sexta-feira, 10 de novembro de 2023

DA MEDITAÇÃO SOBRE A MORTE

1. Muito depressa chegará teu fim neste mundo; vê, pois, como te preparas: hoje está vivo o homem, e amanhã já não existe. Entretanto, logo que se perdeu de vista, também se perderá da memória. Ó cegueira e dureza do coração humano, que só cuida do presente, sem olhar para o futuro! De tal modo te deves haver em todas as tuas obras e pensamentos, como se fosse já a hora da morte. Se tivesses boa consciência não temerias muito a morte. Melhor fora evitar o pecado que fugir da morte. Se não estás preparado hoje, como o estarás amanhã? O dia de amanhã é incerto, e quem sabe se te será concedido?

2. Que nos aproveita vivermos muito tempo, quando tão pouco nos emendamos? Oh! nem sempre traz emenda a longa vida, senão que aumenta, muitas vezes, a culpa. Oxalá tivéssemos, um dia sequer, vivido bem neste mundo! Muitos contam os anos decorridos desde a sua conversão; frequentemente, porém, é pouco o fruto da emenda. Se for tanto para temer o morrer, talvez seja ainda mais perigoso o viver muito. Bem aventurado aquele que medita sempre sobre a hora da morte, e para ela se dispõe cada dia. Se já viste alguém morrer, reflete que também tu passarás pelo mesmo caminho.

3. Pela manhã, pensa que não chegarás à noite, e à noite não te prometas o dia seguinte. Por isso anda sempre preparado e vive de tal modo que te não encontre a morte desprevenido. Muitos morrem repentina e inesperadamente; pois na hora em que menos se pensa, virá o Filho do Homem (Mt 24,44). Quando vier àquela hora derradeira, começarás a julgar muito diferentemente toda a tua vida passada, e doer-te-á muito teres sido tão negligente e remisso.

4. Quão feliz e prudente é aquele que procura ser em vida como deseja que o ache a morte. Pois o que dará grande confiança de morte abençoada é o perfeito desprezo do mundo, o desejo ardente do progresso na virtude, o amor à disciplina, o rigor na penitência, a prontidão na obediência, a renúncia de si mesmo e a paciência em sofrer, por amor de Cristo, qualquer adversidade. Muito fácil é praticar o bem enquanto estás são; mas, quando enfermo, não sei o que poderás. Poucos melhoram com a enfermidade; raro também se santificam os que andam em muitas peregrinações.

5. Não confies em parentes e amigos, nem proteles para mais tarde o negócio de tua salvação, porque mais depressa do que pensas te esquecerão os homens. Melhor é providenciar agora e fazer algo de bem, do que esperar pelo socorro dos outros. Se não cuidas de ti no presente, quem cuidará de ti no futuro? Muito precioso é o tempo presente: agora são os dias de salvação, agora é o tempo favorável. Mas, ai! Que melhor não aproveitas o meio pelo qual podes merecer viver eternamente! Tempo virá de desejares, um dia, uma hora sequer, para a tua emenda, e não sei se a alcançarás.

6. Olha, meu caro irmão, de quantos perigos te poderias livrar e de quantos terrores fugir, se sempre andasses temeroso e desconfiado da morte. Procura agora de tal modo viver, que na hora da morte te possas antes alegrar que temer. Aprende agora a desprezar tudo, para então poderes voar livremente a Cristo. Castiga agora teu corpo pela penitência, para que possas então ter legítima confiança.

7. Ó louco, que pensas viver muito tempo, quando não tens seguro nem um só dia! Quantos têm sido logrados e, de improviso, arrancados ao corpo! Quantas vezes ouviste contar: morreu este a espada; afogou-se aquele; este outro, caindo do alto, quebrou a cabeça; um morreu comendo, outro expirou jogando. Estes se terminaram pelo fogo, aqueles pelo ferro, uns pela peste, outros pelas mãos dos ladrões, e de todos é o fim a morte, e, depressa, qual sombra, acaba a vida do homem.

8. Quem se lembrará de ti depois da morte? E quem rogará por ti? Faze já, irmão caríssimo, quanto puderes; pois não sabes, quando morrerás nem o que te sucederá depois da morte. Enquanto tens tempo, ajunta riquezas imortais. Só cuida de tua salvação, ocupa-te só nas coisas de Deus. Granjeia agora amigos, venerando os santos de Deus e imitando suas obras, para que, ao saíres desta vida, te recebam nas eternas moradas (Lc 16,9).

9. Considera-te como hóspede e peregrino neste mundo, como se nada tivesses com os negócios da terra. Conserva livre teu coração, e erguido a Deus, porque não tens aqui morada permanente (Hb 13,14). Para lá dirige tuas preces e gemidos, cada dia, com lágrimas, a fim de que mereça tua alma, depois da morte, passar venturosamente ao Senhor. Amém.

