sábado, 21 de junho de 2014

OS MILAGRES DA MISSA


Somos sequiosos por milagres, como crianças por chocolate; não obstante, estamos bem próximos ao milagre dos milagres. Que são todos os milagres, se comparados à missa? Perde-se a missa por causa de relíquias! O grande milagre, maior que as relíquias, é a missa.

Estava a preparar um retiro em meu quarto. Entra um padre: 'O bispo me enviou com um tesouro para mostrar-vos'. Era um cibório relicário, contendo uma hóstia inteira, intacta com sangue. Mandaram analisar o sangue: 'perfeito sangue humano', disse o especialista. Se fosse católico, teria de acrescentar: 'perfeito sangue divino'. Que aconteceu? O bispo enviou-o para perto de seu amigo doente; consagrou por ele mas, ao final da missa, morreu o doente, esquecendo de comungar daquela hóstia. Permaneceu um mês no cibório relicário. Quando o abriu, encontrou-o ensanguentado e a hóstia em perfeita brancura. Grande milagre? Não, pequeno, bem pequeno. Prestem atenção!

Existe uma hierarquia de valores. Só a missa é um milagre de primeira ordem, de primeira classe. É o único milagre. Nem a ressurreição de Lázaro, nem outros milagres podem lhe comparar. São milagres de segunda classe as conversões: a conversão de São Paulo ou a de Santo Agostinho. Os demais milagres são de terceira classe: este que acabei de referir é algo belo, mas é um pequeno milagre. Tais milagres não são nada, se comparados aos da missa. Apressamo-nos a ver os pequenos milagres, mas não nos ocupamos do único que há: a missa. É como se eu dissesse: 'Deus vai falar a vós', e vós respondêsseis: 'Estou ocupado em vigiar a criança que está brincando perto de mim'. Ou ainda, que preferísseis contemplar uma folha ou flor em vez do sol. Ausentam-se de umas dez ou vinte missas para visitar Tereza Neumann [famosa estigmatizada católica]... que ausência de doutrina! São verdadeiros todos os fatos ocorridos em sua vida, mas a Igreja não se pronunciou. Os milagres de Paray-le-Monial e de Lourdes são pequenos milagres, se comparados aos milagres contidos naquele do Calvário: eis aí a pura doutrina. Há religiosos que preferem a pequena música das devoções às preces da missa... seu acordeãozinho ao órgão. Não apreciam a missa, a única devoção verdadeira.

A missa tem de provocar um incêndio que deve queimar até a morte. Na missa, existem três celebrantes, o Cristo-Pontífice, o Cristo-Padre, e vós. Sempre somos em três. Por que se necessita de um acólito na missa? Não é para entregar as galhetas ou responder as preces, mas para representar o terceiro celebrante, que sois vós ou a comunidade. Por que das cruzes traçadas sobre o cálice? Per ipsum et cum ipsum. Nele, meu Deus, meu Juiz; por ele, meu Deus e Salvador; com ele, meu Deus e meu Rei, meu bem-amado Esposo. Quem canta assim? A Igreja e eu, junto com ele, para a glória da Trindade. Esta é a razão de ser da encarnação, da redenção, dos sacramentos. Oh! Como queria que vós lêsseis, estudásseis, meditásseis o cânon da missa! O cânon é um mosaico de preces antigas. O que vem antes e depois do cânon é a moldura.

Vivei a missa! Quando tiverdes dois ou três minutos, dizei a missa que chamo a de 'São João'. Compõe-se ela de três preces principais que resumem a missa: oferenda, consagração, comunhão. Copiai do missal a missa da Trindade, ou do Santíssimo Sacramento, ou da Santa Virgem, segundo vossa devoção; levai-a convosco e, nos momentos livres, 'celebrai a missa', em união com as missas que, àquele momento, se celebram, pois que, tanto ao meio-dia quanto à meia-noite, estamos sempre entre dois altares. Deste modo aprende-se a viver a missa o dia inteiro.

