quarta-feira, 10 de maio de 2023

SERMÕES DO CURA D'ARS (X)

SOBRE A COMUNHÃO INDIGNA

Se todo o pecado mortal traz a morte à nossa alma, separando-a de Deus para sempre e cumulando-a de toda a espécie de desgraças, a que estado deve ser reduzido o mais terrível de todos os crimes, que é o sacrilégio? Ó meu Deus, quem pode fazer uma ideia do terrível estado de uma alma envolta pelo sacrilégio? Sim, diz-nos Jesus Cristo, quando virdes a abominação da desolação no lugar santo, predita pelo profeta Daniel, entendei-a bem. Ai de mim! Tendo escolhido o coração do homem para fazer dele a sua morada e o seu templo, Jesus Cristo previu, sem dúvida, as profanações e as abominações funestas que o demônio buscaria fazer aí pelo pecado; que pensamento triste e desolador para Deus! Mas a maior e mais terrível de todas as tristezas é prever que o seu adorável corpo e o seu precioso sangue seriam profanados. Ó meu Deus! Poderão os cristãos ser realmente culpados de um tal crime, que o próprio inferno nunca poderia inventar um semelhante? 

São Paulo deplorou-o no seu tempo. Um dia, não podendo fazer-lhes sentir toda a escuridão desse crime terrível, disse-lhes, chorando amargamente: Que tormento não receberia aquele que pusesse uma mão parricida no corpo de um Deus feito homem, aquele que ferisse esse coração... Ah, esse coração terno que nos ama até à cruz e que fez irromper o sangue das suas veias! Ah, esse sangue adorável derramado por nós, que nos santificou no santo batismo, que nos purificou no sacramento da penitência... parece impossível encontrar castigos suficientemente severos e cristãos capazes de tal crime. E eis que há um ainda infinitamente mais terrível: receber indignamente o adorável Corpo e o precioso Sangue de Jesus Cristo, profaná-lo, conspurcá-lo e degradá-lo. É possível este crime? Ah, pelo menos, é possível para os cristãos? Sim, há monstros de ingratidão que levam a sua cólera a tal extremo! Sim, se o bom Deus mostrasse as comunhões de todos os que estão aqui ao ar livre, ai de nós, quantos apareceriam com a sua sentença de reprovação escrita na sua consciência criminosa com o sangue de um Deus feito homem! Este pensamento nos faz estremecer e, no entanto, nada é tão comum como estas comunhões indignas; quantos têm a temeridade de se aproximar da Mesa Santa com pecados escondidos e disfarçados na confissão! 

Quantos não têm a tristeza do pecado que o bom Deus lhes pede; quantos não se esforçam por se corrigirem; quantos ainda conservam um desejo secreto de voltar a cair no pecado! Quantos não evitam as ocasiões de pecado e, no entanto, são capazes de os cometer? Quantos não guardam inimizades no seu coração aos pés da Mesa Santa? Examine a sua consciência e certifique-se se você já teve alguma dessas disposições ao se aproximar da Santa Comunhão; se já passou por esse infortúnio, meu filho, que termos eu poderia usar para fazê-lo sentir todo o horror disso? Ah! se me permitissem, iria ao inferno para lá arrebatar Judas infame e traidor ardendo devido ao adorável sangue de Jesus Cristo que tão horrivelmente profanou. Ah! se você pudesse ouvir os gritos e os uivos desse homem, se você pudesse perceber os tormentos que suporta por causa de seu sacrilégio, você morreria de medo. Então, o que será daqueles que, talvez durante toda a vida, não fizeram nada além de sacrilégio? Cristãos que vão me ouvir e que são culpados deste crime, ainda poderão viver bem? Sim, o sacrilégio é o maior de todos os crimes, pois ataca um Deus e o mata, e atrai sobre nós toda a sorte de desgraças.

Se eu estivesse a falar com idólatras ou mesmo com hereges, começaria por provar-lhes a realidade de Jesus Cristo no adorável sacramento da Eucaristia; mas não, ninguém de vocês tem a menor dúvida sobre isso. Ah se Jesus Cristo não estivesse lá para aqueles que se aproximam dele com tão mau estado de espírito; mas não, ele está lá, mesmo para aqueles que ousam se apresentar com o pecado em seus corações, assim como está para aqueles que se encontram em estado de graça. Quero apenas começar por citar um exemplo que fortalecerá a vossa fé nesta matéria e vos dará uma ideia das medidas que deveis tomar para não profanar este grande sacramento de amor. Conta-se que um sacerdote que estava a celebrar a Santa Missa, depois de ter pronunciado as palavras da consagração, duvidou que Jesus Cristo estivesse realmente presente em corpo e alma na Sagrada Hóstia; no mesmo momento, a Sagrada Hóstia ficou manchada de sangue. Jesus Cristo parecia querer, com tão grande milagre, repreender o seu ministro pela sua falta de fé e fortalecer os cristãos nesta verdade de fé: Ele está realmente presente na Sagrada Eucaristia. A Sagrada Hóstia derramou sangue tão abundantemente que o corporal, as toalhas do altar e o próprio altar ficaram manchados de sangue. Quando o Santo Padre foi informado deste fato, mandou levar o corporal para uma igreja, onde foi usado todos os anos na festa de Corpus Christi com grande veneração. Não, meu filho, tudo isto não é o mais necessário para você, porque ninguém o duvida; mas a minha intenção é mostrar-lhe o mais possível a grandeza e o horror do sacrilégio. Este conhecimento nunca será dado ao homem mortal; seria preciso que ele fosse o próprio Deus para o poder compreender; no entanto, para vos dar uma ligeira ideia, dir-vos-ei que aquele que tem esta grande desgraça comete um pecado mais ultrajante para o bom Deus do que todos os pecados mortais que se cometeram desde o princípio do mundo e os que se poderão cometer até ao fim dos séculos. É, pois, impossível mostrá-lo em toda a sua iniquidade; e, no entanto, como são comuns tais sacrilégios!