(Da Imitação de Cristo)

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

O DOGMA DO PURGATÓRIO (LXVIII)

Capítulo LXVIII

Alívio às Santas Almas pelas Indulgências - As Indulgências Plenárias de Madre Francisca de Pamplona - Santa Madalena e Santa Teresa e as Religiosas que Passaram Algumas Horas no Purgatório

A Venerável Madre Francisca do Santíssimo Sacramento, de cuja caridade para com as almas santas já falamos, era também muito zelosa em aliviá-las com indulgências. Um dia, Deus mostrou-lhe as almas de três prelados que tinham ocupado anteriormente a Sé de Pamplona e que ainda padeciam os sofrimentos do Purgatório. A serva de Deus compreendeu que devia empregar todos os meios para conseguir a pronta libertação deles. Como a Santa Sé tinha então concedido à Espanha as Bulas da Cruzada, que permitiam obter a indulgência plenária sob certas condições, ela acreditava que o melhor meio de ajudar aquelas pobres almas seria conseguir para cada uma delas a vantagem desta indulgência plenária.

Dirigiu-se então ao seu bispo, Cristóvão de Ribera, informando-o de que três dos seus antecessores ainda se encontravam no Purgatório e instando-o a obter para ela três indulgências das Bulas da Cruzada. Ela cumpriu todas as condições exigidas e aplicou uma indulgência plenária a cada um dos três bispos. Na noite seguinte, todos eles apareceram à Madre Francisca, libertados de todos os seus sofrimentos. Agradeceram-lhe e pediram-lhe que agradecesse também ao Bispo Ribera pelas indulgências que lhes tinham aberto o Céu (Vie de Franqoise du Sacrem., Merv., 26).

O Padre Cepari relata o seguinte na sua obra 'Vida de Santa Madalena de Pazzi'. Morreu uma religiosa professa que, durante a sua última doença, tinha sido cuidada com muita ternura por Santa Madalena e, como era costume expor o corpo na igreja, Madalena sentiu-se inspirada a ir vê-lo mais uma vez. Dirigiu-se, pois, à grade da sala do coro de onde o podia ver; mas, mal o fez, foi arrebatada em êxtase e viu a alma da irmã defunta a voar para o Céu. Transportada de alegria, ouviu-se dizer: 'Adeus, querida irmã; adeus, alma bendita! Como uma pomba pura, voas para o teu lar celestial e nos deixa nesta morada de miséria. Oh, como és bela e gloriosa! Quem pode descrever a glória com que Deus coroou as tuas virtudes?' Quão pouco tempo passaste no Purgatório! O teu corpo ainda não foi levado ao túmulo e eis que a tua alma já foi recebida nas mansões celestes. Conheceis agora a verdade daquelas palavras que vos dirigi ultimamente: 'Que todos os sofrimentos desta vida nada são em comparação com a recompensa que Deus reservou para os seus amigos'. Nesta mesma visão, Nosso Senhor revelou a ela que esta alma piedosa tinha passado apenas quinze horas no Purgatório, porque tinha sofrido muito durante a vida e porque tinha tivera o cuidado de ganhar muitas indulgências concedidas pela Igreja aos seus filhos, em virtude dos méritos de Jesus Cristo.

Santa Teresa, nas suas obras, fala de uma religiosa que dedicava o maior apreço pela mais singela indulgência concedida pela Igreja, e esforçava-se por obter todas as que estavam ao seu alcance. De resto, levava uma vida bastante rotineira e sem grandes obras de virtude. Quando faleceu, a santa, não com grande surpresa, viu a sua alma subir ao Céu quase que imediatamente após a sua morte, de modo que não teve, por assim dizer, a experiência do Purgatório. Quando Santa Teresa manifestou o seu espanto por tal fato, Nosso Senhor fez saber a ela o grande cuidado que a religiosa tivera em obter todas as indulgências possíveis durante a vida. 'Foi por esse meio' - acrescentou - 'que ela saldou quase toda a sua dívida, que era bastante considerável, antes da sua morte e, assim, compareceu com grande pureza perante o tribunal de Deus'.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog.

DOUTORES DA IGREJA (XXX)

   30São Lourenço de Brindisi, Presbítero (†1619)

Doutor Apostólico

(1559 - 1619)

Concessão do título: 1959 - Papa João XXIII

Celebração: 21 de julho (Memória Facultativa)

 Obras e Escritos 

  • Mariale - sermões sobre Salve-Rainha, Magnificat, Ave-Maria e Festividades da Virgem Maria
  • Lutheranismi hypotyposis - obra de refutação ao luteranismo
  • Explanatio in Genesim - exposição dos onze primeiros capítulos do Gênesis
  • De numeris amorosis - opúsculo sobre o significado místico do nome hebraico de Deus
  • Adventus - sermões do Advento
  • Dominicalia - homilias dominicais
  • Sanctorale - festas dos santos e do Tempo Comum
  • Sermões da Quaresma
  • Cartas

terça-feira, 7 de novembro de 2023

ORAÇÃO DA CONFIANÇA EM DEUS


Meu Senhor e meu Deus, eu estou tão convicto de que cuidas de todos os que esperam em ti, e que nada pode faltar àqueles que esperam tudo de ti, que decidi, como norma, viver sem nenhuma preocupação e dirigir a ti toda a minha inquietude.

