quinta-feira, 21 de agosto de 2025

FRASES DE SENDARIUM (LVIII)

 

'Ó Maria, no Sangue de Jesus e em tua intercessão, 
está toda a minha esperança!' 

(Santo Afonso de Ligório)

Louvar Nossa Senhora é cantar a obra prima de Deus: que nós  possamos amar Jesus com o amor do coração de Maria!

quarta-feira, 20 de agosto de 2025

SOMOS APENAS A CASA DO HÓSPEDE

A vida interior depende de três condições preliminares: uma correta concepção de Deus; a harmonia psicológica e as circunstâncias do meio. Uma reta concepção da divindade é a condição fundamental de uma vida interior, rica e fecunda. Pois o que faz a força da vida interior não é o isolamento. É o encontro de Deus em nós. Somos apenas a Casa do Hóspede. O isolamento, como tal, poderá ser apenas mau humor, desespero ou misantropia. E nada de mais alongado dessas formas de negação da vida do que a vida interior. 

Esta, ao contrário, é uma intensificação da vida. Para ter vida interior é preciso, antes e acima de tudo, ter vida, crer na vida e viver a vida do modo mais intenso possível. Ora, só pode preencher essas três exigências ou mesmo qualquer delas quem crê em Deus e encontra a Deus não apenas à distância ou de modo abstrato, mas dentro de si mesmo. O ateísmo pode provocar uma intensificação da vida exterior, mas jamais um aumento da vida interior. Para quem não crê em Deus, só há vida no movimento, na agitação, no mundo das ações e dos fatos. O ateu encontra em si o vazio. Pois se vê, naturalmente, como uma consequência e um motor. Mas jamais como a habitação da própria vida. 

Crer em Deus é portanto a condição essencial da vida interior. E ter de Deus uma noção que permita essa intimidade com o mistério, esse diálogo interior, que não anula a Deus em nós, nem nos aniquila em Deus, é a exigência imediata. E por isso é que duas concepções correntes da divindade, o deísmo e o panteísmo, são também tão contrárias ao mundo interior como o ateísmo. O deísmo coloca a Deus como uma categoria abstrata ou então a uma distância tal que o isola do mundo, tanto exterior como interior. Para o deísmo Deus é uma 'categoria do ideal' , como dizia Renan, ou o 'arquiteto do universo', como dizia Voltaire, ou um Alá inacessível e sem comunicação com o mundo, como quer o fatalismo muçulmano. Essa concepção abstracionista de Deus, como uma peça na geometria do universo, aparta Deus de tal maneira do homem que não há meio de o encontrarmos, quando nos fechamos em nós mesmos. O mesmo se dá com o fatalismo maometano, para quem a linha da divindade é como que paralela à linha da humanidade, sem que entre elas existam quaisquer coordenadas. Por mais puro que seja o moteísmo, desde que separa Deus do homem, não permite que a vida divina se insira na vida humana de modo a alimentar o mistério e a abundância da vida interior. 

O mesmo se dá com a concepção oposta, com o panteísmo. Se dissolvemos Deus no universo, o criador nas criaturas, se apenas vemos Deus em toda parte, encarnado na criação, é como se o tivéssemos solitário e separado no céu geométrico ou fatalista. Os dois contrários se encontram. No panteísmo, Deus se perde no universo e não podemos encontrá-lo em nós, como se Ele se tivesse desinteressado da sua própria obra, por culpa das traições do homem. Para que nossa vida interior represente a vida de Deus em nós e o encontro com Ele no fundo de nós mesmos, é preciso que se resguarde simultaneamente a distinção entre Deus e o mundo, contra o panteísmo e a união de Deus com o mundo, pelas idéias criadoras, pelos sacramentos e pela graça constantemente animando a natureza contra o deísmo. 

Só assim podemos ter a Deus em nós, sem que seja uma ilusão ou uma palavra vã. Só assim podemos encontrar, dentro de nós, o próprio criador da vida. E por isso mesmo é que não bastam as virtudes morais para que tenhamos uma vida interior intensa. É mister que as virtudes teologais, a Fé, a Esperança e o Amor, transfiguradas pelos dons do Espírito Santo, venham permitir que encontremos, no fundo de nossas almas, a presença divina. E essa presença é que faz a riqueza da vida interior. É porque há em nós mais do que nós mesmos, que o mundo interior tem um sentido tão grande. É porque Deus pode habitar em nós e pela vida interior podemos mais de perto conviver com Ele, que ir a Deus não é sair de nós, e sim, pelo contrário, entrar em nós. 