Se eu quisesse lhes falar, meu filhos, da morte corporal de Jesus Cristo, bastar-me-ia pintar-lhes um quadro dos tormentos que Ele suportou durante a sua vida; bastar-me-ia mostrar-lhes o seu pobre corpo todo em farrapos, tal como estava depois da flagelação, tal como está agora no madeiro da cruz; não seria preciso muito mais do que isso para tocar os vossos corações e fazer correr as vossas lágrimas. De fato, qual o pecador, o mais empedernido, que poderia resistir e não misturar as suas lágrimas com esse sangue adorável? ... Meus filhos, a morte que damos a Jesus Cristo pela comunhão sacrílega é ainda mais terrível e dolorosa. Quando estava na terra, só sofreu durante um certo tempo e só morreu uma vez; contudo, foi o seu amor que o fez sofrer e morrer; mas aqui, já não é a mesma coisa. Morre apesar de si mesmo, e a sua morte, longe de ser vantajosa para nós, como da primeira vez, torna-se a nossa desgraça, atraindo para nós toda a espécie de castigos, tanto neste mundo como no outro. Meu Deus, como somos cruéis para com um Deus tão bom! Quando pensamos na conduta desse apóstolo traiçoeiro que traiu e vendeu o seu divino Mestre, que durante muitos anos o tinha admitido no número dos seus favoritos mais queridos, que o tinha cumulado de tantos benefícios, que lhe tinha dado um cargo de preferência a outros, que tinha testemunhado tantos milagres! Quando nos lembramos, digo eu, das crueldades e barbaridades dos judeus, que fizeram a este divino Salvador tudo o que a raiva podia inventar de mais cruel, a este divino Salvador que tinha vindo a este mundo apenas para os salvar da tirania do demônio, para os elevar à gloriosa graça de filhos de Deus, não podemos senão considerá-los como monstros da ingratidão, dignos da execração do céu e da terra, e dos mais rigorosos castigos que o bom Deus pode infligir aos réprobos com todo o seu poder e justa cólera.

Mas eu vos digo que quem tiver a grande desgraça de comungar indignamente comete um crime ainda mais horrível do que o de Judas, que traiu e vendeu o seu divino Mestre, e ainda maior do que o dos judeus, que o crucificaram; porque Judas e os judeus pareciam ter ainda alguma desculpa para duvidar de que Ele fosse realmente o Salvador. Mas pode este cristão, este infeliz profanador, duvidar disso? Não são as provas da sua divindade suficientemente evidentes? Não sabem eles que, por sua morte, todas as criaturas pareciam ter sido renascidas por meio dela, que toda a natureza parecia ter sido aniquilada à vista da morte do seu Criador? Não foi a sua ressurreição manifestada por um número infinito dos mais impressionantes prodígios, que não podiam deixar dúvidas da sua divindade? Não foi a sua ascensão feita na presença de mais de quinhentas pessoas, quase todas derramando o seu sangue para apoiar estas verdades? Mas o miserável profanador nada sabe de tudo isso e, com todo o seu conhecimento, trai e vende o seu Deus e Salvador ao diabo e o crucifica em seu coração pelo pecado. Judas usou um beijo de paz para o entregar aos seus inimigos; mas o indigno comungante leva a sua crueldade ainda mais longe: depois de ter mentido ao Espírito Santo no tribunal da penitência, escondendo ou disfarçando um pecado qualquer, atreve-se, esse infeliz, a ir colocar-se entre os fiéis destinados a comer este pão, com um respeito hipócrita à vista! Ah, não, não, nada o detém, esse monstro da ingratidão; ele avança e consuma a sua condenação. Em vão, este terno Salvador, vendo-o aproximar-se, grita do fundo do seu tabernáculo, como ao pérfido Judas: 'Meu amigo, que fazes aqui? O que é que vais fazer, meu amigo, trair o teu Deus e o teu Salvador com um sinal de paz? Pára, pára, meu filho; ah, por favor, poupa-me'. Mas, não, não, nem os remorsos da sua consciência, nem as ternas censuras do seu Deus podem deter os seus passos criminosos. Ah, ele avança para mais uma vez matar o seu Deus e o seu Salvador! Oh, céu, que horror! Podeis suportar sem tremer este infeliz assassino do vosso Criador? Não é isto o cúmulo do crime e da abominação no lugar santo? O inferno, com toda a sua fúria, jamais poderia inventar algo assim; nem as nações idólatras jamais poderiam inventar algo assim por ódio ao verdadeiro Deus, se compararmos com os ultrajes que um cristão que comunga indignamente faz a Jesus Cristo.

