quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

A BÍBLIA EXPLICADA (XVIII) - A BÍBLIA SEPTUAGINTA


O termo Septuaginta significa 'setenta' em latim e é o nome dado à versão mais antiga conhecida do Antigo Testamento, tendo sido escrito em grego no século III a.C. em Alexandria, para os judeus dispersos pelo mundo. Todo este conjunto de livros sagrados ficou conhecido como 'cânon alexandrino', tendo sido escrito por 72 sábios judeus, enviados pelo sumo sacerdote do Templo para o Egito para traduzir os textos para a língua grega.

Os livros presentes na Septuaginta, conforme a ordem original, são os seguintes: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio, Josué, Juízes, Rute, 1 Samuel (1 Reis), 2 Samuel (2 Reis), 1 Reis (3 Reis), 2 Reis (4 Reis), 1 Crônicas (1 Paralipômenos), 2 Crônicas (2 Paralipômenos), 1 Esdras, 2 Esdras (Esdras e Neemias), Ester, Judite, Tobias, 1 Macabeus, 2 Macabeus, 3 Macabeus, 4 Macabeus, Salmos, Odes, Provérbios, Eclesiastes, Cântico dos Cânticos, Jó, Sabedoria, Eclesiástico (Sirac), Salmos de Salomão, Oseias, Amós, Miqueias, Joel, Obadias, Jonas, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias, Isaías, Jeremias, Lamentações, Baruque, Epístola de Jeremias, Ezequiel, Suzana (7), Daniel, Bel e o Dragão.

Quando o imperador Tito deu a ordem de destruir Jerusalém, alguns rabinos fugiram e levaram os livros sagrados com eles. Reunidos na cidade de Jâmnia, reorganizaram os livros segundo o chamado 'cânon hebraico', omitindo alguns dos livros presentes no cânon original, e dando origem à atual Bíblia Hebraica. Quando os Apóstolos começaram a pregar os evangelhos, usaram a Bíblia Septuaginta ou dos Setenta porque, como era escrita em grego, era mais adequada ao ensino dos gentios, considerando que, naqueles tempos, o grego era a língua universal.

Quando São Jerônimo traduziu a Bíblia do grego para o latim no século IV, adotou o cânon alexandrino para o Antigo Testamento; entretanto, os livros inseridos no cânon hebraico, por terem sido escritos em hebraico, foram traduzidos diretamente para o latim. Estes livros foram chamados de 'protocanônicos', ou seja, do primeiro cânon, pois se imaginou que, uma vez escritos em hebraico, corresponderiam a uma versão mais antiga que aquela escrita em grego. Os livros traduzidos do grego - presentes na Septuaginta, mas sem terem sido traduzidos para o hebraico no cânon judaico - são os chamados livros 'deuterocanônicos'.

Quando Lutero traduziu a sua Bíblia para o alemão, em 1522, embora incorporando os livros 'deuterocanônicos', considerou-os apócrifos, por não possuírem uma versão correspondente em hebraico e, por esta razão, as bíblias protestantes os excluíram. Tal exclusão é baseada no pressuposto de que, não existindo uma versão hebraica, não podem ser originais, o que torna 'invenção' da Igreja o que não consta dos 'livros originais' (a doutrina católica do Purgatório, por exemplo, encontra-se no Capítulo XII do Livro de Macabeus II). Os chamados livros 'deuterocanônicos' são os seguintes:

O Livro de Tobias
O Livro de Judite
As chamadas 'adições gregas' do Livro de Ester
O Livro da Sabedoria
O Livro do Eclesiástico 
O Livro de Baruc
A Carta de Jeremias (Baruc 6)
As 'adições gregas' do Livro de Daniel
Oração de Azarias (Daniel 3: 24-50)
O Hino dos Três Jovens (Daniel 3: 51-90)
A história de Susana (Daniel 13)
A história de Bel e do Dragão (Daniel 14)
O Livro dos Macabeus I
O Livro dos Macabeus II

Muitos anos mais tarde, somente no século XX, a partir da descoberta de versões de alguns livros deuterocanônicos escritos em hebraico e de outros protocanônicos em Qumran, no Mar Morto, é que se confirmou ser a Septuaginta mais antiga que o cânon hebraico e, portanto, constituir a versão mais original dos textos bíblicos. 

