terça-feira, 22 de março de 2016

A CRUZ DE CRISTO - MEDIDA DO MUNDO (I)


Grande número de homens vive e morre sem jamais ter refletido sobre a situação em que se encontra. Aceitam o lhes chega e seguem as suas inclinações até onde as suas oportunidades lhe permitem. Guiam-se principalmente pelo prazer e pela dor, não pela razão, pelos princípios ou pela consciência. Também não tentam interpretar este mundo, determinar o que significa ou reduzir o que vêem e sentem a um sistema. Mas, quando começam a contemplar a situação aparente em que nasceram – quer pela sua mente reflexiva, quer por curiosidade intelectual – logo chegam à conclusão de que é um labirinto e uma perplexidade. É um enigma que não conseguem resolver. Parece cheia de contradições e desprovida de qualquer desígnio. O que é, como proceder nela, como é o que é, de que modo se pode começar a entendê-la, qual é o nosso destino, tudo são mistérios.

Mergulhados nessa dificuldade, alguns compuseram uma filosofia de vida e outros, outra, pensando ter descoberto a chave que lhes permitiria ler aquilo que é tão obscuro. Dez mil coisas passam diante de nós, uma após a outra, ao longo da vida: que devemos pensar delas? Que cor atribuir-lhes? Devemos vê-las de maneira alegre e gozosa? Ou de maneira melancólica? De maneira desalentada ou esperançosa? Devemos tomá-las levianamente ou conferir gravidade a cada assunto? Devemos tornar maiores as coisas de pouca importância ou tirar peso às de grande importância? Guardar na mente o que foi e passou, olhar para o futuro ou deixar-nos absorver pelo presente?

Como devemos olhar as coisas? Esta é a pergunta que todas as pessoas reflexivas fazem a si mesmas, e cada uma lhe responde a seu modo. Desejam pensar por meio de regras, mediante algo que esteja dentro delas e ao mesmo tempo lhes permita harmonizar e ajustar o que está fora. Essa é a necessidade experimentada pelas mentes reflexivas. Agora, permiti-me que pergunte: Qual é a chave real, qual a interpretação cristã deste mundo? Qual o critério que a Revelação nos dá para avaliar e medir este mundo? E a resposta é: o grande acontecimento deste tempo litúrgico, a Crucifixão do Filho de Deus.

A morte do Verbo eterno de Deus feito carne é a nossa grande lição quanto ao modo como devemos pensar e falar deste mundo. A sua Cruz atribuiu a tudo o que vemos o seu devido peso, a todas as riquezas, a todos os benefícios, a todas as categorias, a todas as distinções, a todos os prazeres; à concupiscência da carne, à concupiscência dos olhos e à soberba da vida. Pesou todas as emoções, as rivalidades, as esperanças, os medos, os desejos, os esforços e os triunfos do homem mortal. Deu significado ao instável e vacilante percurso da vida terrena, às suas provações, tentações e sofrimentos. Reuniu e tornou consistente tudo o que parecia discorde e sem propósito. Ensinou-nos como viver, como usar deste mundo, o que aguardar, o que desejar, o que esperar. É a melodia em que se reúnem e harmonizam todas as dissonâncias da música deste mundo.

Olhai à vossa volta e vede o que o mundo vos apresenta tanto de alto como de baixo. Ide à corte dos príncipes. Vede a riqueza e a arte de todas as nações reunidas para honrar o filho de um homem. Observai como os muitos se prostram diante dos poucos. Considerai as formalidades e o cerimonial, a pompa, o luxo, o esplendor – e a vanglória. Quereis saber o valor de tudo isso? Olhai para a Cruz de Cristo. Ide ao mundo da política: vede a inveja que opõe nação a nação, a competição entre uma economia e outra, exércitos e frotas enfrentados uns com os outros. Examinai os diversos estamentos da sociedade, os seus partidos e as suas contendas, as aspirações dos ambiciosos e as intrigas dos astutos. Qual é o fim de toda essa agitação? A sepultura. Qual é a sua medida? A Cruz.

Ide também ao mundo do intelecto e da ciência: considerai as maravilhosas descobertas feitas pela mente humana, a variedade de artes que essas descobertas fizeram surgir, os quase milagres pelas quais demonstra o seu poder, e considerai a seguir o orgulho e a autoconfiança da razão, e a absorção do pensamento em objetos transitórios, que é a sua conseqüência. Quereis julgar retamente tudo isso? Olhai para a Cruz.

