domingo, 10 de maio de 2015

'PERMANECEI NO MEU AMOR'

Páginas do Evangelho - Sexto Domingo da Páscoa


Neste Sexto Domingo da Páscoa, somos chamados a vivenciar em plenitude o amor de Deus. Jesus encontra-se no Cenáculo, pouco antes de sua ida até o Horto das Oliveiras e da sua prisão e morte na cruz. E acaba de revelar aos seus discípulos amados, mais uma vez, a identidade do amor divino entre o Pai e o Filho: 'Como meu Pai me amou, assim também eu vos amei. Permanecei no meu amor' (Jo 15, 9). 'Permanecei no meu amor'; sim, porque o Amor precisa ser amado e é na reciprocidade deste amor que procede do Pai e do Filho, por intermédio do Espírito Santo, que se vive em plenitude a graça de sermos Filhos de Deus. E a posse dessa graça suprema se dá no despojamento do eu e na estrita observância aos mandamentos do Senhor: 'Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, assim como eu guardei os mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor' (Jo 15, 10).

O maior tributo da graça divina é o mandamento do amor. 'Este é o meu mandamento: amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei' (Jo 15, 12). Sim, como Cristo nos amou. Na nossa impossibilidade humana de amar como Cristo nos ama, isso significa amar sem rodeios, amar sem vanglória, amar sem zelos de gratidão, amar de forma despojada e sincera aos que nos amam e aos que não nos amam, a quem não conhecemos, a quem apenas tangenciamos por um momento na vida, a todos os homem criados pelos desígnios imensuráveis do intelecto divino, à sombra e imersos na dimensão do infinito amor de Cristo por nós.

Ainda que na nossa proposição distorcida e acanhada do amor divino, o amor humano se projeta a alturas inimagináveis de santificação, quando expressa a sua identificação de forma incisiva no projeto de redenção de Cristo: 'Ninguém tem amor maior do que aquele que dá sua vida pelos amigos.' (Jo 15, 13). Eis aí a essência do novo mandamento: amar, com igual despojamento, toda a dimensão da humanidade pecadora, a exemplo de um Deus que se entregou à morte de cruz para nos redimir da morte e mostrar que o verdadeiro amor não tem limites nem medida alguma.

O mandamento do amor é fundamentado num conceito inteiramente novo, cujo significado vai muito além dos sentimentos efêmeros deste mundo e que exclui quaisquer padrões de interesses desordenados e subterfúgios: a amizade sincera com Jesus. Neste amor, já não somos servos, mas amigos do Senhor e co-participantes de sua glória, escolhidos desde toda a eternidade: 'Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai. Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi e vos designei para irdes e para que produzais fruto e o vosso fruto permaneça' (Jo 15, 15 - 16). Eis o princípio fundamental do mandamento do amor: amar ao próximo como se ama a Cristo, e sermos frutos de salvação para muitos e arrastar conosco almas, muitas almas, às moradas eternas do Pai, como instrumentos silentes e perfeitos do puro amor de Deus.

sábado, 9 de maio de 2015

VÍDEO: O MILAGRE DA VIDA

(a concepção e o desenvolvimento do feto no ventre materno)


Em cada ejaculação, o homem libera cerca de 300 a 400 milhões de espermatozoides. Cada espermatozoide está programado para procurar o óvulo e fertilizá-lo. Mas a vagina é um meio hostil à sobrevivência dos espermatozoides devido às substâncias ácidas que segrega e que a protegem diariamente das bactérias. Esta acidez destrói milhões de espermatozoides mal entram na cavidade vaginal. Só os mais fortes seguem o seu caminho, nadando vigorosamente através do colo do útero até às Trompas de Falópio (canal que liga cada um dos ovários à cavidade uterina). 

