sábado, 31 de dezembro de 2022

ORAÇÃO PARA O ÚLTIMO DIA DO ANO

Obrigado, Senhor, pelo ano que termina,
porque estou aqui, junto Convosco e com minha
família (com meus amigos),
vivendo a alegria de ter vivido um ano mais
em Vossa Santa Presença.

Obrigado, Senhor,
por mais um ano de vida,
por ter tido ainda este tempo para viver
as santas alegrias do Natal e deste Ano Novo.
Por estar com pessoas que amo
e que compartilham comigo
a mesma fé e o sincero propósito
de viver o Evangelho a cada dia.

Obrigado, Senhor,
por tantas graças recebidas neste ano que passa;
eu Vos ofereço hoje o meu nada
e, dentro do meu nada, todo o meu amor humano possível,
como herança de Vossa Ressurreição.
No meio das luzes do mundo nesse dia de festa,
eu me recolho à sombra da Vossa Misericórdia;
e Vos honro e Vos dou glória nesse tempo
pelos tempos que estarei Convosco para sempre.

Obrigado, Senhor,
por estar aqui na Vossa Presença,
no tempo que conta mais um ano que se vai,
na gratidão da alma confiante
que aprendeu o caminho do Pai.
Das coisas boas que fiz, dou-Vos tudo,
porque as recebi de Vosso Santo Espírito.
E Vos suplico curar com Vosso Corpo e Sangue
as cicatrizes dos meus pecados.

Obrigado, Senhor,
pela caminhada diária com Maria,
que nos ensina no cotidiano de nossas vidas
a ir ao Vosso encontro todos os dias.
Pelo meu Santo Anjo da Guarda,
pelos meus santos de devoção,
pelo papa, e pela Vossa Igreja,
eu Vos agradeço, Senhor, e Vos louvo,
neste último dia do ano.

Obrigado, Senhor,
pelo ano que termina.
Que eu não me lembre nesse tempo
das dores e sofrimentos que passei,
das tristezas e angústias que vivi:
que todo mal seja olvidado agora
na alegria de eu estar aqui Convosco,
e pela resignação à Santa Vontade de Deus.

E que nesta última hora do tempo que se vai,
do ano que chega ao fim:
mais uma vez, não seja eu que viva,
mas o Cristo que vive em mim.
Amém.
(Arcos de Pilares)

INDULGÊNCIAS PLENÁRIAS DE VIRADA DO ANO

  

É concedida a indulgência plenária aos fieis que, na igreja ou publicamente, recitarem solenemente e com piedosa devoção os seguintes hinos nas datas da passagem de ano:

(i) Te Deum, no último dia do ano, em agradecimento a Deus pelos favores recebidos ao longo de todo o ano que termina.

(ii) Veni Creator Spiritus, no primeiro dia do ano, implorando o auxílio divino para o ano que se inicia.

IMAGEM DA SEMANA

 
Papa Bento XVI (1927 - 2022)

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

SOBRE O QUE É SER UM CATÓLICO VERDADEIRO

De tudo que temos dito, parece evidente que o verdadeiro e autêntico católico é aquele que ama a verdade de Deus e a Igreja, corpo de Cristo; aquele que não antepõe nada à religião divina e à fé católica: nem a autoridade de um homem, nem o amor, nem o gênio, nem a eloquência, nem a filosofia; mas que depreciando todas estas coisas e permanecendo solidamente firme na fé, está disposto a admitir e a crer somente o que a Igreja sempre e universalmente tem crido. 

Sabe que toda doutrina nova e nunca antes ouvida, insinuada por uma só pessoa, fora ou contra a doutrina comum dos fiéis, não tem nada a ver com a religião, mas que melhor constitui uma tentação, doutrinado nisto especialmente pelas palavras do Apóstolo Paulo: 'É necessário que entre vós haja partidos para que possam manifestar-se os que são realmente virtuosos' (I Cor 11,19) Como se dissesse: 'Deus não elimina imediatamente aos autores de heresias, para que se manifestem os que são de uma virtude provada, ou seja, para que apareça em que medida cada um é tenaz, fiel, constante e nele mora a fé católica'. 

E, verdadeiramente, apenas um vento de novidades começa a soprar, imediatamente se vê como os grãos coalhados de trigo se separam e se distinguem da casca sem peso, e como sem grande esforço é arrancado fora de lá o que não é sustentado por peso algum. Alguns voltam imediatamente; outros, no entanto, transtornados e desalentados, temem perecer, mas se envergonham de regressar, espancados como estão e mais mortos que vivos; parece exatamente como se tivessem bebido uma dose de veneno que já não podem eliminar e que, ainda que não lhes mate logo, não lhes permite seguir realmente vivendo. Situação desgraçada!

Quantas violentas aflições, quantas perturbações lhes assaltam! Já se deixam levar pelo erro como um vento impetuoso; já se recolhem em si mesmos, como ondas na tempestade, e são lançados na praia; outras vezes, com audácia temerária, dão sua conformidade ao que é errado; em outros momentos, sob o impulso de um medo irracional, se espantam até do que é verdade. Não sabem mais aonde ir, aonde voltar, não sabem o que querem, não sabem do que devem fugir, não sabem o que deve ser mantido e o que, ao contrário, deve ser rechaçado.

E se ao menos soubessem que estas dúvidas e esta angústia de um coração vacilante são o remédio que a misericórdia divina lhes preparou! Por isto precisamente, afastados do porto seguro da fé católica, são sacudidos, golpeados, como imersos na tempestade, para que, recolhidas e amainadas as velas da mente, que estavam estendidas ao largo e desdobradas aos ventos infiéis das novidades, voltem a buscar morada no refúgio confiado de sua Mãe boa e tranquila e, rechaçadas as ondas amargas e alvoroçadas do erro, possam alcançar a fonte de águas vivas e saltitantes e beber dela. Que 'desaprendam' bem o que não fizeram bem em aprender; e que compreendam, de todos os dogmas da Igreja, o que a inteligência pode compreender; o que não podem compreender, que creiam!

(Excertos da obra Commonitorium, de São Vicente de Lérins)

quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

OS GRANDES DOCUMENTOS DA IGREJA (XVI)

Carta Encíclica ADIUTRICEM POPULI 
 [05 de setembro de 1895]

Papa Leão XIII (1878 - 1903)

sobre o Rosário de Nossa Senhora


Consolador despertar da piedade mariana

1. É coisa boa celebrar com louvores sempre maiores e implorar com sempre mais viva confiança a Virgem Mãe de Deus, poderosa e misericordiosíssima auxiliadora do povo cristão. Com efeito, os motivos desta confiança e destes louvores são multiplicados por esse rico e variado tesouro de benefícios sempre mais abundantes derramados em toda parte por Maria para o bem-estar comum.

E, em troca de tal munificência, os católicos certamente não têm faltado ao seu dever de profundo reconhecimento. Visto como hoje, mais do que nunca, não obstante a presente luta contra a religião, podemos ver aumentados e sempre mais afervorados, em todas as classes da sociedade, o amor e o culto para com a beata Virgem.

E a reconstituição e a multiplicação das confrarias sob o seu patrocínio; a construção de suntuosos monumentos dedicados ao seu augusto nome; as peregrinações de multidões devotíssimas aos santuários mais venerados; os congressos que têm como finalidade uma sempre maior difusão da sua glória; e inúmeras outras manifestações deste gênero, excelentes por si mesmas e de feliz augúrio para o futuro, são luminosa prova deste fato.