Leio a missa o dia todo: meu anjo da guarda é o acólito da missa, quero morrer celebrando a missa. A missa é a única homenagem, o único louvor. Atentem bem para o que chamo de 'vício' da missa. Os santos devem se aborrecer quando se abandona a missa para lhes orar; chega a ser ridículo como nos falta doutrina! Devoção aos santos, sim; mas não em lugar da missa. Recitem vinte rosários antes, e cinquenta depois, mas não durante a missa.

Parece que se esqueceram um pouco da festa da Santíssima Trindade; é comum não solenizá-la tanto quanto a de São José ou outros; não há paramentos especiais, nem música. Mas a Igreja não se esqueceu: a festa da Santíssima Trindade é a missa. E o único celebrante digno dela é Jesus. Nem a Santa Virgem, nem os anjos, nem os santos podem entoá-la dignamente. É o coração do rei que canta ao altar. Glória, louva o céu; Glória, entoa o purgatório; Glória, canta a Igreja – todas em festas pela Santíssima Trindade. O que é mais belo do que isto? Nada, nada e mais nada...

Não há criatura que possa dignamente entoar à Trindade, nem Maria. Só, o Pontífice Supremo entoa dignamente o hino de glória à Trindade. Por meio dele, tornamo-nos também um coro maravilhoso, digno da Trindade. Comecemos, já aqui embaixo, a cantar: 'Glória! Hosana!', porque será curta a eternidade. Por ele, com ele e nele, toda a glória, honra e louvor.

(Excertos do texto 'A Missa não é apenas a Comunhão', do Pe. Mateo Crawley-Boevey)

sexta-feira, 20 de junho de 2014

O CÉU É AQUI...

UMA HORA SANTA POR DIA (POR FULTON SHEEN)

No dia da minha Ordenação, tomei duas decisões: (i) Que ofereceria a Sagrada Eucaristia todos os sábados em honra à Santíssima Virgem Maria, para implorar sua proteção sobre meu sacerdócio – a Epístola aos Hebreus ordena ao sacerdote oferecer sacrifícios não só pelos demais, mas também por si mesmo, já que seus pecados são maiores devido à dignidade de seu ofício; (ii) Resolvi também que todos os dias passaria uma Hora Santa na presença de Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento.

Venho mantendo ambas as decisões no decorrer do meu sacerdócio. A Hora Santa originou-se de uma prática que desenvolvi um ano antes de ser ordenado. A grande capela do Seminário de São Paulo fechava às seis da tarde; todavia, havia capelas privadas disponíveis para devoções privadas e orações noturnas. Numa tarde em particular, durante o recreio, caminhei por quase uma hora, de um lado a outro, no exterior da capela maior. Um pensamento me surgiu: 'Por que não fazer uma Hora Santa de adoração na presença do Santíssimo Sacramento?'. Comecei no dia seguinte, e hoje a prática já carrega mais de sessenta anos. Apresentarei brevemente algumas razões pelas quais mantenho esta prática, e por que venho fomentando-a nos demais.

Primeiro, a Hora Santa não é uma devoção; é uma participação na obra da Redenção. No Evangelho de São João, Nosso Santíssimo Senhor usou as palavras 'hora' e 'dia' em duas conotações totalmente diferentes. O 'dia' pertence a Deus; a 'hora' pertence ao maligno. Sete vezes no Evangelho de São João, usa-se a palavra 'hora', e em cada instância referenciando-se ao demônio e aos momentos em que Cristo já não está nas Mãos do Pai, mas nas mãos dos homens. No horto de Getsêmani, Nosso Senhor contrastou duas 'horas': uma era a hora do mal, na qual Judas pôde apagar as luzes do mundo. Em contraste, Nosso Senhor perguntou: 'Não podem velar uma hora comigo?'. Em outras palavras, Ele pediu uma hora de reparação para combater a hora do mal; uma hora de união íntima com a Cruz para sobrepor-nos ao anti-amor do pecado.