Durante este percurso, alguns espermatozoides ficam presos na pregas do útero ou entram na Trompa de Falópio errada, onde não existe nenhum óvulo para fecundar. Os restantes espermatozoides continuam a sua viagem e iniciam a subida pela Trompa de Falópio na esperança de alcançar o óvulo solitário que os aguarda. Só os mais resistentes ultrapassam todos os obstáculos que encontram ao longo do caminho. Das poucas centenas de espermatozoides que conseguem alcançar as Trompas de Falópio e forçam a entrada no óvulo, normalmente, apenas um (o mais forte e apto) o consegue perfurar e fertilizar.

No momento em que um espermatozoide penetra a zona pelúcida (membrana que protege o óvulo), esta se fecha para impedir que outros espermatozoides entrem no óvulo. O óvulo fertilizado tem agora toda a informação genética necessária para gerar uma vida nova. No momento da concepção, o sexo, as caraterísticas físicas e eventuais problemas se saúde hereditários do bebé já foram determinados. 

Cerca de um dia após a fertilização, os núcleos do óvulo e do espermatozoide fundem-se. Cada progenitor contribui com 23 pares de cromossomas cujo núcleo guarda o código DNA de cada um dos pais. Os cromossomas juntam-se e dão origem a uma célula única (zigoto). Inicia-se agora a divisão celular, gênese de uma nova vida. Logo após a concepção, o corpo da mulher inicia uma série de alterações que o preparam para acolher e nutrir o feto em formação. Basicamente, o seu corpo torna-se no suporte de vida de um novo ser humano, relação que vai perdurar e fortalecer-se durante os próximos nove meses (texto publicado originalmente no site Mãe-me-quer)

QUANDO DEUS NOS INFUNDE A ALMA?

Em algum momento singular da concepção de uma nova vida humana, pela infusão da alma, Deus a toma como uma criação divina. Que momento seria esse? Nos primórdios da concepção humana ou após o processo inicial da vida intrauterina, quando efetivamente o embrião começa a apresentar uma 'forma' humana? Ou, algum tempo depois, quando aparentar respostas sensíveis a estímulos externos? Ou somente quando estiver plenamente manifestada no feto a capacidade, após algumas semanas, de ser interpretado como um novo ser humano, por critérios científicos, médicos ou filosóficos? Para muitos, esta resposta tem conformado e anestesiado a consciência em favor do terrível crime do aborto.

A resposta a estas questões tem sido dada, em caráter definitivo, pela própria ciência humana. Não há quaisquer dúvidas ou questionamentos científicos de que o óvulo fecundado (zigoto) já possui, por si e no todo, o código integral de uma nova vida, o DNA primordial de um ser humano completo e distinto dos seus pais. Ainda que não seja visível ou explicitado, no óvulo fecundado já estão programados todos os caracteres e princípios de um  novo ser humano, como sexo, cor, compleição, tipo e cor dos cabelos, dos olhos, formato da face, etc. Diante desta realidade singular, o corpo da mulher se molda e se apronta, de forma especial, para acolher o desenvolvimento do novo ser, de uma nova e singular pessoa humana. Destruir o óvulo fecundado é, portanto, a consumação da morte de um corpo e de uma alma, um crime hediondo contra Deus.

Não deveria isso ser nem um pouco surpreendente para os católicos. Desde os meados do século XIX, muito antes destas fantásticas descobertas científicas, a Santa Igreja, pela luz da fé, já se havia antecipado às luzes da ciência. Pelo dogma da Imaculada Conceição, proclamado pelo Papa Pio IX, em 8 de dezembro de 1854, a Santa Igreja manifestara que a Virgem Maria tinha sido adornada com uma alma espiritual, desde o primeiro instante de sua existência, desde o momento singular de sua concepção:

'Declaramos, pronunciamos e definimos que a doutrina de que a Bem-aventurada Virgem Maria, no primeiro instante de sua conceição, por singular graça e privilégio de Deus Onipotente, em atenção aos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de culpa original; essa doutrina foi revelada por Deus, e deve ser, portanto, firme e constantemente crida por todos os fiéis'.

