sábado, 1 de outubro de 2016

PRIMEIRO SÁBADO DE OUTUBRO


Mensagem de Nossa Senhora à Irmã Lúcia, vidente de Fátima: 
                                                                                                                           (Pontevedra / Espanha)

‘Olha, Minha filha, o Meu Coração cercado de espinhos que os homens ingratos a todo o momento Me cravam, com blasfêmias e ingratidões. Tu, ao menos, vê de Me consolar e diz que a todos aqueles que durante cinco meses seguidos, no primeiro sábado, se confessarem*, recebendo a Sagrada Comunhão, rezarem um Terço e Me fizerem 15 minutos de companhia, meditando nos 15 Mistérios do Rosário com o fim de Me desagravar, Eu prometo assistir-lhes à hora da morte com todas as graças necessárias para a salvação.’
* Com base em aparições posteriores, esclareceu-se que a confissão poderia não se realizar no sábado propriamente dito, mas antes, desde que feita com a intenção explícita (interiormente) de se fazê-la para fins de reparação às blasfêmias cometidas contra o Imaculado Coração de Maria no primeiro sábado seguinte.

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

A VISÃO DE DANIEL

I – Uma noite, o profeta Daniel teve uma visão terrificante. Enquanto os quatro ventos do céu se combatiam sobre um vasto mar, ele viu surgir do meio das vagas quatro bestas monstruosas. Eram um leão, um urso, uma pantera, e um quarto animal medonho de quatro cabeças, dotado de força prodigiosa, tendo dentes e unhas de ferro, e dez chifres na testa. Foi revelado ao profeta que estas quatro bestas significavam quatro impérios que se elevariam sucessivamente sobre as vagas movediças da humanidade.

Ora, enquanto Daniel considerava com horror a quarta besta, viu um chifrezinho nascer no meio dos dez outros, abater três, e crescer acima de todos; e este chifre tinha olhos de homem, e uma boca que falava com insolência; fazia guerra aos santos do Altíssimo, e levava a melhor sobre eles. O profeta perguntou o sentido desta estranha visão. Foi-lhe respondido que os dez chifres representavam dez reis; o chifrezinho era um rei que acabaria por dominar sobre toda a terra com inaudito poder. 'Vomitará, lhe foi dito, blasfêmias contra Deus, esmagará debaixo dos pés os santos do Altíssimo; ele pensará que pode mudar os tempos e as leis; e tudo lhe será entregue durante um tempo, dois tempos, e a metade de um tempo' (Dn 7).

II – Por este rei todos os intérpretes entendem o Anticristo. Qual é a besta sobre a qual surgiu, no tempo marcado, este chifre de impiedade? É a Revolução, pela qual se entende todo o corpo dos ímpios, obedecendo a um motor oculto e se insurgindo contra Deus: a Revolução, poder Satânico e bestial; satânico, porque animado por um espírito infernal; bestial, porque entregue a todos os instintos da natureza degradada. Ela tem dentes e unhas de ferro: pois forja leis despóticas por meio das quais esmaga a liberdade humana. Procura apoderar-se dos reis e dos governos, que têm de fazer um pacto com ela. Quando o Anticristo aparecer, ela terá dez reis a seu serviço, como os dez chifres da testa.

O Anticristo – nos diz Daniel – aparecerá como um chifrezinho; terá um começo obscuro. Não sairá da família real; será um Maomé, um Mahdi, que se levantará pouco a pouco pela audácia de suas imposturas, secundadas pela cumplicidade do diabo. O chifre que o representa é muito diferente dos outros. Tem olhos de homem; pois o novo rei é um vidente, um falso profeta. Tem uma boca que faz grandes discursos; pois se impõe não menos pelo brilho da palavra e a sedução das promessas, do que pela força das armas e das intrigas políticas.

Cedo todo o mundo terá os olhos voltados para o impostor, seus grandes feitos serão celebrados pelas trombetas de uma imprensa complacente. Sua popularidade sombreará a de muitos soberanos apóstatas, que dividirão então entre si o império da besta revolucionária. Seguir-se-á uma luta gigantesca, na qual, segundo Daniel, o Anticristo abaterá todos os seus rivais. Neste momento todos os povos, fanatizados por seus prodígios e suas vitórias, o aclamarão como o salvador da humanidade. E os outros reis não terão outro recurso que se submeterem a ele. Este será o começo de uma crise terrível para a Igreja de Deus. Pois o chifre da impiedade, alcançando o auge do poder, fará guerra aos santos e prevalecerá contra eles.

