segunda-feira, 19 de outubro de 2020

TESOURO DE EXEMPLOS (25/27)


25. PÃO DOS FORTES

Na guerra da Criméia, um coronel francês recebe a ordem de apoderar-se de um fortim. Sem hesitar um instante, avança à frente de seu regimento, que ficou também eletrizado à vista de tamanha coragem. Calmo e impassível no meio das metralhadoras e baionetas, como se se encontrasse em uma parada militar, tomou de assalto a bateria inimiga, terrivelmente defendida pelos russos. Seu general, admirado por tão prodigiosa calma, exclama perante o Estado Maior:

➖ Coronel, que sangue frio! Onde aprendeste tamanha calma  em meio de tão grande perigo?
 Meu general - responde com toda a simplicidade o coronel - é porque eu comunguei esta manhã.

Honra ao coronel valoroso e cristão, e valoroso justamente porque cristão: e cristão não daqueles que se envergonham de sua fé ou se contentam com a comunhão de Páscoa, mas dos fervorosos que sabem alimentar-se do Pão dos Fortes com frequência e, particularmente, diante as circunstâncias mais difíceis da vida.

26. A FORÇA PARA O SACRIFÍCIO

Em 1901, teve início na França o fechamento de todos os conventos e a expulsão dos religiosos. Foi nesse período que se deu, em Reims, o seguinte caso contado pelo Cardeal Langenieux, arcebispo daquela cidade. Havia em Reims, entre outros, um hospital que abrigava somente os doentes atacados de doenças contagiosas, que não encontravam alhures nenhum enfermeiro que quisesse cuidar deles.

Em tais hospitais somente as Irmãs de Caridade costumavam tratar dos doentes e era essa a razão por que ainda não haviam expulsado as religiosas daquela casa. Um dia, porém, chegou ao hospital um grupo de conselheiros municipais informando à Superiora que precisavam visitar todas as salas e quartos do estabelecimento, porque tinham de enviar um relatório ao Governo. A Superiora conduziu atenciosamente aqueles senhores à primeira sala, em que se achavam doentes cujos rostos estavam devorados pelo cancro.

Os conselheiros fizeram uma visita apressada, deixando perceber, no entanto, em suas fisionomias, quanto lhes repugnava demorar-se ali. Passaram então à segunda sala; mas ai encontraram doentes atacados por doenças piores, sendo obrigados a puxar logo os seus lenços, pois não podiam suportar o mau cheiro. A passos rápidos percorreram as outras salas e, ao deixarem o hospital, aqueles homens estavam pálidos e visivelmente comovidos. Um deles, ao se despedir, perguntou à Irmã que os acompanhara:

➖ Quantos anos faz que a senhora trabalha aqui?

➖  Senhor, já são quarenta anos...

➖ Quarenta anos! - exclamou o outro cheio de pasmo - de onde hauris tanta coragem?

➖ Da santa comunhão que recebo diariamente -  respondeu a Superiora. E lhes digo mais, senhores, que no dia em que o Santíssimo Sacramento cessar de estar aqui, ninguém mais terá forças para ficar nesta casa.

27. O AMOR DOS PEQUENINOS

a) Primeira Comunhão

Perguntaram a uma piedosa jovenzinha:

➖ O que é a Primeira Comunhão?

➖ E' um dia de céu na terra.

Perguntaram-lhe então em seguida:

➖ E o que é o Céu?

➖ E' uma Primeira Comunhão que nunca terá fim - respondeu ela graciosamente.

E respondeu muito bem, porque a felicidade dos Anjos e Santos no Céu consiste em possuir a Deus eternamente. Ora, não é justamente a Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, que possuímos pela Santa Comunhão?

b) Dentes de Leite

Escrevia em 1905 um missionário: uma órfãzinha do Orfanato de Trichinopoli, que poderia ter dois palmos de altura, veio um dia suplicar a ele que fosse admitida à Primeira Comunhão.

➖ Que idade tens? perguntei a ela.

➖ Ah ! isso eu não sei.

Recolhida de lugar desconhecido, não se sabia quantos anos teria; nem as Irmãs o puderam descobrir.

➖ Mostra-me os dentes - disse.