Mais ainda: vede a miséria, vede a pobreza e a indigência, vede a opressão e o cativeiro; ide para onde o alimento é escasso e a moradia insalubre. Considerai a dor e o sofrimento, as doenças longas ou agudas, tudo o que é pavoroso e repugnante. Quereis saber que peso têm todas essas coisas? Olhai para a Cruz. Por isso, todas as coisas convergem para a Cruz – e para Aquele que dela pende – todas as coisas lhe estão subordinadas, todas as coisas necessitam dela. É o seu centro e a sua interpretação. Pois Ele foi levantado sobre ela para que pudesse atrair a si todos os homens e todas as coisas.

Mas, dir-nos-ão, a perspectiva da vida humana e do mundo que a Cruz de Cristo nos confere não é a que teríamos por nós mesmos; que não é um modo de ver evidente por si mesmo; as coisas são muito mais claras e ensolaradas do que nos parecem à luz da Quaresma. O mundo parece ter sido feito precisamente para que um ser como o homem desfrute dele, e o homem foi posto neste mundo; o homem tem a capacidade de desfrutar, e o mundo lhe fornece os meios de fazê-lo.

Que modo de pensar tão natural, que filosofia simples e ao mesmo tempo agradável! Mas, como é diferente da filosofia da Cruz! A doutrina da Cruz, poder-se-ia dizer, desarranja as duas partes de um sistema que parecem ter sido feitas uma para outra; separa o fruto de quem o come, o prazer de quem o desfruta. Que problema soluciona? Não será que antes cria um problema?

Respondo, em primeiro lugar, que seja qual for a força desta objeção, não faz senão repetir aquilo que Eva sentiu e Satanás incitou no Éden. Não viu a mulher que o fruto proibido era 'bom para comer' e 'de aspecto desejável'? Será então de estranhar que também nós, os descendentes do primeiro casal, nos encontremos num mundo onde há um fruto proibido, e que as nossas tentações consistam em que ele esteja ao nosso alcance e que a nossa felicidade consista em usufruirmos dele? O mundo, à primeira vista, parece feito para o prazer, e o conhecimento da Cruz de Cristo é uma visão solene e triste que interfere com essa aparência. Seja; mas não consistirá o nosso dever em que nos abstenhamos desse prazer, se era um dever até no Éden?

Mais ainda: dizer que esta vida está feita para o prazer e para a felicidade é encarar de maneira extremamente superficial as coisas. Para aqueles que olham além da superfície, este mundo conta uma história muito diferente. No fim das contas, a doutrina da Cruz somente nos ensina – embora de maneira infinitamente mais contundente – a mesmíssima lição que este mundo ensina àqueles que nele vivem longo tempo, que dele adquirem muita experiência, que o conhecem. O mundo é doce aos lábios, mas amargo ao paladar. Agrada no começo, mas não no fim. Parece alegre por fora, mas o mal e a miséria estão ocultos nele.

Quando um homem passou pelo mundo um certo número de anos, exclama como o autor do Eclesiastes: 'Vaidade das vaidades, tudo é vaidade' (Ecl 1, 2). Mais: se não tiver a religião cristã por guia, terá de ir além e dizer: 'Tudo é vaidade e descontentamento do espírito' (Ecl 6, 2); tudo é desapontamento, tudo é tristeza, tudo é dor. As dolorosas sentenças que Deus pronuncia contra o pecado estão embutidas no mundo e obrigam o homem a afligir-se, quer queira quer não. Portanto, a doutrina da Cruz de Cristo apenas antecipa a nossa experiência do mundo. É verdade que nos exorta a chorar os nossos pecados no meio de tudo o que sorri e brilha ao nosso redor; mas, se não lhe fizermos caso, acabaremos por chorá-los quando estivermos submetidos ao seu terrível castigo. Se não reconhecermos que este mundo se tornou miserável por causa do pecado, olhando para Aquele sobre quem os nossos pecados recaíram, acabaremos por sentir a miséria deste mundo quando as consequências dos nossos pecados recaírem sobre nós.

Temos de reconhecer, pois, que a doutrina da Cruz não se encontra à superfície do mundo, pois a superfície das coisas é meramente brilhante, e a Cruz é triste. É uma doutrina escondida, encontra-se sob um véu. Amedronta-nos à primeira vista, e sentimo-nos tentados a revoltar-nos contra ela. Tal como São Pedro, exclamamos: 'Que Deus não o permita, Senhor! Isto não te acontecerá!' (Mt 16, 22). No entanto, é uma doutrina verdadeira, pois a verdade não se encontra à superfície das coisas, mas nas suas profundezas.