(Beato Papa Pio IX, na proclamação do dogma da Imaculada Conceição, em 08 de dezembro de 1854)

Desta forma, a Virgem Maria, para ser preservada de qualquer pecado desde a sua concepção e receber, naquele instante, o Espírito Santo de Deus, já deveria ser detentora de uma alma espiritual, capaz de receber a graça santificante ('imaculada conceição'). A Santa Virgem, por privilégios extraordinários, foi preservada do pecado original e, assim, Deus não permitiu que ela estivesse separada dele em nenhum segundo de sua existência. Desde a concepção, portanto, cada embrião é um ser humano completo, dotado de uma alma espiritual, conhecido por Deus por toda a eternidade.

Isto é exposto com uma claridade perturbadora nas palavras de Deus ao profeta Jeremias: 'Antes que no seio fosses formado, eu já te conhecia; antes de teu nascimento, eu já te havia consagrado, e te havia designado profeta das nações' (Jr 1, 5); e também ao profeta Isaías: 'O Senhor chamou-me desde meu nascimento; ainda no seio de minha mãe, ele pronunciou o meu nome' (Is 49, 1). Deus nos conhece desde toda a eternidade e nos reconhece como pessoa humana pelo nome e nos consagra com o atributo de uma alma de eternidade, desde o momento de nossa concepção, num óvulo fecundado, mesmo que ainda invisível às tecnologias mais avançadas de observação e de monitoramento da vida intrauterina. 

Estas extraordinárias revelações já estão presentes no Salmo 138, escrito cerca de 500 anos antes de Cristo: 'Fostes vós que plasmastes as entranhas de meu corpo, vós me tecestes no seio de minha mãe. Sede bendito por me haverdes feito de modo tão maravilhoso. Pelas vossas obras tão extraordinárias, conheceis até o fundo a minha alma. Nada de minha substância vos é oculto, quando fui formado ocultamente, quando fui tecido nas entranhas subterrâneas. Cada uma de minhas ações vossos olhos viram, e todas elas foram escritas em vosso livro; cada dia de minha vida foi prefixado, desde antes que um só deles existisse' (Sl 138, 13 - 16).

O embrião não é um mero grumo de células e cromossomos, em um processo contínuo de divisão celular. É essencialmente uma pessoa humana, dotada de uma alma espiritual, nascida do amor humano e programada, desde a sua concepção, para constituir um novo ser, com todas as características genéticas pré-definidas. Esta 'programação' é fruto da infusão de uma alma espiritual ainda no óvulo fecundado, no instante primevo da sua concepção, que dará origem a um novo ser humano, consagrado desde a eternidade e 'tecido nas entranhas subterrâneas do ventre materno', como um ato do amor infinito e da criação personalíssima de Deus.

(Texto baseado no artigo 'Ti ho conosciuto fin dal grembo materno - Così la Bibbia rende sacra la vita dal concepimento', de Enrico Cattaneo, publicado originalmente em La Nuova Bussola Quotidiana)

sexta-feira, 8 de maio de 2015

TU ÉS PEDRO! (PIO XII)

(Pio XII: Eugenio Maria Giuseppe Giovanni Pacelli - 260º papa: 1939 - 1958)

 




 



98 ANOS DAS MENSAGENS DE FÁTIMA (II)

DOS ARQUIVOS DE SENDARIUM
(artigo publicado originalmente no blog em 09/05/2013)

