sexta-feira, 3 de maio de 2019

PORQUE HOJE É A PRIMEIRA SEXTA-FEIRA DO MÊS


A Grande Revelação do Sagrado Coração de Jesus foi feita a Santa Margarida Maria Alacoque durante a oitava da festa de Corpus Christi de 1675...

         'Eis o Coração que tanto amou os homens, que nada poupou, até se esgotar e se consumir para lhes testemunhar seu amor. Como reconhecimento, não recebo da maior parte deles senão ingratidões, pelas suas irreverências, sacrilégios, e pela tibieza e desprezo que têm para comigo na Eucaristia. Entretanto, o que Me é mais sensível é que há corações consagrados que agem assim. Por isto te peço que a primeira sexta-feira após a oitava do Santíssimo Sacramento seja dedicada a uma festa particular para  honrar Meu Coração, comungando neste dia, e O reparando pelos insultos que recebeu durante o tempo em que foi exposto sobre os altares ... Prometo-te que Meu Coração se dilatará para derramar os influxos de Seu amor divino sobre aqueles que Lhe prestarem esta honra'.


... e as doze Promessas:
  1. A minha bênção permanecerá sobre as casas em que se achar exposta e venerada a imagem de meu Sagrado Coração.
  2. Eu darei aos devotos do meu Coração todas as graças necessárias a seu estado.
  3. Estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias.
  4. Eu os consolarei em todas as suas aflições.
  5. Serei seu refúgio seguro na vida, e principalmente na hora da morte.
  6. Lançarei bênçãos abundantes sobre todos os seus trabalhos e empreendimentos.
  7. Os pecadores encontrarão em meu Coração fonte inesgotável de misericórdias.
  8. As almas tíbias se tornarão fervorosas pela prática dessa devoção.
  9. As almas fervorosas subirão em pouco tempo a uma alta perfeição.
  10. Darei aos sacerdotes que praticarem especialmente essa devoção o poder de tocar os corações mais empedernidos.
  11. As pessoas que propagarem esta devoção terão os seus nomes inscritos para sempre no meu Coração.
  12. A todos os que comungarem nas primeiras sextas-feiras de nove meses consecutivos, darei a graça da perseverança final e da salvação eterna.

    ATO DE DESAGRAVO AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS 
    (rezai-o sempre, particularmente nas primeiras sextas-feiras de cada mês)

Dulcíssimo Jesus, cuja infinita caridade para com os homens é deles tão ingratamente correspondida com esquecimentos, friezas e desprezos, eis-nos aqui prostrados, diante do vosso altar, para vos desagravarmos, com especiais homenagens, da insensibilidade tão insensata e das nefandas injúrias com que é de toda parte alvejado o vosso dulcíssimo Coração.

Reconhecendo, porém, com a mais profunda dor, que também nós, mais de uma vez, cometemos as mesmas indignidades, para nós, em primeiro lugar, imploramos a vossa misericórdia, prontos a expiar não só as nossas próprias culpas, senão também as daqueles que, errando longe do caminho da salvação, ou se obstinam na sua infidelidade, não vos querendo como pastor e guia, ou, conspurcando as promessas do batismo, renegam o jugo suave da vossa santa Lei.

De todos estes tão deploráveis crimes, Senhor, queremos nós hoje desagravar-vos, mas particularmente das licenças dos costumes e imodéstias do vestido, de tantos laços de corrupção armados à inocência, da violação dos dias santificados, das execrandas blasfêmias contra vós e vossos santos, dos insultos ao vosso vigário e a todo o vosso clero, do desprezo e das horrendas e sacrílegas profanações do Sacramento do divino Amor, e enfim, dos atentados e rebeldias oficiais das nações contra os direitos e o magistério da vossa Igreja.

Oh, se pudéssemos lavar com o próprio sangue tantas iniquidades! Entretanto, para reparar a honra divina ultrajada, vos oferecemos, juntamente com os merecimentos da Virgem Mãe, de todos os santos e almas piedosas, aquela infinita satisfação que vós oferecestes ao Eterno Pai sobre a cruz, e que não cessais de renovar todos os dias sobre os nossos altares.

Ajudai-nos, Senhor, com o auxílio da vossa graça, para que possamos, como é nosso firme propósito, com a viveza da fé, com a pureza dos costumes, com a fiel observância da lei e caridade evangélicas, reparar todos os pecados cometidos por nós e por nossos próximos, impedir, por todos os meios, novas injúrias à vossa divina Majestade e atrair ao vosso serviço o maior número possível de almas.