(Sermão do Sexto Domingo da Quaresma - Parte I, pelo Cardeal John Henry Newman)

segunda-feira, 21 de março de 2016

O SILÊNCIO DE JESUS

Uma antiga lenda norueguesa narra este episódio sobre um homem chamado Haakon, que cuidava de uma ermida à qual muita gente vinha orar com devoção. Nesta ermida havia uma cruz muito antiga e muitos vinham ali para pedir a Cristo que fizesse algum milagre.

Certo dia, o eremita Haakon quis também pedir-lhe um favor. Impulsionava-o um sentimento generoso. Ajoelhou-se diante da cruz e disse: 'Senhor, quero padecer por vós. Deixai-me ocupar o vosso lugar. Quero substituir-vos na Cruz'. E permaneceu com o olhar pendente da cruz, como quem espera uma resposta.

O Senhor abriu os lábios e falou. As suas palavras caíam do alto, sussurrantes e admoestadoras: 'Meu servo, concedo o teu desejo, mas com uma condição' – 'Qual é, Senhor?' - perguntou Haakon com acento suplicante - 'É uma condição difícil? Estou disposto a cumpri-la com a tua ajuda!'

'Escuta-me: Aconteça o que acontecer, e possas ver o que vires, deves guardar sempre o silêncio'. Haakon respondeu: 'Prometo-o, Senhor!' E fizeram a troca sem que ninguém o percebesse. Ninguém reconheceu o eremita pendente da cruz; quanto ao Senhor, ocupava o lugar de Haakon. Durante muito tempo, este conseguiu cumprir o seu compromisso e não disse nada a ninguém.

Certo dia, porém, chegou um rico. Depois de orar, deixou ali esquecida a sua bolsa. Haakon viu-o e calou. Também não disse nada quando um pobre, que veio duas horas mais tarde, se apropriou da bolsa do rico. E também não quando um rapaz se prostrou diante dele pouco depois para pedir-lhe a sua graça antes de empreender uma longa viagem. Nesse momento, porém, o rico tornou a entrar em busca da bolsa. Como não a encontrasse, pensou que o rapaz é que teria se apropriado dela; voltou-se para ele e o interpelou com raiva: 'Dá-me a bolsa que me roubaste!' O jovem, surpreso, replicou-lhe: 'Não roubei nenhuma bolsa!' - 'Não mintas; devolve-a já!' - 'Repito que não apanhei nenhuma bolsa!'

O rico arremeteu furioso contra ele. Soou então uma voz forte: 'Pára!' O rico olhou para cima e viu que a imagem lhe falava. Haakon, que não conseguira permanecer em silêncio diante daquela injustiça, gritou-lhe, defendeu o jovem e censurou o rico pela falsa acusação. Este ficou aniquilado e saiu da ermida. E o jovem saiu também porque tinha pressa para empreender a sua viagem.

Quando a ermida ficou vazia, Cristo dirigiu-se ao seu servo e lhe disse: 'Desce da Cruz. Não serves para ocupar o meu lugar. Não soubeste guardar silêncio' – 'Mas, Senhor, como podia eu permitir essa injustiça?' Trocaram de lugar. Cristo voltou a ocupar a cruz e o eremita permaneceu diante dela.

O Senhor continuou a falar-lhe: 'Tu não sabias que era conveniente para o rico perder a bolsa, pois trazia nela o preço da virgindade de uma jovem. O pobre, pelo contrário, tinha necessidade desse dinheiro e fez bem em levá-lo; quanto ao rapaz, receberia alguns golpes fortes e suas feridas o teriam impedido de fazer a viagem que, para ele, seria fatal: há alguns minutos o seu barco soçobrou e ele se afogou. Tu também não sabias disto; mas eu sim. E por isso me calo'. E o Senhor tornou a guardar silêncio.

Muitas vezes nos perguntamos por que Deus não nos responde. Por que Deus se cala? Muitos de nós quereríamos que nos respondesse o que desejamos ouvir, mas Ele não o faz: responde-nos com o silêncio. Deveríamos aprender a escutar esse silêncio. O Divino Silêncio é uma palavra destinada a convencer-nos de que Ele, sim, sabe o que faz. Com o seu silêncio, diz-nos carinhosamente: 'Confia em mim, pois sei o que é preciso ser feito!'