Em segundo lugar, a única vez que Nosso Senhor pediu algo a seus Apóstolos foi na noite de sua agonia. Não pediu a todos, talvez porque sabia que não podia contar com sua fidelidade. Porém, ao menos esperava que três lhe fossem fieis: Pedro, Tiago e João. Desde esse momento, e muitas vezes na história da Igreja, o mal está acordado, porém os discípulos estão dormindo. É por isso que de Seu angustiado e solitário Coração saiu o suspiro: 'Não podem velar tão somente uma hora comigo?'. Ele não implorava por uma hora de atividade, mas por uma hora de companhia.

A terceira razão pela qual mantenho a Hora Santa é para crescer mais e mais à semelhança d’Ele. Como diz São Paulo: 'Nos transformamos naquele em que fixamos nosso olhar' (2 Cor 3, 18). Ao contemplar o entardecer, o rosto toma um resplendor dourado. Ao contemplar o Senhor Eucarístico por uma hora, o coração se transforma de um modo misterioso, assim como o rosto de Moisés se transformou na companhia de Deus na montanha. Acontece-nos algo parecido ao que aconteceu com os discípulos de Emaús, no domingo de Páscoa pela tarde, quando o Senhor os encontrou. Ele lhes perguntou por que estavam tão tristes, e depois de passar algum tempo em Sua presença, e ouvir novamente o segredo da espiritualidade – 'O Filho do Homem deve sofrer para entrar em Sua Glória', o tempo de estar com Ele terminou, e seus 'corações ardiam'.

A Hora Santa é difícil? Algumas vezes parecia ser difícil; poderia significar ter que sacrificar um compromisso social, ou levantar-se uma hora mais cedo, porém no fundo nunca foi uma carga, só uma alegria. Não quero dizer que todas as Horas Santas tenham sido edificantes como, por exemplo, aquela na igreja de São Roque, em Paris. Entrei na igreja em torno das três da tarde, sabendo que teria que tomar um trem a Lourdes duas horas mais tarde. Só tenho uns dez dias por ano nos quais posso dormir durante o dia, e este era um desses. Ajoelhei-me e rezei uma oração de adoração, sentei-me para meditar, e poucos minutos depois estava dormindo. Ao despertar, disse ao Bom Senhor: 'Eu fiz uma Hora Santa?'. Pensei que Seu anjo me dizia: 'Bom, foi dessa forma que os Apóstolos fizeram sua primeira Hora Santa no horto de Getsêmani, mas não o faças outra vez'.

Uma Hora Santa difícil que recordo, foi quando tomei um trem de Jerusalém ao Cairo. O trem partiu às quatro da manhã; isso fez com que eu levantasse muito cedo. Em outra ocasião, em Chicago, às sete da noite, pedi permissão ao pároco para entrar em sua igreja e fazer uma Hora Santa, já que a igreja estava fechada. Mais tarde, ele se esqueceu de que me havia deixado entrar, e passei em torno de duas horas tentando encontrar uma maneira de escapar. Finalmente, pulei por uma pequena janela e caí na carvoeira. Isto assustou o caseiro, que veio em meu auxílio.

No início do meu sacerdócio, fazia a Hora Santa durante o dia ou à tarde. No decorrer dos anos, fiquei mais ocupado, e fazia a Hora de manhã cedo, geralmente antes da Santa Missa. Os sacerdotes, como todas as pessoas, dividem-se em duas classes: galos e corujas. Alguns trabalham melhor pela manhã, outros durante a noite.

O objetivo da Hora Santa é fomentar um encontro pessoal e profundo com Jesus Cristo. O santo e glorioso Deus nos convida constantemente a aproximarmo-nos d’Ele, conversar com Ele, para pedir-lhe as coisas que necessitamos e para experimentar a bênção da amizade com Ele. Quando somos neossacerdotes, é fácil nos darmos por inteiro a Cristo, porque o Senhor nos preenche de doçura, da mesma maneira que uma mãe dá um caramelo a seu bebê para animar seu primeiro passo. O entusiasmo, entretanto, não dura muito; rapidamente aprendemos o custo do apostolado. A lua de mel logo termina, assim como a vaidade de ouvir pela primeira vez aquele estimulante título de 'Padre'.

