domingo, 18 de julho de 2021

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'O Senhor é o pastor que me conduz; felicidade e todo bem hão de seguir-me!' (Sl 22)

 18/07/2021 - Décimo Sexto Domingo do Tempo Comum

34. A DUALIDADE DA GRAÇA 

O Evangelho deste domingo reflete as dimensões opostas da vida cristã em comunidade e em isolamento, feitas das santas alegrias do convívio social ou moldadas pelas graças do recolhimento absoluto, tangidas pelo frenesi de multidões em marcha ou pelo silêncio contemplativo dos claustros mais inacessíveis. Como nos são diversos os desígnios do Senhor! Quão diversos são os caminhos e os meios que imprimem a santidade no coração e na alma daqueles que buscam sinceramente a Deus!

Os Apóstolos haviam sido enviados por Jesus em missão, 'dois a dois' (Mc 6,7), com a recomendação expressa de levarem muito pouca coisa: 'nem pão, nem sacola, nem dinheiro na cintura' e nem 'duas túnicas' (Mc 6,8 - 9) e providos pela graça do dom da cura e do 'poder sobre os espíritos impuros' (Mc 6,7). E estes homens, pescadores sem erudição, sem alforge e sem preparos retóricos, cumpriram com coragem heróica e humildade santa os ditames proclamados pelo Mestre: levar a Boa Nova a todos os povos e a todas as nações! E, na santa alegria da primeira missão apostólica cumprida, retornam agora ao convívio do Senhor e, cheios de júbilo, 'contaram tudo o que haviam feito e ensinado' (Mc 6,30).

No convívio do Senhor! Na santa alegria do convívio do Senhor e dos demais Apóstolos, as primícias da Igreja são matizadas naqueles tempos pioneiros da evangelização universal. Uma comunidade viva, moldada pelos princípios das sólidas virtudes da humildade, do despojamento, da fraternidade e da partilha. Uma comunidade que crescia, que exigia novas pregações, que demandava zelo e tempo... Jesus, então, chama os seus discípulos: 'Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco' (Mc 6, 31). No meio da multidão, Jesus os exorta a viver a outra dimensão da realidade cristã, moldada pelo anonimato, pelo silêncio e pela solidão com Deus.

Nesse encontro pessoal com Deus, Jesus nos ensina a buscar a barca, os montes ou o deserto. Sim, na busca de uma maior intimidade com as coisas sobrenaturais, impõe-se afastar do burburinho e da agitação do mundo, para se mergulhar a alma no repouso físico e na contemplação do espírito. Eis, assim, a síntese da perfeição cristã, que associa ação e contemplação, convívio fraterno e recolhimento interior! E, como um círculo de perfeição, refaz-se em seguida a dualidade da graça: as multidões acercam-se uma vez mais do Mestre e este, movido pela compaixão, cerne da verdadeira devoção cristã, recomeça a sua pregação divina 'porque eram como ovelhas sem pastor' (Mc 30, 34).

sábado, 17 de julho de 2021

TESOURO DE EXEMPLOS (85/87)


85. A VIDA LENDÁRIA DE SÃO DIMAS

Contam antigas lendas que a Sagrada Família, ao fugir para o Egito, quis refugiar-se, para passar a noite, numa cova que, por desgraça, era uma guarida de ladrões. O capitão dos bandidos sentiu-se comovido ao ver a venerável bondade de São José, a pureza e formosura da Santíssima Virgem e o olhar todo celeste do Menino Jesus. Acolheu-os, deu-lhes de comer e, na manhã seguinte, ofereceu-lhes pão para a viagem e, a Maria, uma bacia de água para banhar o Menino. 

O capitão tinha um filhinho, aproximadamente da idade de Jesus, que se achava coberto de lepra. Nossa Senhora, correspondendo às finezas daquele homem rude e duro, mas que algo de bom tinha no coração, aconselhou-o a lavar o filhinho na água em que banhara o Menino Jesus. Assim o fez o bandoleiro e, no mesmo instante, seu filhinho ficou curado da lepra. O capitão lembrou muitas vezes ao filho a quem devia a saúde e a vida, dizendo: 'Foi o milagre de um Menino de tua idade, que seria, quem sabe, o Messias anunciado pelos profetas'.

