quarta-feira, 20 de novembro de 2019

SUMA TEOLÓGICA EM FORMA DE CATECISMO (XLII)

XVII

DO NOME DE JESUS CRISTO IMPOSTO AO VERBO ENCARNADO

Quando se impôs ao Filho de Deus o nome de Jesus?
Conforme o que o Anjo do Senhor havia ordenado a Maria e a José, foi-lhe imposto, no oitavo dia do seu nascimento, na cerimônia da circuncisão (XXXVII, 2)*.

O que significa o nome de Jesus imposto por ordem do Céu ao Filho de Deus feito homem?
Designa a sua qualidade característica na ordem da graça, a de Salvador do gênero humano.

Por que ao nome de Jesus se ajunta o de Cristo?
Por que a palavra Cristo, que significa Ungido, dá a entender a unção divina que o converte em Santo, Sacerdote e Rei dos domínios sobrenaturais (XXII, 1 ad 3).

Logo, qual é o seu significado integral e a quem designamos em concreto ao pronunciar o nome de Jesus Cristo?
Designamos ao Filho de Deus, coeterno e consubstanciai com o Pai e o Espírito Santo, Criador, conservador e governador supremo do universo; queremos dizer que este Verbo divino se revestiu da natureza humana e, sem deixar de ser Deus, se fez homem; que, com o dote de tão inefável união, obteve, enquanto homem, graças e privilégios de valor quase infinito, entre os quais sobressai a qualidade de Salvador dos homens, em virtude da qual é, por direito próprio, Mediador único junto de Deus, Pontífice Soberano, Rei Supremo, Profeta sem igual, chefe e cabeça dos eleitos, quer sejam homens ou anjos, pois uns e outros completam o seu corpo místico.

XVIII

DO BATISMO DE JESUS CRISTO

Por que, sendo Jesus Cristo o que acabamos de dizer, quis ser batizado com o batismo de São João ao começar a sua vida pública?
Porque assim convinha que inaugurasse a sua missão na terra. Era esta a de remir-nos; a Redenção consiste em perdoar os pecados, e esta remissão se efetuaria, por sua vez, mediante o batismo que ia promulgar e inaugurar. O batismo de Jesus Cristo é batismo de água, administrado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Todos os homens, sem exceção, devem recebê-lo, visto que todos são pecadores: por isso, querendo o divino Redentor dar a entender a sua imprescindível necessidade, solicitou Ele, que só a aparência tinha de pecador, o batismo de São João, simples figura do seu; e recebeu-o para santificar a água com o seu contato e dispô-la para ser a matéria do Sacramento. No seu batismo se revelaram e manifestaram as três Pessoas da Santíssima Trindade. Ele, na natureza humana; o Espírito Santo, na forma de pomba; e o Pai, na voz que se ouviu, como vinda do céu, dando-nos com isso a entender qual seria a forma do Sacramento. Por último, se declarou ali o seu efeito quando se abriu o céu sobre a cabeça do Salvador, pois também ao receberem a água batismal, o céu se abre para os homens, em virtude do batismo de Sangue com que Cristo havia de lavar em sua própria pessoa os pecados do mundo (XXXIX, 1-8).

XIX

DA VIDA PUBLICA DE JESUS CRISTO - DA TENTAÇÃO, PREGAÇÃO, MILAGRES E TRANSFIGURAÇÃO

Foi a vida pública de Jesus Cristo digna da sua concepção e nascimento e do batismo com que a inaugurou e, além disso, conforme com a sua missão e dignidade?
Sim, Senhor; porque levou uma vida modesta, simples e de extrema pobreza, pelo que preparou os ânimos para receberem a Nova Lei, fazendo que na sua própria pessoa acabasse o império da Antiga (XL, 1-4).

Por que quis Jesus Cristo ser tentado depois do batismo?
Para ensinar-nos a maneira como devemos resistir aos assaltos do inimigo e para subjugar, com a sua vitória, a audácia do demônio, ensoberbecido com a derrota que fez sofrer aos nossos primeiros pais no Paraíso (XLI, 1).

Pregou e ensinou Jesus Cristo da maneira mais convincente?
Sim, Senhor; porque percorreu pessoalmente todo o território do povo escolhido, a quem seu Pai o havia enviado e, em três anos de vida pública, não teve um momento de repouso, na empresa de ensinar aos homens, acomodando à sua capacidade os mistérios do reino dos céus (XLII, 1-4).

