domingo, 25 de julho de 2021

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Saciai os vossos filhos, ó Senhor!' (Sl 144)

 25/07/2021 - Décimo Sétimo Domingo do Tempo Comum

35. CINCO PÃES E DOIS PEIXES 



Depois da morte do Precursor João Batista, 'Jesus subiu ao monte e sentou-se aí, com os seus discípulos' (Jo 6, 3) para um momento de recolhimento e oração. Mas eis que uma grande multidão, uma esplêndida multidão, saiu das cidades e veio ao seu encontro. Tomado de amor e compaixão, Jesus abandona o seu intento inicial e passa a atender com zelo extremado aquela gente durante todo o dia. E, ao final do dia, famintos de Deus, a multidão agora está faminta de pão.

Jesus pergunta, então, a Filipe: 'Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?' (Jo 6, 5). Sabendo em princípio que tal resposta era insondável, o Mestre coloca o seu discípulo à prova. No meio de um campo aberto e relvado, afastado das cidades, uma enorme multidão, cansada e faminta, veio ficar perto de Deus. Não havia condições de alimentação ali e nem perto dali, porque eram centenas de centenas e 'nem duzentas moedas de prata bastariam para dar um pedaço de pão a cada um' (Jo 6, 7). Mas para Deus não existe nada que seja impossível. Movido pela compaixão, Jesus vai realizar ali, diante de todos, um dos seus mais portentosos milagres. E o Cordeiro de Deus há de saciar a todos com o pão da existência e prepará-los também para lhes dar alimento de vida eterna, na Santa Eucaristia.

Pois Deus não nos abandona nunca; não nos cria perspectivas de vida eterna pela insensibilidade de nossas necessidades humanas. Jesus vai dizer em outro momento que 'nem só de pão vive o homem'. Não só de pão, mas também de pão. E, para a incredulidade dos seus discípulos, ordena então: 'Fazei sentar as pessoas' (Jo 6, 10). E, como em tudo o mais, Deus faz uso da graça como fruto da contrapartida humana; Jesus toma o que os homens têm ali a oferecer: cinco pães e dois peixes. Diante de oferta tão singela, vai realizar a partilha do pouco (que é tudo em Deus) entre muitos (que é nada sem Deus), configurando, assim, o prenúncio da partilha do seu Corpo e Sangue na Sagrada Eucaristia.

'Jesus tomou os pães, deu graças e distribuiu-os aos que estavam sentados, tanto quanto queriam. E fez o mesmo com os peixes (Jo 6, 11). E os poucos pães e os poucos peixes se multiplicaram em muitos pães e em muitos peixes, que alimentaram com fartura a multidão, a ponto de serem recolhidos ainda doze cestos cheios (símbolo da partilha universal da graça divina) no final, pois Deus usa sempre da superabundância da graça para pagar o tributo da oferta sincera do homem. Este prodígio extraordinário é o prenúncio de outro milagre ainda maior que subsiste pelos tempos, a cada Santa Missa: na multiplicação das hóstias, o mesmo Deus é entregue aos homens na plenitude da graça, hoje, ontem e até a consumação dos séculos.

sábado, 24 de julho de 2021

A CRUZ QUE SE LEVA É LENHO DE SANTIDADE (III)

 

ORAÇÃO: O TRIUNFO DA CRUZ

(São Luís Maria Grignion de Montfort)

Ó Santa Cruz, nossa proteção, nossa segurança, nossa perfeição e nossa única esperança!

Sois tão preciosa, que uma alma que já está no céu voltaria alegremente à terra para vos abraçar! É por vós, ó Santa Cruz, que se dá a bênção, é por vós que Deus perdoa e concede a remissão! Ele quer que todas as coisas tragam esse vosso selo, sem o qual nada lhe parece belo.