A CONSAGRAÇÃO DA RÚSSIA E A MISSÃO DE LÚCIA

Por que, nas mensagens, Nossa Senhora pediu expressamente a consagração da Rússia ao seu Imaculado Coração? Porque a conversão da Rússia seria reconhecida mundialmente como fruto direto de uma intervenção divina e um triunfo absoluto do Coração Imaculado de Maria. A partir deste fato, tomaria expressão mundial a devoção ao Imaculado Coração de Maria conjuntamente à devoção ao Imaculado Coração de Jesus (Aliança dos Dois Corações). 'Se atenderem aos meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz. Se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja ...' A situação da Rússia, à época das aparições, era totalmente imprevisível em termos de sua enorme influência geopolítica no cenário mundial no decorrer do século XX, o que caracterizaria a mensagem como praticamente ininteligível, mesmo porque a Rússia ainda não se tornara comunista, uma vez que a revolução marxista-leninista somente iria se irromper brutalmente em novembro daquele ano. Em 13/06/1929, a Irmã Lúcia teve uma visão da Santíssima Trindade e recebeu a seguinte mensagem de Nossa Senhora: 'É chegado o momento em que Deus pede para o Santo Padre (Pio XI, 1922 – 1939) fazer, em união com todos os bispos do mundo, a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração, prometendo salvá-la por este meio...' Mais tarde, por meio duma comunicação íntima, Nosso Senhor disse à Lúcia: queixando-se: 'Não quiseram atender o meu pedido ... Arrepender-se-ão e fá-la-ão, mas será tarde'. Em outro depoimento, carta escrita em 1935, Lúcia afirmava que 'Nosso Senhor estava bastante descontente por não se realizar o seu pedido ...' 

A partir dos pontificados seguintes, várias tentativas foram feitas para se estabelecer a consagração da Rússia e do mundo ao Imaculado Coração de Maria (iniciadas com a consagração feita pelo Papa Pio XII, muito tempo depois, em 07/07/52), mas nenhuma delas pareceu atender plenamente as condições impostas por Nossa Senhora para a sua efetiva realização. Entretanto, a consagração realizada pelo Papa João Paulo II em 25 de março de 1984 foi reconhecida como sendo válida pela vidente, desde meados de 1989, embora como expressão de uma sua opinião particular e não como fruto de uma revelação sobrenatural. A União Soviética deixou de existir formalmente em dezembro de 1991, substituída pela CEI (Comunidade dos Estados Independentes), incluída a Rússia como uma de suas repúblicas associadas. 

Os videntes Jacinta e Francisco Marto morreram ainda na infância, logo após as aparições. Quanto a Lúcia, Nossa Senhora assim se expressou: '... Mas tu ficas cá mais algum tempo. Jesus quer servir-se de ti para Me fazer conhecer e amar.Ele quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração...' A missão dada à Lúcia era cristalina: divulgar uma devoção especial à Mãe de Deus e, particularmente, a consagração ao seu Imaculado Coração. Através de Lúcia, esta devoção deveria assumir amplitude mundial e ser instrumento privilegiado de conversão e salvação de muitas almas: 'Se fizerem o que Eu vos disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz'. É fato concreto que a mensagem de Fátima não foi correspondida e os pedidos e súplicas de Nossa Senhora não foram atendidos: os homens continuaram e continuam a pecar em magnitude crescente, numa corrida desenfreada aos paroxismos do inimaginável. A desordem moral vigente (degradação da família, do casamento, da sexualidade e implantação de um regime de vida que prega e justifica todo e qualquer pecado) é uma agressão cotidiana à mensagem de Fátima e combustível que incendeia, a cada dia, a taça da cólera divina. A impiedade e a corrupção moral campeiam em nossa sociedade, formulada essencialmente em princípios naturais e que se especializa cada vez mais em banir totalmente nos homens a ideia de Deus. A crise da Igreja é gravíssima: a permissividade moral, a apostasia, a direção espiritual manietada num sem número de atividades frívolas e materiais, conduz inexoravelmente os sacerdotes (o chamado 'Estado Maior de Cristo', nas palavras de Monsenhor Escrivá de Balaguer, fundador do Opus Dei) a um estado de aviltamento, perplexidade, tibieza e conformismo, em tudo contrário à missão salvífica (Mateus, 16, 15-16): 'Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura. Aquele que crer e for batizado será salvo; o que não crer será condenado'

