quarta-feira, 4 de julho de 2018

DO DESAPEGO ÀS COISAS DO MUNDO

Desejaria exortar-vos a deixar tudo, mas não me atrevo. Se não podeis deixar as coisas do mundo, fazei uso delas de tal modo que não vos prendam a ele, possuindo os bens terrenos sem deixar que vos possuam. Tudo o que possuís esteja sob o domínio do vosso espírito, para que não fiqueis presos pelo amor das coisas terrenas, sendo por elas dominados.

Usemos as coisas temporais, mas desejemos as eternas. As coisas temporais sejam simples ajuda para a caminhada, mas as eternas, o termo do vosso peregrinar. Tudo o que se passa neste mundo seja considerado como acessório. Que o olhar do nosso espírito se volte para frente, fixando-nos firmemente nos bens futuros que esperamos alcançar. Extirpemos radicalmente os vícios, não só das nossas ações mas também dos pensamentos. Que o prazer da carne, o ardor da cobiça e o fogo da ambição não nos afastem da Ceia do Senhor! Até as coisas boas que realizamos no mundo, não nos apeguemos a elas, de modo que as coisas agradáveis sirvam ao nosso corpo sem prejudicar o nosso coração.

Por isso, irmãos, não ousamos dizer-vos que deixeis tudo. Entretanto, se o quiserdes, mesmo possuindo-as, deixareis todas as coisas se tiverdes o coração voltado para o alto. Pois quem põe a serviço da vida todas as coisas necessárias, sem ser por elas dominado, usa do mundo como se dele não usasse. Tais coisas estão ao seu serviço, mas sem perturbar o propósito de quem aspira às do alto. Os que assim procedem têm à sua disposição tudo o que é terreno, não como objeto de sua ambição, mas de sua utilidade. Por conseguinte, nada detenha o desejo do vosso espírito, nenhuma afeição vos prenda a este mundo.

Se amarmos o que é bom, deleite-se o nosso espírito com bens ainda melhores, isto é, os bens celestes. Se tememos o mal, ponhamos diante dos olhos os males eternos. Desse modo, contemplando na eternidade o que mais devemos amar e o que mais devemos temer, não nos deixaremos prender ao que existe na terra. Para assim procedermos, contamos com o auxílio do Mediador entre Deus e os homens. Por meio dele logo obteremos tudo, se amarmos realmente aquele que, sendo Deus, vive e reina com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

('Das Homilias sobre os Evangelhos', de São Gregório Magno)

terça-feira, 3 de julho de 2018

CATECISMO MAIOR DE PIO X (VIII)

Fim do cativeiro da Babilônia e volta dos hebreus à Judeia

66. O cativeiro babilônico durou 70 anos, depois dos quais os judeus alcançaram a liberdade com Ciro. De volta à sua pátria, liderados por Zorobabel (539 a.C.), reedificaram Jerusalém e o Templo, encorajados por Neemias, ministro do rei, e pelo profeta Ageu.

67. Mas nem todos voltaram para casa. Entre aqueles que permaneceram em terra estrangeira, houve por divina disposição Ester, que, escolhida pelo rei Asuero para sua esposa, salvou depois seu povo da ruína a que fora condenado pelo rei, instigados pelo ministro Haman que abominava Mardoqueu, tio da rainha.

68. Os judeus, ao recuperarem a liberdade, eram doravante mais fiéis ao Senhor, vivendo sob os cuidados de suas próprias leis e reconhecendo por chefe de sua nação o Sumo Pontífice, com certa dependência, o rei da Pérsia, o rei da Síria ou do Egito, de acordo com o destino das armas.

69. Entre esses reis, alguns deixaram em paz os judeus e outros os perseguiram para reduzi-los à idolatria. O tirano mais cruel foi Antíoco Epifânio, rei da Síria, que publicou uma lei a que todos os seus súditos estavam obrigados, sob pena de morte, a abraçar a religião dos gentios. Muitos judeus então consentiram naquela impiedade, mas, muitos mais se mantiveram firmes e se conservaram fiéis a Deus, e muitos outros morreram com glorioso martírio. Assim sucedeu a um santo ancião que se chamava Eleazar e sete irmãos, que se diziam Macabeus, com a sua mãe.