Foram convenientes e oportunos os milagres que fez?
Sim, Senhor; pois, com eles, deu provas irrefragáveis de quem era e de como dava aos homens meios infalíveis para reconhecê-lo, demonstrando a sua superioridade e onipotência sobre os espíritos, os corpos siderais, as enfermidades e misérias humanas e até sobre os próprios seres irracionais e insensíveis (XLIII, XLIV).

Fez algum que, por sua natureza e pelas circunstâncias que a rodearam, tivesse particularíssima e excepcional importância?
Sim, Senhor; o da Transfiguração (XLV).

Por que?
Porque, tendo revelado aos discípulos o mistério da sua paixão e morte ignominiosa num patíbulo e prognosticado como os seus sequazes haviam de acompanhá-lo no caminho do padecimento e da dor, quis que os três discípulos privilegiados vissem, na sua pessoa, a finalidade a que o padecimento conduz aos que têm a valentia de arrostá-lo por seu amor; e como esta doutrina e experiência eram o ponto culminante dos seus ensinos, aproveitou aquele momento solene para que proclamassem e dessem testemunho da sua autoridade e da veracidade das suas palavras, de um lado a Lei, personificada em Moisés e os Profetas, representados por Elias, e de outro, O Pai Celestial que deixou ouvir a sua voz, declarando-o Filho muito amado, a quem era necessário ouvir (XLV, 1-4).

Por que declarou o Pai a filiação divina do Filho por ocasião do Batismo e da Transfiguração?
Porque a filiação natural de Jesus Cristo é o modelo com que deve conformar-se a nossa filiação adotiva, e esta começa com a graça do batismo e consuma-se na glória da bem aventurança (XLV, 4 ad 2).

De que falavam Moisés e Elias com Jesus Cristo quando se apresentaram envoltos em resplendores de glória, no monte Tabor?
Do mistério da paixão e morte de Cristo, ou como disse São Lucas, com frase gráfica, da saída de Jesus de Jerusalém (XLV, 3).

XX

DE COMO JESUS CRISTO DEIXOU ESTE MUNDO; DA PAIXÃO, MORTE E SEPULTURA

Que causas compreende a saída de Jesus, verificada em Jerusalém?
Quatro coisas: a paixão, a morte, a sepultura e a descida aos infernos (XLVI-LII).

Por que quis Jesus Cristo padecer as torturas da paixão, antes de padecer a morte na cruz?
Primeiramente para obedecer aos mandatos do Pai que assim o havia determinado nos seus decretos eternos e, além disso, porque Jesus Cristo, profundo conhecedor do plano divino, sabia que a Paixão era a obra prima da sabedoria e amor de Deus, planejada para levar ao fim, com a maior eficácia, a redenção do gênero humano, além de confundir o demônio, nosso mortal inimigo, e oferecer aos homens o testemunho supremo do grande amor com que Deus os amou (XLVI, 1).

Os tormentos que Jesus Cristo padeceu, na sua paixão, excedem em conjunto a quanto se há padecido e se há de padecer?
Sim, Senhor; porque o seu corpo, cuja sensibilidade foi a mais delicada e perfeita que pode haver, foi torturado com toda a diversidade de suplícios, os quais não deixaram órgão nem sentido que não atormentassem, sem que a parte superior do espírito, que desfrutava o pleno gozo da visão beatífica, viesse em auxílio do corpo, ou mitigasse os tormentos da dolorosa sensibilidade; e a sua alma, ao tomar sobre si a responsabilidade e a obrigação de satisfazer por todos os pecados do mundo, quis experimentar torturas e dores proporcionadas àquele objeto (XLI, 5, 6).

De que modo levou ao fim a paixão de Cristo a obra da nossa salvação?
Considerada a paixão de Cristo em relação com a divindade, da qual a humanidade paciente era instrumento, é causa eficiente de nossa Salvação; se a consideramos como livremente aceita por sua vontade humana, é causa meritória; tomada em si mesma, como padecimento e suplício da parte sensível do Redentor, obrou-a por modo de satisfação, já que os seus tormentos compensaram os que mereciam os nossos pecados; por modo de Redenção, se atendermos a que, por ela, nos resgatou da escravidão do pecado e do demônio; e por modo de Sacrifício, se considerarmos que nos reconciliou com Deus e voltamos a achar graça diante dos seus olhos (XLVIII, 1-4).