A vida religiosa só se torna exterior como uma consequência e não como uma causa. Os dois modos de manifestação exterior dessa vida, a oração e o apostolado, só se justificam, quando alicerçados na vida interior. Pela oração é que nos unimos profundamente a Deus. E a oração coletiva, a oração em união com todos os fiéis, a oração do nosso eu em união com a Igreja, Corpo Místico de Cristo, só tem valor quando precedida e acompanhada, simultaneamente, pela oração interior, pela intimidade com Deus no fundo de nossas almas. De outra forma se opera apenas uma mecanização, uma ritualização da prece, que não possui valor espiritual nenhum. O mesmo ocorre com o apostolado. Só há força de irradiação e de contaminação no apostolado, como extensão do Reino de Deus, a que cada cristão está moralmente obrigado, quando essa irradiação parte de um foco ardente que não pode deixar de expandir-se. E, portanto, de uma vida interior que extravasa naturalmente e por isso mesmo de modo mais fecundo para a extensão da vida sobrenatural em nós, que é Deus em nosso mundo interior. 

Uma falsa concepção da divindade é, por conseguinte, um elemento de enfraquecimento, corrupção e aniquilamento de nossa vida interior. Uma verdadeira concepção de Deus, ao contrário, permite que, dentro de nós, encontremos a fonte de toda a vida, a própria Vida em sua cratera ardente e luminosa. Não há pois, vida interior autêntica sem uma profunda vida religiosa. Deus em nós é a condição primeira e maior dessa reverência que devemos ter para com a nossa vida íntima, de modo a expurgá-la de todos os elementos de desagregação e mantê-la na limpidez e na limpeza com que nos preparamos sempre para receber um hóspede. E Deus é mais, muito mais do que um hóspede em nossa casa íntima. É o próprio dono da casa. E quanto mais nos tornarmos hóspedes do nosso Hóspede, tanto mais veremos crescer e florescer o nosso mundo interior.

(Excertos da obra 'Meditação Sobre o Mundo Interior', de Alceu Amoroso Lima)

terça-feira, 19 de agosto de 2025

SOBRE A CONFIANÇA EM DEUS

Desperte, eu lhe digo, levante-se e fique acordado, você que foi vencido pelo sono do pecado; volte à vida finalmente, você que caiu diante da espada mortal de seus inimigos. O apóstolo Paulo está aqui. Ouça-o enquanto ele exige vigorosamente ser ouvido, batendo à sua porta e lhe chamando com palavras claras: 'Acorda do teu sono e levanta-te dentre os mortos e Cristo te iluminará!' (Ef 5,14).

Se você ouve Cristo, que restaura a vida, por que se sente inseguro quanto à sua restauração? Ouça as suas próprias palavras: 'Se alguém crer em mim, ainda que morra, viverá' (Jo 11,25) Se a própria Vida, que dá vida, procura ressuscitar você, por que você continua tolerando ficar morto?

Seu coração deve bater com confiança no amor de Deus e não endurecer e se tornar impenitente diante do seu grande crime. Não são os pecadores, mas os ímpios que devem se desesperar; não é a magnitude do crime de alguém, mas o desprezo por Deus que destrói as esperanças de alguém. Se, de fato, o diabo é tão poderoso que é capaz de lançá-lo nas profundezas desse vício, quão mais eficaz é a força de Cristo para restaurá-lo à posição elevada da qual você caiu? 'Aquele que caiu nunca mais se levantará?' (Sl 40,9). 'Se o jumento do teu inimigo cair sob o peso da sua carga' (cf Ex 23,5) é o aguilhão da penitência que o impele e a mão do espírito que o liberta com coragem.

Se a sua carne impura o enganou... se roubou os sete dons do Espírito Santo, se extinguiu não apenas a luz do seu rosto, mas também a do seu espírito, não fique deprimido e não se desespere completamente. Mais uma vez, reúna suas forças, anime-se como um homem, ouse realizar grandes feitos e, ao agir assim, você terá a força, pela misericórdia de Deus, para triunfar sobre seus inimigos.

