domingo, 31 de agosto de 2025

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Com carinho preparastes uma mesa para o pobre' (Sl 67)

Primeira Leitura (Eclo 3,19-21.30-31) - Segunda Leitura (Hb 12,18-19.22-24a) -  Evangelho (Lc 14,1.7-14)

  31/08/2025 - VIGÉSIMO SEGUNDO DOMINGO DO TEMPO COMUM

'QUEM SE HUMILHA SERÁ ELEVADO'


Humildade e mansidão são os frutos da fé para deleite de abundantes graças de Deus para aquele que vive a generosidade despojada dos que seguem a Jesus: 'Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração' (Mt 11, 29). Na parábola do Evangelho deste domingo, estas virtudes essenciais da graça são manifestas na transposição dos primeiros e dos últimos lugares de um grande banquete.

Diante do Filho de Deus vivo, os escribas e fariseus se preocuparam primeiro em ocupar lugares de honra à mesa. Eles observavam Jesus, eles tinham curiosidade, interesse e empenho em questionar Jesus por qualquer uma de suas palavras ou ações, mas não percebiam a própria insensatez e vaidade de suas ações primeiras: a busca desenfreada por ocupar os primeiros lugares, a vanglória de usufruir com pompas uma posição destacada na mesa de jantar, a jactância de se apropriar sem rodeios das melhores posições para exercerem, com maior júbilo e sem reservas, o desmedido orgulho de suas escolhas humanas.

Eis que Jesus os conclama a viver a humildade da vida em Deus, sem buscar os privilégios e os prestígios efêmeros do mundo: 'Quando tu fores convidado para uma festa de casamento, não ocupes o primeiro lugar... Mas, quando tu fores convidado, vai sentar-te no último lugar' (Lc 14, 8, 10). Como convivas do banquete, seremos provedores de honra ou da vergonha, dependendo da medida de nossa humildade ou da desdita de nosso orgulho: 'Porque quem se eleva, será humilhado e quem se humilha, será elevado' (Lc 14, 11).

E a humildade não pode prescindir do despojamento, da generosidade desinteressada, da mansidão. A mão que estende a dádiva não se curva à retribuição; a ação de oferta não se compraz da gratidão; a semente que gerou fruto não impõe recompensa alguma. Oferece o 'banquete' de seus dons e talentos aos pobres, e aleijados, e coxos, e cegos...'porque eles não te podem retribuir' (Lc 14, 14). Assim, sem a gratidão e os louvores humanos, o homem sábio ajunta tesouros e a recompensa eterna na ressurreição dos justos.

sábado, 30 de agosto de 2025

A GLÓRIA DAS GLÓRIAS É A CRUZ!

Toda ação de Cristo é glória da Igreja católica. Contudo, a glória das glórias é a cruz. Paulo, muito bem instruído, disse: 'Longe de mim gloriar-me a não ser na cruz de Cristo'.

Foi uma coisa digna de admiração que ele tenha recuperado a vista àquele cego de nascença em Siloé. Mas o que é isto em vista dos cegos do mundo inteiro? Foi estupendo e acima das forças da natureza ressuscitar Lázaro após quatro dias de morto. Mas a um só foi dada essa graça; e os outros todos, em toda a terra, mortos pelo pecado? Foi maravilhoso alimentar com cinco pães, qual fonte, a cinco mil homens. Mas e aqueles que em toda a parte sofrem a fome da ignorância? Foi magnífico libertar a mulher ligada há dezoito anos por Satanás; mas que é isto se considerarmos a todos nós, presos pelas cadeias de nossos pecados?

Pois bem; a glória da cruz encheu de luz os que estavam cegos pela ignorância, libertou os cativos do pecado, remiu o universo inteiro. Não nos envergonhemos da cruz do Salvador. Muito pelo contrário, dela tiremos glória. Pois a palavra da cruz é escândalo para os judeus e loucura para os gentios, para nós, no entanto, é salvação. Para aqueles que se perdem é loucura; para nós, que fomos salvos, é força de Deus. Não era um simples homem quem por nós morria; era o Filho de Deus feito homem.