Mas a nós apraz recordar aqui de modo especial que, entre as múltiplas formas de piedade para com Maria, a mais estimada e praticada é a, tão excelente, do santo Rosário. Isto, dizíamos, é de grande alegria para nós; porquanto, se temos dedicado parte notável das Nossas solicitudes a propagar a devoção do Rosário, tocamos com a mão a realidade de com que benevolência a Rainha do Céu, assim invocada, tem correspondido aos nossos votos; como esperamos que ela quererá também amenizar as dores e as amarguras que os próximos dias nos preparam.

Orar pelo retorno dos dissidentes

2. Mas é sobretudo para a difusão do Reino de Cristo que nós esperamos do poder do santo Rosário um socorro mais eficaz. O intento que agora com mais vivo desejo nos prefixamos, como muitas vezes temos dito, é a reconciliação dos povos separados da Igreja; declarando, ao mesmo tempo, que o êxito devemos esperá-lo sobretudo das fervorosas preces dirigidas à onipotência divina. Isto também recentemente afirmamos, por ocasião da solenidade de Pentecostes, recomendando fossem dirigidas, nesta intenção, preces especiais ao Espírito Santo. E sabemos que o nosso convite foi correspondido em toda parte com grande solicitude.

Mas, dada a importância da difícil empresa, e a necessidade de perseverar em toda santa ousadia, vem aqui muito a propósito o conselho do Apóstolo: 'Perseverai na oração' (Cl 4, 2); tanto mais quanto os felizes inícios da obra são de incitamento a esta perseverança na oração. Portanto, ó Veneráveis Irmãos, fareis a coisa mais útil para este fim, e para nós mais grata, se, durante todo o próximo outubro, vós e os vossos fiéis invocardes conosco devotissimamente a Virgem Mãe, com a recitação do santo Rosário nas formas prescritas. Poderosos motivos impelem-nos a, com absoluta confiança, confiar à sua proteção os nossos projetos e os nossos votos.

Maria no Cenáculo mestra dos apóstolos

3. O mistério do imenso amor de Cristo a nós teve, entre outras, uma luminosa manifestação quando Ele, perto de morrer, quis confiar ao seu discípulo João aquela mãe, sua própria Mãe, com aquele solene testamento: 'Eis aí teu filho!' Ora, na pessoa de João, segundo o pensamento constante da Igreja, Cristo quis indicar o gênero humano, e, particularmente, todos aqueles que a Ele adeririam pela fé. E é justamente neste sentido que Santo Anselmo de Cantuária exclama: 'O' Virgem, que privilégio pode ser tido em maior consideração do que esse pelo qual és a mãe daqueles para os quais Cristo se digna de ser pai e irmão?' (Santo Anselmo de Cantuária., Oratio 47).

Por sua parte, Maria generosamente aceitou e tem cumprido essa singular e pesada missão, cujo inícios foram consagrados no Cenáculo. Desde então ela ajudou admiravelmente os primeiros fiéis com a santidade do seu exemplo, com a autoridade dos seus conselhos, com a doçura dos seus incentivos, com a eficácia das Suas orações, tornando-se assim verdadeiramente mãe da Igreja e mestra e rainha dos Apóstolos, aos quais comunicou também aqueles divinos oráculos que ela 'conservava ciosamente no seu coração'.

Do Céu, Maria vela sobre a Igreja

4. Impossível seria, pois, dizer que amplitude e que eficácia hajam adquirido os seus socorros, quando ela foi levada para junto de seu divino Filho, àquele fastígio de glória que convinha à sua dignidade e ao esplendor dos méritos. Com efeito, de lá do alto, consoante os desígnios de Deus, ela começou a velar sobre a Igreja, a assistir-nos e a proteger-nos como uma mãe; de modo que, depois de ter sido a cooperadora da redenção humana, tornou-se também, pelo poder quase ilimitado que lhe foi conferido, a dispensadora da graça que em todos os tempos jorra dessa redenção.

Por isto, com bem razão as almas cristãs, obedecendo como que a um instinto natural, sentem-se arrastadas para Maria, para lhe comunicarem com toda confiança os seus projetos e as suas obras, as suas angústias e as suas alegrias; para recomendarem com filial abandono suas pessoas e suas coisas à bondade e solicitude dela. Por este justíssimo motivo, todos os povos e todos os ritos têm-lhe tributado louvores, que têm vindo sempre crescendo com o sufrágio dos séculos. Donde os títulos a ela dados de 'Mãe nossa, nossa Mediadora' (São Bernardo, Sermo II in Advento Domini, n. 5), 'Reparadora do mundo inteiro' (S. Tharasius, Oratio in Praesentatione Deiparae), 'Dispensadora dos dons celestes' (In Off. Graec., 8 dec., post oden 9).

Maria e a difusão do Evangelho

5. Ora, já que a fé é o fundamento e princípio dos dons divinos pelos quais o homem é elevado, acima da ordem da natureza, aos bens eternos, com toda a razão se celebra a mística influência de Maria para fazer adquirir e frutificar a fé. Maria, com efeito, é aquela que gerou o 'autor da fé', e que, em razão da sua fé, foi saudada bem-aventurada 'Ninguém, ó Virgem, tem pleno conhecimento de Deus senão por ti; ninguém se salva senão por ti, ó Mãe de Deus; ninguém, senão por ti, recebe dons da misericórdia divina' (São Germano Constantinopolitano, Oratio II in Dormitione B. M. V.). E, certamente, não poderá parecer exagerada a afirmação de que especialmente pela sua guia e pelo seu auxílio foi que, mesmo entre enormes obstáculos e adversidades, a sabedoria e as ordenações evangélicas se difundiram tão rapidamente em todo o mundo, instaurando por toda parte uma nova ordem de justiça e de paz.

Consideração esta que sem dúvida devia estar presente ao ânimo de São Cirilo de Alexandria quando, dirigindo-se à Virgem, lhe dizia: 'Por ti os Apóstolos pregaram aos povos a doutrina da salvação; por ti a santa Cruz é louvada e adorada no mundo inteiro; por ti os demônios são afugentados e o homem chamado de novo ao céu; por ti toda criatura, detida pelos erros da idolatria, é reconduzida ao conhecimento da verdade; por ti os fiéis chegaram ao batismo, e em toda parte do mundo foram fundadas as Igrejas' (São Cirilo de Alexandria, Homilia contra Nestorium).

Maria, cetro da verdadeira fé

6. Além disto, consoante o louvor do mesmo Doutor, ela foi vigorosíssimo 'cetro da verdadeira fé' (São Cirilo de Alexandria, Homilia contra Nestorium), pelo contínuo cuidado que teve de manter firme, intacta e fecunda, entre os povos, a fé católica. E disto existem provas numerosíssimas e assaz conhecidas, confirmadas às vezes por acontecimentos prodigiosos. Sobretudo nas épocas e nas regiões em que se houve de deplorar a fé esmorecida por causa da indiferença, ou atacada pelo pernicioso contágio dos erros, foi que o clemente socorro da Virgem se fez particularmente sentir.

Foi então que, graças ao seu impulso e ao seu apoio, surgiram homens, eminentes por santidade e por zelo apostólico, prontos a repelir os ataques dos perversos, a reconduzir as almas à prática e ao fervor da vida cristã. Sozinho, mas poderoso como muitos juntos, Domingos de Gusmão consagrou-se a esta dupla tarefa, tendo posto com êxito a sua confiança no Rosário de Maria.