Colocada a cruz em algum lugar, torna-se sagrado o profano e desaparecem as manchas, porque Deus delas se apodera. Ele quer a Cruz em nossa fronte e em nosso coração, antes de todos os atos, para que sejamos vencedores.

sexta-feira, 23 de julho de 2021

O DOGMA DO PURGATÓRIO (XII)


Capítulo XII

Dores do Purgatório - Santa Cristina, a Admirável

O erudito e piedoso cardeal [Cardeal Belarmino, citado no capítulo anterior] passa então a relatar a história de Santa Cristina, a Admirável, que viveu na Bélgica no final do século XII e cujo corpo se conserva hoje em Sint-Truiden, na igreja dos Padres Redentoristas. A vida desta ilustre virgem foi, diz ele, escrita por Thomas de Cantimpré, religioso da Ordem de São Domingos, autor digno de crédito e contemporâneo da santa. O cardeal James de Vitry, no prefácio da Vida de Maria d'Ognies, fala de um grande número de mulheres santas e virgens ilustres; mas quem ele admira acima de todas as demais é Santa Cristina, de quem relata os feitos mais maravilhosos.

Esta serva de Deus, tendo passado os primeiros anos de sua vida em humildade e paciência, morreu com a idade de trinta e dois anos. Quando estava para ser enterrada, e o corpo já se encontrava na igreja repousando em caixão aberto, segundo o costume da época, ela se levantou cheia de vigor, deixando estupefata toda a cidade de Sint-Truiden, que tinha testemunhado essa maravilha. O espanto aumentou quando souberam, pela sua própria boca, o que lhe acontecera depois de sua morte. Vamos ouvir o seu próprio relato disso.

'Assim que a minha alma foi separada do meu corpo, ela foi recebida pelos anjos, que a conduziram a um lugar muito sombrio, inteiramente cheio de almas. Os tormentos que elas suportavam pareceram-me tão excessivos, que me é impossível dar qualquer ideia do seu rigor. Vi entre elas muitos de meus conhecidos e, profundamente tocada pela sua triste condição, perguntei que lugar era aquele, pois acreditava que fosse o Inferno. Meu guia me respondeu que era o Purgatório, onde eram punidos os pecadores que, antes da morte, se arrependeram de suas faltas, mas não haviam dado satisfação digna a Deus. Dali eu fui conduzida ao Inferno e lá também reconheci, entre os réprobos, alguns que eu havia conhecido anteriormente.

Os anjos então me transportaram para o Céu, até o trono da Divina Majestade. O Senhor me olhou com bons olhos e eu experimentei uma alegria extrema, porque pensei em obter a graça de morar eternamente com Ele. Mas meu Pai Celestial, vendo o que se passava em meu coração, disse-me estas palavras: 'Certamente, minha querida filha, um dia você estará comigo. Agora, porém, permito que você escolha, ou permanecer comigo daqui em diante ou retornar à Terra para cumprir uma missão de caridade e sofrimento. De modo a libertar das chamas do Purgatório aquelas almas que inspiraram tanto a sua compaixão, você deve sofrer por elas na terra; você deverá suportar grandes tormentos sem, no entanto, morrer pelos seus efeitos. E você não só aliviará os que partiram, mas o exemplo que dará aos vivos, e sua vida de sofrimento contínuo, levará pecadores a se converterem e a expiarem os seus crimes. Depois de ter terminado esta nova vida, você deverá retornar a mim sobrecarregada de méritos'. 

A estas palavras, vendo as grandes vantagens que me eram oferecidas pelas almas, respondi, sem hesitar, que voltaria à vida, e levantei-me no mesmo instante. É com este único objetivo, o alívio dos que partiram e a conversão dos pecadores, que voltei a este mundo. Portanto, não se espantem com as penitências que praticarei, nem com a vida que levarei daqui em diante, pois será tão extraordinária que nada parecido jamais foi visto'. 

Tudo isso foi relatado pela própria santa; vejamos agora o que o biógrafo acrescenta nos diversos capítulos de sua vida. 'Cristina começou imediatamente a obra para a qual fôra enviada por Deus. Renunciando a todos os confortos da vida, e reduzida à miséria extrema, viveu sem casa nem fogo, mais miserável que as aves do céu, que têm um ninho para as abrigar. Não satisfeita com essas privações, ela buscou avidamente tudo o que poderia causar sofrimento. Ela se jogou em fornos em chamas, e ali, sofrendo tão grande tortura que não pôde mais suportar, soltou os gritos mais terríveis. Ela permaneceu por um longo tempo no fogo, e ainda assim, ao sair, nenhum sinal de queimaduras foi encontrado em seu corpo. No inverno, quando o Meuse [rio que nasce na França e atravessa a Bélgica e a Holanda] estava congelado, ela mergulhava nele, permanecendo naquele rio congelado não apenas por horas e dias, mas por semanas inteiras, o tempo todo orando a Deus e implorando a sua misericórdia. Às vezes, enquanto rezava nas águas geladas, ela se deixava levar pela corrente até um moinho, cuja roda girava de uma maneira terrível de se ver, mas sem quebrar ou deslocar nenhum dos seus ossos. Em outras ocasiões, seguida por cães, que mordiam e rasgavam a sua carne, ela corria, atraindo-os para as moitas e entre os espinhos, até ficar coberta de sangue; no entanto, ao retornar, nenhuma ferida ou cicatriz era vista. 

