quarta-feira, 19 de maio de 2021

SOBRE A SANTIDADE DO SOFRIMENTO


É fácil santificar as provações quando compreendemos o papel da dor no plano divino. 'Quem fará, com que minha oração seja ouvida', dizia Jó, 'e que Deus me conceda aquilo que espero, isto é, que Ele se digne esmagar-me, pondo fim aos meus dias à mercê de sua vontade e me reste ainda este consolo, e que exulte sob os golpes de uma dor implacável, por não haver contestado os decretos do Santo dos Santos?' (Jó 6, 8-10). Que Deus satisfaça, portanto, sua justiça, contente a sua santidade, exerça o seu poder, e que sua própria bondade proceda livremente, mergulhando-me na dor e retirando dessa mesma dor todos os benefícios que encerra.

São os atributos de Deus que exigem o sofrimento da criatura humana e o fazem servir aos desígnios da sabedoria eterna. Diante da desordem terrível que é o pecado, a justiça incorruptível reclama uma expiação; não pode desistir de seus direitos; Deus deixaria de ser Deus se não castigasse o pecado. Jó, como todos aqueles a quem a santidade da vida valeu grandes esclarecimentos, compreendia a equidade da sentença divina, que condena o homem pecador ao sofrimento. 

Como todas as almas perfeitas, sentia em si um vivo desejo de pagar suas dívidas à justiça divina. As mesmas luzes da graça revelavam-lhe ainda a pureza que o Deus infinitamente santo reclama de seus amigos e desejava ser purificado pelo sofrimento. Sabia também que a Sabedoria Incriada atinge seus fins por vias inteiramente opostas às dos homens e conduz à felicidade pelo sofrimento. Sabia que o Deus infinitamente poderoso e infinitamente bom podia procurar-lhe, por este meio, os mais preciosos bens. Como não pedir então ao Senhor que fosse até ao fim, e completasse nele sua obra, amarga, sem dúvida, porém benfazeja. Esse homem justo não deseja contradizer os decretos do Deus santo, pois se os planos divinos são sabedoria e bondade, pode o homem, infelizmente, fazê-los fracassar, ou, ao menos, impedir-lhe a plena realização. Jó deseja, portanto, e pede que não seja obstáculo aos desígnios do seu Deus.

Deus ficará satisfeito e nisto encontrará a sua glória. Que importa, pois, que eu gema; que importa que uma mísera criatura sofra, se Deus for glorificado, que importa que um ser, um nada, seja esmagado, se Deus ficar contente! Haveria quem protestasse e, para agrado do rei, fosse esmagado um pobre vermezinho, de cujo corpo moído exalasse suave perfume? Ou quem criticasse o consumo de grãos de incenso, queimados para aromatizar uma igreja, deleitar os fiéis e honrar a Deus? Pois bem, somos nós esses vermezinhos, esses pobres grãos de incenso; devemos considerar-nos felizes se, por meio de sofrimentos santamente suportados, fizéramos subir até ao trono de nosso Deus um delicioso perfume.

Tais os pensamentos a que devemos recorrer quando a dor nos oprime, em vez de recordar os fatos que nos entristecem, ou reanimar inutilmente uma ferida que o tempo cicatrizará. Quem maltratasse por prazer uma ferida sua e lhe rasgasse continuamente os tecidos que se refazem, procederia como um louco. Não é menos insensato quem repassa constantemente na memória, as causas de seus sofrimentos, as faltas de seus irmãos para com ele, as injustiças de que se julga vítima, ou os golpes da Providência que o fere. 

Ao contrário, devemos humilhar-nos e reconhecer que tais sofrimentos estão muito aquém do que merecemos, pois, se viéssemos a morrer, passaríamos por um rigoroso purgatório para expiar nossos pecados. Merecemos ser lançados ao fogo; como então podemos nos queixar? Nossas pobres almas, tão manchadas pelo pecado, pelo apego a nós mesmos e a toda espécie de imperfeições, precisam ser purificadas pelo sofrimento para se tornarem agradáveis aos olhos do Deus infinitamente santo. Há em nós como que uma marca que nos desfigura e não pode ser arrancada sem uma acerba dor.