(Autor Desconhecido)

domingo, 20 de março de 2016

HOSANA AO FILHO DE DAVI!

Páginas do Evangelho - Domingo de Ramos


No Domingo de Ramos, tem início a Semana Santa da paixão, morte e ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. Jesus entra na cidade de Jerusalém para celebrar a Páscoa judaica com os seus discípulos e é recebido como um rei, como o libertador do povo judeu da escravidão e da opressão do império romano. Mantos e ramos de oliveira dispostos no chão conformavam o tapete de honra por meio do qual o povo aclamava o Messias Prometido: 'Hosana ao Filho de Davi: bendito seja o que vem em nome do Senhor, o Rei de Israel; hosana nas alturas'.

Jesus, montado em um jumento, passa e abençoa a multidão em polvorosa excitação. Ele conhece o coração humano e pode captar o frenesi e a euforia fácil destas pessoas como assomos de uma mobilização emotiva e superficial; por mais sinceras que sejam as manifestações espontâneas e favoráveis, falta-lhes a densidade dos propósitos e a plena compreensão do ministério salvífico de Cristo. Sim, eles querem e preconizam nEle o rei, o Ungido de Deus, movidos pelas fáceis tentações humanas de revanche, libertação, glória e poder. Mas Jesus, rei dos reis, veio para servir e não para reinar sobre impérios forjados pelos homens. '... meu reino não é deste mundo' (Jo 18, 36). Jesus vai passar no meio da multidão sob ovações e hosanas de aclamação festiva; Jesus vai ser levado sob o silêncio e o desprezo de tantos deles, uns poucos dias depois, para o cimo de uma cruz no Gólgota.

Neste Domingo de Ramos, o Evangelho evoca todas as cenas e acontecimentos que culminam no calvário de Nosso Senhor Jesus Cristo: os julgamentos de Pilatos e Herodes, a condenação de Jesus, a subida do calvário, a crucificação entre dois ladrões e a morte na cruz...'Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito' (Lc 23,46). E desnuda a perfídia, a ingratidão, a falsidade e a traição dos que se propõem a amar com um amor eivado de privilégios e concessões aos seus próprios interesses e vantagens. 

A fé é forjada no cadinho da perseverança e do despojamento; sem isso, toda crença é superficial e inócua e, ao sabor dos ventos, tende a se tornar em desvario. Dos hosanas de agora ao 'Crucifica-O! Crucifica-O!' (Lc 23, 20) de mais além, o desvario humano fez Deus morrer na cruz. O mesmo desvario, o mesmo ultraje, a mesma loucura que se repete à exaustão, agora e mais além no mundo de hoje, quando, em hosanas ao pecado, uma imensa multidão, em frenesi descontrolado, crucifica Jesus de novo em seus corações! 

sábado, 19 de março de 2016

SENHOR DOS PASSOS


Nosso Senhor dos Passos é a devoção celebrada pela Santa Igreja, desde a Idade Média, em memória à Via Crucis percorrida por Jesus na sua Paixão e Morte no Calvário. Jesus é representado com a cruz às costas, símbolo maior da fé cristã: pela cruz, fomos resgatados do pecado; pela cruz, nos foi legada a salvação da humanidade. A devoção teve início com a visita dos cruzados aos lugares santos do caminho para o Calvário percorrido por Jesus, fixados nas 14 estações da Via sacra, no século XVI:

I. Jesus é condenado à morte
II. Jesus carrega a Cruz às costas
III. Jesus cai pela primeira vez
IV. Jesus encontra a sua Mãe
V. Simão Cirineu ajuda Jesus a carregar a Cruz
VI. Verônica limpa o rosto de Jesus
VII. Jesus cai pela segunda vez
VIII. Jesus encontra as mulheres de Jerusalém
IX. Terceira queda de Jesus
X. Jesus é despojado de suas vestes
XI Jesus é pregado na Cruz
XII. Morte de Jesus na Cruz
XIII. Descida do corpo de Jesus da Cruz
XIV. Sepultamento de Jesus

Neste tempo da Quaresma e às vésperas da Semana Santa, esta devoção é comumente celebrada sob a forma de duas procissões distintas:

(i) a primeira é a chamada 'Procissão do Depósito' (comumente realizada no 'Sábado dos Passos', que antecede o Domingo de Ramos), em que a imagem velada de Nosso Senhor dos Passos é conduzida até uma determinada igreja (procissão similar é comumente realizada no dia anterior, com a imagem de Nossa Senhora das Dores);

(ii) a segunda é a chamada 'Procissão do Encontro', na qual a imagem do Senhor dos Passos é levada ao encontro de sua Mãe Santíssima (representada em outra procissão, vinda de direção diferente, como Nossa Senhora das Dores), que haviam sido previamente encerradas em igrejas próximas, pelas respectivas procissões de depósito.