Os Macabeus

70. Surgiram depois contra o ímpio e cruel Antíoco alguns intrépidos defensores da religião e da independência da pátria, à frente dos quais se pôs um sacerdote de nome Matatias, com seus cinco filhos, virtuosos e esforçados como ele. Primeiro retirou-se para os montes, e reunindo ali outros valentes, desceu e feriu seus opressores.

71. Judas, apelidado Macabeu, filho de Matatias, continuou a guerra iniciada por seu pai, e com o favor de Deus e com a ajuda de seus irmãos fundou o pequeno reino chamado dos Macabeus que, por um período de cento e vinte e cinco anos, governaram a Judeia como pontífices e capitães, e depois também como reis. Este grande capitão, chamado na Sagrada Escritura como varão fortíssimo, deu ilustre exemplo de piedade para com os defuntos e confirmou solenemente a fé no purgatório, ordenando uma grande coleta de dinheiro com destino a Jerusalém, para que ali se oferecessem dons e sacrifícios em sufrágio dos que haviam caído mortos na guerra santa. Foi abençoado do povo por suas muitas vitórias e tornou-se o terror de seus inimigos. Mas finalmente dominado por estes, e não apoiado pelos seus, morreu como herói com as armas em punho no ano de 161, antes da era cristã. A Judas Macabeu sucederam um após outro seus irmãos Jonathan e Simão, e depois o filho deste, João Hircano, que realizou um governo sábio, glorioso e feliz.

72. Mas os filhos e descendentes degenerados da virtude de seus mais velhos e outros dissidentes entre si entraram em desastrosos conflitos com seus poderosos vizinhos, e em breve a Judeia perdeu força e autoridade, vindo gradualmente a cair em mãos dos romanos.

Os romanos e o fim do reino de Judá

73. Os romanos primeiro a tornaram tributária, e logo depois lhe impuseram um rei de nação estrangeira, Herodes, o Grande, assim chamado por algumas empresas felizes, mas certamente não grande a juízo da história, que não calou as trapaças e vilezas que empregou para subir ao cobiçado poder, do qual se valeu mais tarde para perseguir a pessoa adorável de Jesus Cristo em sua infância. Afortunado no exterior, viveu e morreu desgraçadíssimo: fim comum dos perseguidores. Depois dele reinou, com mais ou menos extensão de poder, três filhos seus e dois netos, mas pouco durou sua glória, pois o reino foi rapidamente reduzido a província do Império Romano, que enviou um governador para governar em seu nome.

Os Profetas

74. Para conservar seu povo sob a custódia da lei, ou para fazê-lo voltar a ela de novo, quando prevaricava, e em especial para preservá-lo da idolatria, a que poderosamente pendiam, Deus suscitou em todos os momentos homens extraordinários chamados Profetas, que inspirados por Ele previam os eventos que estavam por vir.

75. Alguns desses Profetas, como Elias e Eliseu, não deixaram nada escrito, mas deles e de suas façanhas se faz menção na História Sagrada. Outros dezesseis deixaram escritas suas profecias, que foram conservadas entre os Livros Sagrados.

76. Quatro destes, Jeremias, Daniel, Ezequiel e Isaías, são chamados maiores, porque suas profecias são mais extensas; os outros doze se chamam menores, pela razão oposta.

77. A principal atribuição dos Profetas era manter viva a memória da promessa do Messias e preparar o povo para que o reconhecessem. Muitos séculos antes anunciaram o tempo preciso de sua vinda, e descreveram, com detalhes minuciosos seu nascimento, vida, paixão e morte que, lendo o conjunto de suas profecias, mais parecem historiadores do que profetas.

Algumas profecias relativas ao Messias

78. Eis aqui algumas profecias que se referem ao tempo da vinda do Messias. O profeta Daniel, para o fim do cativeiro babilônico, anunciou claramente que o Messias apareceria, viveria, seria negado e morto pelos judeus dali a setenta semanas de anos, e que, logo após, Jerusalém seria destruída e os judeus dispersos, já incapacitados de constituir uma nação.