III – É provável que durante esse período que poderá durar muitos anos, o homem do pecado afetará ares de moderação hipócrita. Judeu, se apresentará aos judeus como o Messias esperado, como o restaurador da lei de Moisés; tentará torcer a seu favor as misteriosas profecias de Isaías e Ezequiel; reconstruirá, no dizer de muitos Padres da Igreja, o templo de Jerusalém. Os judeus, ao menos em parte, ofuscados por seus falsos milagres e seu fausto insolente, o receberão, o falso Cristo; porão ao seu serviço as altas finanças, toda a imprensa, e as lojas maçônicas do mundo inteiro.

É muito crível também que o Anticristo disporá, para subir, de todos os partidários das falsas religiões. Ele se anunciará como cheio de respeito pela liberdade dos cultos, uma das máximas e uma das mentiras da besta revolucionária. Dirá aos budistas que é um Buda; aos muçulmanos, que Maomé é um grande profeta. Nada impede que o mundo muçulmano aceite o falso messias dos judeus como um novo Maomé.

O que sabemos? Talvez irá até dizer, em sua hipocrisia, como Herodes seu precursor, que quer adorar Jesus Cristo. Mas isso não passará de uma zombaria amarga. Malditos os cristãos que suportam sem indignação que seu adorável Salvador seja posto lado a lado com Buda e Maomé, em não sei que panteon de falsos deuses! Todos esses artifícios, parecidos com a carícia no cavalo do cavaleiro que o quer montar, arrebanharão insensivelmente o mundo para o inimigo de Jesus Cristo; mas uma vez firme nos estribos, usará do freio e das esporas; e a mais terrível tirania pesará sobre a humanidade.

IV – São Paulo nos faz conhecer com um só traço toda a extensão dessa tirania, a mais odiosa que houve e que haverá em todos os tempos. O homem da perdição, diz ele, o filho da perdição, o ímpio, 'se oporá e se levantará contra tudo o que se chama Deus ou que é adorado como Deus, até se sentar no templo de Deus, apresentando-se como se fosse Deus' (2 Tes 2, 4). Daniel tinha predito antes de São Paulo: 'Não terá em conta para nada o Deus de seus pais; ele mergulhará em deboches; não terá preocupação com Deus algum, levantar-se-á contra tudo' (Dn 11, 17).

Assim, quando o Anticristo tiver escravizado o mundo, quando tiver colocado em toda parte seus ordenanças e suas criaturas, quando puder puxar à sua vontade todos os fios de uma centralização levada ao extremo: ele tirará a máscara, proclamará que todos os cultos estão abolidos, se aclamará como deus único e, debaixo das penas mais terríveis e mais infamantes, quererá forçar todos os habitantes da terra a adorar, excluindo qualquer outra, sua própria divindade.

É nisto que desembocará a famosa liberdade de culto da qual se faz tanto alarde; a promiscuidade dos erros exige logicamente esta conclusão. Enquanto esteve na terra, o adorável Jesus, manso e humilde de coração, nunca se propôs à adoração de seus apóstolos sendo Ele Deus; muito ao contrário, pôs-se de joelhos diante deles e lhes lavou os pés. O Anticristo, monstro da impiedade e de orgulho, far-se-á adorar pela humanidade enlouquecida e seduzida; ela terá escolhido este mestre de preferência ao primeiro.

E não se pense que a armadilha será grosseira! Não esqueçamos, diz São Gregório, que o monstro disporá do poder do diabo para fazer falsos prodígios; ao contrário do começo, quando os milagres estavam do lado dos mártires, parecerá que agora estão do lado dos carrascos. Haverá uma ofuscação, uma vertigem. Somente os humildes e firmes em Deus,distinguirão a mentira e escaparão à tentação. Mas onde o Anticristo estabelecerá seu novo culto? São Paulo nos diz: no templo de Deus; Santo Irineu, quase contemporâneo dos Apóstolos, esclarece melhor e diz: no templo de Jerusalém que ele fará reconstruir. Este será o centro da horrível religião. São João em outro lugar nos dá a conhecer a imagem do monstro será proposta por toda parte à adoração dos homens (Ap 13, 24).