Outrora o cordeiro, morto segundo a instituição mosaica, afastava para longe o devastador. Porém, o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo, não poderá muito mais libertar dos pecados? O sangue de um cordeiro irracional manifestava a salvação. Sendo assim, não trará muito maior salvação o sangue do Unigênito?

O Cordeiro não entregou a vida coagido, nem foi imolado à força, mas por sua plena vontade. Ouve o que ele disse: 'Tenho o poder de entregar minha vida; e tenho o poder de retomá-la'. Chegou, portanto, com toda a liberdade à paixão, alegre com a excelente obra, jubiloso pela coroa, felicitando-se com a salvação do homem. Não se envergonhou da cruz pois trazia a salvação para o mundo. Não era um homem qualquer aquele que padecia, era o Deus encarnado a combater pelo prêmio da obediência.

Por conseguinte, não te seja a cruz um gozo apenas em tempo de paz. Também em tempo de perseguição guarda a mesma fidelidade, não aconteça seres tu amigo de Jesus durante a paz e inimigo durante a guerra. Agora recebes a remissão dos pecados e és enriquecido com os generosos dons espirituais de teu rei. Rebentando a guerra, luta por ele valorosamente.

Jesus foi crucificado em teu favor, ele não tinha pecado. Tu, por tua vez, não te deixarás crucificar por aquele que em teu benefício foi pregado na cruz? Não estarás fazendo nenhum favor porque primeiro recebeste. Entretanto, mostras tua gratidão pagando a dívida a quem por ti foi crucificado no Gólgota.

(Das Catequeses de São Cirilo)

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

SOBRE AS ÚLTIMAS QUATRO COISAS (I)


PARTE I - SOBRE A MORTE

I. Sobre os Terrores da Morte

Parece-me desnecessário falar muito sobre os terrores da morte. O assunto já foi suficientemente abordado por vários escritores; além disso, todos sabem e sentem por si mesmos que a vida é doce e a morte é amarga. Por mais velho que seja um homem, por mais debilitada que seja sua saúde, por mais miseráveis que sejam suas circunstâncias, a ideia da morte é sempre desagradável. Há três razões principais pelas quais todas as pessoas sensatas temem tanto a morte:

Primeiro, porque o amor pela vida e o medo da morte são inerentes à natureza humana. Segundo, porque todo ser racional está bem ciente de que a morte é amarga e que a separação da alma e do corpo não pode ocorrer sem um sofrimento inexprimível. Terceiro, porque ninguém sabe para onde irá após a morte, ou como será seu julgamento no Dia do Juízo Final.

Será bom explicar a segunda e a terceira dessas razões de forma mais completa, a fim de que, por um lado, aqueles que levam uma vida descuidada possam talvez despertar para o medo da morte e aprender a evitar o pecado e, por outro, para que cada um de nós seja alertado a se preparar para a morte, para que não sejamos surpreendidos por ela sem estar preparados. Todos recuam instintivamente diante da morte, porque ela é amarga e dolorosa e além da percepção para a natureza humana. 

A alma do homem está sujeita a muitas ansiedades, apreensões e tristezas, e o corpo está sujeito a dores e doenças de todos os tipos, mas nenhuma dessas dores pode ser comparada à agonia da morte. Um homem que perde seu bom nome e seus bens sente uma dor aguda, mas não morre por causa disso. Todo sofrimento e doença, toda dor e angústia, por mais terríveis que sejam, são menos amargos do que a morte. Por isso, vemos a morte como um monarca poderoso, o mais cruel, o mais implacável, o mais formidável inimigo da humanidade. Observe um homem lutando contra a morte e você verá como o tirano domina, desfigura e prostra sua vítima. Agora, por que a morte é algo tão difícil, tão terrível?