Recebei, ó Jesus de Infinito Amor, pelas mãos de Maria Santíssima Reparadora, a espontânea homenagem deste nosso desagravo, e concedei-nos a grande graça de perseverarmos constantes até a morte no fiel cumprimento dos nossos deveres e no vosso santo serviço, para que possamos chegar todos à Pátria bem-aventurada, onde vós, com o Pai e o Espírito Santo, viveis e reinais, Deus, por todos os séculos dos séculos. Amém.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

COMPÊNDIO DE SÃO JOSÉ (X)


46. Mas se afirmamos que Maria concebeu Jesus por obra do Espírito Santo e também no Credo rezamos: 'encarnou-se por obra do Espírito Santo', como afirmamos que José é pai de Jesus e não apenas que ele é o guarda de Jesus? 

Antes de tudo, como já salientamos, os evangelistas chamam José expressamente de pai (Lc 2,27.33.41.43.48; 3,23; Mt 13,55). Portanto, verdadeiro pai e não num sentido redutivo e incompleto. Sua paternidade é humana e não biológica, por isso esta paternidade tem o aspecto jurídico, o aspecto afetivo e também o aspecto educativo. Ser pai não implica apenas gerar na carne, basta lembrar hoje a moderna biotecnologia que compromete seriamente aquela paternidade que tem como único fundamento a geração, como: a fecundação in vitro, a gravidez do embrião numa mãe 'barriga de aluguel', sem levar em conta as especulações de lucro, ou ainda os bancos de espermas selecionados, ignorando completamente a pessoa que é denominada apenas de 'doador'. Podemos afirmar com Santo Tomás que 'José é pai de Jesus do mesmo modo como é entendido como esposo de Maria, sem a união da carne, mas pelo vínculo do próprio matrimônio'. José teve um relacionamento com Jesus muito mais intenso do que um filho adotivo fora do casamento. É importante salientarmos que Cristo nasceu do Espírito Santo não como Filho, por isso Santo Tomás afirma que não se pode dizer que Cristo foi propriamente 'concebido do Espírito Santo, mas sim por obra do Espírito Santo', tudo isso pelo amor de Deus por nós. Este amor e dom de Deus por nós, no Espírito Santo tem uma peculiaridade. De modo analógico, também em São José, o qual foi profundamente envolvido no mistério da Encarnação a ponto de ser considerado por Francisco Suárez como pertencente à ordem da união hipostática. 'O Espírito Santo que honrou José com o nome de pai', como afirmou Orígenes, não excluiu a sua parte, esvaziando assim a sua paternidade. Enquanto Maria recebia um coração de mãe, o Espírito Santo formava em José um coração de pai. 

47. Qual a palavra mais indicada para designar a paternidade de José em relação a Jesus? 

Há sem dúvida uma dificuldade para designar a paternidade de José, sendo este caso único e singular; portanto nossa língua não possui um termo que a defina exatamente. Por isso, muitos chamam-no de 'pai adotivo', porém é uma palavra inadequada, pois indica uma relação paterna com o filho que não é da família, mas que se tornou tal em virtude da lei. Jesus não era estranho à sua família; José personalizava a paternidade divina sobre ele. Outros designam que a sua paternidade é de 'pai legal', baseando-se nas palavras do anjo a José dizendo-lhe de receber Maria como sua esposa, e que dela nasceria um filho no qual ele colocaria o nome de Jesus (Mt 1,21). Esta designação possui um sentido estritamente jurídico, embora expresse que Jesus é legitimamente reconhecido diante da lei como filho de José. Com isso vem conferida a José a legitimidade de sua paternidade, inclusive com o título messiânico da descendência de Davi. Contudo esta explicação tem um significado formal e não responde à relação íntima entre o pai e o filho, portanto é incompleta. Há ainda a denominação de 'pai virginal', esta por sinal bastante comum entre os teólogos: um título que não deixa de ser impróprio, embora possa ser um dos mais adequados e aceitáveis porque capta a essência espiritual desta paternidade e determina a sua natureza, pois coloca José juntamente com Maria dentro do matrimônio virginal do qual nasceu Jesus. Contudo esta expressão é ainda imprópria, pois Maria Virgem concebeu por obra do Espírito Santo dando um corpo, carne e sangue a Jesus, enquanto que José em nada disso cooperou. Há ainda a designação de 'pai nutrício', devido à dedicação de José como pai. Este também é um termo inadequado, pois ressalta algumas funções do exercício de sua paternidade, tais como alimentar, defender, cuidar de Jesus, e isso é restringi-la. A teologia josefina procurou também chamá-lo de 'pai matrimonial' em virtude de seu matrimônio com Maria, visto que o seu matrimônio foi querido por Deus em razão da acolhida de Jesus. Esta denominação é incomum, assim como a expressão 'pai vigário', para indicar que José fez as vezes de Deus Pai aqui na terra para Jesus, mesmo porque é uma linguagem difícil de ser compreendida. Por fim alguns teólogos exprimem a opinião de que a designação da paternidade de José deve ser aquela expressa em Lucas 3,23: 'Ao iniciar o ministério, Jesus tinha uns trinta anos, filho, segundo se pensava, de José…'. Este título também exprime pouco, pois apenas salienta que os moradores de Nazaré acreditavam que ele era o pai de Jesus, não destacando os aspectos positivos de sua paternidade. 