A procissão do encontro, em muitas regiões, acontece na Quarta-feira Santa à noite; em outras, é comumente realizada na tarde do Domingo de Ramos. De acordo com uma tradição muito antiga, são as mulheres que devem fazer a procissão que conduz a imagem de Nossa Senhora das Dores, com cantos penitenciais e com figuras bíblicas representando Maria Madalena, Verônica e outras mulheres que acompanharam a caminhada de Jesus para o Calvário. A outra procissão fica ao encargo dos homens, que carregam a imagem do Senhor dos Passos, figura de Jesus Cristo coroado de espinhos e carregando uma cruz. 

As duas procissões, convergem, então, para o local do encontro, onde é proferido o chamado 'Sermão do Encontro', no qual são relembrados os fatos ocorridos na Sexta-feira Santa e se recorda as dores de Nossa Senhora e o sofrimento de Jesus, conclamando o povo à penitência e à conversão. Nesta exortação, o pregador proclama o chamado 'Sermão das Sete Palavras', alusão direta às sete breves frases pronunciadas por Jesus durante a sua crucificação: 

1. 'Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem' (Lc 23,34 a);
2. 'Hoje estarás comigo no paraíso' (Lc 23,43);
3. 'Mulher eis aí o teu filho, filho eis aí a tua mãe' (Jo 19,26-27);
4. 'Meu Deus, Meu Deus, porque me abandonastes?!' (Mc 15,34);
5. 'Tenho sede' (Jo 19,28 b);
6. 'Tudo está consumado' (Jo 19,30 a);
7. 'Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito' (Lc 23,46 b).

Após o sermão, Verônica entoa um hino e mostra a toalha ensanguentada com a face de Cristo. A parte final da procissão consiste na condução conjunta de ambas as imagens até um destino final, representando os Passos da Paixão no caminho do Calvário. O evento é, então, finalizado, com o chamado 'Sermão do Calvário', que proclama as dores e sofrimentos de Jesus ao longo de sua condenação, paixão, crucificação e morte na cruz.

ORAÇÕES A NOSSO SENHOR DOS PASSOS

'Ó Jesus, relembro tua Paixão, teu Calvário e tuas dores. Olhando as imagens do Senhor carregando a Cruz, imagens com as quais te invocamos sob o título de Nosso Senhor dos Passos e veneramos como símbolos de teu sacrifício e representação de teu ato de amor salvífico, que foi teu sacrifício na cruz, te pedimos como teu discípulo Pedro: Senhor, salva-nos! Salva-nos por tua Cruz, salva-nos por teu sangue; salva-nos por tua misericórdia; salva-nos por teu amor e cura-nos de nossas feridas tanto físicas quanto espirituais, emocionais e psíquicas. Amém'.

'Meu Jesus, Senhor dos Passos, açoitado, coroado de espinhos, escarnecido e cuspido, condenado à morte, carregado com a cruz, caído por terra, pregado no madeiro! Vós sois a Vítima das nossa iniquidades. Eu quero acompanhar os vossos dolorosos passos rumo ao Calvário, em cujo cimo consumiu-se a vossa vida. Mas, do vosso sacrifício, brotou a nossa salvação. Senhor dos Passos, perdoai as minhas maldades e apagai os pecados de todo o mundo. Meu Jesus, Senhor dos Passos, tende piedade de nós. Amém'.

19 DE MARÇO - SÃO JOSÉ


São José, esposo puríssimo de Maria Santíssima e pai adotivo de Jesus Cristo, era de origem nobre e sua genealogia remonta a David e de David aos Patriarcas do Antigo Testa­mento. Pouquíssimo sabemos da vida de José, além de suas atividades de carpinteiro em Nazaré. Mesmo o seu local de nascimento é ignorado: poderia ser Nazaré ou mesmo Belém, por ter sido a cidade de Davi. Ignora-se igualmente a data e as condições da morte de São José, mas existem fortes razões para afirmar que isso deve ter ocorrido an­tes da vida pública de Jesus. Com certeza, José já teria falecido quando da morte de Jesus, uma vez que não se explicaria, então, a recomendação feita aos cuidados mútuos à mãe e ao filho, dados, da cruz,  por Jesus a Maria e a São João Evangelista.