Nesta devastadora crise moral que assola o mundo contemporâneo, a conclusão é óbvia e terrível: a mensagem de Fátima foi desprezada pelos homens e o pressuposto da emenda de vida e conversão foram olvidados ao extremo. As recentes aparições e manifestações de Nossa Senhora, no Brasil e no mundo, apenas ratificam e amplificam, ao extremo da aflição, os mesmos apelos e chamamentos feitos em Fátima. Por que Nossa Senhora chora? No silêncio e na sua angústia, a Mãe chora contra as agressões de tantos filhos, a Mãe chora para extravasar a sua dor premente e a sua tristeza profunda, a Mãe chora na esperança de que suas lágrimas, ao menos suas lágrimas, comovam corações entorpecidos pela dureza do pecado e por uma vida sem Deus. E chora porque mais e mais almas se perdem porque '... vão muitas almas para o Inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas...'. 

(Da publicação '8 Questões sobre as Aparições de Nossa Senhora em Fátima, do autor do blog).

quinta-feira, 7 de maio de 2015

O PENSAMENTO VIVO DE CHARLES DE FOUCAULD (I)

Deus não associou a salvação à ciência, à inteligência, à riqueza, a uma longa experiência, a dons raros que nem todos receberam. Ligou-a àquilo que está ao alcance de todos, de absolutamente todos, dos jovens e dos velhos, dos seres humanos de todas as idades e classes, com todo o tipo de inteligência e fortuna. Associou-a àquilo que todos, absolutamente todos, lhe podem dar, àquilo que todo o ser humano, seja quem for, lhe pode dar, bastando que tenha um pouco de boa vontade: um pouco de boa vontade é tudo o que é preciso para ganhar esse céu que Jesus liga à humildade, ao fato de nos fazermos pequenos, de tomarmos o último lugar, de obedecermos; que liga ainda à pobreza de espírito, à pureza de coração, ao amor da justiça, ao espírito da paz (Mt 5,3-). Tenhamos esperança uma vez que, através da misericórdia de Deus, a salvação está tão próxima de nós, que nos basta apenas um pouco de boa vontade para a obter.


O amor não consiste em sentirmos que amamos, mas em querermos amar. Quando queremos amar, amamos; quando queremos amar acima de tudo, amamos acima de tudo. Se acontecer sucumbirmos a uma tentação, é porque o amor é demasiado fraco, não é porque ele não exista. É preciso chorar, como São Pedro, arrependermo-nos como São Pedro ... mas, também como ele, dizer três vezes: 'Amo-Vos, amo-Vos, amo-Vos, Vós sabeis que, apesar das minhas fragilidades e pecados, eu Vos amo' (Jo 21,15-). Quanto ao amor que Jesus tem por nós, Ele provou-o à abundância para que nele acreditemos sem o sentirmos. Sentir que O amamos e que Ele nos ama seria o céu; mas o céu, salvo em raros momentos e exceções, não é aqui em baixo.

Lembremos sempre uns aos outros esta história dupla: a das graças que Deus nos deu pessoalmente desde o nascimento e a das nossas infidelidades ; e aí acharemos … motivos infinitos para nos perdermos, com ilimitada confiança, no seu amor. Ele ama-nos porque é bom, não porque somos bons; não amam as mães os filhos desencaminhados? E muitas razões havemos de encontrar para nos enterrarmos na humildade e na falta de confiança em nós próprios. Procuremos resgatar um pouco os nossos pecados pelo amor ao próximo, pelo bem feito ao próximo. A caridade para com o próximo, os esforços para fazer bem aos outros são um excelente remédio a opor às tentações: é passar da simples defesa ao contra-ataque.


A virtude que Nosso Senhor recompensa, a virtude que Ele louva, é quase sempre a fé. Por vezes louva o amor [como com Madalena (Lc 7,47)]; por vezes a humildade, mas esses exemplos são raros; é quase sempre a fé que recebe Dele recompensa e louvores. Por quê? Sem dúvida porque a fé é, se não a mais alta virtude (pois a caridade a ultrapassa), pelo menos a mais importante, pois é o fundamento de todas as outras, incluindo a caridade, e também porque é a mais rara.