É próprio e exclusivo de Cristo o atributo de Redentor do gênero humano?
Sim, Senhor; porque foi Ele quem, para partir as cadeias com que nos tinham algemados o demônio e o pecado, ofereceu e entregou ao Pai o sangue e a vida, como preço do nosso resgate e liberdade. Não obstante isto, tendo em conta que a humanidade do Salvador havia recebido sangue e vida da Santíssima Trindade, e que o movimento que impeliu a vontade humana a oferecer semelhante preço por nossa redenção, partiu, em sua origem, da Divindade, causa primeira de todo bem, segue-se que a obra da redenção se atribui à Santíssima Trindade, como causa primeira e ao Filho de Deus, enquanto homem, como causa imediata (XLVIII, 5).

Logo, a paixão de Cristo remiu-nos da escravidão do demônio, arrancando-nos do seu poder?
Sim, Senhor; porque destruiu o pecado com que o homem, cedendo às sugestões do demônio, tinha merecido ficar sujeito ao seu domínio, e nos reconciliou com Deus, a quem havíamos ofendido, cuja justiça havia abandonado o homem ao poder do demônio, e utilizou até o poder tirânico de Satanás, permitindo-lhe enfurecer-se contra o Filho de Deus, até fazê-lo condenar à morte, sendo inocente (XLIX, 1-4).

Podemos considerar, como efeito especial da paixão de Cristo, o de abrir-nos as portas do céu?
Sim, Senhor; porque dois eram os obstáculos que impediam a entrada no céu ao gênero humano: o pecado original, comum a todos os homens como descendentes, por via de geração de Adão pecador e os pecados pessoais; ambos estes obstáculos se destruíram com a paixão de Cristo (XLIX, 5).

Foi conveniente que a paixão do Redentor terminasse com a morte?
Sim, Senhor; porque foi o meio mais adequado e apropriado para que o homem sacudisse o jugo e a servidão com que o tinham cativo a morte espiritual do pecado e a física imposta como castigo da culpa original; e com efeito, ao morrer Cristo pelos homens, venceu a morte e logrou que nós triunfássemos também dela, perdendo o horror natural que ela inspira, pois sabemos que morremos para ressuscitar, e sobretudo, para que, como membros seus, morramos com as mesmas disposições com que Ele morreu e consigamos sobre a morte o triunfo que Ele alcançou (L, 1).

Por que quis ser sepultado depois de morrer?
Primeiramente, para demonstrar que realmente estava morto, pois, de ordinário, a ninguém se sepulta antes de comprovar suficientemente a morte real; em segundo lugar, para confirmar, com a sua ressurreição, o dogma da ressurreição universal; e por último, para ensinar-nos que, se queremos morrer para o pecado, temos que nos despedir da vida turbulenta, em que imperam o desregramento e a paixão, e abandoná-la para levar uma vida escondida e oculta em Deus (LI, 1).

referências aos artigos da obra original

('A Suma Teológica de São Tomás de Aquino em Forma de Catecismo', de R.P. Tomás Pègues, tradução de um sacerdote secular)

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

ÓDIO PERFEITO

'Ó vós que amais o Senhor, odiai o mal!' (Sl 96,10)


'Ó Senhor, não odiarei os que te odeiam? E não me consumirei contra os teus inimigos? Com ódio perfeito eu os odiei e tornaram-se meus inimigos' 
(Sl 138, 21-22).

'O Senhor odeia toda a abominação e ela não será amada pelos que o temem' (Ecl 15, 13)

domingo, 17 de novembro de 2019

PÁGINAS COMENTADAS DOS EVANGELHOS DOS DOMINGOS


'Eis que virá o dia, abrasador como fornalha, em que todos os soberbos e ímpios serão como palha; e esse dia vindouro haverá de queimá-los, diz o Senhor dos exércitos, tal que não lhes deixará raiz nem ramo' 
(Ml 3,19)

PÁGINAS DO EVANGELHO (2018 - 2019)

sábado, 16 de novembro de 2019

O MAIOR CASTIGO DE DEUS: MAUS SACERDOTES

O maior sinal da ira de Deus sobre um povo e a mais terrível punição que sobre ele pode descarregar neste mundo é permitir que, em castigo dos seus crimes, venha a cair nas mãos de pastores que mais o são de nome do que de fato, que mais exercitam contra ele a crueldade de lobos famintos que a caridade de solícitos pastores, e que, em lugar de o alimentar cuidadosamente, o dilacera e devora com crueldade; que, em vez de levar o povo a Deus, o vende a Satanás; que em lugar de o encaminhar para o Céu, o arrasta com eles para o inferno; e, em vez de serem o sal da terra e a luz do mundo, são o seu veneno e as suas trevas.