Com um sorriso gracioso, descobre a inocentinha duas filas de alvíssimos dentinhos.

➖ Oh! exclamei; os teus dentes de leite dizem-me que não tens nem sete anos. Portanto, este ano não poderás fazer a Primeira Comunhão.

Meu Deus! quem o acreditaria?  Tendo ouvido aquelas palavras, a menina, sem dizer nada a ninguém, corre ao quintal, toma uma pedra e, intrepidamente, faz saltar da boca todos os dentinhos. Depois, com a boca ensanguentada e com ar de triunfo, volta e diz-me:

➖ Dai-me Jesus! Eu o quero agora!

Chorando de comoção, tomei-a em meus  braços e segredei-lhe ao ouvido:

➖ Amanhã, minha filha, amanhã te darei Jesus!

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

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domingo, 18 de outubro de 2020

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'Eu sou o Senhor, não existe outro: fora de mim não há deus...que todos saibam, do oriente ao ocidente, que fora de mim outro não existe. Eu sou o Senhor, não há outro' (Is 45, 5-6)

 18/10/2020 - Vigésimo Nono Domingo do Tempo Comum 

47. 'DAI A DEUS O QUE É DE DEUS'


Os fariseus encontravam-se plasmados em fúria; Jesus lhes dera a conhecer a dureza dos seus corações por meio de diversas parábolas. Tramavam a morte do Senhor, mas não a ousavam praticar de pronto temendo a perda de controle da situação e a insubmissão do povo. Era preciso criar subterfúgios, angariar apoio com encenações hipócritas, mentir e difamar, submeter Jesus a ciladas constrangedoras. Era preciso fazer a perfídia humana assumir a dimensão diabólica de um deicídio.

As velhas serpentes mandam alguns dos seus próprios discípulos e outros tantos coligados a Herodes para, com uma questão aparentemente proposta na forma de um dilema de consequências desastrosas, imporem a Jesus uma prova definitiva de condenação pública e explícita. Depois das adulações fraudulentas - 'Mestre, sabemos que és verdadeiro e que, de fato, ensinas o caminho de Deus... (Mt 22, 16), questionam Jesus se seria lícito ou não pagar o tributo imposto pelo governo romano. Em caso de uma resposta afirmativa, seria um declarado manifesto de submissão ao domínio de Roma; em caso negativo, Jesus seria o potencial mentor de uma sublevação.

Percebendo a malícia diabólica daqueles homens, Jesus os revela publicamente como hipócritas e, tomando nas mãos uma moeda cunhada com a efígie do imperador romano e, em resposta à declaração pública de que a figura e a inscrição presentes na mesma referem-se a César, responde: 'Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus' (Mt 22, 21). Em outros termos, Jesus declara à turba ensandecida dos fariseus: as obras humanas são necessárias, boas em si e devem ser feitas de acordo e ajustadas às circunstâncias e valores do mundo; as obras humanas inseridas na vida plena com Deus, entretanto, tornam-se instrumentos de graças e de salvação eterna.

Na moeda romana, convergem a figura de um homem e o valor de uma dada atividade humana. No espelho da alma, reflete-se em nós a própria imagem de Deus. Possuir e conviver com as coisas do mundo e delas se ocupar no cotidiano de nossas vidas, é vida que segue, é o suor do trabalho de nossa herança adâmica. Buscar as coisas do Alto, e projetar todas as nossas ações e pensamentos para a suprema glória divina, é o triunfo de nossa herança como filhos de Deus. No mundo ou passando pelo mundo, o livre arbítrio nos conduz a vivermos para César ou para Deus.

sábado, 17 de outubro de 2020

A ESCADA DE JACÓ

'Jacó, partindo de Bersabeia, tomou o caminho de Harã. Chegou a um lugar, e ali passou a noite, porque o sol já se tinha posto. Serviu-se como travesseiro de uma das pedras que ali se encontravam, e dormiu naquele mesmo lugar. E teve um sonho: via uma escada, que, apoiando-se na terra, tocava com o cimo o céu; e anjos de Deus subiam e desciam pela escada. No alto estava o Senhor, que lhe dizia: Eu sou o Senhor, o Deus de Abraão, teu pai e o Deus de Isaac; darei a ti e à tua descendência a terra em que estás deitado. Tua posteridade será tão numerosa como os grãos de poeira no solo; tu te estenderás, para o ocidente e para o oriente, para o norte e para o meio-dia, e todas as famílias da terra serão benditas em ti e em tua posteridade. Estou contigo, para te guardar aonde quer que fores, e te reconduzirei a esta terra, e não te abandonarei sem ter cumprido o que te prometi' (Gn 28, 10 - 15).