E ninguém poderá pôr em dúvida que grande parte tenha a Mãe de Deus nos serviços prestados pelos veneráveis Padres e Doutores da Igreja, que tão notavelmente trabalharam em defender e ilustrar a doutrina católica. De fato, é a ela, sede da divina sabedoria, que eles atribuem com gratidão a fecunda inspiração dos seus escritos; foi por obra da Virgem Santíssima, e não pelo mérito deles, conforme eles mesmos atestam, que a malícia dos erros foi debelada.

Enfim, príncipes e Pontífices Romanos, guardas e defensores da fé tiveram o costume de recorrer sempre ao nome da divina Mãe: uns na direção das suas guerras sagradas, outros na promulgação dos seus solenes decretos; e sempre lhe experimentaram o poder e a proteção.

7. Por isto a Igreja e os Padres dirigem a Maria estas expressões não menos verdadeiras do que esplêndidas: 'Ave, ó boca sempre eloquente dos Apóstolos; ó sólido fundamento da fé; ó rocha inabalável da Igreja' (Do hino dos Gregos Theotokion). 'Ave: por ti nós fomos computados entre os cidadãos da Igreja, una, santa, católica e apostólica' (São João Damasceno, Oratio in Annunciatione Dei Genitricis, n. 9). 'Ave, ó divina fonte da qual os rios da eterna sabedoria, correndo com as puríssimas e limpidíssimas águas da ortodoxia, prostram a multidão dos erros' (São Germano Constantinopolitano, Oratione in Dei Praesentatione, n. 4). 'Alegra-te, já que só tu conseguiste destruir todas as heresias no mundo inteiro!' (no Ofício da B. V. M.).

Maria e a unidade da fé

8. Esta parte tão importante que a Santíssima Virgem teve e tem no curso de expansão, nos combates, nos triunfos da fé católica, torna mais luminoso o plano divino a seu respeito, e deve despertar em todos os bons uma grande esperança para a consecução de todas as finalidades que estão hoje nos anseios de cada um.

9. É preciso confiar em Maria; é preciso invocar Maria! Ó quão eficaz será o seu poder para a solícita realização do novo e tão desejado triunfo da religião, isto é, que no meio dos povos cristãos uma única profissão de fé deva manter unidas as mentes, e um único vínculo de perfeita caridade estreite os corações! Que não estará ela disposta a fazer para que todas as nações caminhem unidas 'na maravilhosa luz de Deus', quando com tanta insistência o seu Unigênito pediu ao Pai a união delas, e, por meio do batismo, as chamou a participar "da herança da salvação", adquirida com imenso preço? Poderá ela deixar de demonstrar a sua amorosa providência, quer para aliviar os longos trabalhos que para tal fim a Igreja, Esposa de Cristo, enfrenta, quer para realizar na família cristã esse dom da união que é o fruto precioso da sua maternidade?

A antiga unidade e o culto de Maria

10. E um sinal de que o augúrio não está tão longe de verificar-se está na opinião e na confiança, tão ardentes nas almas piedosas, de que Maria será o feliz laço que, com a sua força, unirá todos aqueles que amam a Cristo, onde quer que estejam, formando deles um só povo de irmãos, prontos a obedecer, como a um pai comum, ao Vigário de Cristo na terra, o Pontífice Romano.

Aqui o pensamento reporta-se espontaneamente, através dos fastos da Igreja, aos magníficos exemplos da primitiva unidade, e com mais gosto se detém na recordação do grande Concílio de Éfeso. Porquanto a plena concórdia da fé, a participação nos mesmos sacramentos, que então unia o Oriente e o Ocidente, aqui parece realmente afirmar-se com singular firmeza e brilhar de nova glória, quando os padres do Concílio anunciaram autorizadamente o dogma da divina Maternidade de Maria: a notícia de tal acontecimento, promanando daquela religiosíssima cidade exultante, encheu o mundo católico da mesma incontida alegria.

A oração pelos dissidentes, agradável a Maria

11. Todas estas razões, que sustentam e aumentam a confiança de ser ouvido pelo poder e pela bondade da Virgem, devem ser, para os católicos, outros tantos incitamentos para a rogarem - como nós vivamente recomendamos - com fervoroso empenho. Reflitam os fiéis em quanto é para eles decoroso e útil, e ao mesmo tempo quão aceito e grato para a Virgem Santíssima, este empenho.

De feito, possuindo eles a unidade da fé, destarte manifestam que justamente têm grandíssimo apreço o valor deste benefício, e que querem guardá-lo com todo escrúpulo. Nem podem eles manifestar de melhor forma o seu amor fraterno para com os separados, do que ajudando-os eficazmente de modo que possam reencontrar o maior de todos os bens. Tal afeto fraterno, verdadeiramente cristão, sempre operoso em toda a história da Igreja, achou sempre a sua força principal na Mãe de Deus, excelente fautora de paz e de unidade. São Germano de Constantinopla assim a invocava: 'Lembra-te dos cristãos, que são teus servos; ah! recomenda as orações de todos; conforta as esperanças de todos; reforça a fé; estreita as igrejas na unidade!' (São Germano Constantinopolitano, Oratio Hist. in Dormitione Deiparae).

O culto de Maria entre os Orientais

12. E ainda hoje os Gregos lhe dirigem esta oração: 'Ó Virgem toda pura, que podes sem temor aproximar-te de teu Filho, roga-o, ó toda santa, para que Ele dê a paz ao mundo e inspire um mesmo sentimento a todas as igrejas; e todos nós te aclamaremos!' (Men., 5 maii, post oden 9 de S. Ireneu V. M). E aqui se junta aos outros um motivo especial pelo qual é lícito esperar que a Santíssima Virgem escutará com maior benignidade as nossas preces em favor dos povos dissidentes, e esse motivo é o dos insignes méritos que eles - mas especialmente os orientais adquiriram para com ela. Porque é a eles que muito se deve se a sua devoção tanto se difundiu e cresceu.

Entre eles surgiram grandes apologistas e defensores da sua dignidade; panegiristas célebres pelo fogo e pela delicadeza da sua eloquência; 'imperatrizes diletíssimas a Deus' (São Cirilo de Alexandria, De Fide ad Pulcheriam et Sorores Reginas) que imitaram os exemplos da puríssima Virgem e lhe tributaram homenagens com a sua munificência; e, por último, igrejas e basílicas erguidas em sua honra com esplendor régio.

As imagens de Maria do Oriente ao Ocidente

13. A esta altura apraz-nos aditar uma consideração que, enquanto não é estranha ao assunto, ao mesmo tempo redunda em glória da santíssima Mãe de Deus. É esta: todos sabem que muitíssimas das suas augustas imagens, em diversas épocas, foram trazidas do Oriente para o Ocidente, e, especialmente na Itália e em Roma, foram acolhidas com suma piedade e honradas com magnificência pelos nossos avós, e veneradas depois pelos seus descendentes com não menor transporte.

Ora, nós gostamos de verificar neste fato unia disposição e um benefício da amorosíssima Mãe, já que isso parece querer significar que essas imagens são, junto a nós, como que, palpitantes monumentos de outros tempos, em que a família cristã vivia unida em toda parte do mundo; e como que preciosos penhores de uma comum herança. Por isto, ao contemplá-las, como que por inspiração da própria Virgem devem as almas piedosamente lembrar-se daqueles que a Igreja Católica chama com amorosa solicitude à antiga concórdia e à alegria que já provaram no seu seio.

O Rosário, oração eficaz para os dissidentes

14. Assim, um grande auxílio em vantagem da unidade da Igreja é-nos por Deus oferecido em Maria. E, conquanto este auxílio de muitos modos, possa ser merecido, Nós cremos que o melhor e o mais eficaz é o do Rosário já de outras vezes fizemos observar que não última entre as vantagens do santo Rosário é fornecer ao cristão um meio prático e fácil para alimentar a sua fé e preservá-la da ignorância e do perigo do erro; como manifestamente nos demonstram as suas próprias origens.