Crescendo, seguiu aquele menino o exemplo do pai, tornando-se ladrão. Preso e condenado à morte, ao subir ao Calvário, ia pensando em Jesus, seu companheiro de suplício, que era tão santo e paciente, que, sem dúvida, havia de ser o Messias, aquele mesmo menino que o livrara da lepra. As lendas dizem que o bom ladrão se chamava Dimas e o mau, Gestas. Ambos foram condenados a morrer junto com Jesus e no mesmo suplício.

Atrás de Jesus subiram ao Calvário, levando suas cruzes. Junto com Ele, foram levantados nas respectivas cruzes. Viram como os soldados repartiam entre si as vestes do Salvador; mas, como a túnica era de uma só peça, tiraram a sorte a ver quem a levaria. Ouviram as palavras de Cristo: 'Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem'. Jesus era objeto de todos os insultos. A multidão, curiosa e soez, passava por diante dEle, e, movendo a cabeça em sinal de desprezo, diziam: 'Vamos! Tu que destróis o templo de Deus e em três dias o reedificas, salva-te a ti mesmo. Se és o Filho de Deus, desce da cruz...'

Todos blasfemavam e insultavam a Jesus. Mas a graça operou um milagre: um dos ladrões, Dimas, considerando as virtudes sobre-humanas de Jesus, acreditou ser Ele o Messias prometido e amou de todo o coração a Bondade infinita. Dirigindo-se a Gestas, o outro crucificado, repreendeu-o, dizendo: 'Como não temes a Deus, estando como estás no mesmo suplício? É justo, na verdade, que soframos por nossos crimes, mas Jesus, que mal Ele fez?'

E, cheio de esperança e com grande arrependimento, disse a Jesus: 'Senhor, quando chegares ao teu reino, lembra-te de mim'. Jesus, olhando Dimas com infinita misericórdia, respondeu: 'Em verdade te digo que hoje mesmo estarás comigo no paraíso'. Naquela mesma noite, a alma de Jesus visitou o limbo dos justos e concedeu ao Bom Ladrão a vista de Deus e a felicidade eterna. Sua festa litúrgica é celebrada no dia 25 de março.

86. UM PREGADOR QUE SACUDIA O AUDITÓRIO

Nascido em meados do século XIV, na formosa Valença, São Vicente Ferrer, já na infância, deu claros indícios de extraordinária missão que Deus lhe reservara. Gostava de ouvir sermões, para, depois, reunidos com os seus colegas, repetir-lhes com grande ardor os trechos mais impressionantes.

Apareceram, no pescoço de um seu amiguinho de cinco anos, umas chagas malignas. Vicente foi visitá-lo e, para mortificar-se e aliviar o doente, lambeu-lhe as chagas, que, imediatamente, desapareceram. Este foi o primeiro milagre que operou. Aos dezoito anos, entrou para a Ordem Dominicana, tornando-se professor famoso em várias universidades. Mas o fruto obtido por seus sermões fê-lo abandonar a cátedra e dedicar-se exclusivamente à pregação.

Percorreu, como pregador, grande parte da Europa, não faltando em nenhuma de suas missões o famoso sermão sobre o fim do mundo e o Juízo universal. Certa vez, ao pregá-lo numa praça diante de milhares de ouvintes, quando pronunciou com voz terrível aquelas palavras dos anjos: 'Levantai-vos, ó mortos, vinde ao Juízo!', todo auditório caiu por terra, como morto; e, todos, ao se erguerem, estavam pálidos e a tremer, como se surgissem dos sepulcros.