... À perfídia de Judas, o indigno comungante acrescenta a ingratidão, a fúria e a malícia dos judeus. Ouçamos a terna censura que Jesus Cristo fez aos judeus: 'Por que me perseguis? É por ter iluminado os cegos, curado os coxos, restituído a saúde aos doentes, ressuscitado os mortos? Será então crime que eu vos tenha amado tanto?' É esta a linguagem que Jesus Cristo dirige aos profanadores do seu adorável corpo e do seu precioso sangue. E no entanto, diz-nos diretamente pela boca de um dos seus profetas que se tais insultos e afrontas tivessem sido feitos por inimigos ou por idólatras que nunca tiveram a felicidade de o conhecer, ou mesmo por hereges tangidos pelo erro, eles teriam sido menos sensíveis; 'mas vós' - Ele diria - 'vós que coloquei no seio da minha Igreja, vós que eu enriqueci com meus dons mais preciosos; vós que, pelo batismo, nascestes meus filhos e herdeiros do meu reino! Sois vós que atreveis a insultar-me com tão horrível sacrilégio? Quereis atingir o meu coração que vos amou até à morte? Filho ingrato, não estais ainda satisfeito com todas as crueldades que foram infligidas ao meu corpo inocente durante a minha dolorosa paixão? Esquecestes o estado deplorável a que fui reduzido depois da minha dolorosa e sangrenta flagelação, em que o meu corpo ficou como carne exposta? Esquecestes, filhos ingratos, os sofrimentos que tive de suportar ao carregar a minha cruz: tantos passos, tantas quedas e tantos sofrimentos? Esquecestes que morri no madeiro infame da cruz para vos salvar do inferno e vos abrir o céu? Ah, meu filho, não ficastes ainda tocado? Poderia eu ter levado mais longe o meu amor por ti? Meu filho; por favor, poupai o vosso Deus que tanto vos amou; porque me quereis dar uma segunda morte, recebendo-me com o pecado no vosso coração?'

... Mas, perguntaríeis vós, quem são estes que cometem esta grande desgraça? Quem poderia ser capaz de fazer tal coisa? E eu diria: sois vós, meu amigo, que contastes os vossos pecados com tão pouca dor e com tanta indiferença! Sois vós que, depois das confissões, volveis a cair no mesmo modo de vida fácil; que não mudais vosso modo de vida; que tendes sempre os mesmos pecados para contar em todas as vossas confissões... Quem é o culpado disso? Sois vós, homem da desgraça, que ousais fechar a boca antes de acusar vossos pecados. Quem é culpado disto? Sois vós, pobres cegos, que compreendestes que não contáveis os vossos pecados tal como os conhecíeis. Dizei-me, porque atreveis acercar-se à  Mesa Santa neste estado? Assim, neste estado, comungar? Quereis comungar; mas, miserável, onde quereis colocar o vosso Deus? Será que nos vossos olhos, que maculastes com tantos olhares impuros e adúlteros? Quereis comungar, mas onde quereis colocar o vosso Deus? Será que nas vossas mãos que maculastes com tantos sentidos infames? Quereis comungar, mas onde quereis colocar o vosso Deus? Será na vossa boca e na vossa língua? Ó grande Deus, uma boca e uma língua que tantas vezes profanastes com gestos impuros! Quereis comungar, mas onde quereis colocar o vosso Deus? Será no vosso coração? Ó horror! Ó abominação! Um coração escurecido e ressecado pelo crime, como um tição que se consome no fogo há quinze dias ou três semanas. Quereis comungar, meu amigo, quereis fazer vossa Páscoa? Quando Judas, o infame Judas, vendeu o seu divino Mestre, ficou como um homem desesperado até o entregar aos seus carrascos para ser condenado à morte ...Ai de mim, meu Deus, como é que uma pessoa culpada pode ir à Sagrada Comunhão para cometer o maior de todos os sacrilégios? São Paulo nos diz que, se os judeus tivessem conhecido Jesus Cristo como Salvador, nunca o teriam feito sofrer nem morrer; mas vós, meu amigo, podeis ignorar aquele que ides receber? Se não pensais nisso, pelo menos ouvi o sacerdote que fala em alta voz: 'Eis o Cordeiro de Deus, eis Aquele que tira os pecados do mundo'. Ele é o santo, ele é puro. Se és culpado, infeliz, não caminheis para a frente; se não sois, tremei para que os raios do céu não caiam sobre a vossa cabeça para vos castigar e lançar a vossa alma no inferno.