Ora, não é menos claro o quanto toca de perto a Maria esta fé, que se exercita quer com a repetida oração vocal, quer com a meditação dos mistérios. Porquanto, toda vez que nos pomos em oração diante dela e recitamos com devoção a santa coroa segundo o rito prescrito, nós recordamos a obra maravilhosa da nossa redenção, de modo a contemplarmos, como se se desenrolassem agora todos aqueles fatos que sucessivamente concorrem para torná-la ao mesmo tempo Mãe de Deus e Mãe nossa.

A excelência desta dupla dignidade e o fruto deste duplo ministério mostram-se-nos sob uma vivíssima luz, se piedosamente considerarmos a Virgem Maria ao lado de seu divino Filho nos mistérios gozosos, dolorosos e gloriosos. Daí resulta sentir-se a alma inflamada de um vivo sentimento de gratidão para com ela; e, desdenhando todas as coisas deste mundo, esforçar-se com firme propósito por se tornar digna de tal Mãe e dos seus benefícios.

Aliás, já que Maria, a mais amorosa de todas as mães, não pode deixar de se enternecer e de se mover à compaixão para com os homens por esta frequente e piedosa recordação de tais mistérios, o santo Rosário será, como temos dito, a oração mais oportuna para advogar junto a ela a causa de nossos irmãos dissidentes. Isto entra em cheio na missão da sua maternidade espiritual.

De fato, aqueles que pertencem a Cristo, não os gerou Nossa Senhora, nem podia gerá-los, senão na unidade da fé e do amor a Ele. 'Acaso Cristo foi feito em pedaços?' (1 Cor 1, 13). Por isto, todos nós devemos viver juntos a vida de Cristo, de modo a podermos 'colher frutos para Deus' (Rm 7, 4), num só e idêntico corpo. Necessário é, pois, que todos aqueles que a maldade dos acontecimentos separou desta unidade sejam de novo, por assim dizer, gerados para Cristo, desta mesma Mãe que Deus tornou perenemente fecunda de santa prole.

Ela, por sua parte, nenhuma outra coisa deseja mais ardentemente; e, se nós lhe oferecermos coroas tecidas desta oração a ela tão cara, nos será concedido em abundância os auxílios do 'Espírito Vivificado'. Praza a Deus que eles não recusem secundar os desejos desta sua misericordiosíssima Mãe; e que, lembrados da sua eterna salvação, escutem este amoroso convite: 'Ó filhos, por quem de novo sinto as dores do parto, até que Cristo seja formado em vós' (Gl 4, 19).

O Rosário difundido na Igreja do Oriente

15. Havendo observado o grande poder do santo Rosário em tal terreno, alguns dos Nossos Predecessores procuraram por todos os meios difundi-lo nos países orientais. Primeiro entre todos, Eugênio IV com a sua Constituição Apostólica Advesperascente, de 1139; depois Inocêncio XII e Clemente XI, que com a sua autoridade concederam, para este fim, largos privilégios à Ordem dos Frades Pregadores.

E os frutos não se fizeram esperar longamente, graças ao zelo e à atividade dos religiosos dessa Ordem, como está provado por inúmeros e claros documentos; se bem que aos progressos de tal obra fizesse não pouco dano a prolongada contrariedade dos tempos. Mas, nos nossos dias, naquelas regiões tem voltado a reflorir em muitos corações o mesmo entusiasmo pela devoção ao santo Rosário, que louvamos no principio desta Carta. E esperamos que este fato, tão condizente com os nossos desígnios, seja utilíssimo à realização dos nossos votos.

Novo templo à Virgem do Rosário em Patras

16. A esta esperança se junta um fato consolador, que diz respeito tanto ao Oriente quanto ao Ocidente, e que é plenamente conforme aos nossos desejos. Queremos referir-nos ao propósito, expresso no célebre Congresso Eucarístico de Jerusalém, de erigir-se um templo em honra da Rainha do Santíssimo Rosário em Patras, na Acácia, não longe daqueles lugares nos quais a proteção de Maria fez brilhar as glórias do nome cristão.

Já muitos de vós, exortados pela Comissão, surgida com a nossa aprovação, pressurosamente contribuístes para essa obra com subscrições, juntando-lhes também a promessa de um constante interesse até que a coisa esteja realizada. E, com isto, já se proveu a quanto basta para iniciar, sem mais, os trabalhos com a grandiosidade que convém a esta obra; e nós já autorizamos lançar-se solenemente, o mais breve possível, a primeira pedra desse edifício. O templo surgirá em nome do povo cristão, qual monumento de perene gratidão à nossa Auxiliadora e Mãe celeste. Lá ela será invocada incessantemente em rito latino e grego, a fim de que, com sempre mais benévola assistência, se digne de ajuntar aos antigos novos favores.

Mostra-te Mãe!*

17. E agora, ó Veneráveis Irmãos, a Nossa exortação volta ao ponto do qual partiu. Eia, pois que todos, pastores e rebanhos, especialmente no próximo mês, se coloquem, cheios de confiança, sob a proteção da augusta Virgem. Em público e em particular não cessem, com cantos, orações e votos, de invocar e suplicar confiadamente à Mãe de Deus e Mãe nossa: 'Ah! mostra-te Mãe!'. Que a sua clemência maternal queira preservar de todo perigo sua família inteira: que a conduza a uma verdadeira prosperidade, e sobretudo a estabeleça na santa unidade. Guarde ela com benevolência os católicos de todas as nações, e, unindo-os pelos vínculos da caridade, torne-os mais ativos e mais constantes em sustentar a honra da religião, da qual promanam, mesmo para os povos, os bens mais preciosos.

Guarde, depois, com suma benevolência também os dissidentes: essas grandes e ilustres nações, essas almas eleitas, que sentem a dignidade cristã. Suscite nelas salutares desejos, e depois os alimente e os leve a cumprimento. Redundem em vantagem dos dissidentes orientais a ardente devoção que eles professam para com Nossa Senhora, e os numerosos feitos realizados pelos seus antepassados para a glória dela. Depois, em vantagem dos dissidentes ocidentais redunde a lembrança do salutar patrocínio com que ela teve como cara e recompensou a extraordinária piedade que todas as classes sociais lhe professaram por muitas gerações.

Para estes dissidentes e para todos os outros, onde quer que se achem valha a voz unânime e suplicante de todos os povos católicos, e valha a Nossa voz, que até o último alento invocará: 'Mostra-te Mãe!'. Entrementes, como auspício dos dons celestes e em atestado da nossa benevolência, de todo coração concedemos a cada um de vós, ao vosso clero e ao vosso povo a nossa Bênção Apostólica.

* Diante dos gravíssimos problemas da perda da unidade da fé cristã, o papa faz um apelo dramático à Mãe de Deus: 'Mostra-te Mãe!'. E Nossa Senhora 'mostrou-se' de forma incontestável em Fátima em 1917, aparição mediada sob a autenticação direta do Céu mediante o extraordinário Milagre do Sol. A resposta aos anseios do papa é expresso na sua própria Pessoa, na consagração de toda a cristandade, incluindo a Rússia, ao seu Imaculado Coração. E quais foram as consequências e os efeitos da sua resposta e dos seus apelos à humanidade? 