E é este o pensamento que torna as almas humildes cada vez mais pacientes, enquanto que a falta de resignação indica um orgulho recôndito. Deus é justo quando nos experimenta; sua bondade, porém, brilha ainda mais que a sua justiça. Com efeito, Ele quer que essa dor, ao lavar e purificar as almas, lhes dilate, ao mesmo tempo, a beleza e os méritos. A dor passa, o mérito perdura; tantas outras penas já passaram, de que nem sequer nos lembramos. Deus, porém, conservou-lhes a lembrança, a fim de recompensar. Momentaneum et leve tribulationis nostrae aeternum gloriae pondus operatur in nobis [a nossa tribulação momentânea e  ligeira nos proporciona um peso eterno de glória (2Cor 4,17)]. Nossas penas são passageiras e leves, mas, no grande dia em que se fixar a nossa sorte; cada qual produzirá, e para sempre, novo esplendor de glória.

Deus é justo e santo, Deus é bom quando nos experimenta. Se, na dor, elevarmos para Ele o olhar, de nosso coração partirá um fiat generoso, que será um ato de amor perfeito. Talvez o esforço passageiro despendido será de efeito transitório e a lembrança do sofrimento nos perseguirá, mau grado nosso. A dor, afastada um momento pela resignação, voltaria ao coração; um novo esforço, porém, produzirá novo ato de submissão. Se fitarmos outra vez os olhos nas grandezas e perfeições de Deus, na sua bondade e santidade infinitas, faremos então outro ato de amor. Tantas vitórias alcançadas sobre a natureza, cem por dia talvez, tantos passos dados no caminho do amor e da perfeição.

(Excertos da obra 'O Caminho que leva a Deus', do Cônego Augusto Saudreau)

terça-feira, 18 de maio de 2021

O TEMPO DE DEUS

O que é o Tempo de Deus? Aqueles que isto perguntam ainda não te compreendem, ó sabedoria de Deus (Ef 3,10); ó luz das mentes, ainda não compreendem como são feitas as coisas que por meio de ti e em ti são feitas, e esforçam-se por saborear as realidades eternas, mas o seu coração esvoaça ainda nos movimentos passados e futuros das coisas, continuando vazio (Sl 5,10). 

Quem poderá deter o tempo e fixá-lo, a fim de que ele pare e por um momento capte o esplendor da eternidade sempre fixa, e a compare com os tempos nunca fixos, e veja que a eternidade é incomparável, e veja que um longo tempo não é longo senão a partir de muitos momentos que passam e não podem alongar-se simultaneamente; veja, pelo contrário, que, no que é eterno, nada é passado, mas tudo é presente, enquanto nenhum tempo é todo ele presente: e veja que todo o passado é obrigado a recuar a partir do futuro, e que todo o futuro se segue a partir de um passado, e que todo o passado e futuro são criados e derivam daquilo que é sempre presente? Quem poderá deter o coração do homem, a ponto de ele parar e ver como a eternidade, que é fixa, nem futura nem passada, determina os tempos futuros e passados? Será que, porventura, a minha mão consegue isto, ou que a minha boca, que se manifesta falando, realiza tão grande intento?

E tu não precedes os tempos com o tempo: se assim fosse, não precederias todos os tempos. Mas precedes todos os passados com a grandeza da tua eternidade sempre presente, e superas todos os futuros porque eles são futuros, e quando eles chegarem, serão passado; tu, porém, és o mesmo e os teus anos não têm fim (Sl 101,28; Hb 1,12). 

Os teus anos não vão nem vêm: os nossos vão e vêm, para que todos venham. Os teus anos existem todos ao mesmo tempo, porque não passam, e os que vão não são excluídos pelos que vêm, porque não passam: enquanto os nossos só existirão todos, quando todos não existirem. Os teus anos são um só dia (Sl 89,4; 2Pe 3,8), e o teu dia não é todos os dias, mas um ‘hoje’, porque o teu dia de hoje não antecede o de amanhã; pois não sucede ao de ontem. O teu hoje é a eternidade: por isso, geraste co-eterno contigo aquele a quem disseste: 'Eu hoje te gerei' (Sl 2,7; At 13,33; Hb 1,5; 5,5). Tu fizeste todos os tempos e tu és antes de todos os tempos, e não houve tempo algum em que não havia tempo.

(Do Livro das Confissões, de Santo Agostinho)

domingo, 16 de maio de 2021

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'Por entre aclamações Deus se elevou, o Senhor subiu ao toque da trombeta' (Sl 46)

 16/05/2021 - Festa da Ascensão do Senhor

25. 'IDE E ANUNCIAI O EVANGELHO!' 