Porque nós, sacerdotes e pastores, disse São Gregório, o grande, seremos condenados diante de Deus como 'assassinos das almas que, todos os dias, vão para a morte eterna pelo nosso silêncio e nossa negligência'. Diz também este mesmo santo: 'Nada há que tanto ultraje a Nosso Senhor (e, por conseguinte, que mais provoque a sua ira e atraia mais maldições sobre os pastores e sobre o rebanho, sobre os sacerdotes e sobre o povo) como os exemplos de uma vida depravada dados por quem Ele estabeleceu para correção dos demais; quando pecam os que devem reprimir pecados'.

Isso se dá quando os sacerdotes não cuidam da salvação das almas, quando não se preocupam mais do que em satisfazer as suas inclinações, quando todas as suas afeições terminam em coisas da terra; quando se alimentam com avidez da vã estima dos homens; quando, para satisfazerem as suas ambições, abandonam os trabalhos de Deus para se entregarem aos do mundo; quando, ocupando um lugar de santidade, se ocupam de questões terrenas e profanas e não mais pregam a verdadeira fé, a única que indica o Caminho, a Verdade e a Vida. Quando Deus permite que isto suceda é prova muito certa de que está encolerizado contra o seu povo, sendo este o maior castigo que Ele pode enviar neste mundo. 

(São João Eudes)

quinta-feira, 14 de novembro de 2019

CONSIDERAÇÕES PARA O DIA DE TUA MORTE

Considerações

1. Considera a incerteza do dia de tua morte. Ah, minha alma! Sairás um dia deste corpo. Quando? No inverno ou no verão? Na cidade ou no campo? De dia ou de noite? De modo imprevisto ou avisado? Por doença ou acidente? Terás tempo de te confessar ou não? Terás a assistência do teu confessor e pai espiritual ou não? De tudo isso absolutamente nada sabemos. A única coisa certa é que morreremos, e sempre mais cedo do que julgávamos.

2. Considera que, então, o mundo acabará no que te diz respeito. Ele não existirá mais para ti, ele virará de cabeça para baixo à tua frente. Sim, pois então os prazeres, as vaidades, as alegrias mundanas e os afetos vãos parecerão como nuvens e fantasmas. Ah, miserável, por que ninharias ofendi ao meu Deus? Verás que abandonamos Deus pelo nada. Ao contrário, a devoção, as boas obras te parecerão tão desejáveis e doces! E por que não segui este belo e gracioso caminho? Então os pecados que pareciam pequenos parecerão grandes como montanhas e a tua devoção, bem pequena.

3. Considera o longo e langoroso adeus que a tua alma dirá a este baixo mundo. Dirá adeus às riquezas, às vaidades, às vãs companhias, aos prazeres, aos passatempos, aos amigos, aos vizinhos, aos pais, aos filhos, ao marido, à esposa, em suma, a toda criatura e, por fim, ao seu corpo, que ela abandonará pálido, magro, acabado, medonho e infecto.

4. Considera os trabalhos que terão para erguer o teu corpo e enterrá-lo; e que, feito isso, o mundo quase não pensará mais em ti, como tu quase não pensaste nos outros. Que Deus o tenha, dirão, e acabou-se. Ó morte, como és desdenhada! Como és implacável!

5. Considera que, ao sair do corpo, a alma segue ou para a direita ou para a esquerda. Aonde irá a tua? Que caminho tomará? O mesmo caminho que ela começou a trilhar neste mundo.

Afeições

1. Reza a Deus e te lança entre os seus braços. Ai, Senhor, recebei-me em vossa proteção neste dia apavorante! Tornai-me feliz e favorável esta hora e que todas as outras me sejam tristes e aflitivas.

2. Despreza o mundo. Como não sei a hora a hora em que terei de deixar-te, ó mundo, não quero apegar-me a ti. Ó meus caros amigos, minhas caras alianças, permitai que não me afeiçoe a vós mais do que por uma amizade santa, que possa durar eternamente; pois por que me unir a vós para depois deixar e romper tal laço?

Resoluções

Quero preparar-me para esta hora e tomar os cuidados necessários para fazer felizmente esta passagem. Quero examinar com toda atenção o estado da minha consciência e pôr ordem nestas e naquelas faltas.

Petições

Agradece a Deus por estas resoluções que Ele vos deu; oferece-as à sua Majestade. Roga-lhe, mais uma vez, que Ele torne feliz a tua morte pelo mérito de seu Filho. Implora a ajuda da Santa Virgem e dos santos. Rezai agora o Pai Nosso e a Ave-Maria.

(São Francisco de Sales, na obra 'Novíssimos do Homem')