É porque a alma tem que se separar do corpo. O corpo e a alma foram criados um para o outro, e sua união é tão íntima que a separação entre eles parece quase impossível. Eles suportariam quase tudo em vez de serem separados. A alma tem medo do futuro e da terra desconhecida para onde está indo. O corpo está consciente de que, assim que a alma se afastar dele, se tornará presa dos vermes. Consequentemente, a alma não suporta deixar o corpo, nem o corpo se separar da alma. O corpo e a alma desejam que sua união permaneça intacta e que juntos desfrutem das alegrias da vida.

Em uma de suas epístolas a Santo Agostinho, São Cirilo, bispo de Jerusalém, relata o que lhe foi dito por um homem que havia ressuscitado dos mortos. Entre outras coisas, ele disse: 'O momento em que minha alma deixou meu corpo foi de uma dor e angústia tão terríveis que ninguém pode imaginar a angústia que eu então suportei. Se todos os sofrimentos e dores concebíveis fossem reunidos, eles seriam nada em comparação com a tortura que eu sofri na separação da alma e do corpo'. E para enfatizar suas palavras, ele acrescentou, dirigindo-se a São Cirilo: 'Tu sabes que tens uma alma, mas não sabes o que ela é. Tu sabes que existem seres chamados anjos, mas és ignorante quanto à sua natureza. Tu também sabes que existe um Deus, mas não consegues compreender o seu ser. Assim é com tudo o que não tem forma corpórea; nossa compreensão não consegue captar essas coisas. Da mesma forma, é impossível para ti compreender como eu pude sofrer uma agonia tão intensa em um breve momento'. E se algumas pessoas aparentemente partem de forma muito pacífica, isso é porque a natureza, exausta pelo sofrimento, já não tem forças para lutar contra a morte.

Sabemos, pelo testemunho do próprio Nosso Redentor, que nenhuma agonia se compara à agonia da morte. Embora ao longo de toda a sua dolorosa Paixão Ele tenha sido torturado de forma terrível, todo o martírio que Ele suportou não se compara ao que Ele sofreu no momento da sua morte. Isso é o que deduzimos dos Evangelhos. Em nenhum lugar encontramos que, em qualquer período da sua vida, a grandeza das dores que Ele suportou tenha arrancado de Nosso Senhor um grito de angústia. Mas quando chegou o momento de Ele expirar, e a mão implacável da morte rasgou o seu Coração, lemos que Ele gritou em alta voz e entregou o espírito. Portanto, é evidente que em nenhum momento da Paixão Cristo sofreu tão intensamente como na separação mais dolorosa da sua alma sagrada do seu corpo abençoado.

Para que a humanidade pudesse, pelo menos em certa medida, compreender quão terrível foi a morte que Cristo morreu por nós, Ele determinou que, ao morrermos, provássemos um pouco da amargura da sua morte e experimentássemos a verdade das seguintes palavras do Papa São Gregório: 'O conflito de Cristo com a morte representou nosso último conflito, ensinando-nos que a agonia da morte é a agonia mais intensa que o homem já sentiu ou jamais sentirá. É vontade de Deus que o homem sofra tão intensamente no fim de sua vida, para que possamos reconhecer e apreciar a magnitude do amor de Cristo por nós, o benefício inestimável que Ele nos conferiu ao suportar a morte por nossa causa. Pois teria sido impossível para o homem conhecer plenamente o amor infinito de Deus, a menos que ele também tivesse bebido, em certa medida, do cálice amargo que Cristo bebeu'.

Nesta passagem dos escritos do santo Papa Gregório, somos ensinados que Cristo ordenou que todos os homens, na hora de sua dissolução, sofressem as mesmas dores que Cristo sofreu por nós em sua última agonia, a fim de que pudessem adquirir algum conhecimento, por sua própria experiência, da natureza terrível da morte que Ele suportou por nós e do grande preço que Ele pagou pelo nosso resgate. Quão dolorosa, quão terrível, quão horrível será a morte para nós, se a nossa morte se assemelhar, em qualquer grau que seja, à morte agonizante de Cristo!