(São Pedro Damião)

OS PAPAS DA IGREJA (XXX)

 



segunda-feira, 18 de agosto de 2025

TRATADO SOBRE A HUMILDADE (XXVIII)

 

Exame sobre a Humildade para Consigo Mesmo

128. Ricardo de São Vítor [lib. 2, cap. xxiii, De Epul. inter Hom.] define humildade como o desprezo interior por si mesmo. Examine um pouco se você tem esse sentimento em relação a si mesmo. Quando você tem sonhos de dignidade e honra, e se imagina em meio à grandeza e honras quiméricas, como você se comporta nessas imaginações orgulhosas e vaidosas? Você se alegra e se deleita com elas, desejando habitar nelas cada vez mais? Se amamos a humildade, devemos tratar esses sonhos de ambição mundana e orgulho com desdém e ódio, assim como aqueles que amam a castidade tratam os pensamentos impuros. Devemos orar assim com o rei Davi: 'Não deixe que o pé do orgulho chegue até mim', porque o orgulho primeiro entra na alma através dos pensamentos da mente, e aquele que se acostuma a se deleitar com esses pensamentos já formou o mau hábito do orgulho em seu coração.

129. Você esquece a sua própria insignificância? Você tem alguma autoestima? Se for esse o caso, você é um sedutor, um enganador de si mesmo, porque, como diz São Paulo: Quem se crê algo, 'enganar-se-á a si mesmo' [Gl 6,3]. Você se deleita e se gloria em seu conhecimento, seu poder, suas riquezas ou em algum outro dom natural ou moral? Lembre-se da palavra que Deus disse pelo profeta Jeremias: 'Que o sábio não se glorie em sua sabedoria, que o forte não se glorie em sua força e que o rico não se glorie em suas riquezas' [Jr 1,23]. E novamente como diz São Paulo: 'ão devemos agradar a nós mesmos' [Rm 15,1]. Esse deleite e glória insinuam-se insensivelmente, mas aquele que é humilde percebe-os rapidamente e repele-os como sendo nada mais do que vaidade, que apenas enche o coração de orgulho.

O mesmo se aplica à vida espiritual. Você se considera virtuoso porque às vezes faz um pouco de bem? Faria bem, então, em não se considerar bom, mas em imaginar-se em Jerusalém repudiado por Deus, porque, como disse o profeta, você está 'confiando na sua beleza' [Ez 16,15]. E São Gregório diz sobre pessoas como você: 'A alma confia na sua beleza quando realiza alguma boa ação' [Epístola cxxvi]. O homem orgulhoso se detém mais de bom grado no pouco bem que faz, na pouca devoção que sente, do que no pensamento do mal que cometeu e que comete diariamente. Ele deixa para trás a multidão de seus pecados, para não precisar se envergonhar e se humilhar; e reflete frequentemente sobre certos exercícios minuciosos de piedade cristã, a fim de satisfazer sua auto-complacência, como diz São Gregório: 'É mais fácil para eles verem dentro de si mesmos o que lhes agrada do que o que lhes desagrada' [lib. 22, Mor. c. i]. Talvez você também tenha essa tendência.

130. A humildade nos ensina também a nos considerarmos indignos de qualquer bem que possamos possuir, até mesmo do ar que respiramos, e a nos considerarmos dignos de todos os males e injúrias do mundo. Esses são os pensamentos do homem humilde. Ele sempre mantém diante dos olhos os pecados que cometeu e sua tendência maliciosa de cometê-los novamente. Portanto, ele se considera pior do que os turcos, que não têm a luz da graça, enquanto ele também tem a da fé; pior do que todos os pecadores, que não percebem a gravidade do pecado e que não receberam tanta ajuda da graça quanto ele; pior do que os judeus, 'porque, se o tivessem conhecido, nunca teriam crucificado o Senhor da glória' [1Cor 2,8]; pior até do que os demônios, que pecaram apenas uma vez em pensamento, enquanto ele pecou tantas vezes, mesmo em ação. Mas você já parou para considerar essas coisas seriamente?

131. Você se coloca em situações perigosas, dizendo: 'Não vou cair em pecado', presumindo assim demais da sua própria força? São Gregório diz que não há nada mais distante da humildade do que tal presunção: 'Nada no homem está mais distante da humildade do que confiar na própria virtude' [lib. 22, Mor. c. iii]. Você fica perturbado e agitado ao pensar nas faltas que comete e no seu lento progresso na aquisição da virtude? Isso é orgulho e vem da sua presunção em pensar que você pode fazer grandes coisas com suas próprias forças. Mas é necessário nos humilharmos e, ainda assim, não desanimarmos, mas aprendermos com Santo Agostinho, que diz de si mesmo: 'Quanto mais me falta, mais humilde serei' [in Ps. 38] Serei mais humilde se refletir sobre as virtudes que deveria ter e não tenho.