250 DOGMAS DE FÉ DA IGREJA CATÓLICA (VII)

PARTE XII - A PENITÊNCIA

200. A Igreja recebeu do Cristo o poder de remir os pecados cometidos após o batismo. 

201. Pela absolvição da Igreja, os pecados são verdadeiramente e imediatamente remidos. 

202. O poder da Igreja de perdoar os pecados estende-se a todos os pecados sem exceção. 

203. O exercício do poder da Igreja para perdoar os pecados é um ato judicial.

204. O perdão dos pecados que tem lugar no Tribunal da Penitência é um sacramento verdadeiro e válido, que é distinto do sacramento do batismo.

205. A justificação extra-sacramental é efetivada pelo perfeito arrependimento apenas quando ele é associado com o desejo para o sacramento (votum sacramenti).

206. A contrição emergindo por motivo de temor é moralmente boa e ação sobrenatural. 

207. A confissão sacramental do pecado é ordenado por Deus e é necessária para a salvação. 

208. Pela virtude da divina ordenança, todos os pecados graves de acordo com espécie e número, assim como aquelas circunstâncias que alteram a sua natureza, são objetos da obrigação da confissão.

209. A confissão dos pecados veniais não é necessária, mas é permitida e é útil. 

210. Nem todos os castigos temporais para o pecado são sempre remidos por Deus da culpa do pecado e do castigo eterno.

211. O sacerdote tem o direito e o dever, de acordo com a natureza dos pecados e a possibilidade do penitente, de impor obras salutares e apropriadas para a satisfação. 

212. As obras penitenciais extra-sacramentais, tais como desempenhar práticas penitenciais voluntárias e suportar pacientemente as provações mandadas por Deus, possuem valor satisfatório.

213. A forma do sacramento da penitência consiste nas palavras da absolvição.

214. A absolvição, em associação com os atos do penitente, efetiva o perdão dos pecados.

215. O efeito principal do sacramento da penitência é a reconciliação do pecador com Deus.

216. O sacramento da penitência é necessário para a salvação daqueles que, após o batismo, caem em pecado grave. 

217. Os únicos proprietários do poder de absolvição da Igreja são os bispos e os sacerdotes.

218. A absolvição dada por diáconos, clérigos ou ordem inferior e leigos não constitui a absolvição sacramental.

219. O Sacramento da penitência pode ser recebido por qualquer pessoa batizada que, após o batismo, cometeu um pecado grave ou venial.

220. O uso das indulgências é útil e salutar para o Fiel. 
(Todas as indulgências concedidas pela Igreja continuam válidas, mesmo as mais antigas).

PARTE XIII - AS SANTAS ORDENS

221. A Santa Ordem é um sacramento verdadeiro e distinto que foi instituído por Jesus Cristo.

222. A consagração dos sacerdotes constitui um sacramento.

223. Os bispos são superiores aos sacerdotes e o Bispo de Roma é o Papa e o chefe de todos.

224. O sacramento da ordem confere graça santificante sobre o receptor. 

225. O sacramento da ordem imprime um caráter sobre o receptor.

226. O sacramento da ordem confere um poder espiritual permanente sobre o receptor.

227. O dispensador ordinário de todos os graus da ordem, tanto sacramental como não-sacramental, é apenas o bispo validamente consagrado.