48. Então qual é a designação exata que podemos usar para expressar a paternidade de José? 

Na verdade nenhum dos títulos citados exprime a totalidade do relacionamento de José com Jesus, pois ele teve, como afirma Suárez: 'Salvo a sua virgindade, tudo aquilo que é próprio de um pai'. Participou da mesma dignidade de Maria, a Mãe de Jesus. Esta é uma paternidade única, sobrenatural, e não encontrando uma palavra completa que possa expressar perfeitamente essa paternidade especial, devemos chamar José simplesmente de 'pai de Jesus', como a sagrada escritura o chama, (Lc 2,27. 33.41.43.48; 3,23; Mt 13,55), sem acrescentar nenhum adjetivo especial a esse título.

49. Sendo José pai de Jesus, quais foram as atribuições mais específicas que José exerceu neste ministério? 

Basicamente os evangelistas ressaltaram estas: a imposição do nome ao Menino (Mt 1,15), assumindo o direito paterno e reconhecendo Jesus como seu filho; a descendência davídica, reconhecendo a Jesus o título de descendente de Davi, portanto da casa e da família de Davi (Lc 2,4); o rito da circuncisão (Lc 2,21), com o qual Jesus passou a fazer parte do povo da Aliança; o rito do resgate como primogênito, na apresentação do Menino no Templo (Lc 2,22ss); o cuidado com o Menino e sua mãe na fuga e permanência no Egito (Mt 2,13- 22) e a vida de dedicação à família e ao trabalho em Nazaré, onde Jesus lhe era submisso (Mt 2,51).

50. Sendo pai de Jesus, como José o educava? 

Um aspecto muitas vezes esquecido em relação à paternidade de São José é aquele que diz respeito à sua função de educador de Jesus. Evidentemente deve-se admitir que a influência que uma pessoa recebe do ambiente em que vive e o circunda tem grande importância na sua vida, e isto foi muito real em relação à educação de Jesus. O Papa Paulo VI compreendeu muito bem este aspecto, vendo refletida no comportamento de Jesus a longa convivência que ele teve com José, e por isso mesmo afirmou: 'São José é o tipo do evangelho que Jesus, depois de deixar a pequena oficina de Nazaré e ao iniciar a sua missão de profeta e de mestre, anunciará como programa para a redenção da humanidade'. Isto significa que o tipo de homem novo que Jesus pregava como ideal no Reino, fora formado e plasmado em sua mente ao longo dos anos que conviveu com José, em correspondência àquele modelo concreto que sempre teve diante de si durante os 30 anos de convivência na Sagrada Família de Nazaré. Jesus embebeu-se da educação recebida de José, uma educação fundamentada no exemplo, na coerência, no esforço do cumprimento da vontade de Deus, de uma maneira simples, tornando-se um modelo a ser imitado. Por isso o mesmo o Papa declara: 'São José é a prova que para ser bons e autênticos seguidores de Cristo não é preciso grandes coisas, basta o cumprimento das virtudes comuns, humanas e simples, contanto que verdadeiras e autênticas'.

('100 Questões sobre a Teologia de São José', do Pe. José Antonio Bertolin, adaptado)

quarta-feira, 1 de maio de 2019

01 DE MAIO - SÃO JOSÉ OPERÁRIO


São José, São José carpinteiro,
dai-me o cinzel do entalhador
para que eu molde almas, muitas almas,
com a sagrada face do Senhor...