Então o budismo, o islamismo, o protestantismo, etc. serão suprimidos e abolidos. Mas não é preciso dizer que o furor do mundo se dirigirá contra Nosso Senhor e sua Igreja. Fará cessar o culto público; desaparecerá, diz Daniel, o Sacrifício Perpétuo. Só se poderá celebrar a Santa Missa em cavernas e em lugares escondidos. As igrejas profanadas só apresentarão ao olhar a abominação da desolação, a saber, a imagem do monstro elevada aos altares do verdadeiro Deus. Houve um ensaio dessas coisas na Revolução Francesa. Aí a mão de Deus se fará sentir. Ele abreviará esses dias de suprema angústia. Essa perseguição, que fará vacilar as colunas do céu, só durará um tempo, dois tempos e a metade de um tempo, a saber, três anos e meio.

(Excertos da obra 'O Drama do Fim dos Tempos', do Pe. Emmanuel-André)

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

29 DE SETEMBRO - SÃO MIGUEL ARCANJO

(São Miguel com elmo e armadura medieval - Catedral de Bruxelas)

'Houve uma batalha no Céu: Miguel e os seus Anjos guerrearam contra o Dragão. O Dragão batalhou, juntamente com os seus Anjos, mas foi derrotado e não se encontrou mais um lugar para eles no Céu' (Ap 12, 7-8).

'Naquele tempo, surgirá Miguel, o grande Príncipe, constituído defensor dos filhos do seu povo e será tempo de angústia como jamais houve' (Dn 12, 1).

Assim como Lúcifer é o chefe dos demônios, Miguel é o maior dentre os anjos, Príncipe das milícias celestes, protetor da Santa Igreja e da humanidade contra as forças do inferno. Assim, a designação de arcanjo (oitavo coro dos anjos) tem sentido genérico e nominativo, pois certamente São Miguel, sendo o primeiro dentre os Anjos, é o maior dos serafins. Dentre os vários santuários destinados ao Arcanjo São Miguel, Príncipe das milícias celestes, destaca-se aquele localizado no Monte Saint Michel na França, cuja foto constitui a abertura e o símbolo deste blog.

(Santuário de São Miguel - Monte Saint Michel/França)

São Miguel, rogai por nós!
Intercedei a Deus por nós!

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

ALMA DO SILÊNCIO


'O silêncio é o segredo das grandes almas', já escreveu alguém. As grandes almas são raras. Por isso há pouco silêncio no mundo. Mas muito barulho. Muita confusão. Muitas palavras. Já não se ouvem, por isso, as discretas admoestações da consciência. Nem o perpassar dulcíssimo da graça. Nem os convites suaves para as boas resoluções. O barulho a tudo sufoca. Dispersando forças. Enfraquecendo energias. Mirrando as almas. Tornando-as mesquinhas também. 

Pois 'é no silêncio que as almas crescem'’ diz a Imitação de Cristo. O silêncio é força. 'O silêncio é vida' — escreveu a santa carmelita Ir. Marie Aimée — 'ele é que forja os santos, trabalha-os, aperfeiçoa-os'. O Eterno Pai é vida. Por isso Ele diz uma só palavra: o Verbo Eterno. E por meio deste único Verbo criou todas as maravilhas do Universo. Maria, melhor do que ninguém, compreendeu toda a força e todo o encanto do silêncio. E a ele se entregou ciosamente. 

Eis por que são tão raras as palavras que dela se leem nos santos Evangelhos, palavras de humildade, palavras de amor. E, justamente, por causa deste seu silêncio, se diz dela uma sentença profunda: 'Maria conservava todas estas palavras em seu coração' (Lc 2, 19), meditando-as, refletindo sobre elas, o que é um dos mais belos frutos do silêncio. E a seu esposo castíssimo, São José, dá-se o nome de 'santo silencioso', ó que admirável silêncio não havia de reinar então na casinha de Nazaré! 

Mas não era um silêncio de cemitério, silêncio infrutífero, mas sim realizador e produtivo, assim como o silêncio das águas nos grandes reservatórios que, saindo de sua concentração, desenvolvem energias prodigiosas, produzindo força, produzindo luz. Eis a missão do silêncio. E um dos silêncios mais admiráveis de Maria é o grande silêncio ao pé da cruz. Nada de frases, de exclamações, de lamentos, mas o silêncio dos heróis. 

Foi este sempre o seu procedimento. Silêncio que a acompanhou pela vida afora. Silêncio de humildade: nunca falando sobre si mesma; silêncio de caridade: nunca entristecendo o próximo; silêncio de obediência: nunca murmurando; silêncio de resignação: nunca se queixando; silêncio de prudência: nunca dizendo uma palavra demais; silêncio de recolhimento: nunca dizendo palavras ociosas; silêncio de fé: nunca ofendendo a Deus presente. Era assim o silêncio da alma gloriosa de Maria!