(Compilação da obra 'Fundamentos do Dogma Católico', de Ludwig Ott)

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'Meu filho, foge de todo o mal ou daquilo que se assemelha ao mal. Não sejas irascível: a cólera leva ao crime. Não sejas ciumento, conflituoso nem violento: essas paixões originam mortes. Meu filho, não sejas sensual: a sensualidade é o caminho para o adultério. Não uses de linguagem licenciosa, nem tenhas um olhar atrevido: também isso engendra adultério. Resguarda-te dos encantamentos, da astrologia, das purificações mágicas; recusa-te a vê-las e a ouvi-las: isso seria perderes-te na idolatria. Meu filho, não sejas mentiroso, porque a mentira conduz ao roubo. Não te deixes seduzir pelo dinheiro nem pela vaidade, que também incitam a roubar. Meu filho, não murmures contra os outros: tornar-te-ás blasfemo. Não sejas insolente nem malévolo, pois isso também conduz à blasfêmia. Usa de mansidão: 'Felizes os mansos, porque possuirão a terra' (Mt 5,5). Sê paciente, misericordioso, sem malícia, cheio de paz e bondade. Respeita sempre as palavras que ouviste do Senhor (Is 66,2). Não te engrandeças a ti próprio, não abandones o teu coração ao orgulho. Não te alies aos soberbos, mas frequenta os justos e os humildes. Recebe os acontecimentos da vida como dons, sabendo que é Deus quem dispõe sobre todas as coisas'.
 Da Didaqué (catequese cristã do primeiro século)

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

A FÉ EXPLICADA: O SUICÍDIO PODE SER PERDOADO?


O único pecado para o qual não existe perdão é o pecado contra o Espírito Santo. E em que consiste esse pecado? Consiste em fechar a mente e o coração à ação do Espírito Santo (Lc 12,10). E não é perdoado, porque por não permitir que a pessoa seja influenciada pelo Espírito Santo, ela não pode se arrepender e, sem arrependimento, não pode haver perdão. Na realidade, o pecado contra o Espírito Santo é a rejeição da graça de Deus e do arrependimento final: é a rejeição de Deus até o momento da morte.

O arrependimento ou contrição é essencial para receber o perdão de Deus. É assim que o Catecismo da Igreja Católica define a contrição: 'uma dor da alma e uma aversão ao pecado cometida com a resolução de não pecar novamente' (Catecismo da Igreja Católica: # 1451).

Existe a 'contrição perfeita', que é um dom do Espírito Santo e consiste em escolher Deus e rejeitar o pecado, porque preferimos Deus mais do que qualquer outra coisa. A 'contrição perfeita' brota, então, do amor de Deus acima de todas as coisas. Este tipo de arrependimento perdoa as faltas veniais e também obtém o perdão dos pecados mortais, desde que tenhamos a firme resolução de confessar esses pecados graves no Sacramento da Confissão o mais rápido possível (CIC: # 1452).

Existe ainda a 'contrição imperfeita' ou 'atrição', também impulso do Espírito Santo, pelo qual nos arrependemos de nossos pecados por medo da condenação eterna ou porque podemos apreciar a miséria do próprio pecado. Este tipo de arrependimento, embora imperfeito, é suficiente para obter o perdão dos pecados mortais ou veniais no Sacramento da Confissão (CIC: # 1453).

Por outro lado, o suicídio é gravemente contrário à justiça, à esperança e à caridade, sendo proibido pelo quinto mandamento. O suicídio contradiz a inclinação natural do ser humano a conservar e perpetuar a própria vida. Entretanto, ainda que gravíssimo, é um pecado também passível de acolhimento e perdão pela misericórdia divina, como explicitado pelo próprio Catecismo da Igreja: 'Não se deve desesperar pela salvação eterna das pessoas que se mataram. Deus pode ter providenciado a eles, de maneiras conhecidas apenas por Ele, a ocasião de arrependimento salvador. A Igreja reza pelas pessoas que atentaram contra a própria vida' (Catecismo da Igreja Católica: # 2283).

Somente Deus é o dono de cada vida humana. Não podemos dispor de nossa vida e de outras pessoas de acordo com nossos desejos e critérios. O mandamento 'não matar' se aplica à morte para si mesmo e à morte para quaisquer outras pessoas, incluindo bebês que ainda estão no ventre de sua mãe desde o primeiro momento de sua concepção; então o aborto, em qualquer momento durante a gravidez, também é um pecado grave. Outro pecado contra a vida é a eutanásia ou assassinato misericordioso, que consiste em acabar com a vida de um doente terminal. Ninguém tem o direito, nem o paciente nem os médicos, de decidir o momento da morte, por isso o chamado 'suicídio assistido' é também um pecado grave que cometem todos aqueles que colaboram para dar fim a uma vida humana.