O amor sensível, ou amor humano, diminui com o tempo, porém o Amor Divino não. O primeiro concerne ao corpo, que responde cada vez menos aos estímulos, mas na ordem da graça, a resposta do Divino ao pequeno, os atos humanos de amor se intensificam. Nem o conhecimento teológico, nem a ação social por si só são suficientes para nos mantermos em amor com Jesus Cristo, a menos que ambos estejam precedidos por um encontro pessoal com Ele.

Moisés viu que a sarça ardente no deserto não se alimentava de nenhum combustível. A chama, sem alimentar-se de nada visível, continuava existindo sem destruir a madeira. Uma dedicação tão pessoal a Cristo não deforma nenhum de nossos dons naturais, disposições ou caráter; só renova sem matar. Como a madeira se transforma em fogo, e o fogo perdura, assim nos transformamos em Cristo, e Cristo perdura.

Descobri que leva algum tempo para incendiar-se, rezando. Esta tem sido uma das vantagens da Hora Diária. Não é tão curta como para não permitir à alma abismar-se e sacudir-se às múltiplas distrações do mundo. Estar ante a presença de Nosso Senhor é como expor o corpo ao sol para absorver seus raios. O silêncio na Hora é como uma conversa privada com o Senhor. Nesses momentos, rezamos menos e ouvimos mais. Não dizemos: 'Ouve, Senhor, porque teu servo fala!', mas 'Fala, Senhor, que teu servo escuta!'.

Busquei muitas vezes uma maneira de explicar o fato de que nós, os sacerdotes, devemos conhecer mais a Jesus Cristo do que sobre Jesus Cristo. Muitas traduções da Bíblia usam a palavra 'conhecer' para indicar a união carnal de dois em um. Por exemplo: 'Salomão não a conhecia', o que significava que não havia tido relações carnais com ela. A Santíssima Virgem Maria disse ao Anjo na Anunciação: 'Não conheço nenhum homem'. São Paulo exorta os maridos a possuírem suas mulheres em 'conhecimento'. A palavra 'conhecer' aqui indica unidade carnal de dois em um. A aproximação dessa identidade provém da aproximação da mente com qualquer objeto conhecido. Nenhuma faca poderia separar minha mente da ideia que ela tem de uma maçã. A união íntima de marido e mulher descrita como 'conhecimento' deve ser o fundamento desse amor pelo qual o sacerdote ama a Cristo.

Intimidade é abertura sem reservas, que não guarda nenhum segredo, e revela o coração aberto a Cristo. Demasiadas vezes os amigos são só 'dos barcos que passam dentro da noite'. O amor carnal, apesar de ser íntimo, muitas vezes pode ser uma troca de egoísmos. O ego se projeta na outra pessoa, e o que se ama não é a outra pessoa, mas o prazer que a outra pessoa oferece. Notei ao longo da minha vida que, quando eu retrocedia ante as demandas que o encontro me havia imposto, me via mais ocupado e mais preocupado com atividades. Isto me dava uma desculpa para dizer: 'Não tenho tempo', como um marido que pode absorver-se no trabalho, e se esquecer do amor de sua mulher.

É impossível para mim explicar o quão útil foi a Hora Santa para preservar minha vocação. A Escritura oferece uma considerável evidência para provar que um sacerdote começa a falhar em seu sacerdócio quando falha no amor à Eucaristia. Muitas vezes assume-se que Judas caiu porque amava o dinheiro. A avareza é raramente o princípio do erro e da queda de um embaixador. O princípio da queda de Judas, e o fim de Judas, ambos giram em torno da Eucaristia. A primeira vez que a Escritura Sagrada menciona que Nosso Senhor sabia quem haveria de traí-lo, é ao final do capítulo seis de São João, que é o capítulo da anunciação da Eucaristia. A queda de Judas veio na noite que Nosso Senhor instituiu a Eucaristia, na noite da Última Ceia.