Tais são as obras de admirável penitência descritas pelo autor da Vida de Santa Cristina. Este escritor era um bispo subordinado ao arcebispo de Cambray. 'E nós temos', diz Belarmino, 'motivos para crer em seu testemunho, pois ele tem por garantia outro grande autor, Tiago de Vitry, bispo e cardeal, e porque relata o que aconteceu em seu próprio tempo, e mesmo na província onde viveu. Além disso, os sofrimentos desta admirável virgem não foram ocultados. Todos puderam ver que ela estava no meio das chamas sem ser consumida e coberta de feridas, todas as quais desapareceram apenas momentos depois. Mas, mais do que isso, foi a vida maravilhosa que ela levou por quarenta e dois anos, depois que ela foi ressuscitada dos mortos, com Deus mostrando claramente que as maravilhas operadas nela foram pelas virtudes do Alto.

'Assim', argumenta Belarmino, 'Deus quis silenciar aqueles libertinos que fazem profissão aberta de não acreditar em nada, e que têm a audácia de perguntar com desprezo: 'Quem voltou do outro mundo? Quem já viu os tormentos do Inferno ou do Purgatório?' Eis aqui duas testemunhas confiáveis [Santa Cristina e Drithelm - ver capítulo anterior], que nos asseguram tê-los visto e que são terríveis. O que se segue, então, senão que os incrédulos são indesculpáveis, mas que aqueles que acreditam e, no entanto, negligenciam fazer penitência, não merecem ainda mais ser condenados?'

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)

quinta-feira, 22 de julho de 2021

22 DE JULHO - SANTA MARIA MADALENA

 

Maria Madalena. Para se fazer distinção do nome Maria tão comum entre os habitantes de Israel (esse era o nome, por exemplo, da irmã de Moisés), os textos bíblicos nomeavam as diferentes Marias por um acréscimo singular do personagem - assim, Maria Madalena é a Maria de Magdala, povoado situado às margens do Lago da Galileia e próximo à cidade de Tiberíades. Eis as pouquíssimas referências a ela nas Sagradas Escrituras:

[Lc 8, 2-3]: 'Os Doze estavam com ele, como também algumas mulheres que tinham sido livradas de espíritos malignos e curadas de enfermidades: Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete demônios; Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes; Susana e muitas outras, que o assistiram com as suas posses'.

[Jo 19, 25]: 'Junto à cruz de Jesus estavam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena'.

[Mc 15,40-41; 47]: 'Achavam-se ali também umas mulheres, observando de longe, entre as quais Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o Menor, e de José, e Salomé, que o tinham seguido e o haviam assistido, quando ele estava na Galileia; e muitas outras que haviam subido juntamente com ele a Jerusalém... Maria Madalena e Maria, mãe de José, observavam onde o depositavam'.

[Mc 16, 1; 5-6; 9-10]: 'Passado o sábado, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé compraram aromas para ungir Jesus... Entrando no sepulcro, viram, sentado do lado direito, um jovem, vestido de roupas brancas, e assustaram-se. Ele lhes falou: Não tenhais medo. Buscais Jesus de Nazaré, que foi crucificado. Ele ressuscitou, já não está aqui. Eis o lugar onde o depositaram... Tendo Jesus ressuscitado de manhã, no primeiro dia da semana, apareceu primeiramente a Maria de Magdala, de quem tinha expulsado sete demônios. Foi ela noticiá-lo aos que estiveram com ele, os quais estavam aflitos e chorosos'.