Entretanto, por mais graves que sejam esses pecados contra a vida, todos são passíveis do perdão de Deus, se o devido arrependimento for cumprido e manifestado expressamente por meio do sacramento da confissão.

(adaptação de texto originalmente publicado em www.homilia.org)

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

ORAÇÃO: ATO DE CONTRIÇÃO


Meu Deus do meu coração, da minha alma, da minha vida, das minhas entranhas, a quem tanto ofendi: tanto meu Deus, e Senhor, como não tem o mar areias, o céu estrelas, o campo flores, as plantas folhas, cujo número não exceda a multidão sem número de meus pecados, a variedade sem conta dos meus delitos. 

Pequei, Senhor, ofendi-vos, fiz mal na face dos Céus e da terra; afastei-me de vossa Lei, dei as costas à vossa graça, adorei a vossa ofensa, fiz ídolo da minha culpa, corri sem temor nem pejo pelos caminhos do engano, da vaidade, da perdição. Ah meu Deus! quanto me pesa do muito que vos ofendi! Pesa-me do pouco que me pesa, do muito que vos agravei: mais me pesa pela muita ingratidão com que vos tenho agravado, que pelo grande inferno, que tenho merecido. 

Mas que digo, Senhor? nada me pesa, meu Deus: um pesar que me não tira a vida, não é pesar; uma pena que me não arranca esta alma, não é pena; uma dor que me não me parte o coração, ainda não é dor. Quisera ter uma pena das culpas que cometi, tamanha como as minhas culpas. Quisera ter uma mágoa da ofensa. Quisera ter uma dor igual à vossa misericórdia. Quisera com lágrimas de sangue chorar meus grandes pecados, mais pelo que tem de culpa e agravo contra vós, que pelo que tem de dano e perdição contra mim. Quisera, Senhor, que assim como no agravo foi infinita a culpa, fosse no arrependimento infinita a pena. 

Mas onde achei esta ânsia, senão na fonte de vossa graça? Onde acharei esta dor, senão no conhecimento de vossa bondade imensa e de minha maldade infinita? De onde hão de de vir estas lágrimas, senão do mar de Vossa misericórdia? 

Aqui venho aos vossos pés; não olheis o como; não estranheis o quando, não repareis no tarde, olhai somente que venho. Ó que miserável que venho, Senhor! Ó que torpe, ó que abominável! vestido das fealdades de meus pecados, coberto das torpezas de minhas culpas, cheio de abominações e vícios de minha vida! Mas como venho aos vossos pés, confiado venho, meu Deus, de achar em vossa misericórdia porto, em vossa piedade amparo, em vossa clemência refúgio, em vossa bondade remédio. 

Por isso, tremendo de vossa justiça, não me valho de outro seguro, mais que do de vossa clemência: não solicito outro abrigo, senão vossa misericórdia: nesta me fio, meu Deus; porque ainda que eu por minha culpa perdi o ser de filho, vós, Senhor, infinitamente bom não perdestes o ser e condição que tendes de Pai. 

Acabe pois, Senhor, em mim vossa graça infinita esta obra, que começou em mim vossa piedade infinita: acuda vossa clemência a esta miserável criatura e tende dó e compaixão desta pobre alma. Proponho com vossa graça emendar a vida, confessar as culpas, perseverar na emenda, perdoar agravos, esquecer-me de injúrias, aborrecer meus vícios, restituir como posso, satisfazer como devo aos vossos mandamentos. 

Espero, Senhor, em vossa bondade infinita me haveis de perdoar todos os meus pecados, pela morte e paixão de meu Senhor Jesus Cristo: porque, se nas suas chagas tendes a justiça para me castigar, também tendes a misericórdia para me favorecer. Misericórdia. Misericórdia. Misericórdia!

(Frei Antônio das Chagas, pregador apostólico)