Que conflito severo está diante de nós, pobres mortais! Que tormentos nos aguardam em nossa última hora! Quase nos sentimos inclinados a pensar que teria sido preferível nunca ter nascido, a nascer para sofrer tal angústia. Mas é assim que o Céu deve ser conquistado e somente por esta porta estreita podemos entrar no Paraíso. Portanto, ó cristão, aceite o seu destino com alegria e tome a firme resolução de suportar sem reclamar a amargura da morte. Pois é um grande mérito entregar a vida que todo homem ama tanto e submeter-se com mente pronta e disposta às dores da morte. E com o objetivo de encorajá-lo a ganhar méritos em seus últimos momentos, deixe-me aconselhá-lo a tomar a seguinte decisão de sofrer a morte com coragem.

RESOLUÇÃO

Ó Deus de toda justiça, que determinaste que, desde a queda de nossos primeiros pais, todos os homens morressem, e também que fosse o destino de muitos entre nós provar em sua morte algo das dores que o teu Filho suportou na hora da sua morte, eu me submeto de boa vontade a este teu severo decreto. Embora a vida seja doce para mim e a morte pareça muito amarga, ainda assim, por obediência a Ti, aceito voluntariamente a morte com todas as suas dores e estou pronto para entregar minha alma quando, onde e da maneira que for do agrado da Divina Providência. E uma vez que fizeste a morte tão amarga para o homem, a fim de que pudéssemos sentir, em certa medida, por nossa própria experiência, quão dolorosa foi a morte que o teu amado Filho sofreu por nossa causa, aceito de bom grado a pena da morte, para que, pelo menos no meu fim, possa conhecer algo das dores que o meu abençoado Senhor sofreu por minha causa. Em honra, portanto, da sua amarga Paixão e morte, submeto-me agora alegremente a quaisquer sofrimentos que eu possa ser chamado a passar no momento da minha partida, e declaro minha determinação de suportá-los com toda a constância de que sou capaz. Rezo para que esta resolução da minha parte seja agradável aos teus olhos e que Tu me dês a graça de suportar minha última agonia com paciência. Amém.

(Excertos da obra 'The Four Last Things - Death, Judgment, Hell and Heaven', do Pe. Martin Von Cochem, 1899; tradução do autor do blog)

OS PAPAS DA IGREJA (XXXIII)



quinta-feira, 28 de agosto de 2025

28 DE AGOSTO: SANTO AGOSTINHO DE HIPONA

 


"...Inquieto está o nosso coração enquanto não repousar em Ti."

Dia 28 de agosto é a festa de um dos grandes santos da Igreja, um dos fundadores da chamada Patrística (a fase inicial da formação da Teologia Cristã e seus dogmas). Santo Agostinho nasceu a 13 de novembro de 354, na pequena cidade de Tagaste, perto de Hipona, na Numídia (atual Argélia), filho de Patrício e Mônica (santa da Igreja Católica, cuja festa é celebrada em 27 de agosto). Da vida promíscua ao desvario da sua inclusão em seitas maniqueístas, Santo Agostinho experimentou desde a indiferença até a descrença completa nas coisas de Deus. A resposta da sua mãe, profundamente dolorosa diante a perspectiva da perda eterna da alma do filho amado, foi sempre a mesma: oração, oração, oração!

E a conversão de Agostinho foi lenta e profunda: no ano de 382, em Milão, então com 32 anos de idade, o santo foi finalmente batizado, junto com um amigo e o seu filho Adeodato (que morreria pouco tempo depois) por Santo Ambrósio. E que conversão! Sobre o tapete dos pecados passados, da vida desregrada da juventude (que descreveria com imenso desgosto em sua obra máxima ‘Confissões’), nasceria um santo dedicado por inteiro à glória de Deus, pregando como sacerdote e, mais tarde, como bispo de Hipona, que a verdadeira fonte da santidade nasce, renasce e se fortalece na humildade. Combateu com tal veemência as diversas frentes de heresias do seu tempo, incluindo o arianismo e o maniqueísmo, que foi alcunhado de Escudo da Fé e Martelo dos Hereges. Santo Agostinho, Doutor da Igreja e Defensor da Graça, morreu em 28 de agosto de 430, aos 76 anos de idade.