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

O 'MAL' DA CRIAÇÃO E O SENTIDO DA VIDA

A vida tem profundo sentido para o homem que crê. E para o incrédulo? Non est pax impiisnão há paz para o homem irreligioso (Is 48, 22). Sem fé em Deus, não há possibilidade de encontrar sentido na vida humana. Incredulidade e ateísmo são manifestações de pessimismo existencial. A fé é a vitória do otimismo porque é a vitória do amor. 

Pessimismo ou otimismo – eis a base lógica do ateísmo e respectivamente da religião. Sem dúvida, haverá em muitos casos uma explicação psicológica. Mas o argumento psicológico não explica tudo: o problema atinge profundezas metafísicas. Todo o ser tem tendência de se afirmar, afirmando com isso o sentido do universo. Todo o ser existente é, no íntimo, otimista. O pessimismo e a negação de onde vêm? Do fator 'limitação'. O ser criado vive sempre na vizinhança do Nada de onde saiu. Somente Deus, 'Aquele que é' (Ex 3, 14), o Ser absoluto, a Plenitude do ser, é incapaz de vacilação, dúvida e negação. 

Pela criação, Deus chamou o homem a participar desta qualidade divina: de ser. A criação é para nós um mistério de amor e generosidade. É um milagre de amor; não tanto em Deus nos fazer, mas em retirar-se, esconder-se, diminuir-se, por assim dizer, pois nos é inconcebível como Deus não é tudo, como seu poder não se estende até todos os limites. Mas o fato é que a criação não se identifica com Deus. Deus, para criar o universo, não usou tanto do seu poder quanto de sua generosidade, eclipsando-se, não estendendo o seu poder até o limite. 'A criação é da parte de Deus um ato, não de expansão, mas antes de retraimento, de renúncia. Deus e todas as criaturas é menos que Deus só. Deus aceitou essa diminuição. Deixou uma parte do ser vazia de Si' (Weil, Simone – Espera de Dios, 1954, p. 98). Essa parte vazia de Deus, vazia do 'Ser' – eis o Nada que explica o mal e as imperfeições existentes neste mundo.

O mal, diz Santo Tomás de Aquino, não é nada positivo; é ausência, carência do ser. O conceito 'criação' implica necessariamente em 'mal' nesse sentido: em imperfeição, em limitação do ser. Pois, uma criação absolutamente perfeita é um contrassenso. Somente Deus possui a plenitude do ser, somente Ele é perfeito em sentido absoluto. E Deus não pode criar outro Deus. O ato da criação foi, pois, antes de manifestação de poder e grandeza, generosidade, renúncia ao poder. O 'mal', a imperfeição existente neste mundo é prova clara que Deus, por assim dizer, se retirou: se não o tivesse feito, não existiria o 'mal', porque não existiria criatura humana.

Nossa existência é certamente um bem: pois é participação do 'Ser'. Mas também um 'mal' porque é uma forma limitada de 'ser'. A própria palavra 'existência', tão em voga atualmente, revela essa situação. Deriva-se do latim ex-sistere, colocar-se fora. Existência é a saída de Deus. Isso implica o estarmos expostos, desprotegidos, ameaçados, em vizinhança perigosa com o nada, com o mal. O 'mistério da iniquidade' está justamente nisso: como é que o 'Nada', o mal, exerce tal influência sobre a criatura que ela o prefira à plenitude de ser a vida encontrada em Deus? Por que é que os homens 'amam as trevas mais do que a luz'? (Jo 3, 19). A carência mais do que a plenitude? O mal mais do que o bem? Pois essa preferência do 'mal', da carência do ser, é o verdadeiro mal, o mal moral: o pecado.

No pecado, concretizou-se o perigo da 'ex-sistência': caímos, sem segurança nem apoio, num abismo sem chão: no nada. A simples existência já era saída de Deus; mas o homem permanecia sustentado por Deus, envolvido pelo calor de seu amor paternal. Pelo pecado, colocou-se fora, até às trevas exteriores, realizou até ao máximo o potencial negativo da criatura, o seu caráter 'existencial'. Emancipou-se, escapou da mão de Deus, iludido pela sugestão diabólica: sereis emancipados, sereis semelhantes a Deus, conhecendo o bem e o mal. 

Em Cristo, nos foi revelado o sentido da vida humana, o sentido da humanidade e de todo o universo. Pois 'tudo foi criado por Ele e para Ele' (Cl 1, 16). O grandioso desígnio secreto que Deus tinha estabelecido consigo mesmo, consiste em 'restaurar em Cristo todas as coisas, quando tivesse chegado a plenitude dos tempos, assim as que há nos céus, como as que há na terra' (Ef 1, 10). A palavra 'restaurar' não traduz fielmente o sentido do original. A palavra correspondente no grego significa resumir, no fim de um discurso, os pontos principais; mais exato seria 'recapitular' – colocar tudo debaixo de uma cabeça, sob um denominador comum. 

No fim dos tempos Deus vai 'recapitular' o seu discurso: resumindo tudo num só ponto, colocando tudo debaixo de uma cabeça: Cristo, Verbo encarnado. Somente nEle tem o Pai as suas complacências. E somente quem estiver em Cristo e na medida em que estiver incorporado nEle, agradará ao Pai: 'Ninguém vem ao Pai senão por Mim' (Jo 14, 6) e 'Ninguém conhece o Pai senão o Filho e a quem o Filho o revelar' (Mt 11, 27). A volta para Deus, isto é, a plena realização da vida humana, somente se consegue em Cristo e por Cristo. Fora de Cristo não há salvação.

(Excertos da obra 'O Sentido da Vida', de  Dom Valfredo Tepe)

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

PALAVRAS DA SALVAÇÃO

'E tomei por advogado e senhor ao glorioso São José e me encomendei muito a ele. Vi com clareza que, tanto desta necessidade como de outras maiores, de perder a fama e a alma, esse pai e senhor meu me livrou melhor do que aquilo que eu sabia pedir. Não me lembro até hoje de haver-lhe suplicado nada que não me tenha concedido... É coisa que espanta as grandes mercês que me fez Deus por meio deste bem-aventurado santo, e dos perigos de que me livrou, tanto de corpo como de alma; que a outros santos parece que lhes deu o Senhor graça para socorrer em uma necessidade; mas a este glorioso santo tenho experiência de que socorre em todas, e quer o Senhor nos dar a entender, que assim como a ele esteve submetido na terra, pois como tinha nome de pai, sendo guardião, nele podia mandar, assim no céu faz o quanto lhe pede... Queria eu persuadir a todos que fossem devotos desse glorioso santo, pela grande experiência que tenho dos bens que alcança de Deus. Não conheci ninguém que lhe tenha verdadeira devoção e lhe faça serviços especiais, que não se veja mais beneficiado na virtude; pois ajuda muito às almas que a ele se encomendam'.

(Santa Teresa de Ávila)

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

A VIDA OCULTA EM DEUS: MATERNIDADE ESPIRITUAL


Deus dá à alma interior, como sua Esposa, uma verdadeira fecundidade espiritual. Assim, existem algumas almas no mundo que estão unidas a ela e devem nutrir-se dela como uma mãe alimenta os seus filhos. Não é necessário que ela conheça todas essas almas para se encarregar delas diante de Deus. Porém, às vezes, quando Ele julgar conveniente, Deus disporá de tal modo que a mãe e o filho espiritual se conheçam. Este encontro será de uma profunda alegria para ambos, totalmente espiritual e de coração. A alma interior não pode comunicar a vida divina senão do modo como o Pai a comunica ao Filho e o Filho ao Espírito Santo. A carne não possui nenhuma influência porque não há nada aqui para ela. O que nasceu do Espírito é Espírito e assim deve permanecer.