Ter verdadeiramente fé, a fé que inspira todas as ações, essa fé sobrenatural que despoja o mundo da sua máscara e mostra Deus em todas as coisas; que faz desaparecer todos os impossíveis; que retira sentido às palavras de inquietação, de perigo, de medo; que faz com que se caminhe na vida com uma calma, uma paz e uma alegria profundas, como um menino levado pela mão da mãe; que conduz a alma a um desapego tão absoluto de todas as coisas sensíveis, cujo vazio e puerilidade detecta claramente; que proporciona uma tal confiança na oração, a confiança da criança que pede uma coisa boa a seu pai; essa fé que nos mostra que tudo o que não for agradar a Deus é mentira.

Essa fé que nos faz ver em tudo a outra luz — os homens como imagens de Deus, que é preciso amar e venerar, como retratos do nosso Bem-Amado, a quem devemos fazer todo o bem possível; as outras criaturas, como coisas que devem, sem exceção, ajudar-nos a ganhar o céu, louvando a Deus, quer através delas quer privando-nos delas — essa fé que, deixando entrever a grandeza de Deus, nos faz ver a nossa pequenez; que nos leva a fazer sem hesitar, sem corar, sem temer, sem jamais recuar, tudo o que é agradável a Deus: ó como é rara essa fé! Meu Deus, concede-a a mim! Meu Deus eu creio, mas aumenta a minha fé! Meu Deus, faz com que eu creia mais e Vos ame.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

98 ANOS DAS MENSAGENS DE FÁTIMA (I)

DOS ARQUIVOS DE SENDARIUM

(artigo publicado originalmente no blog em 04/05/2013)

AS MENSAGENS E OS SEGREDOS DE FÁTIMA

As aparições de Nossa Senhora em Fátima/Portugal, de 13 de maio a 13 de outubro de 1917, a três humildes crianças, Jacinta e Francisco Marto (ambos falecidos ainda na infância, logo após as aparições, em 20/02/1920 e 04/04/1919, respectivamente) e Lúcia dos Santos (falecida em Coimbra, em 13/02/2005, com quase 98 anos de idade), à época com 7, 9 e 10 anos, respectivamente, constituem a síntese das aparições marianas, em que estes princípios apresentam-se entrelaçados de modo admirável numa mensagem de cunho universal, mundialmente conhecida como Segredo de Fátima. Com efeito, Fátima está inserida no contexto da Primeira Guerra Mundial (1914 -18) e da revolução marxista-leninista na Rússia (1917), frutos de um mundo em estado de pecado generalizado muito grave, em situação de impiedade (falta de fé) e impureza muito piores que àquelas vigentes à época das mensagens de La Salette. 

Falando aos pequenos pastores, a mensagem de Nossa Senhora constitui uma revisão ainda mais vigorosa que os apelos transmitidos aos homens por meio de Mélanie e Maximino em 1846, com uma forte exortação aos homens de todo o mundo pelo retorno à oração, à penitência, à conversão e uma indicação clara dos graves riscos a que se submetia a humanidade caso os homens não se convertessem de fato. Mas Fátima é essencialmente a promessa de uma conversão de almas e o triunfo do Imaculado Coração de Maria num mundo novo, uma nova Terra. Assim, Fátima é o grande marco da História da Igreja contemporânea, delineando de forma insofismável os eventos apocalípticos dos últimos tempos e a redenção da humanidade nos tempos novos do Reino de Maria. 