Outra vez, pregando o mesmo sermão, disse ser ele o anjo, do qual São João diz, no Apocalipse, que cruzará pelos ares, clamando: 'Temei a Deus e honrai-o, porque está chegando a hora do Juízo'. Escandalizaram-se alguns, ao ouvirem tais palavras; mas o santo, para provar-lhes que tinha razão, mandou que trouxessem uma defunta que era levada ao cemitério. Vários homens saíram e, realmente, encontraram o cortejo fúnebre e trouxeram à praça o caixão. Puseram-no, por ordem do santo, no meio do povo. O pregador mandou que a defunta se levantasse e convidou-a a reconhecer que era ele o anjo do Apocalipse, enviado por Deus para lembrar aos homens o fim do mundo. Ela confirmou a palavra do santo, diante daquela imensa multidão admirada.

Dirigindo-se à ressuscitada, perguntou São Vicente: 'Queres viver ou morrer de novo?' - 'Quero viver para fazer mais pelo céu'. E aquela mulher foi, por muitos anos, um atestado vivo do poder de São Vicente. Seus sermões convertiam cidades inteiras e enchiam os seminários e os conventos. Seguiam-no milhares de penitentes, indo os homens à direita, as mulheres à esquerda e, no meio, os sacerdotes, rezando todos o rosário e cantando hinos religiosos. Era de ver o fervor com que todos faziam penitência, disciplinando-se e implorando o perdão de seus pecados. São Vicente morreu como santo em 1419 e sua festa litúrgica é celebrada no dia 5 de abril.

87. SANTA CASSILDA

Era princesa moura, filha do rei Toledo, e nasceu em fins do século décimo. Seu boníssimo coração estremecia diante das misérias e sofrimentos que suportavam os escravos cristãos, aprisionados pelo rei em suas campanhas guerreiras. A princesa visitava as masmorras e socorria os prisioneiros com dádivas e palavras consoladoras. Eles, em troca, instruíam-na pouco a pouco na doutrina cristã.

Atraída pela beleza de nossa religião, tão heroica e ao mesmo tempo tão misericordiosa, Cassilda pedia a Nossa Senhora, da qual lhe haviam falado os cativos, que se compadecesse dela e lhe mostrasse o caminho para receber o batismo e viver seguindo a fé cristã. A Virgem atendeu às suas súplicas. Cassilda começou a sentir-se doente de mal estranho que lhe consumia os ossos, e contra o qual se mostravam impotentes os melhores médicos.

Um cativo cristão contou-lhe que, perto de Burgos, havia uma fonte, chamada de São Vicente, cujas águas curariam a sua doença. A princesa referiu ao pai o que ouvira do cativo e pediu-lhe licença para experimentar aquele remédio. Seu pai opôs-se, a princípio, por achar-se a fonte em terra de cristãos; mas, diante dos progressos da enfermidade, terminou por aceder. Acompanhada de um séquito deslumbrante, chegou Cassilda a Burgos, onde foi cortesmente recebida pelo rei Fernando I da Castela e hospedada com todas as honras. Dirigiu-se logo à prodigiosa fonte e, quando se banhou em suas águas, recobrou a saúde corporal. Atribuindo-a à intercessão de Nossa Senhora, acabou de instruir-se na doutrina cristã e, pouco depois, as águas do batismo deram-lhe a saúde da alma.

O rei, seu pai, alarmado com a demora e com as notícias que recebia, enviou-lhe mensageiros com a ordem de regressar imediatamente. Santa Cassilda mandou dizer-lhe que já era princesa do céu e que, por seu reino temporal, não queria perder o reino eterno. Mandou construir uma humilde cela perto da fonte milagrosa e da igreja, onde recebera o batismo, e ali passou a vida, dando exemplo de todas as virtudes, especialmente de caridade e penitência. Sua festa é celebrada no dia 9 de abril e suas preciosas relíquias são veneradas, atualmente, parte na catedral de Burgos e parte na catedral de Toledo.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

ver PÁGINA: TESOURO DE EXEMPLOS

sexta-feira, 16 de julho de 2021

GLÓRIAS DE MARIA: MÃE E FORMOSURA DO CARMELO

 


No dia 16 de julho de 1251, São Simão Stock suplicava a intercessão de Nossa Senhora para resolver problemas da Ordem Carmelita quando teve uma visão da Virgem que, trazendo o Escapulário nas mãos, lhe disse as seguintes palavras:

"Filho diletíssimo, recebe o Escapulário da tua Ordem, sinal especial de minha amizade fraterna, privilégio para ti e todos os carmelitas. Aqueles que morrerem com este Escapulário não padecerão o fogo do Inferno. É sinal de salvação, amparo e proteção nos perigos, e aliança de paz para sempre". 