Nas origens das famílias religiosas, há sempre uma alma que vive nos cumes perto de Deus. Os problemas geralmente caem sobre ela em grande número como as gotas de uma chuva tempestuosa ou os flocos de uma tempestade de neve. Mas o amor que ela guarda em seu coração é mais forte do que tudo. E assim, o que seria motivo para a prostrar, a eleva; o que poderia extinguir a sua chama, a impele. O obstáculo torna-se uma solução e a ruína é o começo da prosperidade. Então ela assume toda a sua fortaleza e segue em frente no seu caminho, atraindo e arrastando tudo atrás de si.

(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte IV - Fecundidade Apostólica; tradução do autor do blog)

domingo, 25 de dezembro de 2022

FELIZ E SANTO NATAL EM CRISTO!

Desejo a todos os nossos amigos e visitantes um Santo e Feliz Natal! 

IGREJA CATÓLICA: ALMA DO NATAL
(Luís Dufaur)


CÂNTICO DE NATAL


Ó meu Menino Jesus, 
sede a minha esperança!
Que na gruta da vossa Belém 
eu possa renascer também
como uma outra criança!  

Ó meu Menino Jesus,  
sede minha santa alegria!
Que o meu presépio se faça 
banhando minha alma na graça
de uma pobre estrebaria!

Ó meu Menino Jesus, 
sede minha força e minha fé!
Que a mãe que me vela agora
seja a mesma Nossa Senhora 
da família de Nazaré!

Ó meu Menino Jesus, 
sede farol e minha luz!
Que este Natal de abraços,
se faça caminho de passos
que passam diante da Cruz! 

Ó meu Menino Jesus, 
sede a alma do meu viver!
Que este Natal me converta
em dom, partilha e oferta
para os que vão renascer!
E em dom, oferta e partilha,
onde ainda hoje não brilha
a luz do vosso nascer! 

Ó meu Menino Jesus, 
sede minha paz e todo bem!
Que eu viva a bem aventurança 
de adorar Deus feito criança
numa gruta de Belém!

(Arcos de Pilares)

ORAÇÃO: 25 DE DEZEMBRO DA DIVINA INFÂNCIA

  

A JESUS FEITO MENINO PELO NOSSO AMOR

Ó homem, vede com que amor este terno Salvador desceu do céu para vos buscar? Não ouvis os seus gritos infantis? Apenas nascido, dirige-se a vós, escuta como Ele vos chama pelos seus vagidos. Alma, alma, ó alma a quem amo, parece dizer-vos, a vós procuro; é para vós e pra obter o vosso amor, que vim do céu à terra. 

O' meu Jesus, soberano Senhor meu e Deus verdadeiro, quem vos determinou a descerdes do céu e a nascerdes numa gruta, se não o vosso amor aos homens? Quem vos arrebatou do seio do vosso eterno Pai e vos colocou numa lapa? Quem vos reduziu a deixar o vosso trono elevado acima de todos os tronos, para ficardes deitado sobre palha? Quem vos atraiu do meio dos coros dos anjos para vos colocar entre dois animais? Em santo ardor abrasais os serafins, e eis que tremeis de frio neste presépio! Aos céus e ao sol dais movimento, e eis que não vos podeis mudar de lugar sem socorro de um braço estranho! Provedes ao nutrimento dos homens e dos animais, e eis que precisais de um pouco de leite para sustentar a vossa vida. Sois a alegria do céu, e eis que vos ouço chorar e gemer! 

Dizei-me: por que todas estas misérias? É porque amais os homens. O' doce Menino, que viestes fazer sobre a terra? O que vindes aqui buscar? Ah! eu vos entendo: viestes para morrer por mim, para me livrar do inferno; viestes buscar-me, a mim, ovelha perdida, para que no futuro não me separe mais de vós, e vos ame. O' meu Jesus, meu tesouro, minha vida, meu amor, meu tudo, se não vos amo, a quem hei de querer amar? Onde posso achar um pai, um amigo, um mestre, mais amável do que vós, e que mais do que vós me queira bem? 

Amo-vos, meu Deus, amo-vos, meu único bem. Lastimo ter vivido tantos anos não somente sem vos amar mas ofendendo-vos e desprezando-vos. Perdoai-me, ó meu amadíssimo Redentor, arrependo-me de vos ter tratado assim, arrependo-me de toda a minha alma. Perdoai-me e dai-me a graça de não me separar mais de vós. Ó terna Mãe, minha advogada, suplicai ao vosso divino Filho que me perdoe e me conceda a santa perseverança até à morte!


(A Divina Infância de Jesus, celebrada a cada dia 25 do mês, por Santo Afonso Maria de Ligório)

sábado, 24 de dezembro de 2022

O NASCIMENTO DE JESUS

Maria sentiu um leve estremecimento no ventre. Estremecimento e não dor. Percebera-o nitidamente em meio ao movimento harmônico do trote do burrico pela estrada poeirenta. No recolhimento de sua oração profunda, sua mão busca tocar levemente o ventre como uma resposta imediata da Mãe ao sinal enviado pelo Filho: a longa preparação do Tempo dos Profetas há de ser realidade em breve naquele tempo da história e Deus feito homem vai nascer no mundo. É o primeiro sinal. Suave estremecimento, perceptível apenas por Maria, naquele momento da longa travessia que perpassa agora os campos abertos que levam mais adiante à Belém de todas as profecias.

José, puxando o burrico, olha para trás e se preocupa. O vento começa a soprar mais forte e mais frio e a jornada agora é mais lenta e penosa, nos declives mais acentuados da estrada que serpenteia pelo vale e pelos contrafortes de formações rochosas. E há muitas pessoas e alarido em torno deles. De tempos em tempos, são obrigados a parar e dar passagem a outros viajantes em marcha mais apressada ou para superarem com extremo cuidado os trechos mais íngremes. Quase todos os peregrinos têm o mesmo destino e o mesmo objetivo: apresentarem-se às autoridades em Belém e cumprirem as normas do novo recenseamento imposto pelas autoridades romanas. 

Em meio a um acontecimento regional e específico da história humana, está prestes a ocorrer o mais extraordinário evento da humanidade. Em meio ao burburinho e à agitação de toda aquela gente, Maria recebeu o primeiro sinal da manifestação da vinda do Messias prometido. Um murmúrio de humanidade no sagrado ventre consubstancia em definitivo o Mistério da Anunciação. Um leve estremecimento acaba de prenunciar o nascimento de Deus. 


As ruas estreitas se consomem de tanta gente. Há um cenário de mercado livre por toda a Belém daqueles dias. Eles acabaram de cumprir os registros formais do recenseamento e agora buscam ansiosamente uma pousada para o pernoite. Não é apenas o albergue principal da cidade que está com a lotação esgotada; as casas se transformaram em emaranhados de pessoas e utensílios, num entra e sai sem fim de gente ruidosa e apressada. Há o burburinho comum das crianças e o festim grotesco das ofertas gritadas e dos negócios de ocasião. No vaivém das ruas apinhadas e confusas, Maria e José buscam refúgio fora da cidade, além das casas mais ermas e mais afastadas. Aqui e ali ainda se veem acampamentos rústicos, improvisados, à guisa de refúgio de grupos mais ou menos numerosos. Além, mais além, as formações calcárias formam reintrâncias e cavernas, que muitas vezes são utilizadas como estrebarias pelos mercadores das grandes rotas até Jerusalém.