Excertos da Obra: 'Confissões', de Santo Agostinho:

'Amo-te, Senhor, com uma consciência não vacilante, mas firme. Feriste o meu coração com a tua palavra, e eu amei-te. Mas eis que o céu, e a terra, e todas as coisas que neles existem me dizem a mim, por toda a parte, que te ame, e não cessam de o dizer a todos os homens, de tal modo que eles não têm desculpa. Tu, porém, compadecer-te-ás mais profundamente de quem te compadeceres,e concederás a tua misericórdia àquele para quem fores misericordioso: de outra forma, é para surdos que o céu e a terra entoam os teus louvores. Mas que amo eu, quando te amo? Não a beleza do corpo, nem a glória do tempo, nem esta claridade da luz, tão amável a meus olhos, não as doces melodias de todo o gênero de canções, não a fragrância das flores, e dos perfumes, e dos aromas, não o maná e o mel, não os membros agradáveis aos abraços da carne. Não é isto o que eu amo, quando amo o meu Deus, E, no entanto, amo uma certa luz, e uma certa voz, e um certo perfume, e um certo alimento, e um certo abraço, quando amo o meu Deus, luz, voz, perfume, alimento, abraço do homem interior que há em mim, onde brilha para a minha alma o que não ocupa lugar, e onde ressoa o que o tempo não rouba, e onde exala perfume o que o vento não dissipa, e onde dá sabor o que a sofreguidão não diminui, e onde se une o que o que a saciedade não separa. Isto é o que eu amo, quando amo o meu Deus'.

'Aterrorizado com os meus pecados e com o peso da minha miséria, tinha considerado e meditado no meu coração fugir para a solidão, mas tu proibiste-me e encorajaste-me, dizendo: Cristo morreu por todos, a fim de que os que vivem já não vivam para si, mas para aquele que morreu por eles. Eis, Senhor, que eu lanço em ti a minha inquietação, a fim de que viva, e considerarei as maravilhas da tua Lei. Tu conheces a minha incapacidade e a minha fragilidade: ensina-me e cura-me. O teu Unigênito, em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência, redimiu-me com o seu sangue. Não me caluniem os soberbos, porque penso no preço da minha redenção, e como, e bebo, e distribuo, e, pobre, desejo saciar-me dele entre aqueles que dele se alimentam e saciam: e louvam o Senhor aqueles que o procuram'.

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

A CIÊNCIA DE DEUS (V)


No comentário sobre o Livro do Gênesis, escrito em 414 d.C, Santo Agostinho baseou-se em observações astronômicas consolidadas para chegar à conclusão de que o Primeiro Relato da Criação do Gênesis deve contemplar uma cosmogonia simbólica e não uma descrição científica pronta e acabada. No relato bíblico, cada 'dia' termina com as palavras 'veio a tarde e seguiu-se a manhã'. Santo Agostinho percebeu que os seis 'dias' não poderiam ter o significado usual de dias de 24 horas, pois era bem sabido que os horários da noite e do dia são diferentes em diferentes partes do mundo:

'Mas se eu disser que [os dias são períodos de vinte e quatro horas], receio que serei ridicularizado por aqueles que sabem isso com certeza... que durante o tempo em que é noite para nós, a presença da luz está iluminando outras partes do mundo, além das quais o sol estará retornando do seu pôr do sol para o seu renascer... Então, vamos realmente colocar Deus em alguma parte [do mundo] onde pode ser noite para ele, enquanto a luz se retira dessa parte para outra?' [St. Augustine, De Genesi ad Litteram].