Imposição e Uso do Escapulário

- Qualquer padre pode fazer a bênção e imposição do Escapulário à pessoa.

2 - A bênção e a imposição valem para toda a vida e, portanto, basta receber o Escapulário uma única vez.

- Quando o Escapulário se desgastar, basta substituí-lo por um novo.

- Mesmo quando alguém tiver a infelicidade de deixar de usá-lo durante algum tempo, pode simplesmente retomar o seu uso, não sendo necessária outra bênção.

5 - Uma vez recebido, o Escapulário deve ser usado em todas as ocasiões (inclusive ao dormir), preferencialmente no pescoço.

6 - Em casos de necessidade de retirada do Escapulário, como no caso de doenças e/ou internações em hospitais, a promessa de Nossa Senhora se mantém, como se a pessoa o estivesse usando.

7 - Mesmo um leigo pode fazer a imposição do Escapulário a uma pessoa em risco de morte, bastando recitar uma oração a Nossa Senhora e colocar na pessoa um escapulário já bento por algum sacerdote.

8 - O Escapulário pode ser substituído por uma medalha que tenha, de um lado, o Sagrado Coração de Jesus e, do outro, uma imagem de Nossa Senhora (por autorização do Papa São Pio X).
Oração a Nossa Senhora do Carmo
     Ó Virgem do Carmo e mãe amorosa de todos os fiéis, mas especialmente dos que vestem vosso sagrado Escapulário, em cujo número tenho a dita de ser incluído, intercedei por mim ante o trono do Altíssimo. 

          Obtende-me que, depois de uma vida verdadeiramente cristã, expire revestido deste santo hábito e, livrando-me do fogo do inferno, conforme prometestes, mereça sair quanto antes, por vossa intercessão poderosa, das chamas do Purgatório.

        Ó Virgem dulcíssima, dissestes que o Escapulário é a defesa nos perigos, sinal do vosso entranhado amor e laço de aliança sempiterna entre Vós e os vossos filhos. Fazei, pois, Mãe amorosíssima, que ele me una perpetuamente a Vós e livre para sempre minha alma do pecado. 

       Em prova do meu reconhecimento e fidelidade, ofereço-me todo a Vós, consagrando-Vos neste dia os meus olhos, meus ouvidos, minha boca, meu coração e todo o meu ser. E porque Vos pertenço inteiramente, guardai-me e defendei-me como filho e servidor vosso. Amém.

PARA VIVER A DIVINA MISERICÓRDIA UM DIA POR SEMANA¹⁰

  

Ó Sangue e Água que jorrastes do Coração de Jesus como fonte de misericórdia para nós,
eu confio em Vós!

'Fala ao mundo da Minha Misericórdia, que toda a humanidade conheça a Minha insondável misericórdia. Este é o sinal para os últimos tempos; depois dele virá o dia da justiça. Enquanto é tempo, recorram à fonte da Minha Misericórdia'

Intenção do Dia - Décima Semana

rezar pelas almas do Purgatório

Que as benditas almas do Purgatório / encontrem refrigério e graça / no Sangue e Água derramados / do Coração da infinita misericórdia de Jesus

quinta-feira, 15 de julho de 2021

A MEDIDA DO RIGOR DA JUSTIÇA DIVINA


Inocêncio III foi o papa da Igreja no período de 1198 até 1216, quando faleceu repentinamente. Eleito pontífice aos 37 anos, desenvolveu um dos mais longos pontificados (18 anos) e, entre as suas muitas e decisivas contribuições à Igreja, destacam-se a iniciativa de convocação do IV Concílio de Latrão, no qual foi definida dogmaticamente a doutrina da transubstanciação e o firme combate às heresias e às tentativas de invasão das hordas muçulmanas na Europa. São Francisco de Assis recebeu diretamente deste papa a permissão para fundar a sua Ordem dos Frades Menores.