79. Os profetas Ageu e Malaquias anunciaram aos judeus que o Messias viria no segundo templo, e, portanto, antes de sua destruição. O profeta Isaías, além de descrever muitas circunstâncias do nascimento e da vida do Messias, anunciou que, depois de sua vinda, os gentios seriam convertidos.

80. O que este e os outros Profetas anunciaram teve seu cumprimento. A saber: as setenta semanas foram cumpridas, Jerusalém foi destruída, destruído o segundo Templo, os judeus foram e permaneceram espalhados por toda a terra, e os gentios se converteram: então, o Messias veio. Acima de tudo essas profecias tiveram seu cumprimento na pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo, e somente nEle; portanto, Ele é o verdadeiro Messias prometido.

[Fim da primeira Parte - Resumo da História do Antigo Testamento]

(Do Catecismo Maior de Pio X)

domingo, 1 de julho de 2018

AS COLUNAS DA IGREJA

Páginas do Evangelho - Solenidade de São Pedro e São Paulo


Neste domingo, a liturgia católica celebra a Solenidade dos Apóstolos São Pedro e São Paulo, primícias da fé, fundamentos da Igreja. 'Naquele tempo', as mensagens e as pregações públicas de Jesus estavam consolidadas; os milagres e os poderes sobrenaturais do Senhor eram de conhecimento generalizado; multidões acorriam para ver e ouvir o Mestre, dominados pela falsa expectativa de encontrar um personagem mítico e um Messias dominador do mundo. Na oração profunda, Jesus afasta-se do júbilo fácil do mundo e das multidões errantes, que O tomam por João Batista, por Elias, por um dos antigos profetas. Jesus, então, reúne os seus discípulos e lhes pede o testemunho próprio:  'E vós, quem dizeis que eu sou?' (Mt 16, 15). Por inspiração divina, a resposta de Pedro é uma confissão extremada da fé humana: 'Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo' (Mt 16, 16).

E, diante tal testemunho do Apóstolo, Jesus impõe a ele as primícias do papado e da Igreja: 'Por isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la' (Mt 16, 18). Esta será a Igreja Militante, a Igreja Temporal, A Igreja da terra, obra temporária a caminho da Igreja Eterna do Céu. Mas ligada a Pedro e aos sucessores de Pedro, sumos pontífices herdeiros da glória, poder e realeza de Cristo.

(Cristo entrega as chaves a São Pedro - Basílica de Paray-le-Monial, França)

E Jesus vai declarar, em seguida e sem condicionantes, o poder universal e sobrenatural da Santa Igreja Católica Apostólica e Romana: 'Eu te darei as chaves do Reino dos Céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus; tudo o que desligares na terra será desligado nos céus' (Mt 16, 19). Ligado ou desligado. Poder absoluto, domínio universal, primado da verdade, Cátedra de Pedro. Na terra árida de algum ermo qualquer da 'Cesareia de Felipe', erigiu-se naquele dia, pela Vontade Divina, nas sementeiras da humanidade pecadora, a Santa Igreja, a Videira Eterna.

Com São Paulo, a Igreja que nasce, nasce com um gigante do apostolado e se afirma como escola de salvação universal. Eis aí a síntese do espírito cristão levado à plenitude da graça: Paulo se fez 'outro Cristo' em Roma, na Grécia, entre os gentios do mundo. No apostolado cristão de São Paulo, está o apostolado cristão de todos os tempos; a síntese da cristandade nasceu, cresceu e se moldou nos acordes pautados em suas epístolas singulares proferidas aos Tessalonicenses, em Éfeso ou em Corinto. Síntese de fé, que será expressa pelas próprias palavras de São Paulo: 'Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé' (2Tm 4,7).