Eis por que todos os quadros marianos, de pintores célebres, nos mostram o rosto amavelmente sério de quem sabia medir suas palavras. Como são silenciosas, por exemplo, as Madonas de Rafael e de Murilo! Nem se pode imaginar de outro modo aquela que andava a escutar, continuamente, o Verbo Eterno Humanado. Se nós aprendêssemos o silêncio de Maria!

Silêncio que é amor, que é adoração! Se nós soubéssemos nos calar, como cresceriam depressa as nossas almas! Mas nós gostamos de muitas palavras, de muita dissipação. É conhecida e bem verdadeira a frase antiga: 'muitas vezes, me arrependi de ter falado, nunca de me ter calado'. E quando nos calamos exteriormente, quem sabe, quantos diálogos e discursos no nosso interior! Se queremos, pois, ter forças para a ação, forças para o amor e forças para o sacrifício, amemos o silêncio. 

Ele é de tanta utilidade que todos os Fundadores de Ordens o puseram em suas regras e, quanto melhor observado ele é, mais florescem todas as virtudes. E o apóstolo São Tiago escreve que 'é varão perfeito somente aquele que pratica o silêncio' (1 Jb 3, 2). Virgem Prudentíssima, Vaso Insigne de Devoção, ó Maria, estabelecei-nos num grande silêncio exterior e interior, em espírito de fé, de adoração e de amor para com a Santíssima Trindade, 'na qual temos a vida, o movimento e o ser' (At 17, 28). 

(Excertos da obra 'A Alma Gloriosa de Maria' de Frei Henrique G. Trindade, 1937)

terça-feira, 27 de setembro de 2016

A MÁ MORTE DOS RICOS DO MUNDO

Além de tudo que já foi dito, eu devo acrescentar uma refutação a certo erro muito prevalente entre os ricos deste mundo, que muito os afasta de uma vida correta e uma boa morte. O erro consiste nisto: o rico supõe que toda riqueza que possui é absolutamente sua propriedade, se justamente adquirida; e, portanto, podem legalmente gastá-la ou desperdiçá-la e ninguém pode lhes dizer: 'Por que você fez isto? Por que se vestir tão ricamente? Por que organizar festas tão suntuosas? Por que gastar tão prodigamente com teus cachorros e falcões? Por que gastar tanto em jogos e outros prazeres semelhante?'. E eles respondem: 'O que é isto para ti? Não é correto eu gastar o meu dinheiro para fazer aquilo que eu desejar?'

Este erro é, sem dúvida, mais grave e pernicioso: considerar que os ricos são mestres das suas propriedades com relação aos demais homens; embora, em relação a Deus, eles não sejam mestres, mas apenas administradores. Esta verdade pode ser provada com muitos argumentos: 'Do Senhor é a terra e o que nela existe, o mundo e seus habitantes' (Sl 24, 1). E ainda: 'Não preciso do novilho do teu estábulo, nem dos cabritos de teus apriscos, pois minhas são todas as feras das matas; há milhares de animais nos meus montes. Conheço todos os pássaros do céu, e tudo o que se move nos campos. Se tivesse fome, não precisava dizer-te, porque minha é a terra e tudo o que ela contém' (Sl 50, 9-12).

E no primeiro livro de Crônicas, quando Davi ofereceu para a construção do templo três mil moedas de ouro e sete mil moedas de prata e mármore em grande abundância; e quando movidos pelo exemplo do Rei, os príncipes das tribos ofereceram cinco mil moedas de ouro, dez mil moedas de prata, dezoito mil de bronze e cem mil de ferro, então Davi disse ao Senhor: 'A vós, Senhor, a grandeza, o poder, a honra, a majestade e a glória, porque tudo que está no céu e na terra vos pertence. A vós, Senhor, a realeza, porque sois soberanamente elevado acima de todas as coisas. É de vós que vêm a riqueza e a glória, sois vós o Senhor de todas as coisas; é em vossa mão que residem a força e o poder. E é vossa mão que tem o poder de dar a todas as coisas grandeza e solidez. Agora, ó nosso Deus, nós vos louvamos e celebramos vosso nome glorioso. Quem sou eu, e quem é meu povo, para que possamos fazer-vos voluntariamente estas oferendas? Tudo vem de vós e não oferecemos senão o que temos recebido de vossa mão' (1Cr 29, 11-14).O testemunho de Deus pode ser acrescentado através das palavras do profeta Ageu: 'A prata e o ouro me pertencem - oráculo do Senhor dos exércitos' (Ag 2,8). Assim falou o Senhor, para que o povo compreendesse que nada seria necessário caso o Senhor ordenasse sua construção, pois a Ele pertencem todo ouro e prata deste mundo.