A Eucaristia é tão essencial para nossa união com Cristo, que nem bem Nosso Senhor a anunciou no Evangelho, já começou a ser a prova de fidelidade de seus seguidores. Primeiro, perdeu as massas, porque era muito duro em suas palavras, e já não mais o seguiam. Em segundo lugar, perdeu alguns de seus discípulos: 'Eles já não andavam mais com Ele'. Terceiro, dividiu seu grupo de apóstolos, já que aqui Judas é anunciado como o traidor.

Portanto, a Hora Santa, além de seus benefícios espirituais, preveniu meus pés de vaguear muito longe. Quando se está atado a um Sacrário, a própria corda não é tão larga para encontrar outras pastagens. Essa tênue lâmpada do tabernáculo, embora pálida e difusa, tem uma misteriosa luminosidade para obscurecer o brilho 'das luzes brilhantes'. A Hora Santa tornou-se como um tanque de oxigênio para reavivar o sopro do Espírito Santo no meio da suja e hedionda atmosfera do mundo. Mesmo quando parecia ser tão pouco proveitoso, e carente de intimidade espiritual, tinha a sensação de ser ao menos como um cão na porta de seu dono, pronto caso fosse chamado.

A Hora Santa tornou-se, também, um magistério e uma mestra, já que, embora antes de amar a alguém devemos conhecer essa pessoa, sem embargo, depois sabemos que é o Amor que aumenta o conhecimento. As convicções teológicas não só são obtidas das duas capas de um livro formal, mas dos dois joelhos sobre um genuflexório ante um Sacrário.

Finalmente, fazendo uma Hora Santa todos os dias, constituía para mim uma área da vida na qual podia pregar o que praticava. Muitas poucas vezes em minha vida preguei o jejum de forma rigorosa, já que o jejum sempre me pareceu extremadamente difícil; porém, podia pedir aos outros para fazerem a Hora Santa, porque eu a fazia.

Gostaria de ter mantido, ao longo do tempo, um registro das milhares de cartas que venho recebendo de sacerdotes e leigos, contando-me suas experiências na prática da Hora Santa. Cada retiro para sacerdotes que eu pregava tinha a Hora Santa como resolução prática. Demasiadas vezes os retiros são como as conferências sobre saúde. Há um acordo geral sobre a necessidade de se ter saúde, porém falta uma recomendação específica sobre como ser saudável. A Hora Santa se transformou em um desafio para os sacerdotes do retiro, e depois, quando os vídeos dos meus retiros estavam disponíveis para os leigos, era edificante ler sobre os que respondiam à graça, fazendo uma Hora diária frente ao Senhor. Um monsenhor, por debilidade ante o álcool, e pelo consequente escândalo, foi ordenado a deixar sua paróquia, e foi posto à prova em outra diocese, onde participou do meu retiro. Respondendo à graça de Deus, deixou o álcool, foi restituído efetivamente em seu sacerdócio, seguiu fazendo a Hora Santa todos os dias, e morreu na presença do Santíssimo Sacramento.

Como exemplo da grande amplitude de efeitos da Hora Santa, certa vez recebi uma carta de um sacerdote da Inglaterra que dizia, com suas próprias palavras: 'Deixei o sacerdócio, e caí em um estado de degradação'. Um sacerdote amigo o convidou a ouvir o cassete sobre a Hora Santa de um retiro que eu havia pregado. Respondendo à Graça, foi restituído novamente ao sacerdócio, e lhe foi confiado o cuidado de uma paróquia. A Divina Misericórdia produziu nele uma mudança, e então recebi esta carta:

'Semana passada, tivemos nossa Solene Exposição anual do Santíssimo Sacramento. Animei um grande número de pessoas a vir e velar durante todo o dia, e todos os dias, e assim não teríamos que guardar o Santíssimo Sacramento por falta de pessoas para velar. Na última tarde, organizei uma procissão com os Primeiros Comungantes (crianças que estavam prestes a fazer sua Primeira Comunhão), atirando pétalas de rosa diante do Senhor. Os homens da paróquia formaram uma Guarda de Honra. O resultado foi surpreendente: havia mais de 250 pessoas presentes para a procissão e a Hora Santa. Estou convencido de que nossa gente está buscando, muitas das vezes, devoções que muitas das paróquias oferecem, e isto passa porque nós, os sacerdotes, não podemos ser molestados com incômodos. No ano que vem espero que a Exposição Solene seja ainda com mais quantidade de pessoas, já que agora a notícia está sendo espalhada. No último par de semanas, formei um grupo de estudos da Bíblia; isto é para animar nossa gente a ler a Palavra de Deus. Começo com a leitura das Escrituras e meditamos durante a tarde; logo depois, temos uma breve exposição do Santíssimo Sacramento, e meditação até o momento da Bênção. Comecei também a percorrer as ruas ao redor da paróquia, e rezo a Missa toda semana em uma casa da quadra, e convido todos dessa rua a vir e participar. A resposta tem sido muito boa, tendo em conta que isto é novidade por aqui. Não quero me converter em um sacerdote ativista; assim que me levanto, bem cedo, faço minha Hora Santa. Ainda tenho meus problemas pessoais para controlar, porém tomei coragem de suas palavras: 'terás que combater muitas batalhas, mas não te preocupes porque, no final, ganharás a guerra ante o Santíssimo Sacramento'.

Muitos leigos que leem os livros e ouvem os cassetes também estão fazendo a Hora Santa. Outro dos frutos da Hora Santa é a sensibilidade à Presença Eucarística de Nosso Divino Senhor. Recordo-me de haver lido nos escritos de Lacordaire, o famoso orador da Catedral de Notre Dame em Paris: 'Dai-me um jovem que possa apreciar por dias, semanas e anos, a dádiva de uma rosa, ou o aperto da mão de um amigo'.

Vendo, no início de meu sacerdócio, que os matrimônios se destroem e os amigos se separam quando a sensibilidade e a delicadeza se perdem, tomei várias medidas para conservar essa responsabilidade. Recém-ordenado, e como estudante na Universidade Católica de Washington, nunca entrava na sala de aula sem antes subir a escadaria até a capela para fazer um pequeno ato de amor a Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento. Mais tarde, na Universidade de Louvain, na Bélgica, entrava para visitar Nosso Santíssimo Senhor em cada uma das igrejas pelas quais passava até chegar à sala de aula. Quando segui o trabalho de graduação em Roma, e fui às Universidades Angelicum e Gregoriana, visitava todas as igrejas no caminho desde a zona de Trastevere, onde vivia. Tempos depois, como professor na Universidade Católica de Washington, consegui pôr uma capela em frente à minha casa, para que sempre pudesse, antes e depois de sair, ver a lâmpada do Sacrário como um sinal para ir adorar o Coração de Jesus Cristo pelo menos por uns poucos segundos. Tratei de ser fiel a esta prática durante toda a minha vida, e ainda agora, no departamento em New York onde vivo, a capela está entre meu local de estudo e meu dormitório. Isto quer dizer que não posso me mover de uma área à outra de meu pequeno departamento sem ao menos fazer uma genuflexão e uma pequena jaculatória a Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento.

(Excertos da obra ' Treasure in Clay: The Autobiography of Fulton J. Sheen', Image Books, New York, 1980 , tradução de Carlos Wolkartt)

quinta-feira, 19 de junho de 2014

CORPUS CHRISTI 2014


O pão é pão e o vinho é vinho
como frutos do homem em oração;
é o que trazemos, é tudo o que temos,
como oferendas da nossa devoção. 

Não é mais pão, nem é mais vinho
quando espécies na consagração;
alma e divindade que se reconciliam
a cada missa, em cada comunhão.

Aparente pão, aparente vinho,
é mais que vinho, muito mais que pão;
o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo
 é o alimento da nossa salvação.