Antes de subir aos Céus, Jesus manifesta aos seus discípulos (de ontem e de sempre) as bases do verdadeiro apostolado cristão, a ser levado a todos os povos e nações: 'Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura! Quem crer e for batizado será salvo. Quem não crer será condenado'. (Mc 16, 15 - 16). Ratificando as mensagens proféticas do Antigo Testamento, Nosso Senhor imprime diretamente no coração humano os sinais da fé sobrenatural e da esperança definitiva na Boa Nova do Evangelho, que nasce, se transcende e se propaga com a Igreja de Cristo na terra.

Antes de subir aos Céus, Jesus nos fez testemunhas da esperança. Pela ação de Pentecostes, pela efusão do Espírito Santo, pela manifestação da 'Força do Alto', os apóstolos tornar-se-iam instrumentos da graça e da conversão de muitos povos e nações: 'recebereis o poder do Espírito Santo que descerá sobre vós, para serdes minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e na Samaria, e até os confins da terra' (At 1,8). E os apóstolos assumiram de pronto a imensa tarefa a fazer, na missão a eles confiada por Jesus: 'Os discípulos então saíram e pregaram por toda parte. O Senhor os ajudava e confirmava sua palavra por meio dos sinais que a acompanhavam' (Mc 16, 20).

Na mesma certeza, somos continuadores dessa aliança de Deus com os homens, na missão de semear a Boa Nova do Evangelho nos terrenos áridos da humanidade pecadora para depois colher, a cem por um, os frutos da redenção nos campos eternos da glória. Como missionários da graça, 'Que ele abra o vosso coração à sua luz, para que saibais qual a esperança que o seu chamamento vos dá, qual a riqueza da glória que está na vossa herança com os santos' (Ef 1, 18). Neste propósito, nos anima e fortalece as divinas promessas da vitória antecipada da graça, na feliz espera de sermos partícipes de sua glória eterna.

Jesus se eleva diante dos seus discípulos e sobe para os Céus. Jesus vai primeiro porque é o Caminho que vai preparar, para cada um de nós, 'as muitas moradas da casa do Pai'. Na solenidade da Ascensão do Senhor, a Igreja comemora a glorificação final de Jesus Cristo na terra, como o Filho de Deus Vivo e, ao mesmo tempo, imprime na nossa alma o legado cristão que nos tornou, neste dia, testemunhas da esperança em Cristo e herdeiros da eternidade junto de Deus.

sábado, 15 de maio de 2021

10 QUESTÕES SOBRE UMA CERTA MISSA...

1. A Igreja Católica deve conceder exéquias eclesiásticas a pecadores públicos e manifestos, que assumiram uma vida notoriamente contrária aos princípios da autêntica fé cristã?

Não. Com uma exceção: a não ser em caso de um sinal ou manifestação explícita de arrependimento do pecador à sua condição de vida anterior.

2. Não existindo tal manifestação de arrependimento, essa concessão pode ser dada mediante atribuição específica de algum sacerdote ou de alguma diocese da Santa Igreja?

Não. Não, sem exceções.

3. Por que não?

Porque este impedimento está explícito no texto do Direito Canônico, por meio do Cân. 1184, que estabelece:

Cân. 1184 — § 1. Devem ser privados de exéquias eclesiásticas, a não ser que antes da morte tenham dado algum sinal de arrependimento: 1.° os apóstatas notórios, os hereges e os cismáticos; 2.° os que escolheram a cremação do corpo próprio, por razões contrárias à fé cristã; 3.° os outros pecadores manifestos, aos quais não se possam conceder exéquias eclesiásticas sem escândalo público dos fiéis.

4. Esses princípios se aplicariam também a uma possível concessão a tais pecadores da chamada missa de sétimo dia?

A não concessão de exéquias eclesiásticas privilegia particularmente a negação das missas exequiais, conforme claramente exposto no Cân. 1185:

Cân. 1185 — Àquele a quem foram recusadas exéquias eclesiásticas, deve também ser-lhe negada qualquer Missa exequial.

5. Assim, um pecador público não pode ser objeto de amparo espiritual pela Igreja Católica?

Podem e devem ser feitas orações e/ou outras intenções privadas em relação à vida de qualquer pessoa, em função do fato de que o julgamento final de cada alma é atributo exclusivamente da infinita justiça e misericórdia de Deus. E porque também são destinadas ao conforto espiritual dos parentes e amigos daquela pessoa. Mas, estas orações e intenções, não podem ser nunca expressas na intenção da alma de um pecador manifesto ou de um herege público na forma de uma missa exequial.

6. É, portanto, inválida a missa exequial nestas condições?