[Jo 20, 1-2; 18]: 'No primeiro dia que se seguia ao sábado, Maria Madalena foi ao sepulcro, de manhã cedo, quando ainda estava escuro. Viu a pedra removida do sepulcro. Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava: Tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o puseram! ... Maria Madalena correu para anunciar aos discípulos que ela tinha visto o Senhor e contou o que ele lhe tinha falado'.

Ela é a figura bíblica 'Maria de Magdala', da qual Jesus havia expulsado sete demônios. Esta acepção não implica a interpretação direta de 'uma grande pecadora'. O fato de ter-se livrado de 'sete demônios' (sete é o número da perfeição, da plenitude) implica que ela foi curada de todos os seus males tanto físicos (enfermidades) como espirituais (pecados, estes de naturezas quaisquer). É absolutamente forçada e despropositada a conjectura de que Maria Madalena pudesse ter sido uma 'prostituta' na sua condição pregressa antes do seu encontro com Jesus. Desta interpretação espúria, nasceram inúmeras outras lendas e desdobramentos fantasiosos da participação e do envolvimento desta mulher singular na vida pública de Jesus e dos seus apóstolos. 

quarta-feira, 21 de julho de 2021

terça-feira, 20 de julho de 2021

DUAS IGREJAS E DUAS LÚCIAS DE FÁTIMA?

Dentre os extraordinários fatos e revelações que caracterizam as mensagens de Nossa Senhora em Fátima, um dos mais perturbadores e absurdos é a personagem da Irmã Lúcia após 1957 - 1960. São duas Lúcias tão diversas quanto a realidade e a versão divulgada do Terceiro Segredo. Na história dos primeiros 40 anos dos eventos (1917 - 1957) - um período aproximado - temos conhecimento de uma Lúcia tipificada pela introversão e penitência de claustro, sob confinamento forçado ou não, mas fazendo, com as profundas limitações de suas próprias forças e condições, o que Nossa Senhora lhe dera por missão, na sua Segunda Aparição - a difusão no mundo da devoção ao Imaculado Coração de Maria:

– Queria pedir-Lhe para nos levar para o Céu.
– Sim; a Jacinta e o Francisco levo-os em breve. Mas tu ficas cá mais algum tempo. Jesus quer servir-se de ti para me fazer conhecer e amar. Ele quer estabelecer no mundo a devoção ao Meu Imaculado Coração.
– Fico cá sozinha? – perguntei, com pena.
– Não, filha. E tu sofres muito? Não desanimes. Eu nunca te deixarei. O meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus.

Essa Lúcia - a Lúcia das aparições - tinha antecipado o seu 'sim' aos desígnios da graça já na Primeira Aparição:

- Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido, e de súplica pela conversão dos pecadores?
Sim, queremos.
Ide, pois, ter muito que sofrer, mas a graça de Deus será o vosso conforto.

Assim, a missão de Lúcia foi estabelecida pela via do ostracismo e do sofrimento, longe da realidade do mundo: – 'Ide, pois, ter muito que sofrer'. Lúcia não ganharia o Céu de imediato e nem teria mais o mundo. Neste escondimento e anonimato, entretanto, nunca esteve realmente sozinha, pois Nossa Senhora sempre a amparou – O meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus. Com uma vida inteiramente dedicada à oração, penitências e sacrifícios, Lúcia cumpriu a sua missão, não como fonte irradiadora da luz divina, mas como espelho débil e generoso de que se valeu Nossa Senhora para nele refletir os portentosos desígnios da Providência divina.

A Irmã Lúcia revelou expressamente que o Terceiro Segredo de Fátima deveria ser revelado em 1960 ou até um pouco antes, em caso da sua morte. E por que 1960? Porque este ano representa uma data referencial para o cerne da revelação mariana: uma crise de fé universal, tão crítica e tão tremenda que seria capaz de abalar os fundamentos da Igreja - uma aurora de uma apostasia universal e a destruição quase completa dos fundamentos da Santa Igreja Católica. Assim, o ano de 1960 era de especial e fundamental relevância para o bem da Igreja e do mundo no sentido de uma plena compreensão (e consequente tomada de posição) contra fatos, circunstâncias ou eventos que tenderiam a ser particularmente graves e deletérios para a Santa Igreja e para toda a humanidade nas décadas seguintes. 