Do conjunto de mensagens que Nossa Senhora e Mãe de Deus revelou ao mundo em Fátima, algumas das revelações foram sistematizadas em três partes distintas, numa abordagem que ficou mundialmente conhecida como Segredo de Fátima. As duas primeiras partes do Segredo foram formalmente reveladas por Lúcia em 1941, nas suas Terceira e Quarta Memórias e são as seguintes: 

1. Visão do Inferno 

Na terceira aparição, a 17 de julho de 1917, Nossa Senhora, após ensinar às crianças uma oração pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos, abriu as mãos e o reflexo dos raios de luz, que delas emanavam, pareceu penetrar a terra, revelando a Visão do Inferno. Acompanhemos a descrição do inferno nas terríveis palavras de Lúcia: 

'... e vimos como que um mar de fogo: mergulhados neste fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras, ou bronzeadas, com forma humana, que flutuavam no incêndio, levadas pelas chamas, que delas mesmo saíam juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das fagulhas nos grandes incêndios, sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizavam e faziam estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e asquerosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes como negros carvões em brasa...' 

2. Castigos Universais e os Meios para Evitá-los 

A Segunda parte do Segredo, revelada às crianças na seqüência imediata da Visão do Inferno, consiste no anúncio do advento de grandes castigos para a humanidade, caso os homens não se convertessem e, principalmente, os meios de salvação colocados à disposição de todos e capazes de reorientar e modificar completamente as perspectivas previstas para as futuras gerações: a oração do Rosário, a prática dos Cinco Primeiros Sábados e a Devoção ao Imaculado Coração de Maria. O pedido premente da Mãe de Deus não se restringe à geração do início do século XX, mas é um clamor incessante a todas as gerações futuras e o seu teor constitui uma realidade impressionante para todos os homens nestes primeiros anos do Século XXI: 

'Vistes o Inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores. Para as salvar, Deus quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração. Se fizerem o que Eu disser, salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar. Mas, se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI começará outra pior. Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre. Para o impedir, virei pedir a consagração da Rússia ao meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem aos meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz. Se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito o que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-Me-á a Rússia, que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz. Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé, etc...' 

3.  'O Terceiro Segredo' 

A última frase das mensagens reveladas é bastante singular: 'Em Portugal se conservará sempre o dogma da fé, etc...'. Este etc... sugere que o texto da terceira parte do Segredo estaria a seguir (lembrando que a segunda parte sucedeu imediatamente a revelação da primeira parte). Mas a própria frase parece desconectada do contexto anterior, pois a referência específica (situação em Portugal) confronta com o texto prévio (castigo das nações, dimensão universal dos castigos), de forma que pode se interpretar esta frase já no contexto da terceira parte do Segredo. Se em Portugal o dogma da fé será mantido (e se esta afirmativa assume um caráter de tal relevância que mereça uma menção especial na mensagem), é razoável deduzir que este fato – a perda da fé – atingirá dimensões inconcebíveis no âmbito da história humana e terá proporções mundiais. Nesta concepção, a terceira parte da mensagem referir-se-ia à questão de uma apostasia generalizada e sem paralelo na história da humanidade. Uma crise de fé de tal relevância deveria estar intimamente relacionada a uma gravíssima crise da própria Igreja de Cristo e isto explicaria a não divulgação pública desta terceira e última parte do Segredo. 

Tomemos, como referência, algumas mensagens ao Pe Gobbi, do Movimento Sacerdotal Mariano (MSM), em que Nossa Senhora explicita claramente estas concepções:

678/90 - Causas da apostasia (ver Segunda Carta de São Paulo aos Tessalonicenses - 2,3): 
- difusão de erros teológicos 
- mau exemplo de sacerdotes 
- rebeliões contra a Igreja / Papa 

688/90 - O meu terceiro segredo, que aqui dei a conhecer às três crianças a quem apareci, e que até agora ainda não vos foi revelado, tornar-se-á manifesto a todos pelo próprio desenrolar dos acontecimentos. A Igreja conhecerá a hora de sua maior apostasia, o homem iníquo introduzir-se-á no seu interior e sentar-se-á no próprio templo de Deus, enquanto o pequeno resto, que permanecerá fiel, será submetido às maiores provações e perseguições. 

832/93 - Viveis os anos sanguinolentos da batalha ... Está se realizando o que está contido na terceira parte da minha mensagem, que ainda não vos foi revelada ... 