Você é prudente, não confiando em sua própria ingenuidade nem em suas próprias opiniões, sem se preocupar em pedir conselhos, especialmente em assuntos de grande importância? Isso é um grande pecado contra a humildade, e o Espírito Santo assim o adverte: 'Não confie em sua própria prudência: não seja sábio em sua própria presunção' [Pv 3,5.7]. E São Jerônimo chama de intolerável o orgulho pelo qual damos aos outros a entender que somos tão sábios que não precisamos de seus conselhos: 'O orgulho é insuportável, mas considerar-se um nada precisa de conselho' [cap.1, Isa.].

('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)

domingo, 17 de agosto de 2025

EVANGELHO DO DOMINGO

 

À vossa direita se encontra a rainha, 
com veste esplendente de ouro de Ofir' (Sl 44)

Primeira Leitura (Ap 11,19a;12,1-6a.10ab) - Segunda Leitura (1Cor 15,20-27a) -  Evangelho (Lc 1,39-56)

  17/08/2025 - SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DA VIRGEM MARIA

ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

 'O Todo-Poderoso fez grandes coisas a meu favor'

As glórias de Maria podem ser resumidas na portentosa frase enunciada pelo anjo Gabriel: 'Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus' (Lc 1, 30). Ao receber a boa-nova do anjo, Maria prostrou-se como serva e disse 'sim', e por meio desse sim, como nos ensina São Luís Grignion de Montfort, 'Deus Se fez homem, uma Virgem de tornou Mãe de Deus, as almas dos justos foram livradas do limbo, as ruínas do céu foram reparadas e os tronos vazios foram preenchidos, o pecado foi perdoado, a graça nos foi dada, os doentes foram curados, os mortos ressuscitados, os exilados chamados de volta, a Santíssima Trindade foi aplacada, e os homens obtiveram a vida eterna'.

Esta efusão de graças segue Maria na Visitação, pois ela é reflexo da presença e das graças do Espírito Santo que são levadas à sua prima Isabel e à criança em seu ventre. No instante da purificação de São João Batista, o Precursor, Santa Isabel foi arrebatada por inteira pelo Espírito Santo: 'Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança pulou no seu ventre e Isabel ficou cheia do Espírito Santo' (Lc 1,41). Por meio de uma extraordinária revelação interior, Santa Isabel confirma em Maria o repositório infinito das graças de Deus: 'Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu' (Lc 1,43).

E é ainda nesta plenitude de comunhão com o Espírito Santo, que Maria vai proclamar o seu Magnificat: 'A minha alma engrandece o Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador, porque olhou para a humildade de sua serva. Doravante todas as gerações me chamarão bem-aventurada, porque o Todo-poderoso fez grandes coisas em meu favor. O seu nome é santo, e sua misericórdia se estende, de geração em geração, a todos os que o respeitam. Ele mostrou a força de seu braço: dispersou os soberbos de coração. Derrubou do trono os poderosos e elevou os humildes. Encheu de bens os famintos, e despediu os ricos de mãos vazias. Socorreu Israel, seu servo, lembrando-se de sua misericórdia, conforme prometera aos nossos pais, em favor de Abraão e de sua descendência, para sempre' (Lc 1, 46-55).

Mãe da humildade, mãe da obediência, mãe da fé, mãe do amor. Mãe de todas as graças e de todos os privilégios, Maria foi contemplada com o dogma de fé divina e católica da assunção, em corpo e alma, à Glória Celeste. Dentre as tantas glórias e honras a Maria, a Igreja celebra jubilosa neste domingo a Serva do Senhor como Nossa Senhora da Assunção.

sábado, 16 de agosto de 2025

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

O amor basta-se a si mesmo, em si e por sua causa encontra satisfação. É seu mérito, seu próprio prêmio. Além de si mesmo, o amor não exige motivo nem fruto. Seu fruto é o próprio ato de amar. Amo porque amo, amo para amar. Grande coisa é o amor, contanto que vá a seu princípio, volte à sua origem, mergulhe em sua fonte, sempre beba donde corre sem cessar. De todos os movimentos da alma, sentidos e afeições, o amor é o único com que pode a criatura, embora não condignamente, responder ao Criador e, por sua vez, dar-lhe outro tanto. Pois quando Deus ama não quer outra coisa senão ser amado, já que ama para ser amado; porque bem sabe que serão felizes pelo amor aqueles que o amarem.

(São Bernardo)