortalece a fé, governa a paz, auxilia o amor, instrui a humildade, excita o arrependimento, faz satisfação pelos pecados, ata a língua, refreia a carne, resguarda o espírito, aperfeiçoa todas as virtudes e dota-nos, ao fim desta vida, com a bem-aventurada imortalidade: 'Porque agora o que é para nós uma tribulação momentânea e ligeira, produz em nós um peso eterno de uma sublime e incomparável glória' (2 Cor 4,17).

(Excertos traduzidos da obra 'Textbook Of The Spiritual Life' do Pe. Charles Joseph Morotius, texto publicado originalmente no site confrarianossasenhoradocarmo)