Nossa Senhora faz uma correlação direta entre o terceiro segredo de Fátima e os sinais escatológicos; as mensagens de Nossa Senhora em Fátima não foram reveladas (a mensagem original é de 1993) e, assim, não propiciaram a reação adequada ao espantoso alerta dos nossos tempos: a humanidade, corrompida pelas potências do mal, será objeto de uma apostasia de cunho universal propiciando as condições para o surgimento do anticristo, ratificando, assim, as palavras de São Paulo na segunda carta aos tessalonicenses. 

762/92 - Entrais nos tempos decisivos ... o novo ano levará ao cumprimento o que Eu vos tenho revelado em alguns dos meus segredos ... Assim, aumentarão em toda parte o mal e o pecado ... as guerras se difundirão, envolvendo outros povos e nações ... 

816/93 - A grande prova chegou para toda a humanidade ... Quantos deverão sofrer o flagelo da fome, da carestia, da discórdia, das lutas fratricidas que espalharão tanto sangue pelos vossos caminhos. 

821/93 - A humanidade conhecerá a hora sangrenta do seu castigo: será golpeada pelo flagelo das epidemias, da fome e do fogo; muito sangue será derramado nas vossas estradas; a guerra se estenderá por toda parte, levando ao mundo uma incomensurável devastação. 

831/93 - (as potências do mal) conseguiram levar toda a humanidade a viver sem Deus; difundiram por toda a parte o erro do ateísmo teórico e prático; construíram novos ídolos, diante dos quais a humanidade se prosta em adoração: o prazer, o dinheiro, o orgulho, a impureza, o predomínio e a impiedade. 

832/93 - Viveis os anos sanguinolentos da batalha ... Está se realizando o que está contido na terceira parte da minha mensagem, que ainda não vos foi revelada ... 

Esta terceira parte do segredo, escrita por Lúcia em janeiro de 1944, seria formalmente revelada publicamente pelo Vaticano em 26 de junho de 2000, em termos tão abrangentes e eivados de naturalismo, que não justificam, de forma alguma, os cuidados extremos e o silêncio pontifício imposto à exposição pública das mensagens durante décadas, pelas consequências e impactos decorrentes de revelações particularmente graves e universais. Assim, a revelação divulgada oficialmente como 'terceiro segredo' não se enquadra absolutamente nestas graves e definitivas mensagens de Nossa Senhora ao MSM e muito menos na gravíssima realidade atual de perda da fé e de uma apostasia geral da humanidade. 

A terceira parte do segredo constitui essencialmente, portanto, a revelação de uma profunda crise de fé e crise da Igreja, com a perda substancial da Verdade revelada, substituída por um sem número de doutrinas heréticas no campo dogmático e da moral e implementação de falsas liturgias, com profundo impacto nos valores do cristianismo autêntico e concessões crescentes ao permissivismo moral, ao agnosticismo e ao ateísmo. Nas demolidoras palavras de Paulo VI: '... por alguma fissura entrou a fumaça de Satanás no templo de Deus...

Na própria mensagem de Fátima, o Segredo aparece como três partes distintas de um todo, ou seja, existe uma relação direta e comum interligando as três partes do Segredo em uma única mensagem: a crise de fé e a apostasia universal (terceira parte do Segredo) seriam os fatores de condenação ao Inferno de um grande número de almas (primeira parte) e a causa fundamental para a sucessão de castigos que se abateriam sobre o mundo (segunda parte). Desta forma, a terceira parte constituiria, na verdade, a causa dos eventos descritos nas primeiras duas partes reveladas (perda das almas, representada nas aparições pela Visão do Inferno e os castigos universais, caso não se concretizassem a conversão dos homens). Os meios disponibilizados por Nossa Senhora para evitar estes castigos seriam, então, o Santo Rosário, a Consagração dos Cinco Primeiros Sábados e a Devoção ao Imaculado Coração de Maria.

(Da publicação '8 Questões sobre as Aparições de Nossa Senhora em Fátima', do autor do blog).