(Arcos de Pilares)

CORPUS CHRISTI


Corpus Christi, expressão latina que significa Corpo de Cristo, é uma festa litúrgica da Igreja sempre celebrada na quinta–feira seguinte ao domingo da Santíssima Trindade, que acontece no domingo seguinte ao de Pentecostes, 50 dias depois da Páscoa. Abaixo, duas orações características desta data litúrgica:

Anima Christi

Anima Christi, sanctifica me.
Corpus Christi, salva me.
Sanguis Christi, inebria me.
Aqua lateris Christi, lava me.
Passio Christi, conforta me.
O bone Iesu, exaudi me.
Intra tua vulnera absconde me.
Ne permittas me separari a te.
Ab hoste maligno defende me.
In hora mortis meæ voca me.
Et iube me venire ad te,
ut cum Sanctis tuis laudem te
in sæcula sæculorum. 
Amen.


Tantum Ergo   

Tantum ergo Sacramentum 
Veneremur cernui:
Et antiquum documentum 
Novo cedat ritui: 
Praestet fides supplementum 
Sensuum defectui. Genitori, 
Genitoque Laus et iubilatio, 
Salus, honor, virtus quoque 
Sit et benedictio: 
Procedenti ab utroque 
Compar sit laudatio. 
Amen.


quarta-feira, 18 de junho de 2014

INDULGÊNCIAS DO DIA DA SOLENIDADE DE CORPUS CHRISTI


Amanhã, dia da solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, o católico pode ser contemplado com as seguintes indulgências:

(i) Indulgência parcial: rezar, com piedosa devoção, a oração 'Alma de Cristo':

Alma de Cristo, santificai-me.
Corpo de Cristo, salvai-me.
Sangue de Cristo, inebriai-me.
Água do lado de Cristo, lavai-me.
Paixão de Cristo, confortai-me.
Ó bom Jesus, ouvi-me.
Dentro de vossa chagas, escondei-me.
Não permitais que eu me separe de vós.
Do espírito maligno, defendei-me.
Na hora da morte chamai-me e
mandai-me ir para vós,
para que com vossos Santos vos louve
por todos os séculos dos séculos.
Amém. 

(ii) Indulgência plenária: rezar, com piedosa devoção, a oração 'Tantum Ergo' ou 'Tão sublime Sacramento':

Tão sublime sacramento
vamos todos adorar,
pois um Novo testamento
vem o antigo suplantar!
Seja a fé nosso argumento
se o sentido nos faltar.
Ao eterno Pai cantemos
e a Jesus, o Salvador,
igual honra tributemos,
ao Espírito de amor.
Nossos hinos cantaremos,
chegue aos céus nosso louvor.
Amém.

Do céu lhes deste o pão,
Que contém todo o sabor.

Oremos: Senhor Jesus Cristo, neste admirável Sacramento, nos deixastes o memorial da vossa Paixão. Dai-nos venerar com tão grande amor o mistério do vosso corpo e do vosso sangue, que possamos colher continuamente os frutos da vossa redenção. Vós que viveis e reinais para sempre. Amém.

O PENSAMENTO DA ETERNIDADE

Cogitavi dies antiquos et annos aeternos in mente habui — Pensei nos dias antigos e tive na mente os anos eternos (Sl 76, 6).

Sumário. Feliz de quem vive tendo sempre em mira a eternidade e pensa que em breve o paraíso ou o inferno será a morada de sua alma! Este pensamento infundiu a milhões de mártires a coragem para darem a sua vida por Jesus Cristo; fez tantos jovens, mesmo príncipes e reis, encerrarem-se nos claustros. Quanto mais eficaz não será, pois, para nos desprender dos miseráveis bens da terra e fazer-nos carregar com paciência as cruzes que Deus nos envia? Quem pensa na eternidade e não se converte a Deus, perdeu ou o juízo ou a fé.

I. O pensamento da eternidade é chamado por Santo Agostinho o grande pensamento: Magna cogitatio. Este pensamento fez com que todos os tesouros e grandezas da terra se afigurassem aos santos como que palhas, lodo, fumo e monturo. Este pensamento inspirou tantos anacoretas a retirarem-se para desertos e grutas, tantos jovens nobres e mesmo reis e príncipes reinantes a encerrarem-se nos claustros. Este pensamento deu a tantos mártires coragem para sofrer os cavaletes, as unhas de ferro, as grelhas em brasa e a morte pelo fogo.