São José, modelo de virtudes,
imprimi em mim virtuoso labor
para que eu seja luz, luz que alumie,
os santos caminhos do Senhor...


São José, homem de oração,
dai-me a graça da vida interior
para que eu leve ovelhas, muitas ovelhas,
 ao rebanho do Bom Pastor...
  

São José, São José missionário,
guiai-me no apostolado do amor
pelos homens, para que muitos se salvem,
 na infinita misericórdia do Senhor...



 São José, esposo de Maria,
ungi-me a fronte com especial fervor
de levar as almas, todas as almas,
às fontes da graça do Senhor...


São José, São José camponês,
dai-me o arado e fazei-me semeador
que eu possa dar frutos, muitos frutos,
nas vinhas gloriosas do Senhor...


São José, homem justo na fé,
fazei de mim esteio consolador
de todos que sofrem, dos que padecem,
crucificados como o Senhor...



São José, São José operário,
fazei de mim um santo trabalhador
que eu seja obra de muitos nomes
nas moradas eternas do Senhor...

('Poema a São José', de Arcos de Pilares)

terça-feira, 30 de abril de 2019

A TRISTEZA BOA E A TRISTEZA MÁ

'A tristeza que é segundo Deus, afirma São Paulo, produz uma penitência estável para a salvação; a tristeza do mundo produz a morte' (2 Co 7, 10). A tristeza pode, pois, ser boa ou má, conforme os efeitos que produza em nós. Mas, em geral, produz mais efeitos maus que bons, porque os bons são apenas dois: a misericórdia - o pesar pelo mal dos outros - e a penitência - a dor de ter ofendido a Deus - ao passo que os maus são seis: medo, preguiça, indignação, ciúme, inveja e impaciência. Por isso, diz o sábio: 'A tristeza mata a muitos e não há utilidade nela' (Ecle 30, 25), já que, para dois regatos de águas límpidas que nascem do manancial da tristeza, nascem seis de águas poluídas'.

Essa é a razão por que o demônio faz grandes esforços para produzir em nós essa má tristeza e, a fim de levar-nos ao desânimo, começa por perturbar-nos. Não lhe custa muito sugerir pretextos para isso. Não deveríamos afligir-nos por ter ofendido a Majestade divina, ultrajado a Beleza infinita e ferido o coração de Deus, o mais terno dos pais? 'Com certeza', responde-nos São Francisco de Sales. 'Devemos entristecer-nos, mas com um arrependimento verdadeiro, não com uma dor mal-humorada, cheia de despeito e indignação. O verdadeiro arrependimento é sempre calmo, como todo o sentimento inspirado pelo bom Espírito: o Senhor não está na perturbação' (conforme 1 Rs 19, 11). Onde principiam a inquietação e a perturbação, a tristeza má passa a ocupar o lugar da tristeza boa. 

'A má tristeza' - insiste o santo - 'deprime e perturba a alma, inquieta-a, incute-lhe temores desmedidos, tira-lhe o gosto pela oração, atordoa e fatiga-lhe a cabeça, impede-a de tirar proveito dos bons conselhos, de tomar resoluções, de formar juízos, de ter coragem, e abate-lhe as forças. Numa palavra: é como um inverno rigoroso que cresta toda a formosura da terra e mergulha na letargia todos os animais; porque priva a alma de toda a suavidade e a deixa paralítica, bloqueando todas as suas faculdades' (Introdução à Vida Devota).

Muitos de nós reconhecerão nestes sintomas a perturbação em que se deixaram envolver após as suas faltas e os estragos que ela lhes causou! Tinham começado a levar a sério a vida espiritual e seguiam resolutamente os passos do Mestre pelo caminho do dever, pela rude encosta do Calvário. Mas eis que sobrevém um queda e, com ela, a perturbação! A alma levanta-se sob o amparo do arrependimento e da absolvição sacramental, que tudo vem reparar. Mas nem por isso sossega. Olha-se, examina-se ansiosamente, conta as feridas mal cicatrizadas, remexe-as com receio, infecta-as mais por querer curá-las com despeito e impaciência, 'porque não há nada que mais conserve os nossos defeitos do que o desassossego e a pressa em querer expurgá-los' (São francisco de Sales).

