sábado, 3 de maio de 2014

VERSUS: SOBRE A COVARDIA

'Recordo-me de um sonho que tive nessa idade (uns quatro anos aproximadamente) e que me ficou gravado na memória: Andava eu a passear sozinha no jardim, quando de repente divisei perto do caramanchão dois horrendos diabinhos a dançar em cima de uma barrica de cal com vertiginosa agilidade, não obstante os pesados grilhões que tinham nos pés. Deitaram-me primeiro uns olhos que faiscavam lume; depois, como que tomados de espanto, vi-os precipitarem-se rapidamente no fundo da barrica, saírem logo não sei por que abertura, correrem e esconderem-se finalmente na rouparia contígua ao jardim e ao mesmo nível deles. Vendo-os tão covardes, quis saber o que iam fazer naquele esconderijo, e, sobrepondo-me ao susto, abeirei-me da janela... Os pobres demônios andavam a correr e a saltar por cima das mesas, sem atinarem como haviam de fugir às minhas vistas. De vez em quando, assomavam-se à janela, a espreitar pelos vidros, com olhar inquieto; mas vendo que eu não despejava dali, recomeçavam a sua carreira numa fúria desesperada.

Evidentemente neste sonho não há nada de extraordinário; julgo que se quis Deus servir-se deles para me mostrar que uma alma em estado de graça nada tem a temer dos demônios, que afinal [os demônios] são uns covardes, que se envergonham de fugir diante de uma criança'.

(Recordação de um sonho da infância de Santa Teresa do Menino Jesus, descrito na sua obra 'História de uma Alma'. Livraria Apostolado da Imprensa, 1952. p. 17).


'Os covardes não entrarão no reino dos Céus. O reino dos Céus admite violência; só os violentos o arrebatam ... Oh! quão violento é esse combate: e é preciso sempre recomeçar. A vitória da véspera não garante a do dia seguinte. Hoje, vencedor, amanhã, vencido. Basta qualquer descanso para preparar a derrota: só saem vitoriosos dessa guerra aqueles que jamais cessam de lutar. É preciso escalar o Céu, tomá-lo de assalto …O fundo de nossa natureza é a covardia; todos os vícios nada mais são que covardia

(Excertos da obra 'La Divine Eucharistie' de São Pedro Julião Eymard, Paris, 1926, 16ª ed., p. 293 e 295).