Esta revelação, entretanto, poderia também ocorrer um pouco antes de 1960, em caso da morte da vidente, como ela própria havia assinalado. A Irmã Lúcia, amparada por Nossa Senhora durante toda a sua missão na terra, teria ciência clara de que cumprira a missão a ela destinada e esta, uma vez concluída (Fátima já seria uma realidade para o mundo inteiro nesta época), 'o algum tempo' que lhe restava nesta vida estaria prestes a se concluir também. Neste sentido, 1960 era o tempo do Terceiro Segredo e um limite de tempo prescrito pelos Céus para a missão da Irmã Lúcia e, por essa razão, é bastante razoável admitir que a verdadeira Irmã Lúcia tenha falecido alguns meses ou anos um pouco antes de 1960. 

Desta forma, o domínio do tempo das revelações de Nossa Senhora em Fátima estaria circunscrito aproximadamente ao ano de 1960, com duas determinações precisas e enfáticas de Nossa Senhora: a primeira - dirigida e cumprida por Lúcia - consistia na sua missão de divulgar ao mundo a devoção ao seu Imaculado Coração e a segunda - dirigida e não cumprida pelos papas da Igreja - consistia na devoção explícita da Rússia ao Imaculado Coração de Maria e o anúncio do Terceiro Segredo ao mundo católico e à toda a humanidade. De alguma forma, naquele período singular da história da humanidade e por razões diversas, Lúcia e o papado - na concepção plena dos papas como sucessores de Pedro e irmanados na observância rigorosa da doutrina católica fundamentada pelos Evangelhos e pela tradição bimilenar da Igreja, morreram juntos.  

E, ressurgiram também juntos, com uma nova Lúcia e um novo papado - e, consequentemente, uma nova Igreja - pelo Concílio Vaticano II, concílio ecumênico convocado pelo Papa João XXIII em 25 de dezembro de 1961, inaugurado em 11 de outubro de 1962 e concluído pelo seu sucessor, o Papa Paulo VI, em 8 de dezembro de 1965. Um concílio que não teve como objeto estabelecer nenhum dogma, denunciar quaisquer erros doutrinários ou condenar quaisquer heresias, mas que simplesmente formalizou um novo rito litúrgico da chamada Missa Nova e promoveu uma verdadeira revolução nos pilares da fé autêntica da Igreja de Cristo. 

A distinção é óbvia nos tempos da Igreja pré e pós-conciliar. Os maus frutos desta árvore má são abundantes e estão espalhados por todos os lados nestes tristes tempos de apostasia universal. Mas muitos - uma maioria moldada pela tibieza, pelo indiferentismo e pelo ecumenismo mais diabólico - simplesmente não vê o que não quer ver. Mas o que o espírito humano se apraz em legitimar como unidade das duas Igrejas, a tecnologia avançada não deixa dúvidas entre uma Lúcia verdadeira e uma Lúcia falsa, utilizando simplesmente a técnica do envelhecimento (ou rejuvenescimento) de rostos ou das suas mudanças físicas em termos da adição, remoção ou alteração de formatos ou de elementos fisionômicos (comumente na forma de mudanças em termos de cortes de cabelo ou inclusão/exclusão de barba, óculos, próteses dentárias, etc). 

A sequência de fotografias abaixo apresenta comparações entre a Lúcia Jovem (pré-1960), a Lúcia Jovem artificialmente envelhecida e a Lúcia Idosa (pós-1960), utilizando as técnicas citadas. A sequência seguinte apresenta os rostos das duas Lúcias num sorriso mais aberto. Mas a distinção maior entre essas duas personagens está no 'état d'esprit' (sequência inferior das fotos): a Lúcia mais jovem é contida, recatada, quase solene; enquanto a Lúcia mais idosa é afável, cordial, quase relaxada. Surpreendentemente duas Lúcias, que se assemelham talvez pelos hábitos religiosos que vestem.




Duas Lúcias é uma teoria da conspiração? Ou o resultado de uma conspiração monstruosa e de consequências avassaladoras para a Igreja? Se a primeira serviu-se do escondimento e da pequenez, a segunda serviu de suporte muito adequado para encontros e eventos públicos da Igreja pós-conciliar. A hipótese de duas Lúcias tem outros elementos de abordagem, mas nos basta aqui fazê-la por apenas mais um viés complementar.