FOTO DA SEMANA

'Que fareis vós no dia do ajuste de contas, e da tempestade que virá de longe? Junto de quem procurareis auxílio, e onde deixareis vossas riquezas?' (Is 10, 3)

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

10 HORAS PARA O MUNDO

Uma vez, havia um homem, cuja esposa com quem foi legalmente casado, era encantadora e prudente. No entanto, ele gostava mais da empregada doméstica do que sua esposa. Isto teve três consequências. A primeira é que as palavras e gestos da empregada o agradava mais do que as da sua esposa. A segunda é que ele vestia a empregada muito bem com roupas finas sem se importar que sua esposa estivesse vestida de andrajos comuns. O terceiro é que ele estava acostumado a gastar nove horas com a empregada e apenas a décima hora com sua esposa. 

Ele passou a primeira hora ao lado da empregada, divertindo-se ao olhar para sua beleza. Ele passou a hora segunda dormindo em seus braços. Ele passou a hora terceira fazendo alegremente trabalho manual pelo amor ao conforto da empregada. Ele passou a hora quarta fazendo descanso físico com ela após exaustivo trabalho físico . Ele passou a hora quinta inquieto em sua mente e preocupando-se sobre como sustentá-la. Ele passou a sexta hora em repouso com ela, vendo agora que ela aprovou totalmente o que ele tinha feito por ela. Na sétima hora, o incêndio de luxúria carnal entrou nele. Ele passou a oitava hora satisfazendo toda sua luxúria com ela. Na hora nona ele negligenciou determinadas tarefas que ele, no entanto, teria gostado de realizar. 

Ele passou da hora décima fazendo algumas tarefas que ele não quis fazer. E apenas durante esta hora ele ficou com sua esposa. Um dos parentes de sua esposa veio ao adúltero e lhe acusou duramente, dizendo: 'converta a afeição de seu coração na direção de sua esposa legítima. Ame-a e vista-a adequadamente e gaste nove horas com ela e apenas a décima hora com a empregada doméstica. Se não, cuidado, porque você morrerá uma morte súbita e horrível'.

Por esse adúltero a que me refiro, é alguém que possua o ministério de bispo para suprir a Igreja, mas, apesar disso, leva uma vida adúltera. Ele está associado à Santa Igreja em união espiritual para que ela seja sua noiva mais preciosa, mas ele retira seus afetos dela e ama o mundo servil muito mais do que sua nobre dama e noiva. Assim, ele faz três coisas. Em primeiro lugar, ele se alegra mais na adulação fraudulenta do mundo do que numa disposição obediente em direção a Santa Igreja. Em segundo lugar, ele ama enfeites mundanos, mas se interessa pouco sobre a falta de enfeites materiais e espirituais da Igreja. Em terceiro lugar, ele gasta nove horas com o mundo e apenas uma das dez com a Igreja Santa. 

Assim, ele gasta a primeira hora na em boa alegria, contemplando a beleza do mundo com grande satisfação. Ele gasta a hora segunda dormindo docemente nos braços do mundo, isto é, no meio de suas fortificações elevadas e a vigilância de seus exércitos, alegremente confiante na segurança física por causa dessas coisas. Ele passa a terceira hora alegremente a fazer trabalho manual por amor a vantagens mundanas para que ele possa obter o prazer físico do mundo. Ele passa a quarta hora com prazer tendo descanso físico após seu esforço físico, agora que ele tem meios suficientes. Ele gasta a hora quinta inquieto em sua mente de maneiras diferentes, preocupado com como ele pode parecer ser prudente em matérias mundanas. 