Devo acrescentar dois outros testemunhos das palavras de Cristo, no Novo Testamento: Havia um homem rico que tinha um administrador. Este lhe foi denunciado de ter dissipado os seus bens. Ele chamou o administrador e lhe disse: 'Que é que ouço dizer de ti? Presta contas da tua administração, pois já não poderás administrar meus bens' (Lc 16, 1-2). O 'homem rico' aqui significa Deus, como dissemos a pouco, pois como diz o profeta Ageu, dele é o ouro e a prata. Por 'administrador'entenda-se os homens ricos, como explicam os santos padres Agostinho, Ambrósio e o Venerável Beda sobre esta passagem.

Se o Evangelho, então, deve ser acreditado, todo homem rico deste mundo deve reconhecer que suas riquezas, justa ou injustamente adquiridas, não são suas: se ele as adquiriu corretamente, ele é apenas o administrador; se injustamente, ele não é nada além de um ladrão. E desde que o homem rico não é mestre de suas riquezas, por consequência, quando acusado de uma injustiça frente a Deus, Deus pode retirá-las através da morte ou tomando-as, pois assim esta indicado nestas palavras: 'Presta contas da tua administração, pois já não poderás administrar meus bens'. Para Deus sempre haverá meios de reduzir um rico à pobreza, retirando os bens de sua custódia. Naufrágios, roubos, tempestades de granizo, pragas, muita chuva, seca e outras aflições são as muitas vozes de Deus dizendo ao rico: 'já não poderás administrar meus bens'.

Mas, então, ao final da parábola, nosso Senhor diz: 'fazei amigos com a riqueza injusta, para que, no dia em que ela vos faltar, eles vos recebam nos tabernáculos eternos' (Lc 16, 9). Ele não quer dizer que as esmolas são dadas a Ele, mas que os ricos não são ricos, propriamente falando, mas somente sombras Dele. Isto é evidente em outra passagem do Evangelho de São Lucas: 'Se, pois, não tiverdes sido fiéis nas riquezas injustas, quem vos confiará as verdadeiras?' (Lc 16, 11).O significado destas palavras é: se nas injustas riquezas ou seja, nas falsas riquezas, não tiverdes sido fiéis dando tudo liberalmente aos pobres, quem vos confiará as verdadeiras que fazem um homem realmente rico? Esta é a explicação dada por São Cipriano e Santo Agostinho.

Em outra passagem do mesmo evangelho, que pode ser considerada como um comentário sobre o administrador injusto: 'Havia um homem rico que se vestia de púrpura e linho finíssimo, e que todos os dias se banqueteava e se regalava. Havia também um mendigo, por nome Lázaro, todo coberto de chagas, que estava deitado à porta do rico. Ele avidamente desejava matar a fome com as migalhas que caíam da mesa do rico... Até os cães iam lamber-lhe as chagas. Ora, aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos ao seio de Abraão. Morreu também o rico e foi sepultado. estando ele nos tormentos do inferno' (Lc 16, 19-23a). 

Este rico era certamente um daqueles que supõe ser mestre de seu próprio dinheiro e não administrador e, portanto, ele imaginou não estar ofendendo a Deus quando estava vestido de púrpura e linho, e celebrava suntuosamente todos os dias, tinha seus cães e bufões. Talvez tenha dito a si mesmo: eu gasto o meu dinheiro, não ataco ninguém, eu não violo as leis de Deus, eu não blasfemo nem juro em falso, observo os dias santos, honro pai e mãe, não mato, não sou adúltero, não roubo, não dou falso testemunho, não desejo a mulher do próximo, não faço nada disto. Mas, se é este o caso, por que ele foi para o inferno, ser atormentado no fogo? Devemos reconhecer que aqueles enganados, que supõem ser mestres absolutos de seu dinheiro, devem responder por muitos graves pecados, que as Santas Escrituras deveriam mencionar. Mas como nada mais é dito, entendemos que os adornos supérfluos e caros, seus magníficos banquetes, a multidão de servos e cães, enquanto não possuía nenhuma compaixão pelo pobre é causa suficiente para condená-lo aos tormentos eternos.