Não existem quaisquer relíquias de São José e se desconhece o local do seu sepultamento. Muitos pais da Igreja defendiam que, devido à sua missão e santidade, São José, a exemplo de São João Batista, teria sido consagrado antes do nasci­mento e já gozava de corpo e alma da glória de Deus no céu, em com­panhia de Jesus e sua santíssima Esposa. As virtudes e as graças concedidas a São José foram extraordinárias, pela enorme missão a ele confiada pelo Altíssimo. A dig­nidade, humildade, modéstia e pobreza, a amizade íntima com Je­sus e Maria e o papel proeminente no plano da Redenção, são atributos e méritos extraordinários que lhe garantem a influência e o poder junto ao tro­no de Deus. Pedir, portanto, a intercessão de São José, é garantia de ser ouvido no mais alto dos céus. Santa Tereza, ardorosa devota de São José, dizia: 'Não me lembro de ter-me dirigido a São José sem que tivesse obtido tudo que pedira'.

A devoção a São José na Igreja Ca­tólica é antiquíssima. A Igreja do Oriente celebra-lhe a festa, desde o século nono, no domingo depois do Natal. Foram os carmelitas que in­troduziram esta solenidade na Igreja Ocidental; os franciscanos, já em 1399, festejavam a comemoração do Santo Pa­triarca. Xisto IV inseriu-a no bre­viário e no missal; Gregório XV ge­neralizou-a em toda a Igreja. Cle­mente XI compôs o ofício, com os hinos, para a celebração da Festa de São José em 19 de março e colocou as missões na China sob a proteção do Santo. Pio IX introdu­ziu, em 1847, a festa do Patrocínio de São José e, em 1871, declarou-o Pa­droeiro da Igreja; muitos pontífices promoveram solenemente a devoção a São José, por meio de orações, homilias, encíclicas e devoções diversas.

São José, rogai por nós!

sexta-feira, 18 de março de 2016

MÃE DE TODAS AS DORES


DEVOCIONÁRIO DE NOSSA SENHORA DAS DORES

Introdução (Todos os Dias)

V. Ó Deus, vinde em meu auxílio; 
R. Senhor, apressai-Vos em me socorrer

V. Glória ao Pai...
R. Assim como era no princípio...

Dia I 

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, na aflição do Vosso coração terno com a profecia do santo velho Simeão. Querida Mãe, pelo Vosso coração tão afligido, obtende para mim a virtude da humildade e o dom do santo Temor de Deus. 

Rezar uma Ave Maria. 

Dia II

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, na angústia do Vosso afetuosíssimo coração durante a fuga para o Egito e a Vossa estadia ali. Querida Mãe, pelo Vosso coração tão perturbado, obtende para mim a virtude da generosidade, especialmente para com os pobres, e o dom da Piedade. 

Rezar uma Ave Maria. 

Dia III

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, nas ansiedades que perturbaram o Vosso coração amargurado pela perda do Vosso querido Jesus. Querida Mãe, pelo Vosso coração tão angustiado, obtende para mim a virtude da castidade e o dom da Ciência. 

Rezar uma Ave Maria. 

Dia IV

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, na consternação do Vosso coração ao encontrardes Jesus quando carregava a Sua Cruz. Querida Mãe, pelo Vosso coração tão perturbado, obtende para mim a virtude da paciência e o dom da Fortaleza. 

Rezar uma Ave Maria. 

Dia V

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, no martírio que o Vosso coração generoso suportou ao estar perto de Jesus na Sua agonia. Querida Mãe, pelo Vosso coração de tal maneira aflito, obtende para mim a virtude da temperança e o dom do Conselho. 

Rezar uma Ave Maria. 

Dia VI

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, no ferimento do Vosso coração compassivo, quando o lado de Jesus foi atingido pela lança e o Seu Coração foi trespassado. Querida Mãe, pelo Vosso coração assim trespassado, obtende para mim a virtude da caridade fraterna e o dom do Entendimento. 

Rezar uma Ave Maria. 

Dia VII

Sofro por Vós, Maria dolorosíssima, pelas dores que apertaram o Vosso amantíssimo coração quando Jesus foi sepultado. Querida Mãe, pelo Vosso coração mergulhado na amargura da desolação, obtende para mim a virtude da diligência e o dom da Sabedoria. 