Meu amigo, sondai a vossa consciência, e vede em que estado está; vede se, ao deixar a Santa Mesa, comparecereis com confiança perante o tribunal de Jesus Cristo... Ao lhe dar uma ideia da magnitude do sacrilégio, não foi minha intenção afastá-lo da Sagrada Comunhão, mas apenas abrir os olhos daqueles que que o possam ter feito, de modo a reparar o mal que fizeram enquanto há tempo, e para trazer disposições ainda mais perfeitas para aqueles que têm a esperança de estarem isentos desse crime terrível. O que devemos concluir de tudo isso? Eis aqui: que façamos as nossas confissões e nossas comunhões como gostaríamos de fazê-las na hora da nossa morte, quando então compareceremos ante o tribunal de Jesus Cristo de modo que, almejando sempre fazer o bem, tenhamos o céu como recompensa.

terça-feira, 9 de maio de 2023

ORAÇÃO A JESUS PELA NOSSA SALVAÇÃO

ORAÇÃO A JESUS PELA NOSSA SALVAÇÃO

Divino Jesus, Filho Encarnado de Deus que, para a nossa salvação, vos dignastes nascer num estábulo, passar a vossa vida na pobreza, nas angústias e miséria, e morrer pelo suplício da cruz, dizei ao Vosso Pai Eterno, eu vo-lo conjuro, no momento da minha morte: 'Meu Pai, perdoai-lhe!'; dizei a Vossa Mãe querida: 'Eis vosso Filho!'; dizei a minha alma: 'Hoje estarás comigo no paraíso!'. Meu Deus, meu Deus, não me abandoneis nessa hora. Eu tenho sede: sim, meu Deus, a minha alma tem sede de Vós, que sois a fonte de águas vivas. A minha vida passa como a sombra; ainda um pouco de tempo e tudo estará terminado! Por isto, meu adorável Salvador, é que deponho o meu espírito nas Vossas mãos por toda a eternidade. Jesus, meu Senhor, dignai-vos receber a minha alma. Amém.

(Santo Afonso Maria de Ligório)

segunda-feira, 8 de maio de 2023

DOUTORES DA IGREJA (X)

  10São Boaventura, Bispo (†1274)

Doutor Seráfico

Concessão do título: 1588 - Papa Sisto V

Celebração: 15 de julho (Memória Obrigatória)

 Obras e Escritos  

  • Commentaria in Quatuor Libros Sententiarum - Comentário sobre os Quatro Livros de Sentenças [de Pedro Lombardo] (4 vols)
  • Itinerarium mentis in Deum - Itinerário da Mente para Deus
  • Christus Unus Omnium Magister
  • Breviloquium - Brevilóquio
  • De Reductione Artium ad Theologiam - Sobre a Redução das Ciências à Teologia
  • De perfecte evangelica - Sobre a Perfeição Evangélica
  • Collationes de decem praeceptis - Conferências sobre os Dez Mandamentos
  • Collationes in Hexaemeron - Conferências sobre Hexameron
  • Collationes de septem donis Spiritus sancti - Conferências sobre os Sete Dons do Espírito Santo
  • De mysterio Trinitatis - Sobre o Mistério da Trindade [Questões Disputadas]
  • De scientia Christi - Sobre o Conhecimento de Cristo [Questões Disputadas]
  • Apologia pauperum - Defesa dos Mendicantes
  • A Vida de São Francisco de Assis
  • Saltério à Virgem Maria
  • As Cinco Festividades do Menino Jesus
  • A Vinha Mística - Tratado sobre a Paixão de Nosso Senhor
  • Tratado de Preparação para a Missa
  • A Vida Perfeita e a Direção da Alma
  • Comentário ao Evangelho de Lucas
  • Comentário ao Evangelho de João
  • Comentário ao  Eclesiastes
  • Escritos sobre a Ordem Franciscana
  • Sermões e Orações

domingo, 7 de maio de 2023

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça, da mesma forma que em Vós nós esperamos!(Sl 32)

Primeira Leitura (At 6,1-7) - Segunda Leitura (1Pd 2,4-9)  -  Evangelho (Jo 14,1-12)
 
 07/05/2023 - Quinto Domingo da Páscoa 

24. 'EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA'


Jesus inicia o Evangelho deste Quinto Domingo da Páscoa manifestando o poder de sua Divindade e da autêntica fé cristã: 'Não se perturbe o vosso coração. Tendes fé em Deus, tendes fé em mim também' (Jo 14, 1). Sim, a medida do nosso amor é a confiança em Deus e nos desígnios da Providência Divina. Que nada além desta disposição interior, de colocar tudo nas mãos de Deus, seja o nosso conforto e consolação. Deus governa todas as coisas e sabe, muito além de nós mesmos, como nos levar a uma mais perfeita santificação. Ele nos cumula de bênçãos e graças, nos chama a cada nova situação, nos clama pela nossa confiança quando aparentemente nos abandona.

Em seguida, confia aos discípulos que eles são herdeiros do Reino dos Céus, a pátria eterna dos bem aventurados, os que colherão com fartura os frutos das sementes de amor e confiança plantadas no Coração do Pai: 'Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, eu vos teria dito. Vou preparar um lugar para vós e, quando eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que onde eu estiver estejais também vós' (Jo 14, 2-3). Nos mistérios insondáveis de Deus, as moradas são muitas e desiguais, sem que os eleitos padeçam dessa desigualdade pois todos serão igualmente possuidores da Visão Beatífica e serão cumulados plenamente da glória que lhes bastam.