(São Paulo Apóstolo - Basílica de Alba, Itália)

São Pedro foi o patriarca dos bispos de Roma, São Paulo foi o patriarca do apostolado cristão. Homens de fé e coragem extremadas, foram as colunas da Igreja. São Pedro morreu na cruz, São Paulo morreu por decapitação pela espada. Mártires, percorreram ambos os mesmos passos da Paixão do Senhor. E se ergueram juntos na Glória de Deus pela Ressurreição de Cristo.

sábado, 30 de junho de 2018

INSTRUMENTOS DA GRAÇA ESPIRITUAL

Primeiramente, amar ao Senhor Deus de todo o coração, com toda a alma, com todas as forças.
Depois, amar ao próximo como a si mesmo.
Em seguida, não matar.
Não cometer adultério.
Não furtar.
Não cobiçar.
Não levantar falso testemunho.
Honrar todos os homens.
E não fazer a outrem o que não quer que lhe seja feito.
Abnegar-se a si mesmo para seguir o Cristo.
Castigar o corpo.
Não abraçar as delícias.
Amar o jejum.
Reconfortar os pobres.
Vestir os nus.
Visitar os enfermos.
Sepultar os mortos.
Socorrer na tribulação.
Consolar o que sofre.
Fazer-se alheio às coisas do mundo. 
Nada antepor ao amor de Cristo.
Não satisfazer a ira.
Não reservar tempo para a cólera.
Não conservar a falsidade no coração.
Não conceder paz simulada.
Não se afastar da caridade.
Não jurar para não vir a perjurar.
Proferir a verdade de coração e de boca.
Não retribuir o mal com o mal.
Não fazer injustiça, mas suportar pacientemente as que lhe são feitas.
Amar os inimigos.
Não retribuir com maldição aos que o amaldiçoam, mas antes abençoá-los.
Suportar perseguição pela justiça.
Não ser soberbo.
Não ser dado ao vinho.
Não ser guloso.
Não ser apegado ao sono.
Não ser preguiçoso.
Não ser murmurador.
Não ser detrator.
Colocar toda a esperança em Deus.
O que achar de bem em si, atribuí-lo a Deus e não a si mesmo.
Mas, quanto ao mal, saber que é sempre obra sua e a si mesmo atribuí-lo.
Temer o dia do juízo.
Ter pavor do inferno.
Desejar a vida eterna com toda a cobiça espiritual.
Ter diariamente diante dos olhos a morte a surpreendê-lo.
Vigiar a toda hora os atos de sua vida.
Saber como certo que Deus o vê em todo lugar.
Quebrar imediatamente de encontro ao Cristo os maus pensamentos que lhe advêm ao coração e revelá-los a um conselheiro espiritual.
Guardar sua boca da palavra má ou perversa. 
Não gostar de falar muito.
Não falar palavras vãs ou que só sirvam para provocar riso. 
Não gostar do riso excessivo ou ruidoso.
Ouvir de boa vontade as santas leituras.
Dar-se frequentemente à oração.
Confessar todos os dias a Deus na oração, com lágrimas e gemidos, as faltas passadas e daí por diante emendar-se delas. 
Não satisfazer os desejos da carne.
Odiar a própria vontade.
Obedecer em tudo às ordens do Abade, mesmo que este, o que não aconteça, proceda de outra forma, lembrando-se do preceito do Senhor: 'Fazei o que dizem, mas não o que fazem'. 
Não querer ser tido como santo antes que o seja, mas primeiramente sê-lo para que como tal o tenham com mais fundamento.
Por em prática diariamente os preceitos de Deus. 
Amar a castidade.
Não odiar a ninguém.
Não ter ciúmes.
Não exercer a inveja.
Não amar a rixa.
Fugir da vanglória.
Venerar os mais velhos.
Amar os mais moços.
Orar, no amor de Cristo, pelos inimigos.
Voltar à paz, antes do por-do-sol, com aqueles com quem teve desavença.
E nunca desesperar da misericórdia de Deus.

Eis aí os instrumentos da arte espiritual: se forem postos em ação por nós, dia e noite, sem cessar, e devolvidos no dia do juízo, seremos recompensados pelo Senhor com aquele prêmio que Ele mesmo prometeu: 'O que olhos não viram nem ouvidos ouviram preparou Deus para aqueles que o amam'. São, porém, os claustros do mosteiro e a estabilidade na comunidade a oficina onde executaremos diligentemente tudo isso.