Absolutamente inválida porque as exéquias eclesiásticas, com as quais a Igreja implora o auxílio espiritual para os defuntos e honra os seus corpos e, ao mesmo tempo, leva aos vivos a consolação da esperança, devem celebrar-se em conformidade com as leis litúrgicas vigentes.

7. A missa exequial realizada nestas condições é apenas inválida?

Não, é muito mais grave do que isso, porque estabelece simultaneamente uma ruptura com a liturgia da Igreja e um espetáculo de escândalo público, além da possibilidade de incorporar um sem número de outros sacrilégios, incluindo manifestações e pronunciamentos totalmente antagônicos à sacralidade da liturgia, bem como comunhões sacrílegas, por exemplo. E, além disso, há todo um potencial ciclo de consequências dos que tendem a explorar o fato de forma a atacar a Santa Igreja, o que potencializa tremendamente a gravidade dessa situação. 

8. Mas o pecador impenitente não poderia se salvar no extremo momento da morte?

Possível é porque Deus é Deus. Mas a Igreja é extremamente prudente aos ditames da autêntica fé cristã: quem viveu por livre arbítrio de forma impenitente não pode contestar que a Santa Igreja tome por princípio que se morre como se vive e que, assim, quem vive impenitente morre também de forma impenitente. Os ritos da Santa Igreja não são ecumênicos e são expressamente destinados aos que creem e praticam in totum a doutrina ensinada por Nosso Senhor Jesus Cristo. 

9. Mas a percepção geral atualmente...

Nos tempos atuais, há uma percepção absolutamente falsa e ecumênica de que a salvação é uma coisa fácil e Deus, sendo um abismo de misericórdia, há de salvar todos os homens. A salvação de uma alma é uma luta difícil e obra de uma vida inteira de renúncia ao pecado e de perseverança na graça. Deus é um abismo de misericórdia e um abismo de justiça. A Igreja Católica, ciente disso, tem reiteradamente defendido, seja pela tradição, seja pelos ensinamentos dos Padres da Igreja, que o número dos que se salvam é pequeno, como explicitado cristalinamente pelo próprio Jesus: 'Fazei todo esforço possível para entrar pela porta estreita' (Lc 13, 22).

10. O que se pode constatar destes fatos recentes então?

Que o verdadeiro abismo é o pecado. Os que dele se usufruem, nele se refestelam e nele querem aplicar livre e generalizadamente todos os seus arbítrios. E ai daqueles que devendo ser os pastores do rebanho do Senhor e luz do mundo, aliam-se aos lobos por respeito humano, falta de prudência ou simplesmente pelas comezinhas retribuições mundanas. Tornam-se, como outros tantos, iguais pedras de escândalo. 

sexta-feira, 14 de maio de 2021

PARA VIVER A DIVINA MISERICÓRDIA UM DIA POR SEMANA¹

 

Ó Sangue e Água que jorrastes do Coração de Jesus como fonte de misericórdia para nós,
eu confio em Vós!

'Fala ao mundo da Minha Misericórdia, que toda a humanidade conheça a Minha insondável misericórdia. Este é o sinal para os últimos tempos; depois dele virá o dia da justiça. Enquanto é tempo, recorram à fonte da Minha Misericórdia'

Intenção do Dia - Primeira Semana

consagração à confiança e à misericórdia infinita de Deus

como pecador que sou / seria réu da justiça divina / mas pela graça do Senhor / quero ser obra da sua infinita misericórdia

quinta-feira, 13 de maio de 2021

104 ANOS DE FÁTIMA

Fátima é o acontecimento sobrenatural mais extraordinário de Nossa Senhora e a mais profética das aparições modernas (que incluíram a visão do inferno, 'terceiro segredo', consagração aos Primeiros Cinco Sábados, orações ensinadas por Nossa Senhora às crianças, consagração da Rússia, milagre do sol e as aparições do Anjo de Portugal), constituindo a proclamação definitiva das mensagens prévias dadas pela Mãe de Deus em Lourdes e La Salette. Por Fátima, o mundo poderá chegar à plena restauração da fé e da vida em Deus, conformando o paraíso na terra. Por Fátima, a humanidade será redimida e salva, pelo triunfo do Coração Imaculado de Maria. Se os homens esquecerem as glórias de Maria em Fátima e os tesouros da graça, serão também esquecidos por Deus.

'por fim, o meu Imaculado Coração triunfará'


Ver Postagem Especial na Biblioteca Digital do Blog
(a história completa de Fátima resumida em 100 questões):


FÁTIMA EM 100 FATOS E FOTOS