Portanto, podemos estabelecer uma regra clara para viver e morrer bem, e sempre considerar que iremos prestar contas a Deus de nosso palácios luxuosos, jardins, muitos servos, esplendor nas vestimentas, banquetes, gastos desnecessários, que afetam a multidão de pobres e doentes, que procuram pelos nossos supérfluos, que choram a Deus, e no dia do julgamento não pararão de clamar contra todos os homens ricos, até que sejam condenados às chamas eternas.

(Excertos da obra 'A Arte de Morrer Bem' de São Roberto Belarmino)

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

QUESTÕES SOBRE A NATUREZA DO DEMÔNIO (III)


QUESTÃO 5: Que paralelismo pode ser feito entre a zoologia e a demonologia?

Poderíamos dizer que existe um certo paralelismo entre a zoologia e a demonologia, uma vez que cada ser angélico deve ser completamente distinto de outro, ao extrapolar a sua forma [ou seja, não possuindo matéria, cada anjo deve tomar uma forma - em sentido filosófico - diferente para se distinguir dos demais]. Não obstante, é possível englobá-los em grandes grupos. De outra forma: se imaginarmos que, de cada espécie de mamífero, existisse um único exemplar; um único cervo, um único gamo, um único cavalo, etc. Cada um deles seria distinto dos demais; porém, num contexto zoológico, poderíamos agrupar esses seres únicos em uma espécie - a dos mamíferos - não porque estes seres vivos sejam iguais entre si, mas porque são mais semelhantes entre si em relação aos [seres vivos] pertencentes às espécies dos dos insetos, dos peixes, etc.

Estes mamíferos seriam distintos entre si, mas poderiam ser agrupados por existir uma maior semelhança entre eles do que entre os demais seres vivos. O mesmo acontece com as naturezas angélicas; cada uma é distinta da outra, mas podem ser reunidas em grandes grupos e, neste caso, em nove grupos, conforme a Bíblia: serafins; querubins; tronos; dominações; virtudes; potestades; principados; arcanjos e anjos. Se as diferenças entre os animais são, às vezes, tão grandes, no mundo angélico, estas são ainda maiores, pois a forma está livre das leis biológicas e físicas. Portanto, se é muito grande a diferença entre uma libélula e uma águia, muito maiores são as diferenças entre as naturezas angélicas. Se é enorme a diferença entre uma joaninha e uma baleia azul, indescritivelmente maior é a diferença entre um anjo da nona hierarquia em relação àqueles da primeira.

QUESTÃO 6: Que paralelismo pode ser feito entre a astronomia e a demonologia?

Existe [também] um certo paralelismo entre a astronomia e a demonologia. Um sistema solar é como uma espécie de parábola [que faz uma analogia] do que são Deus, os anjos e os demônios. Deus seria o Astro-Rei, ao redor do qual orbitam todos os demais corpos celestes do sistema solar, pois Ele é o centro que ilumina a todos. O restante de planetas, asteroides e satélites seriam os santos e os anjos. O sistema de rotação dos satélites em torno dos planetas seria como uma imagem da iluminação de uns seres angélicos sobre os outros. Ainda que os satélites girem em torno de um planeta, também giram em torno do Sol. 

Deus é o centro por mais intermediários que possam existir. Assim, os demônios seriam como aqueles corpos que se deixaram afastar da atração do Sol. O Sol os atrai, não os deixa de atrair nunca, não deixa de iluminar e de dar calor. Entretanto, esses corpos se afastaram tanto (livremente) que [agora] vivem nas trevas exteriores, no frio do vácuo e da escuridão. Deus segue atraindo-os, em cada instante, a cada segundo. Mas eles já estão irremediavelmente fora do alcance de sua atração e de sua luz. O Sol não os priva de sua luz; são eles que preferiram desviar-se em direção oposta.

Muitos homens se perguntam onde está a linha divisória entre a condenação eterna e a salvação. Esta parábola astronômica oferece luz sobre o tema, pois tal linha é como o limite [da ação] da força da gravidade.Um [corpo] pode estar já muito afastado, mas se [ainda] está unido à força da gravidade do Sol, está unido a Ele. Por outro lado, se [um corpo] vaga já completamente livre, alheio por completo à ação da gravidade [do Sol], isso constitui a condenação eterna. Se observarmos esta parábola astronômica desde a superfície da Terra, temos de adotar certas variantes (incluir as estrelas, por exemplo) e incluir outras nuances (incluir a Lua, por exemplo). Deus seria o Sol, a Virgem [Santíssima] seria a Lua e os anjos seriam as estrelas.