Durante a sexta hora ele experimenta um agradável descanso de alma, vendo que pessoas em todo a parte aprovam o que ele tem feito. Na sétima hora, ele ouve e vê prazeres mundanos e abre sua luxúria para eles. Isso provoca um incêndio a arder impaciente e intoleravelmente no seu coração. Na oitava hora que ele realiza em atos o que antes tinha apenas sido sua ardente vontade. Durante a hora nona, ele omite por negligência determinadas tarefas que ele queria ter feito por motivos mundanos, para não se ofender aqueles para quem tem uma mera natural afeição. 

Na décima hora, ele executa sem alegria alguns atos bons, com medo de que ele possa cair no desprezo e ganhar má reputação ou receber uma pena severa, se por algum motivo, ele totalmente haja negligenciado em cumpri-los. Ele é acostumado a gastar apenas esta décima hora com a Santa Igreja fazendo o bem não por amor mas por medo. Ele está, naturalmente, com medo de punição dos incêndios do inferno. Se ele pudesse viver para sempre no conforto físico e com abundância de bens mundanos, ele não se preocuparia em perder a felicidade do céu. 

(Das Profecias e Revelações de Santa Brígida da Suécia)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

O DOM DE LER OS CORAÇÕES (CURA D'ARS)


Por volta de 1833, Marguerite Humbert, de Ecully, então Madame Fayolle, fez uma visita - a primeira em quinze anos - ao seu primo, Jean-Marie Vianney. Ela estava então sob os cuidados das Filhas da Providência, a pedido do próprio cura, particularmente porque ela tinha cuidado dele durante o tempo dos seus estudos. Ela relata o ocorrido: 'Pouco antes de partir [da cidadezinha de Ars], retornei à igreja [onde o cura atendia confissões] e me perguntei se deveria ou não confessar-me com o meu primo. Neste exato momento, alguém me chamou e me comunicou que o cura estava à minha espera. Fiquei muito surpresa porque ele não podia ver onde eu me encontrava ... Deixei Ars cheia de uma grande alegria interior'.

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Um dia, o servo de Deus estava ouvindo confissões na sacristia. O relato é de M. Oriol: 'De repente ele apareceu na entrada da sacristia e, dirigindo-se a mim, falou: 'Meu amigo, peça aquela senhora que está nos fundos da igreja para vir até aqui'. E me disse então como eu deveria reconhecê-la. Sem encontrar tal pessoa no local onde ele havia indicado, retornei e lhe comuniquei o fato. Ele respondeu então: 'Vá depressa ... Ela está passando na frente de tal casa [e a descreveu rapidamente para mim]. Eu corri e alcancei a senhora no lugar mencionado; ela estava indo embora, muito decepcionada por não ter podido confessar, porque não podia esperar mais. A pobre mulher, que por excessiva timidez tinha perdido a oportunidade de se confessar com o cura umas duas ou três vezes anteriormente, estava há oito dias em Ars sem conseguir uma nova oportunidade de se confessar. Agora o próprio santo havia ido buscá-la; mais do que isso, ele a conduziu desde a entrada da igreja até a Capela de São João Batista para receber a sua confissão. O santo sabia que a graça tem os seus momentos e que ela pode passar e não voltar mais. Neste caso em especial, ele literalmente apanhou essa alma com as asas'.