José leva o burrico na direção destas cavernas. Ele não sente no rosto o vento frio da tarde que se desvanece, nem o cansaço da longa jornada. Seu pensamento é todo, totalmente por Maria. A preocupação em encontrar um lugar digno para ela o consome por completo. A ânsia de dar descanso e refúgio a Maria tolhe todos os seus sentidos e atividades. A dimensão do mistério insondável o atordoa e o aniquila: a humanidade de José sente o peso incomensurável dos desígnios da Providência.

Passa adiante da primeira entrada, que não passa de um buraco estreito e irregular na rocha. A seguinte é pouco melhor do que isso. As demais mostram-se maiores e limpas, mas já estão todas ocupadas. As pessoas amontoam-se nos espaços exíguos em silêncio, homens na sua grande maioria, cercados por animais, feno e capim. São estrebarias que agora acomodam pessoas. José se inquieta ainda mais. Não há possibilidade aparente de privacidade para o nascimento de Jesus, não há lugar nenhum para um abrigo ainda que provisório. 

Avançado o paredão rochoso, José agora se depara com um cinturão de amendoeiras que margeiam o caminho adiante, que se abre, então, para campos e vales ao longe. Bem distante, na encosta suave do outro lado do vale, consegue divisar um pastor empurrando o seu rebanho. Nesse momento, sente os ombros dolorosamente pesados e seu andar vacilante. Seu olhar havia percorrido cada entrada rochosa e cada rosto humano em busca de recepção e de um gesto de boa vontade. E nada. Agora volve o seu olhar para Maria, como que pedindo perdão pela sua incapacidade e incerteza daquele momento. A humanidade inteira geme as suas ânsias pelo olhar desconsolado de José. 

Ao passar pela terceira gruta, Maria sentiu, como uma vibração percorrendo todo o seu corpo, o sopro do Espírito de Deus. Desde o primeiro sinal, recolhera-se, ainda com maior devoção, à oração de dar glórias ao Pai pelo que estava prestes a acontecer. Como serva da Anunciação, era agora a mesma serva como Mãe de Deus. E, nesse momento, pressentira o segundo sinal. A Divina Promessa iria dispensar a Redenção em breve à humanidade pecadora. Ao olhar para José, compreendendo a sua aflição e seu desapontamento, fitou-o com os olhos da perseverança e da fé inquebrantáveis e o brilho deste olhar emanava a própria luz de Deus.

Diante do olhar de Maria, a humanidade de José se detém e suas dúvidas se dissipam. Então, ele avança mais vinte, mais cinquenta metros, contorna as árvores e avista a gruta que emerge da continuação do maciço rochoso à esquerda. É e será sempre a visão do paraíso. Não é exatamente uma gruta, mas uma escavação que avança em profundidade na rocha e é protegida por uma murada frontal de pedras mal alinhadas, trançadas com restos de vigas de madeira, espalhados em desordenada profusão, que fecham de maneira irregular a entrada do lugar, protegendo-o dos ventos e das intempéries. Escondida, erma, isolada, bendita seja a gruta de Belém! 

Ela está suja, úmida, mal cuidada, mas não de todo desconhecida ou abandonada, porque um boi ali se encontra, com bastante feno e água. Há sujeira e palha solta em todos os lugares. Num canto, um arranjo de pedras enegrecidas indica o lugar de costume de se acender o fogo. Aliviado e feliz, José se consome nos arranjos práticos do refúgio improvisado. Ajuda Maria a entrar na gruta e se apressa a alimentá-la e a acomodá-la o melhor possível; dá feno e água ao burrico que é levado para junto do boi, monta um tablado de feno no chão, dispondo cuidadosamente os fardos; com paus e pedras, faz um arremedo de cercado em torno de Maria e o cobre com a sua manta grossa de viagem; empilha num canto os troncos e os pedaços de madeira espalhados; limpa as pedras e o chão com feixes de palhas e, com gravetos e pedaços de madeira seca, acende o fogo. A pequena luz se espalha pela escondida, erma, isolada, bendita gruta de Belém! 


O silêncio da gruta é quebrado apenas pelo crepitar das últimas chamas. O fogo aqueceu o espaço limitado e agora existe mais penumbra do que claridade. O fogo emoldura em repentes luminosos o rosto de José enquanto, pelas aberturas das muradas de pedras, o luar desenha feixes de luzes prateadas que cortam a escuridão que envolve toda a gruta. De repente, Maria põe-se de joelhos em contrita oração. Prostra-se com o rosto no chão e José percebe, apesar de toda a escuridão, o que está para acontecer. Coloca-se também de joelhos, também em fervorosa oração, louvando a Deus por ser testemunha e personagem de mistério tão extraordinário. Em muda expectativa, contempla o perfil de Maria apenas esboçado na escuridão da gruta.

A princípio, supõe ver os feixes de luar convergirem para o rosto de Maria ou auréolas de luz provenientes do fogo a envolverem completamente. Mas sabe que é muito mais que isso: uma luz, de claridade e brilho espantosos, nasce, emana e flui dela, enchendo a gruta de uma tal iridescência, que todas as coisas perdem a forma, o volume e a natureza material. Maria não se transfigura em luz, ela é a própria luz! O rosto de Maria é luz, as vestes de Maria são luz, as mãos de Maria são luz. Mas não é uma luz deste mundo, nem o brilho do cristal mais polido, nem o resplendor do diamante mais lapidado, nem a etérea luminosidade dos átomos em fissão; tudo isso seria uma mera pátina de luz. Maria torna-se um espelho do próprio Deus, da qual emana a luz do Céu!

José se transfigura neste redemoinho de luz sem ser a luz. Seus olhos puderam contemplar o terceiro e definitivo sinal da Natividade de Deus. E trêmulo, mudo, pasmado, contempla o recém-nascido acolhido entre os braços de Maria, recebendo o primeiro carinho e o primeiro beijo da Mãe Imaculada. Pressuroso e em êxtase, prepara a humilde manjedoura, o primeiro altar de Jesus na terra. O Filho do Deus Vivo já habita entre nós!

(Adaptação livre do autor do blog sobre os eventos prévios ao nascimento de Jesus)

sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

IMAGEM DA SEMANA


Os anjos cantaram no presépio de Belém: 'Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade' - Gloria in excelsis Deo et in terra pax hominibus bonae voluntatis. Jesus baixou à terra. O Príncipe da Paz veio estabelecer o seu reino de amor e de misericórdia. E nos dirá: 'Eu vos dou a minha paz". A paz de Deus não é como a dos homens. Os homens procuram a paz nos tratados, nos discursos, mas guardam no coração tanto ódio e tanta maldade! 

A Vossa paz, doce menino do Presépio, ó adorável Menino Jesus, é a paz inalterável e doce que penetra nas profundezas do coração. Ó doce paz do Senhor, como és boa para os que te conhecem! Mas a paz se encontra na luta contra nossa ingrata e pobre natureza, rebelde à graça. E só quem, cheio de boa vontade, abraçou a cruz de Jesus Cristo e aceitou o combate, só esse goza a verdadeira paz dos filhos de Deus. Vem daí a felicidade incomparável dos santos. Agora, mais do que nunca, o mundo tem necessidade de santos, porque o mundo tem necessidade de paz! Santos, isto é, homens de boa vontade! Precisamos de santos que preguem o amor, como São Francisco de Assis ou Santa Catarina de Sena, que assim bradava: Paz! Paz! Paz!... 

Nada triunfa no coração do homem como a paz. O ódio ao próximo é uma ofensa contra Deus. Devemos odiar o ódio. Que venha a paz sobre o mundo, ó Menino Jesus do Presépio, que venha a paz aos nossos corações!