É o próprio Jesus que nos vai abrir as portas do Céu, com a sua Paixão, Morte e Ressurreição. Ao romper as portas celestes, antes seladas pelos pecados dos homens, Jesus torna-se o rei de um reino que não é deste mundo e que tem as dimensões da eternidade. Um reino de muitas moradas, preparadas por Jesus para cada um de nós, filhos da esperança transformados em herdeiros das bem aventuranças celestes. E, assim, por meio de Jesus, chegaremos ao Pai, a morada eterna: 'Acreditai-me: eu estou no Pai e o Pai está em mim' (Jo 14,11).

Jesus vai ratificar esta premissa essencial da fé cristã com clareza divina: 'Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim' (Jo 14, 6). Não há outro caminho possível, não há opções de rumo, nem atalhos, nem passagens ocultas. Por isso Jesus é tão explícito ao unir, no anúncio pleno de sua divindade, os termos Caminho, Verdade e Vida. Só existe um Caminho de Verdade para a Vida Plena dos herdeiros dos Céus: seguir Jesus com confiança extremada e jubilosos na fé que abraçamos, e que nada nem ninguém nos perturbe o coração nesta caminhada de salvação para as eternas moradas de Deus.

sábado, 6 de maio de 2023

TESOURO DE EXEMPLOS (220/222)

  

220. A RECOMPENSA DO MUNDO

A rainha Isabel da Inglaterra, de triste memória, tinha entre os nobres de sua corte um extraordinário bailarino, chamado Tomás Pando. Quando bailava, todos gritavam com delírio: 'Outra vez! Bis, bis!' E ele continuava bailando. Mas um dia estava tão cansado que suas pernas não lhe permitiam nenhum esforço a mais. 

Mas a fanática rainha gritou: 'Outra vez! Outra vez!'. E Tomás, para fazer-lhe a vontade, bailou, nas últimas voltas, porém, teve vertigem e caiu ao solo. Puseram-se todos a rir, e a rainha gritou: 'Levanta-te boi!' O pobre bailarino ouviu o insulto, mordeu os lábios e levantou-se. No dia seguinte desapareceu da corte. Fugiu para os montes e nunca mais foi visto bailar.

Assim são as recompensas do mundo. Aos aplausos, louvores e sorrisos sucedem quase sempre o abandono, o desprezo e o insulto amargo: 'Levanta-te, boi!'

221. A ORAÇÃO NAS TENTAÇÕES

Em Roma foi metida no cárcere Daria, a santa esposa de Crisanto, por ser cristã e haver convertido inúmeras mulheres da idolatria à verdadeira religião. Empregaram contra ela os mais dolorosos tormentos; puseram em prática todas as astúcias infernais para arrebatar-lhe a virtude, mas tudo em vão.

Levaram-na, finalmente, a um lugar infame; mas Daria, levantando as mãos e os olhos aos céus, pôs-se a orar. Nem bem começara a rezar e eis que aparece, ao lado dela, um majestoso leão disposto a despedaçar a quem quer que se atrevesse a molestá-la (Leonis tutela contumedia divinitus defenditur). Nossa alma está rodeada de terríveis inimigos, como estava a de Santa Daria. Qual será a nossa defesa? A oração. Sem ela não há salvação.

22. SÃO E SALVO NO MEIO DOS LEÕES

O rei Dario proibira severamente toda e qualquer oração. Ora, numa casa com a janela aberta, viu-se um homem orando de joelhos e com o rosto voltado para Jerusalém, a cidade santa. Quem orava era Daniel, o grande ministro do rei.

Espiaram-no muito os inimigos e viram que três vezes ao dia (de manhã, ao meio-dia e à noite), naquela humilde atitude, ele fazia a sua recolhida oração. Foi denunciado e condenado a morrer despedaçado pelos leões. Meteram-no na cova dessas feras e fecharam a abertura da mesma com uma grande pedra marcada com o selo real.

Ao amanhecer Dario, que não pregara os olhos, correu à cova e encontrou Daniel ileso e sorridente. O homem que ora em nome de Jesus será sempre vitorioso. Nem o mundo, nem o leão mais feroz (o demônio) poderão causar-lhe algum dano.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

sexta-feira, 5 de maio de 2023

OS GRANDES SINAIS PRECURSORES DO JUÍZO FINAL (II)

 

Statim autem, post tribulatimem dierum illorum, sol obscurabitur, et luna non dabit lumen suum

'Logo após esses dias de tribulação, o sol escurecerá, a lua não terá claridade, cairão do céu as estrelas e as potências dos céus serão abaladas' (Mt 24, 29)

Segunda Parte

O que você pensaria se, como poderia facilmente ser o caso, o Anticristo nascesse agora para que pudéssemos viver em seu tempo? Pois ninguém sabe quando chegará esse tempo, pois Deus reservou o conhecimento dele somente para si. Em todo caso, imaginemos que o homem cruel já está realmente no mundo, e que ouvimos e vimos tudo o que foi dito sobre ele; o que deveríamos fazer? Devemos ousar renunciar a Cristo e ficar do lado desse monstro? Deveríamos nos deixar marcar com aquele sinal odioso: 'Nego a Cristo'? O quê - diriam cada um de vocês - negar a Cristo? E ficar ao lado dos demônios? Deus me livre de pensar em tal coisa! 