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No ano de 1853, um alegre bando de jovens partiu de Lyon para ir em peregrinação a Ars. Todos eles eram bons cristãos, exceto um, um velho homem que havia se juntado ao grupo 'simplesmente para agradar aos jovens'. Eles chegaram à aldeia por volta das três horas da tarde. 'Vocês podem ir à igreja, se quiserem', disse o incrédulo aos demais 'quanto a mim, vou pedir o jantar'. Ele caminhou alguns passos e parou: 'Não, pensando bem, eu vou com vocês, porque isto não deve demorar muito'. Em seguida, todo o grupo entrou na igreja. Neste momento, o Cura d'Ars saiu da sacristia e entrou na capela-mor. Ele se ajoelhou, levantou-se e virou-se; seus olhos estavam procurando alguém próximo à pia de água benta; finalmente, ele sinalizou para alguém se aproximar. 'É você que ele está chamando' disseram os jovens ao velho incrédulo. Este se dirigiu titubeante ao cura, no relato da freira que nos conta esta história. O Cura apertou as suas mãos, dizendo: 'Tem muito tempo que você não faz uma confissão?' 'Meu bom cura, tem uns trinta anos, eu acho...' 'Trinta anos, meu amigo?'... acho que são trinta e três anos ... e você a fez em tal lugar [mencionando o lugar]. 'Você está certo, senhor'. 'Ah, bem, então nós vamos fazer nossa confissão agora, não vamos?' O velho homem confessou mais tarde que ele estava tão surpreso com o convite que não se atreveu a dizer não; mas acrescentou: 'Eu experimentei uma sensação de conforto indescritível'. A confissão levou cerca de vinte minutos, e fez dele um novo homem.

domingo, 24 de janeiro de 2016

O UNGIDO DO PAI

Páginas do Evangelho - Terceiro Domingo do Tempo Comum


O Evangelho de São Lucas traduz, em larga escala, a personalidade ímpar do autor, de alguém que, embora possa não ter sido testemunha ocular dos acontecimentos narrados: 'como nos foram transmitidos por aqueles que, desde o princípio, foram testemunhas oculares e ministros da palavra' (Lc 1, 2), elaborou uma obra regida particularmente pelo rigor da informação e por uma ordenação lógica dos eventos associados à vida pública de Jesus: 'após fazer um estudo cuidadoso de tudo o que aconteceu desde o princípio, também eu decidi escrever de modo ordenado' (Lc 1, 3), o que a torna fruto do trabalho de um eminente escritor e historiador: 'Deste modo, poderás verificar a solidez dos ensinamentos que recebeste' (Lc 1, 4).

Desta forma, a par a semelhança e a mesma contextualização geral com os demais evangelhos sinóticos (São Mateus e São Marcos), o evangelho de São Lucas é pautado por uma visão própria, objetiva e cronológica da doutrina e dos ensinamentos públicos de Jesus (tempo presente da narrativa), inserida num contexto histórico do passado (Antigo Testamento) e do futuro (tempo da Igreja), incorporando, assim, um caráter muitíssimo pessoal e, portanto, original, à transcrição das mensagens evangélicas. 

Após um preâmbulo típico do rigor objetivo do historiador, São Lucas desvela o instrumento de evangelização adotado por Jesus - a pregação pública e sua estrita observância, neste sentido, aos preceitos da Lei - a leitura, aos sábados, da palavra sagrada nas sinagogas. No seu primeiro retorno à Nazaré, foi convidado a ler e a comentar uma passagem do Livro de Isaías: 'Abrindo o livro, Jesus achou a passagem em que está escrito: O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para anunciar a Boa-nova aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos cativos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos e para proclamar um ano da graça do Senhor' (Lc 1, 17 - 19).

Ao recolher o rolo de pergaminho e se sentar, ao final da leitura 'todos os que estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele' (Lc 1, 20), porque, de certa forma, compreendiam a grandiosidade deste momento, que se materializou, então, com a manifestação direta e sucinta de Jesus: 'Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabastes de ouvir' (Lc 1, 21), anunciando aos homens ser Ele o Ungido pelo Espírito Santo para fazer novas todas as coisas, para abrir os tempos do Messias esperado por todo Israel e para testemunhar aos homens a presença viva do Reino de Deus sobre a terra. 