(Excertos da obra 'Breviário da Confiança, do Pe. Ascânio Brandão)

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

TEMPO E OITAVAS DO NATAL


É sempre importante destacar que o Natal não contempla apenas o dia 25 de dezembro (com início solene da sua celebração na noite do dia 24 de dezembro). Na verdade, este é apenas o primeiro dia do Tempo do Natal, que transcorre desde o dia 25 de dezembro até o domingo do Batismo do Senhor de acordo com o atual calendário litúrgico e que, junto ao Tempo do Advento, constitui o período chamado de 'Ciclo do Natal'. Os oito dias entre 25 de dezembro e 1º de janeiro são chamados 'Oitava de Natal' (cuja origens remontam as grandes festas judaicas que duravam oito dias e ao simbolismo do oitavo dia, como dia simbólico da eternidade, tempo sem fim que se segue ao período de uma semana convencional dos tempos humanos). Na Oitava de Natal, são celebradas as seguintes festas particulares:

26 de dezembro - Santo Estêvão: primeiro mártir do cristianismo, símbolo de todos que morreram em nome de Cristo.

27 de dezembro - São João Evangelista: 'o discípulo amado', símbolo de todos que seriam capazes de morrer em nome de Cristo.

28 de dezembro - Santos Inocentes: símbolo de todos que morreram por Cristo sem o saber. 

Domingo da Oitava - Sagrada Família: símbolo e modelo para todas as famílias cristãs (caso o domingo coincida com o dia 1º de janeiro, a data é transferida para o dia 30 de dezembro).

1º de janeiro - Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus. 

Esta semana é a mais santa de todas no ano, um tempo propício para se alcançar graças extraordinárias para toda Igreja e para todos os cristãos e, muito especialmente, para as benditas almas do Purgatório. Eis o tempo mais propício e mais especial para se rezar na intenção das almas de nossos entes queridos falecidos! 

O tempo de Natal é concluído com as seguintes datas principais:

6 de Janeiro – Solenidade da Epifania do Senhor ou Dia de Reis.
Domingo depois da Epifania – Festa do Batismo de Jesus Cristo.

No calendário litúrgico tradicional, o Tempo de Natal compreendia um período maior, que se estendia desde o dia 25 de dezembro até o dia 13 de janeiro, contemplando as seguintes festas principais:

25 de Dezembro – Nascimento do Menino Jesus.
28 de Dezembro – Massacre dos Santos Inocentes.
Domingo entre o Natal e a Oitava – Apresentação do Menino Jesus no Templo.
1 de Janeiro – Oitava de Natal.
Domingo entre a Oitava e a Epifania – Festa do Santíssimo Nome de Jesus (data transferida para o dia 02 de janeiro, no caso de não ocorrer um Domingo entre a Oitava do Natal e a Epifania).
6 de Janeiro – Epifania ou Dia de Reis.
Domingo depois da Epifania – Festa da Sagrada Família.
13 de Janeiro – Batismo de Jesus Cristo.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

TESOURO DE EXEMPLOS (192/194)

 

192 . SACERDOTE MÁRTIR

Santo era aquele sacerdote (cônego de Vich). Foi condenado à morte tão somente pelo 'crime' de ser sacerdote, porque os comunistas espanhóis tinham ódio mortal aos ministros de Cristo. Saiu para a morte... 

Tinha já diante dos olhos o pelotão de milicianos que o haveriam de matar. Ele está calmo: tem a paz da al. Pode-se dizer que um gozo celestial se espelha em seu semblante. Abriu a boca e disse então: 'Milicianos, três graças pedi a Deus durante a minha vida: a graça de ser sacerdote, a de morrer mártir e a de ser a minha morte a salvação de algum de meus assassinos. Consegui a primeira. Agora morro mártir de minha fé e de amor a Jesus Cristo. E, neste momento, peço-lhe que me conceda a última: que algum de vós se salve pelos méritos do sangue que vou derramar por amor de Deus.

Quando acabou de falar, um dos seus assassinos ajoelhou-se arrependido e quis ser assassinado e martirizado ao lado daquele sacerdote que até à hora da morte era tão santo e generoso.

193. TUDO PELO CÉU

São Martinho era naquele tempo um soldado. Encontrava-se com um pobre desnudo, que lhe pede uma esmola: dá-lhe a metade de sua capa... Pelos séculos dos séculos gozará desse ato de generosidade!

A. São João de Deus encontrou um pobre cheio de chagas e horrível de ver. Tomou-o sobre os seus ombros, levou-o a seu hospital e al, o curou com carinhos quase maternais. Pelos séculos dos séculos gozará desse ato de caridade!

B. Santo Isidoro, lavrador, ia para a roça. Arava a terra dura, recolhia os feixes à eira e com o calor do verão batia o trigo e dormia ao relento. Em meio de suas ocupações elevava o coração a Deus. Pelos séculos dos séculos gozará da recompensa dessas fadigas suportadas com paciência...

C. Santa Zita servia na casa de uma distinta senhora. Ia à fonte buscar água, varria a casa, acendia o lume na cozinha, aguentava as insolências de sua patroa e remendava os seus próprios e pobres vestidos. Enquanto suas mãos trabalhavam, seu coração orava. Pelos séculos dos séculos gozará a recompensa dessas humilhações dos serviços domésticos.

D. São Bento José Labre pedia esmola de porta em porta. Comia a mísera comida que lhe deitavam na pobre escudela. Levava aos ombros um saco e suas vestes eram um mosaico de mal costurados remendos. Onde dormia? Num palheiro. Onde descansava de suas longas caminhadas? À sombra de alguma árvore ou à beira dos caminhos. Onde rezava? Sua vida de peregrino era uma oração contínua. Pelos séculos dos séculos gozará de seu surrão de pobreza, do ladrar dos cães e do desprezo dos homens que passavam ao seu lado.

Qual é a vossa vida? Quais as vossas ocupações? O que importa é que penseis no céu, suspireis pelo céu e pelo céu e para o céu trabalheis, porque somente assim gozareis dos méritos de vossas obras pelos séculos dos séculos.

194. 'MÃE, TENHO DEZESSEIS ANOS!...'

Monsenhor Bougaud, um dos mais ilustres escritores franceses do século passado, fala-nos de uma senhora católica, com quem se passou o triste acontecimento que vamos transcrever. Tinha aquela senhora um filho. Nos primeiros anos educou- o cristãmente. Ensinava-lhe as rezas, levava-o à igreja, dava-lhe conselhos. Aos doze anos o menino entrou no Instituto de França.

Antes não tivesse entrado! Que se viu ali? O que ouviu naquela escola? A mãe julgava-o ainda um rapaz piedoso e honesto. Mas não era assim. Como havia de sê-lo, se em casa tivera sempre diante dos olhos os exemplos perversos do pai e no Instituto vivia no meio dos amigos mais ímpios e dissolutos? A mãe sonhava ainda; sonhava que o seu filho (com aqueles dezesseis anos que começavam a despertar no coração loucuras de libertinagem) era ainda uma alma de fé. 

Chegou um dia de grande festa religiosa. Pela manhã disse-lhe a mãe:
➖ Filho, queres ir comigo à igreja? Farás tua confissão e comungarás comigo...
Ao que o rapaz respondeu fria e secamente:
➖ Mãe, já tenho dezesseis anos!... Já não creio em Deus, nem nessas coisas.

Que golpe, que facada no coração daquela pobre mãe! Daquele tempo a esta parte são muitos os jovens como aquele, os operários e todos em geral que se multiplicam como larvas de insetos nos charcos de água podre. Só uma graça extraordinária de Deus os poderá arrancar desses charcos!

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)