E Santo Agostinho, inspirado por sua reverência pela sabedoria perfeita de Deus, considerou também desprovida a ideia de atos criativos, separados da parte de Deus, para explicar as origens dos seres vivos ou dos seres humanos. Se Deus é perfeito, seu ato criativo também deve ser perfeito, sem falta de nada, sem necessidade de atos divinos adicionais para completá-lo. Portanto, Santo Agostinho especulou que Deus criou o universo com tudo o que ele precisava para produzir vida. Por exemplo, ele ensinou que todos os seres vivos, incluindo os seres humanos, existiam naturalmente no universo desde o seu primeiro momento, não como organismos reais, mas como rationes seminales - isto é, com 'razões seminais' ou 'princípios similares a sementes' - ocultos na própria natureza ou, por assim dizer, na própria textura dos elementos... [requerendo apenas] a ocasião adequada e propícia para realmente emergir' [St. Augustine, De Trinitate 3.9.16. Cf. De Genesi].

Embora não tivesse noção de descendência comum a partir de um ancestral original, nem de seleção natural e variação genética, a integridade da natureza como fonte da vida, que Darwin defenderia, já era celebrada por este Padre e Doutor da Igreja um milênio e meio antes dele.

(Fonte: Society of Catholic Scientists, artigo de Christopher Baglow)

terça-feira, 26 de agosto de 2025

'SOU DEVORADO PELO AMOR DE DEUS!'


O 'santo' é aquele que ama. O que transforma um homem em 'santo' é o amor. Mas não o amor humano. Não o amor terreno. Não o amor carnal. Não o amor natural. Não, nenhum desses amores jamais pode transformar um homem em um 'santo'.

Se pensarmos em São Pedro e São Paulo, os Apóstolos, por exemplo, se pensarmos em Santa Maria Madalena e São João Evangelista, se pensarmos em São Francisco de Assis e Santa Clara, imediatamente entendemos que eles foram transformados em 'santos' somente pelo amor divino:

Foi somente o amor divino, de fato, que fez de São Pedro e São Paulo dois 'mártires' intrépidos , que fez de Santa Maria Madalena e São João Evangelista dois santos 'amados' por Jesus, que fez de São Francisco e Santa Clara de Assis dois santos 'seráficos'.

Os santos, todos os santos, são as obras-primas do amor divino, isto é, do amor a Deus e ao próximo, levado às alturas ardentes do amor heróico que procura sacrificar-se e consumir-se total e plenamente, sem medida, à imitação de Jesus crucificado que se sacrificou inteiramente, deixando-se esgotar por amor ao Pai e por amor a todo o homem.

A expressão do Padre Pio – 'sou devorado pelo amor de Deus e pelo amor ao próximo' – revela, precisamente, a dinâmica do amor divino que 'devora' e consome o homem, transformando-o num 'santo', isto é, numa 'sarça ardente' de amor que arde cada vez mais intensamente sem nunca se consumir (cf Ex 3,2).

Se refletirmos sobre a vida do Padre Pio, podemos ver que é exatamente assim que as coisas são. Desde criança, aos cinco anos de idade, ele foi inspirado a amar Jesus, já tentando imitá-lo, batendo-se com correntes, dormindo no chão, desejando compartilhar o seu sofrimento pelos pecadores. E, em sua vida religiosa como capuchinho e em seu apostolado sacerdotal, durante cinquenta anos sangrando estigmas, ele se ofereceu verdadeira e heroicamente à imolação diária em seu ministério como confessor para regenerar as almas dos homens para que fossem salvas e conduzidas ao Céu.

Este é o amor divino do 'santo'. Não um amor divino comedido ou medíocre, mas um amor 'devorador', sem medida. Não um amor divino de água e açúcar - como o nosso! - mas um amor divino inteiramente de 'sangue'.

(Excertos da obra 'O Pensamento do Padre Pio', do Pe. Stefano Manelli)