('Instrumentos das Boas Obras', das Regras de São Bento)

SUMA TEOLÓGICA EM FORMA DE CATECISMO (XIV)

XII

DO PECADO ORIGINAL E SUAS CONSEQUÊNCIAS, OU FERIDAS DA NATUREZA HUMANA

Existia a concupiscência no estado primitivo em que Deus criou o homem?
Não, Senhor.

Por que existe agora?
Porque o homem se acha em estado de natureza decaída (LXXXI-LXXXIII)*.

Que entendeis por estado de natureza decaída?
O estado que se seguiu como efeito e consequência do primeiro pecado do primeiro homem (LXXX, 4; LXXXII, 1).

Por que se estendem a todos e a cada um dos homens, os efeitos e consequências daquele primeiro pecado do nosso primeiro pai?
Porque a nossa natureza é a sua e dele a recebemos (Ibid).

Se não tivesse pecado o primeiro homem, ter-nos-ia transmitido a natureza em outro estado?
Sim, Senhor; no estado de integridade e justiça original (LXXXI, 2).

O estado em que atualmente a recebemos é estado de pecado?
Sim, Senhor (LXXXI, 1; LXXXII, 1).

Por que?
Porque recebemo-la como ela é e conforme ficou em consequência do pecado (Ibid).

Como se chama esta mancha do pecado que se nos transmite, junto com a natureza, efeito da queda do primeiro homem?
Chama-se pecado original (Ibid).

Logo, o pecado original transmite-se a todos os homens pelo fato de receber a natureza de Adão pecador?
Por este único fato se transmite (Ibid).

Que efeito produz em cada indivíduo da espécie humana o chamado pecado original?
A privação dos dons sobrenaturais e gratuitos que Deus misericordiosamente havia concedido à natureza, na pessoa do primeiro homem e pai comum dos mortais (LXXXII, 1).

Quais eram os dons de que nos privou o pecado original?
Em primeiro lugar, a graça santificante com as virtudes sobrenaturais infusas e os dons do Espírito Santo; além disso, o privilégio da integridade vinculado aos dons sobrenaturais.

Que efeito produzia o privilégio da integridade?
A subordinação perfeita dos sentidos à razão, e do corpo à alma.

Que bens se conseguiam com tão perfeita subordinação?
Conseguia-se que as faculdades afetivas não podiam experimentar nenhum movimento desordenado, e que o corpo fosse impassível ou imortal.

Logo, a morte e as outras misérias corporais são o efeito próprio do pecado?
Sim, Senhor (LXXXV, 5).

Como se chamam os efeitos do pecado na alma?
Chamam-se feridas.

Quais são?
Ignorância, malícia, fragilidade e concupiscência (LXXXV; 3).

Que entendeis por ignorância?
A condição a que ficou reduzida a inteligência quando perdeu a disposição infalível para a verdade, como a possuía no estado de integridade (Ibid).

Que entendeis por malícia?
A condição a que ficou reduzida a vontade, desapossada da disposição infalível para o bem, que tinha no estado de Justiça original (Ibid).

Que entendeis por fragilidade?
A condição a que ficou reduzida a parte afetiva sensível, destituída da ordem conatural para com tudo o que é mau ou difícil e que ela possuía no estado de integridade original.

Que entendeis por concupiscência?
A condição a que se reduziu a parte afetiva sensível quando sacudiu a autoridade que, no estado de inocência, a mantinha nos limites do prazer sensível, moderado pela razão (Ibid).

São estas quatro feridas efeitos do primeiro pecado do primeiro homem?
Sim, Senhor.

Podem agravá-las os nossos pecados pessoais e os dos nossos ascendentes?
Sim, Senhor (LXXXV, 1, 2).

Têm alguns pecados pessoais a propriedade de produzir no homem disposições e inclinações especiais para cometer outros novos?
Sim, Senhor; os chamados pecados capitais.

Quais são?
Soberba, Avareza, Gula, Luxúria, Preguiça, Inveja e Ira.

Apesar de todos estes motivos de pecado, herdados de nosso primeiro progenitor e ascendentes, devemos sustentar que o homem é livre quando executa atos morais e que jamais peca por necessidade?
Sim, Senhor.