A diferença entre a luz do Sol e a das estrelas seria uma imagem análoga da diferença entre o ser de Deus e os dos espíritos angélicos. Os anjos seriam como um pálido e débil pontinho de luz em relação à luz ofuscante e irresistível de Deus. A diferença entre a luz das estrelas e da Lua seria a diferença entre [a luz irradiada] pelos anjos e pela Virgem. Aliás, em muitas passagens das Sagradas Escrituras, fica claro que as estrelas, brilhando luminosas no firmamento, são imagens dos espíritos angélicos (como, por exemplo, em Ap 12, 4 e Is 14, 12-15, entre outros).

QUESTÃO 7: Quais são os nomes dos demônios?

Satã: é o mais belo, inteligente e poderoso dos demônios que se rebelaram. É chamado de Satã ou Satanás no Antigo Testamento. A raiz primitiva do nome significa 'atacar', 'acusar', 'ser adversário', 'resistir' e, assim, Satã significaria 'adversário', 'inimigo', 'opositor'.

Diabo: é como Satã é chamado no Novo Testamento. Diabo vem do verbo grego diaballo, 'acusar'. Nós empregamos as palavras diabo e demônio como sinônimos, mas a Bíblia não. A Bíblia sempre utiliza o nome Diabo no singular para referir-se ao mais poderoso de todos os demônios. As Sagradas Escrituras também o chama de 'Acusador', 'o Inimigo', 'o Tentador', 'o Maligno', 'o Homicida desde o princípio', 'o Pai da Mentira', 'Príncipe deste mundo' e 'a Serpente'.

Belzebu: nome utilizado comumente como sinônimo de Diabo; provém de Baal-zebul que significa 'senhor das moscas' (citado em 2 Re 1,2).

Lilith: citado em Is 34,14, é considerado pela tradição judaica um ser demoníaco. Na mitologia mesopotâmica, é representado como um gênio com cabeça e corpo de mulher, mas com asas e extremidades inferiores de pássaro. 

Asmodeu: citado no Livro de Tobias, este nome provém do persa aesma daeva, que significa 'espírito de cólera'.

Seirim: citado em Is 13,21; Lev 17,7 e em Bar 4,35, sendo traduzido como 'os peludos'. O nome deriva do hebraico sa’ir que significa 'peludo' ou “bode'. 

Demônio: do grego daimon que significa 'gênio'; na mitologia greco-romana, não se tratava necessariamente de uma entidade maléfica. No Novo Testamento, porém, é um termo sempre usado para designar seres espirituais malignos.

Belial ou Beliar: da raiz baal, que significa 'senhor'; é citado, por exemplo, em  2 Cor 6, 15.

Apollyon: que significa 'destruidor', citado em Ap 9, 11. Diz-se que o nome hebraico equivalente é Abaddon, que significa 'perdição', 'destruição'.

Lúcifer: é um nome extra-bíblico que significa 'estrela da manhã' ou 'o que leva a luz'. O nome dado a ele por Deus nos dá a conhecer sobre a beleza deste anjo e nos recorda a enorme punição que mereceu. [Por outro lado] nos revela que foi um anjo especialmente privilegiado em sua natureza nos firmamentos angélicos, antes de se rebelar e de se deformar. A imensa maioria dos textos eclesiásticos utiliza o nome de Lúcifer como sinônimo de Diabo. Entretanto, o Pe. Gabriele Amorth considera este o nome próprio do demônio em segundo lugar na hierarquia demoníaca. Compartilho inteiramente da mesma opinião e o que conhecemos dos exorcismos nos confirma que Lúcifer é alguém distinto de Satã.

Como curiosidade, posso dizer que, em um exorcismo, um demônio revelou que os cinco demônios mais poderosos dos infernos seriam, nesta ordem: Satã, Lúcifer, Belzebu, Belial e Meridiano. É verossímil esta hierarquia? Somente Deus o sabe! O que é certo, e o sabemos pelas Sagradas Escrituras e pelos exorcismos, é que cada demônio possui um nome. Um nome dado por Deus que expressa a natureza do seu pecado. Diferentes nomes de demônios revelados por eles em exorcismos são: Perversão, Morte, Porta, Morada, etc. Outros, entretanto, revelam nomes que não sabemos o que significam: ElisedeiQuobad, JansenEishelij, etc. 