Entretanto, o passo vai afrouxando; já não se corre; anda-se a custo. A pessoa arrasta-se, descontente de si e quase que do próprio Deus, perde a confiança na oração e abeira-se dos sacramentos com medo - até que uma circunstância especial, uma confissão excepcionalmente bem feita ou um retiro, lhe restitui por um certo período o fervor que tivera no princípio. Mas se, decorrido algum tempo após essa renovação, não elimina essa intranquilidade, uma nova queda ou simplesmente a lembrança das faltas passadas provocará nela um surto de redobrada depressão e melancolia; voltará ao passo cansado e queira Deus que, à força de hesitações e delongas, não termine por cair numa inércia quase sem remédio.

(Excertos da obra 'A arte de aproveitar as próprias faltas', de Joseph Tissot)

segunda-feira, 29 de abril de 2019

'ALMA NASCIDA PARA UM OCEANO DE AMOR, PERDESTE O MAR!'

Era uma vez uma gota de água que, de repente, sentiu o chamado do mar, e para o mar foi apressurada e transparente. Pelo leito do regato corria cantarolando. Tudo se alegrava com sua presença: as margens floresciam à sua passagem, os bosques reverdeciam, as avezinhas cantavam. E para o mar corria límpida e cantarolando.

Mas, um dia, cansou-se de tanto caminhar pelo leito apertado do regato. Ao saltar sobre a represa de um moinho divisou no horizonte a terra, e em terra desejou converter-se. Aproveitando o desvio que dava para uma cisterna, desgarrou-se da mãe e estacionou. Inesperadamente, sentiu-se prisioneira da terra; converteu-se em lama suja, mal-cheirosa, podre: repugnantes animalejos cresceram em seu seio e o sol deixou de se espelhar nela.

Numa tarde, passou por aí um viandante; deteve-se perto do lamaçal e, sentencioso, exclamou: 'Pobre água! Ias para o mar e ficaste neste charco!' Teve pena dela. Inclinou-se, tomou-a no côncavo da mão e devolveu-a ao regato, dizendo: 'Pobre gota! Retoma tua vocação! Vai-te para o mar!' 

Alma, compreendeste essa parábola? É a tua própria história. A história da água começa assim: 'Era uma vez uma gota de água que de repente sentiu o chamado do mar...' A tua começa assim: 'Era uma vez uma alma que, ao sair do colégio, de uma missão, de uma confissão, sentiu de repente o chamado de Deus'.

Todavia estou-te vendo regressar para casa, daqueles exercícios. Voltavas cantando, generosa para aquele convite santo. Alegravas a todos com tua presença: a casa, os arredores, os agrupamentos, os passeios. E assim era. Tanto que, admirados, chegam a perguntar-te: 'Mas, que te aconteceu?' 'Nada!' respondias, o Senhor passou e eu ouvi o chamado de seu amor'.

Mas um dia te cansaste. Cansou-te o leito acanhado do plano de vida, a sujeição à direção espiritual. Vias outras almas, livres de obrigações e deveres, correrem pelos campos onde não havia os mandamentos da Lei de Deus, rindo-se, aparentemente satisfeitas consigo mesmas. E tu saíste do regato. Foste pelas margens do plano de vida; aproveitaste uma ocasião qualquer: bodas, festa, férias, veraneio, e deixaste tudo. Que tudo fosse rodando... tu também querias liberdade.

Súbito sentiste que eras prisioneira da terra, com suas modas exageradas, seus modos atrevidos, cheia de tibiezas, fria de generosidade, enlameada de pecados graves. Tu te convertes-te em triste lamaçal! É para exclamar: 'Pobre alma!' Ias para o mar e te tornaste um charco. Voavas para o alto e quebraste as asas. Vives rasteira! Durou tão pouco!

Pensar, ó meu Deus, que existem gotas de água que nunca chegaram ao mar! Pensar, ó meu Deus, que existem almas que perderam a vocação para a santidade por própria culpa! Pensar, ó meu Deus, que uma dessas almas sou eu!

Que diferença! O que eu era antes e o que sou agora! Aquela paz, aquela alegria interior, cristalina e transbordante; aquelas comunhões e meditações que eu fazia voando em asas de neve; aquele correr inquieto para Deus... E agora esse rastejamento, esse estancamento, essa vida vazia! Mas não esmoreças, alma irmã. Sem saberes por que, sem nada fazeres, acaba de passar um viandante, o Divino Peregrino. Ele detém-se ciente de tua inatividade espiritual. Não percebes a sua presença?