Como poderiam as ditas causas de pecado destruir a liberdade humana?
Privando o homem do uso da razão (LXXXVII, 7).

Logo, enquanto o homem conserva o uso da razão, é livre e depende dele evitar ou não o pecado?
Sim, Senhor.

As preditas causas podem, apesar do exposto, entorpecer o exercício da liberdade até ao ponto de diminuir ou atenuar a gravidade do pecado?
Sim, Senhor; exceto o caso em que as agrava o pecado pessoal (LXXXVII, 6).

XIII

DISTINÇÃO DA GRAVIDADE DOS PECADOS E DE SEUS CORRESPONDENTES CASTIGOS

Têm os mesmos caracteres de gravidade todos os pecados cometidos pelos homens?
Não, Senhor.

A que se atende para determinar a gravidade de um pecado?
A categoria e necessidade do bem de que priva e à maior ou menor liberdade com que se executa (LXXIII, 1-8).

Merecem castigo todos os atos pecaminosos?
Sim, Senhor (LXXXVII, 1).

Por que?
Porque, todo pecado é usurpação do direito alheio e o castigo é a maneira de restituição do que injustamente se tomou (Ibid).

Logo, o castigo do pecado é ato de rigorosa Justiça?
Sim, Senhor.

Quem pode impor a pena devida pelo pecado?
Os encarregados de velar pela ordem e pela justiça, contra os atentados do pecador (Ibid).

Quais são?
Primeiramente Deus, depois, a autoridade humana, nos assuntos de sua competência; e, por último, o próprio pecador (Ibid).

Como pode o pecador castigar o seu próprio pecado?
De duas maneiras; por meio da penitência e do remorso da consciência (Ibid).

Como intervém a autoridade humana?
Impondo castigos (Ibid).

Como Deus pode castigar?
De duas maneiras, mediata ou imediatamente (Ibid).

Quando dizemos que castiga mediatamente?
Quando o faz mediante a autoridade humana ou a consciência do pecador (Ibid).

Por que chamais castigos divinos aos impostos pela autoridade humana e pela consciência do pecador?
Porque a autoridade humana e a própria consciência participam do poder de Deus, de quem são de algum modo instrumentos (Ibid).

Emprega Deus algum outro meio para castigar o pecado?
Sim, Senhor; utiliza as próprias criaturas, que a Ele pertencem e cuja subordinação e harmonia o pecador procura perturbar (Ibid).

Podemos neste sentido dizer que há uma justiça imanente?
Sim, Senhor; e, em virtude dela, as mesmas coisas inanimadas servem como instrumento à Justiça divina para castigar o pecado, fazendo padecer o pecador as consequências de sua culpa (Ibid).

Que entendeis por intervenção imediata de Deus no castigo do pecado?
Uma intervenção particular e sobrenatural, em virtude da qual Ele mesmo castiga os atentados do pecador contra a ordem sobrenatural por Ele estabelecida (LXXXVII, 3, 5).

Em que se diferencia o castigo imposto imediatamente por Deus, na ordem sobrenatural, dos impostos pelas criaturas?
Em que Deus castiga alguns pecados com penas que durarão eternamente (LXXXVII, 3).

referências aos artigos da obra original

('A Suma Teológica de São Tomás de Aquino em Forma de Catecismo', de R.P. Tomás Pègues, tradução de um sacerdote secular)

sexta-feira, 29 de junho de 2018

PALAVRAS DE SALVAÇÃO


'A humildade é a verdade, e a verdade é que eu sou somente nada. Portanto, tudo o que é bom em mim vem de Deus. Ora, acontece muitas vezes que desperdiçamos o que Deus pôs de bom em nós... A ideia de que, a cada dia, o Senhor vem até nós e nos dá tudo deveria tornar-nos humildes. Ora, é o oposto o que acontece, porque o demônio faz brotar dentro de nós ataques de orgulho. Isso em nada nos honra. Temos de lutar contra o nosso orgulho. Quando não pudermos mais, paremos um instante e façamos um ato de humildade; então Deus, que ama os corações humildes, virá ao nosso encontro'.

(São Pio de Pietrelcina)