Os homens podem despojar-me de todos os bens e mesmo da minha honra; as doenças podem privar-me das forças e dos meios para servir-te; com o pecado posso até perder a tua graça, mas não perderei nunca jamais a minha confiança em ti. A conservarei até ao extremo da minha vida e o demônio, com todos os seus esforços, não conseguirá tirá-la de mim.

Outros esperem a felicidade das riquezas e de seu talento ou confiem mesmo na inocência de suas vidas, no rigor de suas penitências, na quantidade de suas boas obras ou no fervor de suas orações; para mim toda a minha confiança está na própria confiança que tenho; confiança que não enganou ninguém.

Eis porque tenho absoluta certeza de ser eternamente feliz, porque tenho a inabalável confiança de sê-lo e porque o espero unicamente de ti.

Por minha triste experiência, devo infelizmente reconhecer ser débil e inconstante; sei quanto as tentações podem contra as virtudes mais firmes; e no entanto nada, enquanto conservar esta firme confiança em ti, poderá assustar-me; me reabilitarei de qualquer desgraça e estarei certo de continuar a esperar, porque espero com esta imutável esperança.

Enfim, meu Deus, sou intimamente persuadido de que não será jamais exagerada a confiança em ti e que o que obterei de ti, será sempre muito mais do que o que terei esperado.

Espero também, Senhor, que Tu me sustentes nas minhas frágeis debilidades; me sustentes nos assaltos mais violentos; faças triunfar a minha fraqueza sobre os meus inimigos mais temidos.

Tenho muita confiança que Tu me amarás sempre e que também eu, por minha vez, te amarei para sempre. E para levar ao mais alto grau esta minha confiança, ó meu Criador, eu espero em ti mesmo, pelo tempo e pela eternidade. Amém.

(São Claúdio de La Colombiére)

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

FRASES DE SENDARIUM (XIV)

'A verdadeira sabedoria consiste em obras e não em grandes talentos como o mundo tanto admira, são os tolos que ignoram a vontade de Deus e não sabem como controlar as suas paixões’

(Santa Brígida da Suécia)

Quantos se embriagam das miragens dos palácios, das vertigens dos aplausos e do torpor das paixões mundanas... são insensatos que buscam ganhar o mundo e arriscam a perder as suas almas.

domingo, 5 de novembro de 2023

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'É assim a geração dos que procuram o Senhor!' (Sl 23)

Primeira Leitura (Ap 7,2-4.9-14) - Segunda Leitura (1Jo 3,1-3)  -  Evangelho (Mt 5,1-12a)

 05/11/2023 - Solenidade de Todos os Santos 

50. AS BEM AVENTURANÇAS


Neste domingo da Solenidade de Todos os Santos, nós somos por inteiro a Santa Igreja de Deus, o Corpo Místico de Cristo: almas peregrinas do Céu da Igreja Militante, almas sob a justiça divina da Igreja Padecente, almas santificadas da Igreja Triunfante, testemunhas da Visão Beatífica e cidadãos eternos da Jerusalém Celeste, nem mais peregrinos e nem mais sujeitos à Santa Justiça, mas tornados eleitos do Pai e herdeiros da Glória de Deus.

Com efeito, Filhos de Deus já o somos desde agora, como peregrinos do Céu mergulhados nas penumbras da fé e nas vertigens das realidades humanas... 'mas nem sequer se manifestou o que seremos! Sabemos que, quando Jesus se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque o veremos tal como Ele é (1Jo 3, 2). Filhos de Deus, gerados para a eternidade da glória de Deus, seremos os vestidos de roupas brancas, enquanto perseverantes na fé e revestidos da luz de Cristo: 'Esses são os que vieram da grande tribulação. Lavaram e alvejaram as suas roupas no sangue do Cordeiro' (Ap 7, 14).

Na solenidade de Todos os Santos, os que seremos santos amanhã se confortam dessa certeza nos que já são santos na Glória Celeste, vivendo a felicidade perfeita, e indescritível sob o ponto de vista das palavras e pensamentos humanos. Jesus nos fala dessa realidade transcendente na comunhão dos santos e na unidade da família de Deus: 'Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus' (Mt 5, 12). Em contraponto à fidelidade e à fé dos que almejaram ser santos, Deus os recompensará com limites insondáveis de graça, as chamadas bem-aventuranças de Deus.

Bem-aventurados os pobres de espírito, os simples de coração. Bem-aventurados os aflitos que anseiam por consolação. Bem-aventurados os mansos que se espelham no Coração de Jesus. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça. Bem-aventurados os misericordiosos, filhos prediletos da caridade. Bem-aventurados os puros de coração, transformados em novas manjedouras do Sagrado Coração de Jesus. Bem-aventurados os que promovem a paz e os que são perseguidos por causa da justiça. E bem-aventurados os que foram injuriados e perseguidos em nome da Cruz, do Calvário, dos Evangelhos e de Jesus Cristo porque serão os santos dos santos de Deus!