Eu preferiria morrer mil mortes a ser infiel ao meu Salvador e Deus ou abjurar sua fé na qual somente a salvação pode ser encontrada! Eu riria dos pretensos milagres, e desprezaria os prazeres oferecidos pela carne, as honras e as riquezas; resistiria heroicamente à tortura, por mais terrível que fosse, com a assistência divina; tudo isso eu faria prontamente para não perder minha única alma imortal e as alegrias eternas do céu. Ó quão verdadeiramente bela e cristã seria tal resolução! E tal deve ser a determinação de cada um de nós mesmos em circunstâncias tão terríveis.

Mas, infelizmente, como somos pobres mortais em todas as nossas resoluções e promessas! Deus de bondade, levai-me para fora deste mundo antes que esses tempos terríveis aconteçam! O que realmente seria de nós? É fácil dizer que pisaríamos nas riquezas, honras e prazeres oferecidos agora, enquanto vivemos em paz e sossego e temos todas as oportunidades de considerar devidamente o assunto, embora a menor tentação é muitas vezes suficiente para nos fazer transgredir da maneira mais vergonhosa e renunciar à amizade de Deus, que é tão digno de nosso amor. Como então podemos ousar dizer que seremos fortes o suficiente para resistir aos ataques de tal monstro? Mesmo agora, embora estejamos um pouco humilhados, o sopro do louvor humano e a esperança de honra ou uma posição elevada são capazes de cegar tanto os olhos de nossa mente que, contrariando a lei de Cristo, nos tornamos cheios de orgulho imundo e o mostramos em nosso vestuário e comportamento externo. Como poderíamos então ser fiéis à humildade de Nosso Salvador, se fôssemos exaltados por todo o mundo? 

Mesmo agora, embora aprendamos com a experiência diária a natureza transitória das coisas terrenas, e quão cedo e facilmente podemos perdê-las, às vezes somos tão assaltados pela paixão da avareza que vendemos nossas almas e nossa salvação por uma moeda miserável; tentamos lucrar com as calamidades públicas e, quando a nossa consciência ou o pensamento de perder nossas almas nos incomoda, despachamos tais pensamentos dizendo a nós mesmos: não importa como o dinheiro é ganho, contanto que eu consiga ganhá-lo! Como então poderíamos esperar poder pisar as riquezas se elas nos fossem oferecidas em abundância? Mesmo agora, quando temos tantas ocasiões de lamentar e deplorar nossa fraqueza, com a lei cristã pintando para nós a abominação e a deformidade do amor impuro e do prazer carnal, nós nos deixamos enfeitiçar e ser enganados por um olhar, um sorriso, uma palavra ou uma carícia, que nos esquecemos de nosso Deus, cedemos à nossa luxúria e sacrificamos imprudentemente nossa modéstia, pureza, honra e fidelidade. O que iríamos fazer se tais prazeres nos fossem apresentados como lícitos e louváveis? Ó que Deus conceda que um tempo tão terrível nunca aconteça para nós! 

É fácil dizer que devemos rir da hipocrisia, da falsa doutrina e dos falsos milagres. Mesmo agora, enquanto temos à mão inúmeras oportunidades de fazer o bem, acolhidos e zelosos no serviço a Deus por tantas devoções públicas, tendo em nosso poder frequentar os sacramentos quase diariamente para purificar nossas almas do pecado e nos alimentarmos com o corpo e o sangue de Jesus Cristo; tendo nossa ignorância iluminada por tantos sermões que nos encorajam ao bem, nos alertam contra o mal, nos exortam a evitar as ocasiões de pecado, os maus costumes e os prazeres do mundo; com tudo isso ainda permanecemos tão mornos e frios no serviço divino, tão obstinados nos hábitos que uma vez adquirimos que, às vezes, até atribuímos pouco crédito à palavra de Deus ou não acreditamos mais nela do que aquilo que convém às nossas fantasias. 

O que o mundo corrupto prega, o que aprendemos com os escândalos dos outros, o que os ociosos nos dizem; tudo isso deve ser sempre admitido como verdadeiro, válido e lícito; a tudo isso devem ceder as doutrinas e o ensinamento infalível do santo Evangelho, juntamente com os ensinamentos dos Padres e Doutores da Igreja. Se vemos alguém que aparenta ter uma conduta piedosa, agindo em conformidade com os costumes do mundo, dizemos logo: então não há mal nenhum nisso, já que tal pessoa o faz! Se aqui e ali ouvimos um confessor que tende a ser liberal em certos assuntos que nos incomoda impor restrições, aderimos às suas ideias como se ele fosse tão infalível quanto o próprio Evangelho, enquanto confrontamos e ridicularizamos todos os que têm nisso opinião contrária. Então, repito, se é assim que agimos em plena luz do dia, o que faremos quando o uso dos sacramentos for abolido, as devoções públicas impedidas, os sermões e instruções proibidos e, em meio à corrupção e à perversão gerais, uma nova lei for promulgada para louvar e incentivar a nossa sensualidade e orgulho, confirmada por milagres e apoiada por uma falsa aparência de piedade e pela aprovação de todo o mundo? Oh, não, repito, que Deus não permita que tenhamos de viver em tempos tão difíceis, pois sabemos que seríamos demasiado frouxos para tanta provação.