Vejo que Ele se inclina para ti; toma no côncavo de sua graça a gota de água de tua vida e exclama: 'Pobrezinha! Não sejas lamaçal! Recobra a tua vocação para o mar! Corre cantando para o oceano do amor!' Quando termino, Senhor, esta meditação, existe uma alma que tornou a sentir em suas entranhas o chamado do Amor, uma alma que quer ser mar, que voltará com a tua graça a correr generosa, que te amará. E essa alma é a minha alma; agradecida. E que assim seja.

(P. López Arróniz)

domingo, 28 de abril de 2019

'MEU SENHOR E MEU DEUS!'

Páginas do Evangelho - Segundo Domingo da Páscoa


O segundo domingo do tempo pascal é consagrado como sendo o 'Domingo da Divina Misericórdia', com base no decreto promulgado pelo Papa João Paulo II na Páscoa do ano 2000. No Domingo da Divina Misericórdia daquele ano, o Santo Padre canonizou Santa Maria Faustina Kowalska, instrumento pelo qual Nosso Senhor Jesus Cristo fez conhecer aos homens Seu amor misericordioso: 'Causam-me prazer as almas que recorrem à Minha misericórdia. A estas almas concedo graças que excedem os seus pedidos. Não posso castigar, mesmo o maior dos pecadores, se ele recorre à Minha compaixão, mas justifico-o na Minha insondável e inescrutável misericórdia'.

No Evangelho deste domingo, Jesus já havia se revelado às santas mulheres, a Pedro e aos discípulos de Emaús. Agora, apresenta-Se diante os Apóstolos reunidos em local fechado e, uma vez 'estando fechadas as portas' (Jo 20, 19), manifesta, assim, a glória de Sua ressurreição aos discípulos amados. 'A paz esteja convosco' (Jo 20, 19) foi a saudação inicial do Mestre aos apóstolos mergulhados em tristeza e desamparo profundos. 'A paz esteja convosco' (Jo 20, 21) vai dizer ainda uma segunda vez e, em seguida, infunde sobre eles o dom do Espírito Santo para o perdão dos pecados: 'Recebei o Espírito Santo. A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos' (Jo 20, 22-23), manifestação preceptora da infusão dos demais dons do Espírito Santo por ocasião de Pentecostes. A paz de Cristo e o Sacramento da Reconciliação são reflexos incomensuráveis do amor e da misericórdia de Deus. 

E eis que se manifesta, então, o apóstolo da incredulidade, Tomé, tomado pela obstinação à graça: 'Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei' (Jo 20, 25). E o Deus de Infinita Misericórdia se submete à presunção do apóstolo incrédulo ao lhe oferecer as chagas e o lado, numa segunda aparição oito dias depois, quando estão todos novamente reunidos, agora com a presença de Tomé, chamado Dídimo. 'Meu Senhor e meu Deus!' (Jo 20, 28) é a confissão extremada de fé do apóstolo arrependido, expressando, nesta curta expressão, todo o tesouro teológico das duas naturezas - humana e divina - imanentes na pessoa do Cristo.

'Bem-aventurados os que creram sem terem visto!' (Jo 20, 29) é a exclamação final de Jesus Ressuscitado pronunciada neste Evangelho. Benditos somos nós, que cremos sem termos vistos, que colocamos toda a nossa vida nas mãos do Pai, que nos consolamos no tesouro de graças da Santa Igreja. E bem aventurados somos nós que podemos chegar ao Cristo Ressuscitado com Maria, espelho da eternidade de Deus na consumação infinita da Misericórdia do Pai. 

sábado, 27 de abril de 2019

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

Ó mundanos, amadores do tempo e das coisas que com ele passam e totalmente esquecidos do eterno, lembrai-vos que há de vir um dia, cláusula de todos os dias e princípio de duas eternidades, uma de suma felicidade outra de miséria suma, uma nas alturas louvando a Deus, outra blasfemando de Deus nas profundezas.

Vós outros que consumis os dias e os anos em vosso deleite e armais dilações à penitência de hoje para amanhã, de amanhã para outro dia e outro ano e muitos anos, ó que mau é o vosso engano agora e que pior será então o vosso desengano?

Há de chegar (é certo) aquele estado, onde não há amanhã, nem tarde, hoje, nem ontem, nem séculos, nem anos, nem dias, nem horas, nem diferença alguma de tempo, senão uma duração fixa e interminável, ou sempre gozando de Deus ou sempre ardendo em fogo. Temamos estes sinais à vista de tão horrendo significado, e empreguemos os breves espaços da vida temporal como quem há de vir a parar nos da eterna.

(Pe. Manuel Bernardes)