Durante uma entrevista com a Irmã Lúcia entre 17 e 18 de outubro de 1946, o Cônego Barthas perguntou à vidente: 'Quando nos será revelada a terceira parte do segredo?' A resposta foi incisiva: 'Em 1960'. Na sequência, o cônego escreveu: 'E quando levei a minha audácia tão longe ao ponto de perguntar sobre o porquê de ser necessário esperar até lá, a única resposta que recebi foi: 'Porque a Santíssima Virgem deseja que assim o seja' (Barthas, Fátima, Merveille du XXe siecle, pág. 83, Fatima-editions, 1952). Essa acepção foi explicitamente exposta, em termos diretos pela própria caligrafia da Irmã Lúcia, na forma de um encaminhamento postado sobre um envelope pardo que conteria o texto original da revelação, como apresentado pelo Cardeal Bertone em vídeo público, quando do anúncio do terceiro segredo de Fátima pelo Vaticano, no ano de 2000: 'Por ordem expressa de Nossa Senhora, este envelope só pode ser aberto em 1960...'

Nos termos mais completos do Segredo revelado publicamente ('A Mensagem de Fátima', texto disponível no site do Vaticano), consta um interrogatório realizado com a vidente pelo próprio Cardeal Bertone, que incluiu a sequinte questão: 'Por que o limite de 1960? Foi Nossa Senhora que indicou aquela data?', cuja resposta da vidente de Fátima foi perturbadoramente estranha: 'Não foi Nossa Senhora; fui eu mesma que meti essa data porque, segundo intuição minha, antes de 1960 não se perceberia, compreender-se-ia somente depois. Agora pode-se compreender melhor. Eu escrevi o que vi, não compete a mim a interpretação, mas ao papa'.

A resposta dessa 'Lúcia' contradiz frontalmente a afirmação de Lúcia. Além de confrontar o que se afirmara antes, a resposta dada é totalmente estranha e descabida. A data de 1960 - um elemento de singularidade histórica para a vida da Igreja e para a civilização cristã - teria sido fruto da intuição da vidente e não de uma mensagem profética de Nossa Senhora? Baseado em quais fatos e evidências? A vidente tornava-se então, mais que meramente intuitiva, uma profetisa dos Céus? Não tem sentido algum. Para, logo em seguida, afirmar que não competia a ela, mas ao papa, a interpretação dos fatos! Como se intuir não fosse uma interpretação além dos fatos... Definitivamente, há algo errado com essa Lúcia de Fátima! Definitivamente, estamos diante de Lúcias que são diferentes, que agem de maneiras diferentes, que falam coisas diferentes...

segunda-feira, 19 de julho de 2021

A CRUZ QUE SE LEVA É LENHO DE SANTIDADE (II)

 

Não está de acordo com a natureza do homem levar a cruz, amar a cruz, castigar o corpo e reduzi-lo à escravidão, fugir das honras e sofrer, de bom grado, as injúrias, desprezar-se a si mesmo e desejar ser desprezado, suportar as coisas mais adversas e danosas e não desejar nenhuma prosperidade neste mundo.

Se olhas para ti vês logo que só com as tuas forças não serás capaz de nenhuma destas coisas; mas, se confiares em Deus, receberás do Céu a força necessária, e o mundo e a carne ficarão sujeitos ao teu domínio. Mais ainda, não temerás sequer o inimigo infernal, se estiveres armado com o escudo da fé e marcado com o sinal da Cruz de Cristo.

Resolve-te, pois, como bom e fiel servo de Cristo, a levar, virilmente, a Cruz do teu Senhor, que se deixou crucificar por teu amor. Prepara-te para enfrentar nesta miserável vida muitas adversidades e muitas angústias; eis o que te espera por onde quer que fores, eis o que encontrarás em qualquer lugar onde te encontrares.

... E, na verdade, se houvesse um método melhor e mais útil para a salvação dos homens que o sofrimento, certamente Cristo no-lo teria ensinado pela palavra e pelo exemplo. Pois, manifestamente, exorta os seus discípulos e todos os que o querem seguir a que levem a sua cruz, dizendo: 'Se alguém me quer seguir, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me' (Mt 16,24). Portanto, consideradas e examinadas todas as coisas, devemos concluir: 'Importa passar por muitas tribulações para entrar no reino de Deus' (At 14,21).

(Da Imitação de Cristo)