É fácil falar em resistir aos tormentos e enfrentar o martírio! Ah como se pudessem entregar os corpos às lâminas, espadas, maças de chumbo ou ganchos de ferro, para serem rasgados e esfolados, os que agora são tão frágeis e vulneráveis que são incapazes de suportar a picada de uma agulha, os que acham um dia de jejum intolerável e são absolutamente incapazes de ficar de pé ou ajoelhados por uma hora na igreja ou de se levantar de manhã cedo por causa do frio! Como deixariam ser queimados e assados vivos os que, deitados em camas um pouco mais incômodas, não conseguem dormir de impaciência? Como poderiam rir de tormentos para os quais todas as cruzes são terríveis, os que suspiram e gemem ao menor julgamento e deixam dar vazão aos sentimentos por meio de juramentos e maldições diante o mais insignificante aborrecimento, expressando sua insatisfação também com a renúncia à prática da oração e devoção e à frequência aos sacramentos? 

Oh não! Deus de bondade! Não queremos um anticristo para provar nossa virtude, nossa fé, esperança e caridade, submetendo-nos à tortura! Já temos tribulações diárias suficientes: mais do que desejamos, para provar nossa virtude! Oxalá pudéssemos suportá-los com paciência e resignação por amor a Vós e para ganhar o Céu! A cada hora do dia temos abundante oportunidade de mortificar nossos olhos, ouvidos, língua, sensualidade e más inclinações; mas fazê-lo muitas vezes é para nós um amargo martírio que, sem nenhum tirano para nos obrigar, nos faz esquecer a obediência que devemos à vossa Santa Lei. Um leve desgosto, uma palavra de contradição, um olhar irritado às vezes é suficiente para perturbar nossa chamada virtude e transformá-la em impaciência, ódio e raiva. O que seria então de nós em meio a uma tão grande perseguição, que muitos, mesmo os mais santos e inocentes, não suportarão?

Finalmente, é fácil dizer que deveríamos preferir morrer mil mortes a negar a Cristo e tomar o partido do seu mortal inimigo! A maioria dos homens, entretanto, já se encontra do lado do Anticristo contra Jesus, nosso Salvador. Ouça o que São João diz em sua primeira epístola: 'todo espírito que não proclama Jesus esse não é de Deus, mas é o espírito do Anticristo de cuja vinda tendes ouvido, e que já está agora no mundo'¹⁸. 'Não pessoalmente' - como diz Cornelius à Lapide - 'mas em espírito; isto é, em seus precursores'¹⁹. Se vocês examinarem o assunto, meus queridos irmãos, vocês encontrarão não um, mas muitos anticristos. Não são anticristos aqueles pais que permitem a seus filhos toda licenciosidade, os levam à vaidade e ao orgulho imundo do mundo, à ociosidade e os afastam do zeloso amor de Deus e da verdadeira devoção? Não é um anticristo aquele que, contrário à lei de Deus, nutre vingança contra o próximo e frequenta os perigos e ocasiões de pecado? Não é um anticristo quem tenta desviar uma donzela do caminho da virtude com presentes e dinheiro? Não é o Anticristo aquela mulher que, por despudor no vestir e nas maneiras dissolutas, leva os outros ao pecado? Não é um anticristo aquele que causa escândalo com conversas pecaminosas e maus exemplos? Todos estes - diz Santo Agostinho - são anticristos e servos do diabo: todo aquele, não importa quem seja, padre ou leigo, que vive contra a justiça e as exigências de seu estado é um anticristo e um ministro de Satanás²⁰. 

O que vale mais: não negar a Cristo com os lábios ou não condenar uma fé tíbia que o nega pelas suas obras e que te conduz à perdição pelos seus pecados mortais? De que servirá a vossa fé, senão para uma vossa maior condenação? Que mais fazeis quando vos deixais seduzir pelos anticristos entre os quais viveis, mas renunciais a Cristo no mundo? Qual é o falso juramento que fizestes, senão renunciar a Deus por causa de um ganho temporal insignificante? Quando vos entregais a pensamentos e desejos impuros, que outra coisa fazeis senão gravar no vosso coração as palavras: 'Nego a Cristo'? Quando pecais por atos impuros, não trazeis esse mesmo sinal na vossa mão? Numa palavra, cada pecado mortal que cometeis em pensamento, palavra ou ação, nada mais é do que uma declaração de que, embora não abjureis a vossa fé em Cristo, recusais o amor e a obediência que lhe são devidos e recusais isso em nome de alguma riqueza, honra ou prazer que o espírito do Anticristo infernal vos oferece. E, desgraçadamente, quantos pecados mortais não são cometidos diariamente no mundo!