Rezar uma Ave Maria. 

Oração Final (Todos os Dias)

V. Orai por nós, Virgem dolorosíssima, 
R. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo. 

Oremos. Seja feita intercessão por nós, vos suplicamos, Senhor Jesus Cristo, agora e na hora da nossa morte, perante o trono da Vossa misericórdia, pela Santíssima Virgem Maria, Vossa Mãe, cuja santíssima alma foi trespassada por uma espada de dor na hora da Vossa amarga Paixão. Pedimos isto por intermédio de Vós, Jesus Cristo, Salvador do mundo, que com o Pai e o Espírito Santo vive e reina pelos séculos dos séculos. Amém.

Indulgência de 5 anos. Indulgência de 7 anos em cada dia de setembro. Indulgência plenária uma vez por mês, nas condições usuais, se estas orações forem rezadas diariamente (Pio VII, Audiência em 14 de Janeiro de 1815).

quinta-feira, 17 de março de 2016

SÃO JOSÉ - MODELO DE SANTIFICAÇÃO PELA VIDA INTERIOR


São José é um santo oculto. Sua vida exterior se passa na sombra e no silêncio. A sua vida interior — aquela em que ele é particularmente admirável — também é sombra e obscuridade. Nele, a sombra atrai a sombra. A vida do nosso santo não oferece aos olhares nada de extraordinário, nada que provoque atenção. 

Dos seus primeiros anos nada sabemos. Ele só nos aparece no momento do advento do Salvador. Descende da família de Davi, decaída do seu antigo esplendor. Os seus dias, na maioria, transcorrem na pequena povoação de Nazaré, que motivou a pergunta: 'De Nazaré pode sair alguma coisa boa?' (Jo 1, 46) e ele não parece haver exercido ali qualquer função oficial. Conhecem-no simplesmente como um carpinteiro — profissão que não tem nada de glorioso. Quanto à sua missão especial e pessoal de pai legal de Jesus, por mais bela e mais sublime que seja em si mesma, ela precisamente requeria a sombra e o silêncio. Os profetas, os apóstolos e os mártires proclamaram a divindade de Jesus e, por isso mesmo, adquiriram a glória. Ao contrário, a missão de São José, durante a sua vida inteira, foi encobrir essa divindade.

Já o vimos: ele foi a sombra do Pai Celeste não só representando o Pai junto de Jesus, mas ainda subtraindo aos olhos do mundo a divindade do Salvador, visto como aos olhos de todos ele era o pai do menino. Ora, a sombra não é só o silêncio. Ela cobre com mistério tudo o que lhe entra na esfera. Velando a divindade de Jesus, São José velava também o milagre realizado em Maria: a virgindade e a maternidade divina.

Essa missão especial, José aceita e cumpre-a de todo o coração, sem desmenti-la uma só vez durante a vida inteira. Ele quer ser oculto, quer permanecer oculto. Mas isso não bastava. Que maravilhas poderia ter ele revelado falando da Virgem admirável, objeto de profecias tão numerosas e luminosas, esperança do povo de Deus! Ele abriga sob o seu teto o Messias esperado com tanta impaciência e não trai com uma só palavra o seu segredo! Leva-o consigo para o túmulo.

Quando vêm os dias em que o Salvador realiza seus milagres, quando a glória da Ressurreição transforma em triunfo os sofrimentos e as humilhações da Paixão, José já não é deste mundo. Mesmo quando o cristianismo alarga as suas conquistas, o nosso santo ainda permanece na sombra até que venha a hora de se lhe prestar um culto bem merecido. Tal foi a prodigiosa vocação de José: ser a sombra, projetar a sombra sobre si mesmo e sobre tudo o que entra na sua esfera, sobre o próprio Deus.

A sua vida exterior foi, pois, uma vida oculta. Mas isso não bastava. Era mister que essa vida oculta fosse igualmente uma vida interior. Assim o pedia a missão do santo patriarca. Ser o guarda e o protetor da vida oculta de Jesus era a vocação de São José. Ora, essa vida oculta do Salvador era essencialmente uma vida interior. Para velar por essa vida, mister se fazia uma alma, um santo que amasse e praticasse a vida interior.