Logo após a sua morte, este papa apresentou-se diante de Santa Lutgarda de Aywieres, uma das grandes místicas do século XIII, reconhecida pelas suas visões, profecias e diversos milagres, que incluíram até a levitação. A ela, o papa Inocêncio III revelou estar no Purgatório, ao qual descreveu como 'terrível', para a purgação de três pecados específicos cometidos em sua vida. Revelou ainda que que tal aparição consistia em um favor especial de Nossa Senhora, que o permitiu pedir, à mística belga, orações em sua intenção para a abreviação da sua pena e dos seus sofrimentos que, segundo ele, poderiam demandar um tempo 'equivalente a séculos'.

Assim, um papa, renomado e aclamado como um dos grandes pontífices da Igreja, revelou ser refém do Purgatório após a sua morte e que poderia padecer daqueles tormentos terríveis por um tempo da ordem de séculos, para expiação de três faltas específicas cometidas em vida. Desse fato - e quantos não o corroboram da mesma forma - resultam duas grandes lições:

(i) as almas do Purgatório não possuem méritos próprios para abreviar ou livrar-se das penas da purificação e, assim, dependem, em escala absoluta, da nossa intercessão neste mundo, para oferecer orações e penitências em suas intenções. 

(ii) os tempos de purgação são regulados pela justiça divina e não pelas interpretações humanas; quem morre, mesmo que seja uma pessoa reconhecidamente de grande bem e notória santidade, precisa de muitas orações e penitências de nossa parte. Não sabemos se qualquer pessoa falecida já está em Deus ou 'foi descansar' depois de um longo sofrimento nesta vida: em quaisquer circunstâncias, as almas dos falecidos precisam de nossas orações, orações e orações, não apenas nos dias seguintes à sua morte, mas todos os dias, ao longo de semanas, anos e mais anos, porque, definitivamente, não conhecemos com exatidão a magnitude da justiça divina.

A medida do rigor da justiça divina pode ser apreendida ao se relembrar um fato específico e quase casual das mensagens de Nossa Senhora em Fátima. Este fato ocorreu já na primeira aparição e a sua revelação deveu-se a uma resposta de Nossa Senhora a uma pergunta de Lúcia. Recapitulemos o diálogo entre a Mãe de Deus e a pastorinha de Fátima:

  - A Maria das Neves já está no céu?

   - Sim, está.

   - E a Amélia?

   - Estará no Purgatório até o fim do mundo.

quarta-feira, 14 de julho de 2021

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'Sem uma paixão, nada se alcança: a vida não tem um objetivo; arrasta-se uma vida inútil! Pois bem, na ordem da salvação, é necessário sentir também uma paixão que nos domine e faça produzir, para a glória de Deus, todos os frutos que o Senhor espera. Ame apaixonadamente tal virtude, tal verdade, tal mistério. Dedica-lhe a sua vida, consagra-lhe os seus pensamentos e trabalhos; sem isso, nunca alcançarás nada. No Juízo, Nosso Senhor nos censurará por seu amor. 'Você me amou menos que as criaturas! Você não fez de Mim a felicidade da sua vida! Você me amou o suficiente para não Me ofender mortalmente; mas não para viver de Mim!' Haverá quem diga: 'Que exagero!' Mas o que é o amor senão exagero? Exagerar é ir além da lei; pois bem, o amor deve exagerar!'.