Cristãos! Que grande responsabilidade tende vós! Ah, pobres almas infelizes que viverão nos tempos do Anticristo, como sereis dignos de pena! Mas se vós, quase forçados como sereis a abandonar Deus por graves perseguições, tentações, tormentos, mentiras e pretensos milagres, fordes, no entanto, condenados por uma sentença muito justa a tormentos eternos, que desculpa teremos nós? Que inferno nos espera, aqueles que tão facilmente podemos desfrutar da liberdade de filhos de Deus e que, no entanto, nos deixamos desviar, afastamos de Deus e aceitamos ser atraídos para o rol do demônio para viver como anticristos, ou seja, inimigos declarados de Jesus Cristo?

Almas inocentes que desde então têm permanecido fieis ao vosso Senhor, fujam, fujam com toda a diligência possível daqueles que tentariam, de qualquer forma, levar-vos a fazer qualquer coisa contrária à lei de Deus! Sede firmes em todas as tentações e ocasiões de pecado! Pensai e dizei com coragem contra o Anticristo e os seus seguidores: 'Fora! Eu amo Jesus!' Este sinal estará no meu coração, nos meus olhos e nas minhas mãos. 'Eu amo Jesus Cristo!' Só a Ele servirei fielmente; a sua amizade não venderei por quaisquer bens, honras ou prazeres mundanos. Amo Jesus Cristo e amá-lo-ei enquanto tiver vida. Renuncio para sempre a tudo o que se opõe a Ele. E Vós, Deus Todo-Poderoso, concedei-nos a vossa graça poderosa para que possamos antecipar os tempos terríveis do Anticristo por meio de um verdadeiro arrependimento de todos os nossos pecados e fuga de todos os males que sustentarão o seu reino de orgulho e perversidade! Concedei-nos que vos sirvamos com mais zelo, com mais paciência nas adversidades, com um amor mais fervoroso por Vós, nosso Deus e Salvador, nas nossas atividades públicas, nas nossas ações exteriores, no nosso comportamento, para que nada nos possa ligar ao Anticristo e aos seus seguidores, mas que tudo isso nos ajude a perseverar na vossa fé e no vosso amor até à morte. Amém.

18. Omnis spiritus qui solvit Jesum, ex Deo non est; et hic est antichristus, de quo audistis quoniam venit, et nunc jam in mundo est (1Jo 4,3).
19. Non in persona, sed in spiritu, scilicet in suis praecursoribus.
20. Quicunqne contra justitiam vivit, etc., Antichristus est, minister Satanae (S. Agostinho c. 9. Tract de Antichristo).

(Excertos da obra 'Sermons on the Four Last Things' - Sermon 26, do Rev. Francis Hunolt /1694 -1746/, tradução do autor do blog)

quinta-feira, 4 de maio de 2023

BREVIÁRIO DIGITAL - LEGENDA ÁUREA (VI)

São Basílio estava prestes a morrer, prostrado pela doença que o consumia. Mandou chamar então um judeu chamado José, médico consumado de quem o homem de Deus gostava muito e pretendia converter. José tomou o pulso de Basílio, viu que ele estava à beira da morte e pediu aos serviçais: 'Preparem tudo que for necessário para seu sepultamento, porque ele está prestes a expirar'. Ao ouvir aquilo, Basílio disse-lhe: 'Você não sabe o que fala'. José replicou: ''Acredite, meu senhor, quando o sol morrer hoje, você morrerá também'. Basílio replicou: 'O que você dirá, se eu não morrer hoje?' José respondeu: 'Isso não é possível, senhor'. Basílio insistiu: 'E se eu ainda estiver vivo amanhã na sexta hora, o que você diria?' José respondeu: 'Se você sobreviver até essa hora, eu mesmo morrerei'. Então Basílio lhe disse: 'Pois bem, morra para o pecado a fim de viver para Cristo', ao que José respondeu: 'Entendo o que quer dizer; caso você viva até essa hora, farei aquilo a que me exorta'. 

Então o bem aventurado Basílio, que segundo as leis naturais devia morrer logo, obteve do Senhor um adiamento da morte e viveu até a nona hora do dia seguinte. Vendo aquilo, José ficou estupefato e converteu-se a Cristo. Basílio, com a força da alma superando a fraqueza do corpo, levantou-se da cama, foi à igreja e batizou José. Depois disso, retornou ao seu leito e imediatamente rendeu a alma a Deus. Ele viveu por volta do ano 370 do Senhor. 

(Excertos da obra 'Legenda Áurea - Vidas de Santos, de Jacopo de Varazze)

Legenda Áurea constitui meramente um livro de devoção católica, acessível às pessoas comuns de todas as épocas, sem nenhum propósito de abordagem biográfica da vida dos santos sob o escopo da veracidade ou da confiabilidade histórica. Trata-se, portanto, de uma coletânea de fatos ficcionais e inverídicos (lendários) que, uma vez associados às virtudes heroicas específicas dos diferentes santos da Igreja, tinha por objetivo incrementar a devoção católica do leitor pelos santos para a sua própria santificação pessoal. Alguns deles serão publicados no blog. A excelência dos objetivos e resultados alcançados pela obra pode ser aferida pelo enorme sucesso das muitas e diversas versões e traduções realizadas desde a sua publicação original no século XIII.