Em alguns livros de magia e bruxaria, encontram-se extensas listas de nomes [de demônios]. Estas listas enormes são tão enfadonhas quanto inventadas.  Não têm outro valor que não o da imaginação [fértil] de seus autores. Pois alguns oferecem não apenas as listas de nomes, mas inclusive o número de demônios que povoam o inferno. Essas descrições detalhadas das legiões infernais são essencialmente inventadas. Avançar além dos parcos dados [disponíveis] nas Sagradas Escrituras supõe adentrar no mundo da literatura [fantástica], abandonando o terreno firme da Palavra de Deus.

A Teologia pode nos dizer muitas coisas relativas aos demônios, mas sempre num contexto geral, trabalhando com conceitos. Ao trabalhar na essência [do tema], nada pode dizer sobre um dado demônio concretamente.  O autor de uma certa lista de demônios (tão exaustiva quanto inventada) afirma acerca de um deles, chamado Xaphan, que ele teria sugerido a Satã atear fogo no Céu, mas que teriam sido lançados no inferno antes de cometer o ato hediondo. Diz [ainda] que este demônio está encarregado eternamente de manter acesas as chamas do inferno. É desnecessário dizer que aconselho a este inventor de mitos que leia este livro, onde descobrirá que não há como atear fogo ao Céu, nem maneira de manter acesas as chamas do inferno.

(Excertos da obra 'Summa Daemoniaca', do Pe. Jose Antonio Fortea, tradução do autor do blog)

domingo, 25 de setembro de 2016

O HOMEM RICO E O POBRE LÁZARO

Páginas do Evangelho - Vigésimo Sexto Domingo do Tempo Comum 


Na parábola de Jesus no evangelho deste domingo, confrontam-se os valores da riqueza e da pobreza, presentes no corpo e nos sentidos dos liames humanos, fontes diversas que forjam o abismo incomensurável dos destinos eternos da alma. De um lado, o homem rico, avarento e enfastiado pela opulência dos bens materiais; de outro, o mendigo,  na pobreza de sua indigência completa, que almejava apenas 'matar a fome com as sobras que caíam da mesa do rico' (Lc 16, 21). Duas pessoas tão próximas, tão juntas, como as bordas adjacentes de um abismo profundo moldado pelo paroxismo da indiferença humana.

E este abismo tende a se tornar definitivamente intransponível para ambos ao final de suas vidas mortais. Se há um momento em que todos os homens se tornam absolutamente iguais é a hora da morte. Se há um momento em que os homens se tornam absolutamente desiguais é no momento após a morte. Eis a grande lição do evangelho deste domingo: o céu e o inferno são realidades dogmáticas da fé cristã e o pecado mortal impõe ao condenado a definitiva separação de Deus e sua danação eterna no abismo dos abismos: 'há um grande abismo entre nós; por mais que alguém desejasse, não poderia passar daqui para junto de vós, e nem os daí poderiam atravessar até nós’ (Lc 16, 25).

Ricos e pobres, todos nós seremos julgados não pela medida do muito ou pouco que fizemos nesta vida, mas pela medida com que fizemos bem aquilo que era da santa vontade de Deus. Ao morrer impenitente, o rico passa a viver a miséria da sua perdição; o pobre, que era apenas um nome neste mundo, torna-se o Lázaro na côrte eterna de Abraão. E, em contraposição à mendicância e às súplicas nunca ouvidas às suas portas, o rico irá suplicar três vezes pela clemência de Lázaro em seu favor e ao de seus irmãos: 'manda Lázaro molhar a ponta dos dedos... manda Lázaro à casa do meu pai ... se um dos mortos for até eles...' (Lc 16, 24, 27, 30).

A resposta de Abraão não estabelece concessão alguma: 'Se não escutam a Moisés, nem aos Profetas, eles não acreditarão, mesmo que alguém ressuscite dos mortos' (Lc 16, 31). É uma sentença definitiva sob o primado da verdade eterna. Com efeito, Jesus ressuscitou, mas quantos O escutam? Escutar Moisés e os Profetas é ouvir a Palavra de Deus, seguir Jesus pelas passagens do Evangelho, combater o bom combate da fé, carregar a cruz de todos os dias com Cristo, por Cristo e em Cristo para que um dia, transposta a morte que nos torna homens todos iguais, sejamos os Lázaros da vida eterna.