(São Pedro Julião Eymard) 

terça-feira, 13 de julho de 2021

A VIDA OCULTA EM DEUS: OS 'TEMPOS MENORES' DA UNIÃO E AS NOVAS BUSCAS DE DEUS


A intimidade consciente da alma com Deus não se mantém constantemente no seu grau mais elevado. Com efeito, embora em certos momentos esteja muito viva, geralmente tende a ser bastante latente, oclusa, semiconsciente. Em uma palavra, ainda não é perfeita. Nestes longos momentos que poderiam ser chamados de 'tempos menores' da vida interior, a união ainda continua existindo. Deus ainda é o bem da alma e a alma ainda é o bem de Deus. Deus não duvida da alma, assim como a alma não duvida de Deus. Em ambos os lados existe ainda a fidelidade mais sensível.

E, no entanto, às vezes Deus parece se afastar. Se alguém perguntar ao interior da alma: 'Onde está o teu Deus? Ele não te abandonou?', ela responderia com toda a sinceridade do seu coração: 'É verdade que já não sinto mais tanto a sua presença comigo, mas ele não me abandonou. Na verdade, sei onde está e o que faz: pastoreia entre lírios'. Pois Jesus tem outras ovelhas que ama e que cuida. E eles constituem o seu rebanho.

Mas Deus continua a se ocultar e as horas vão passando. A esperança persiste viva em nossos corações. Uma vez que Deus se esconde, não há que se procurá-lo? E se Ele continua se escondendo, como é seu direito, não devemos buscá-lo sempre e continuamente como nosso dever? A alma interior deve então, mais do que tudo, proclamar muito alto e sinceramente, apesar disso lhe custar tanto, o direito de seu Deus dedicar-se a ela quando e como quiser.

Há bem pouco bastaria à alma recolher-se, e mirar-se no íntimo de si mesma, para aí encontrar o seu Deus e deleitar-se da paz e da alegria da sua presença e da sua posse. Mas eis que agora, não importa o quanto faça para retomar aquela intimidade interior que é como a fonte do repouso para estar com 'Aquele a quem o seu coração ama', ela não o possui e não o encontra, porque Deus assim o quer. Momentos dolorosos da vida interior, em que parece que as graças de outrora nada mais foram do que um raio que se desfez na noite e que nunca mais voltará a brilhar! Se a força divina não a sustentasse sem que ela soubesse e se a paz, uma paz profunda, não desse a certeza de que está tudo bem mesmo assim, a alma interior tenderia a abandonar a sua busca e prostraria desanimada. Mas não é isso que devemos fazer: devemos perseverar sempre!

A alma interior não pode resignar-se à ausência de Deus. Ela o procurou onde o encontraria, onde Ele se dignava a dar-se a ela, isto é, no íntimo de si mesma, mas foi em vão. O que fazer então? Ficar na inação estéril não é possível. O amor que não age não é verdadeiro. Se o Amado não vem à alma, a alma deve ir a Ele. Levantar-me-ei e andarei pela cidade, procurando o Amado da minha alma. Mas onde pode estar? Qual direção tomar para encontrá-lo? Ele não pode estar senão nesta cidade que é a sua, a cidade de Deus: 'Se percorrêssemos toda a cidade, se visitássemos todas as praças e todas as ruas da cidade, uma a uma, por acaso não o encontraríamos?'

E é assim que começa aquela busca incessante. A alma interior busca encontrar Aquele a quem ama no Céu, mais do que em qualquer outro lugar, pois é lá que Ele mora. E lá descortina tudo e lá percorre por todos os caminhos. Ela implora aos anjos e aos santos, e especialmente à Bem-aventurada Virgem Maria, que os façam encontrar o seu Deus. E todos a ouvem com gentileza e se solidarizam com ela. Eles a encorajam a perseverar. Mas, aparentemente, todos seguem uma ordem comum para se calarem. O silêncio deles é como um véu que envolve e recobre o Santo dos Santos. A alma compreende, então, que, apesar de seu forte desejo e insistência, esse véu não será desvelado. Vós sois um Deus oculto, ó meu Deus! Só Vós podeis iluminar as trevas e revelar-se à alma que o ama. Quando o fareis?