Não, não é para esta terra que fomos criados; o fim para o qual Deus nos pôs neste mundo, é que pelas nossas boas obras mereçamos possuir a vida eterna: Finem vero, vitam aeternam  — E por fim a vida eterna. Pelo que Santo Euquério disse que o único negócio em que devemos cuidar na vida presente é a eternidade. Se assegurarmos este negócio, seremos felizes para sempre; se o errarmos, seremos para sempre infelizes.

Feliz de quem vive tendo sempre em mira a eternidade, pela fé viva que dentro em breve tem de morrer e entrar na eternidade! Iustus ex fide vivit  — O justo vive pela fé. A fé faz o justo viver na graça de Deus, dá vida à alma, desprendendo-a dos afetos terrenos, e lembrando-lhe os bens eternos que Deus promete aos que O amam. Dizia Santa Teresa que todos os pecados provêm da falta de fé. Pelo que, a fim de vencermos as paixões e as tentações, é mister que frequentemente avivemos a nossa fé, dizendo: Credo vitam aeternam — Creio na vida eterna. Creio que, depois desta vida, que em breve acabará para mim, há a vida eterna, ou cheia de gozos ou cheia de sofrimentos, uma das quais me tocará segundo os meus méritos ou deméritos. Costumava por isso Santo Agostinho dizer que o que crê na eternidade e não se converte a Deus, perdeu o juízo ou a fé.

II. 'Ai dos pecadores', exclama São Cesário, 'ai daqueles que entram na eternidade sem a terem conhecido, por não terem querido pensar nela! Ó infelizes! Para eles, a porta do inferno se abrirá para os deixar entrar, não para os deixar sair'. Santa Teresa repetia às suas religiosas: 'Minhas filhas, uma alma, uma eternidade!' Queria dizer: 'Minhas filhas, temos uma só alma; perdida esta, tudo está perdido; e perdida esta uma vez, está perdida para sempre. Numa palavra, de nosso último suspiro na hora da morte dependerá, se seremos felizes para sempre, ou para sempre em desespero'.

Roguemos, pois, ao Senhor, que nos aumente a fé: Domine, adauge fidem — Senhor, aumentai a minha fé, porquanto, se não estivermos firmes na fé, tornar-nos-emos piores do que um Lutero ou um Calvino. Ao contrário, um vivo pensamento da eternidade que nos espera, pode fazer-nos santos. Quando tivermos que sofrer alguma enfermidade ou perseguição, lembremo-nos do inferno, que temos merecido pelos nossos pecados. Desta maneira toda a cruz se nos afigurará leve, e daremos graças ao Senhor dizendo: Misericordiae Domini, quia non sumus consumpti  — Misericórdias são do Senhor o não termos sido consumidos. Digamos também com Davi: 'Se o Senhor não se tivesse compadecido de mim, estaria eu no inferno desde o dia em que O ofendi pelo pecado mortal'. Eu já estava pedido, mas Vós, ó Deus de misericórdia, estendestes para mim a vossa mão e me tirastes do inferno: Tu autem eruisti animam meam, ut non periret  — Tu livraste a minha alma para ela não perecer.

Meu Deus, Vós sabeis quantas vezes tenho merecido o inferno; mas apesar disso, quereis que tenha confiança, e quero esperar em Vós. Os meus pecados me atemorizam, mas a vossa morte e a promessa de perdoardes a quem se arrepende inspiram-me confiança. Nos tempos passados Vos desprezei, mas agora amo-Vos sobre todas as coisas e detesto mais que todos os outros males, o ter-Vos ofendido. Meu Jesus, tende piedade de mim; Maria, Mãe de Deus, intercedei por mim. 'Ó Deus que, com a luz da vossa verdade, iluminais aos que erram, para que possam tornar ao caminho da justiça, concedei a todos os cristãos, que rejeitem quanto se opõe à santidade deste nome, e sigam quanto com ele se conforma'.

(Excertos da obra 'Meditações para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II, de Santo Afonso Maria de Ligório)