Que vem a ser essa vida interior? É o lado espiritual, o lado melhor da vida humana. É a vida que confere ao homem uma grandeza e um valor muito acima das aparências da vida exterior. Ela consiste na parte que a alma, o espírito do homem, pelo seu lado superior e sobrenatural, toma nos atos exteriores. É o homem vivendo para Deus, de Deus e em Deus. Assim sendo, para frisá-la em alguns traços, a vida interior consiste sobretudo na pureza do coração, na fuga de tudo o que pode desagradar a Deus e tornar-nos menos agradável a seus olhos, por conseguinte na fuga de toda falta voluntária e ainda na vigência sobre o nosso interior. Consiste, além disso, em nos esforçarmos por transformar todos os nossos atos exteriores em outros tantos atos de virtude — de uma virtude sobrenatural; transformá-los em outros tantos méritos perante Deus, dando-lhes uma intenção reta e sobrenatural. Consiste enfim, em conversarmos diretamente com Deus pela oração e em correspondermos fielmente às suas inspirações.

Eis aí, praticamente, a vida interior. Tal deve ter sido a de São José. Mas quem nos fará compreender-lhe a perfeição? Pensemos na missão gloriosa de José, pensemos nas graças que Deus lhe concedeu dessa missão! Se desde o primeiro instante de sua existência Maria recebeu uma plenitude transbordante de dons celestes, porque devia ser a mãe do Salvador, José, cuja missão tem mais de uma analogia com a de Maria, deve ter, por sua vez, recebido as graças correspondentes à sua alta vocação. Esse capital de graças não pôde senão multiplicar-se pela prática da vida interior, e frutificar tanto mais quanto a vida exterior do nosso santo era mais humilde e, de alguma sorte, mais vulgar. Além disso, uma contínua intimidade com o Salvador e com Maria favorecia singularmente o progresso da vida interior.

Que pureza nos pensamentos de José, suas intenções, porquanto, fruindo da sociedade de Jesus, ele estava incessantemente, como os anjos, em presença do Deus três vezes santo! Que recolhimento em suas ações, desde que a sua vida toda se achava, por isso mesmo, diretamente consagrada ao serviço de Deus, à execução dos conselhos divinos! Que fervor na caridade, pois tudo em torno dele, tudo o que ele via, tudo o que ouvia, eram outras tantas revelações do amor de Deus, outras tantas inexauríveis fontes de graças, outras tantas manifestações da sabedoria e da beleza divinas! José estava imerso em Deus. A luz de Deus banhava-lhe a vida interior, como a luz do astro das noites transparece através da nuvem que a vela por um instante.

São José é, pois, o melhor modelo da vida interior. Sem dúvida, ele não era a luz que impõe a atenção e fere todos os olhares. Compará-lo-íamos antes a um perfume cujo aroma respiramos sem reconhecer sempre de onde se exala. O nosso santo é, pois, ainda agora, na Igreja, o padroeiro da vida interior. Essa vida interior faz a sua grandeza. Ela lhe é necessária. Sem ela, ele não teria passado de uma sombra vã diante dos homens e diante de Deus. Ter-se-ia assemelhado a esses ricos e a esses grandes do mundo de quem a Escritura diz, que 'no seu despertar, nada acharam em suas mãos' (Sl 76,6). Com ela e por ela, José foi rico diante de Deus. Foi grande da grandeza do próprio Deus. Por ser Deus, e por ser infinitamente feliz em Si mesmo, Deus nos é oculto, silencioso, invisível. E é a vida interior que nos associa a essa grandeza de Deus, porque ela consiste essencialmente em viver para Deus e em Deus.

A vida interior é pureza, porque é uma frequente conversa com Deus, espelho de toda pureza. É riqueza, porque tudo o que fazemos, fazemo-lo para Deus e o transformamos numa recompensa eterna. É força porque, pela união com Deus, ela nos atrai a graça de vencermos os perigos e as dificuldades da vida exterior.

Coloquemo-nos, pois, sob a proteção de São José e, confiantes no seu socorro, trilhemos os caminhos da vida interior, pela vigilância sobre nós mesmos, pela pureza de intenção em todas as coisas, pela prática da oração, pela docilidade às inspirações da graça. Sem estes exercícios da vida interior, a própria vida mais oculta ficaria sem mérito diante de Deus, sem valor para a eternidade. E, para entrar nessa terra prometida da vida interior, não há guia melhor nem mais seguro do que São José: é uma das recompensas concedidas aos serviços que ele prestou à santa infância do Salvador.

(Excertos da obra 'São José - Na Vida de Cristo e da Igreja', do Pe. Maurício Meschler, 1943)