A alma então se volta para as almas do Purgatório. Talvez elas possam lhe dizer onde está o seu Deus e como fazer para encontrá-lo. Mas, infelizmente, também não tem melhor sorte com elas. 'O mal que padeces' - respondem estas almas - 'é o mesmo que sofremos. Não nos preocuparíamos com o fogo que nos atormenta se possuíssemos Aquele que também amamos. O que aumenta a nossa dor, tal como aumenta a sua, é que não sabemos quando esse Deus, tão justo e tão bom mesmo em seus rigores, se dignará a se mostrar finalmente a nós. Parece-nos que esse 'mal de amor' nunca vai ter fim. Pobre alma, que busca se acolher em quem lhe é ainda mais infeliz! Se o nosso Deus dignar-se a lhe devolver a alegria da sua doce presença, lembre-se de nós e suplique a Ele que venha nos encontrar também o mais rápido possível'. 

É preciso, portanto, voltar à terra e bater à porta daquelas almas que sabemos estar mais perto de Deus. Normalmente elas também se escondem. Mais que tudo, elas escondem cuidadosamente o segredo de suas vidas, mas percebemos quem são. Meio que adivinhamos quem são. E, discretamente, com receio de que nos afastem, as interrogamos: 'Como descobrir onde Deus se esconde? Como atrair sobre nós a presença de um Deus tão bom? Como podemos manter a sua presença em nós? Como trazê-lo à nossa volta se está longe? Certamente há uma  forma de acessá-lo e conquistá-lo. Quem poderia e gostaria de me ensinar isso? Queria tanto aprender e pagaria tudo para saber como! Quem se sensibilizaria por mim? Quem iluminaria o meu caminho, quem compartilharia esse segredo, quem me daria todas as respostas? Quem me permitiria, enfim, buscar e finalmente encontrar o meu Deus?' Todas essas perguntas permaneceriam sem resposta. Pois mesmo as almas mais santas seriam impotentes enquanto Deus não quiser fazer este encontro. E a alma desolada continuaria assim repetindo o grito doloroso do seu coração: 'Procurei por Deus e não o encontrei'.

Deus quer que a alma interior se submeta humildemente, como uma criança, àqueles que o representam legitimamente nesta terra. Ele permanece esperando por este último ato para recompensar todos os atos da alma de uma só vez. Por outro lado, a Deus agrada intervir quando toda a esperança parece perdida e, assim, manifestar a sua onipotência. Quer que tenhamos bem em conta que Ele é livre para dar quando e como quiser. A alma não ignora isso. E assim deixa ao seu Deus o cuidado e a hora de manifestar a sua recompensa. Enquanto isso, continua a sua caminhada e a sua busca incessante, até que o seu desejo seja enfim concedido. E, de repente, a alma encontra-se face a face diante de Deus. E, tal como outrora Maria Madalena, ouve também ser chamada pelo nome e, então, não é capaz de exclamar nada mais do que uma única frase: 'Meu Deus!'

Que alegria então, meu Deus, quando uma alma que Vos buscou por tanto tempo e com tanta dor, finalmente Vos encontrasse! Se fosse dada a pensar racionalmente, nem seria capaz de acreditar em tal coisa! Mas nem tem tempo para isso. A presença de Deus a imobiliza e, de certa forma, também o seu próprio pensamento. Deus aí está. O olhar da alma está posto em Deus, somente em Deus, fixado em Deus e por Deus cativado. Ó como é bom e suave contemplar-Vos, ó meu Deus, 'beleza sempre antiga e sempre eterna'! E, Vos contemplar, ainda que de forma imperfeita e velada no desterro dessa vida, já não é Vos possuir? É isso que experimenta a alma bem aventurada quando Deus se digna a aparecer a ela: parece que, verdadeiramente, contemplar-Vos já é possuir-Vos! E isso não é uma ilusão do seu coração.

(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte II -  A Ação de Deus; tradução do autor do blog)