sábado, 23 de janeiro de 2016

SOBRE A PACIÊNCIA

Paciência é a virtude pela qual suportamos os infortúnios deste mundo com tranquilidade de espírito, para que em razão deles não fiquemos desnecessariamente perturbados ou entristecidos interiormente, e não nos permitamos fazer nada de errado ou de inadequado. As adversidades desta vida que a paciência suporta são doenças, desterros, angústia psicológica, desgraça, escárnio, maltrato, insultos, calúnias, reprimendas, fome, sede, frio, as mortes dos pais e dos filhos, dos parentes e dos amigos, massacres e calamidades públicas, e outras coisas da mesma espécie que geralmente ocorrem todos os dias. 

A longanimidade é a parte da paciência que fortalece o espírito contra o aborrecimento ocasionado pela demora em receber algo que esperamos. Ela difere da paciência por suportar males por um longo tempo e aguardar consolação postergada por muitos dias, meses e anos. Assim Deus é chamado longânime, porque Ele tolera nossas demoras e hesitações enquanto nos convida ao arrependimento. Também a equanimidade não é uma virtude distinta da paciência, embora seja considerada especialmente voltada a moderar o aborrecimento que advém da perda de bens exteriores.

A matéria próxima com que a paciência se ocupa é a aflição da mente e a tristeza por conta dos reveses enumerados acima: essa virtude as reprime por inteiro ou então as controla tanto, que elas não excedem as exigências da reta razão. As principais ações da paciência são:

(i) Suportar todas as sobreditas adversidades calmamente, de bom grado, com ânimo e em ação de graças, e sem nenhuma murmuração ou queixa;
(ii) Suportar esses males mesmo não tendo culpa, e mesmo que nos sejam infligidos por aqueles que receberam muitos benefícios de nós;
(iii) Atribuir todos os nossos problemas e dificuldades unicamente à vontade Divina, não importa por intermédio de quem provenham;
(iv) Sempre que estivermos feridos ou irritados, voltarmo-nos para Jesus crucificado como estando presente, buscando obter d’Ele a paciência e oferecendo a Ele tudo o que sofremos;

(v) Oferecer-se a si próprio, bem no começo de todas as manhãs, a Deus para sofrer não importa o quê, e para suscitar um desejo ardente na alma de sofrer todos os males possíveis em imitação de Cristo.

Nós temos muitas ocasiões para exercitar a paciência a quase todo momento, suportando os males e perdas que nos acometem com respeito a nossa boa reputação, vida e bens exteriores. Os sinais da paciência são:

(i) Suportar com calma as imperfeições dos outros;
(ii) Não ceder ao rancor quando maltratado pelo próximo;
(iii) Não murmurar contra as punições divinas;
(iv) Não evitar a companhia daqueles que cometem injustiça contra nós, mas antes ir ao seu encontro, ter amor por eles e por eles rezar;
(v) Em alguma enfermidade, rezar a Deus que aumente nosso sofrimento;
(vi) Manter silêncio em meio às injustiças, não se desculpar, mas entregar tudo nas mãos de Deus a exemplo de Nosso Senhor que, mesmo quando convocado a Se defender, preferiu permanecer em silêncio.

Agora, quem não faria tudo o que está em seu poder para exercer essa virtude com máximo cuidado, considerando a paciência e longanimidade de Deus, que não somente tolera os pecadores com benevolência, mas não cessa de cobri-los com os maiores benefícios? E a vida de Cristo e Sua amaríssima paixão não proporcionam o exemplo supremo de paciência?

Nem deve ser preterido o exemplo dos santos do Antigo e do Novo Testamentos, principalmente de Jó e Tobias e dos incontáveis mártires. Ademais, quem quer que considere atentamente os inomináveis tormentos do inferno, de que tão frequentemente escapou por conta da infinita misericórdia de Deus, não considerará os aborrecimentos desta vida, não importa quão graves e dolorosos, como de nenhuma importância, e até os tratará como prazeres?

Finalmente, como diz o Apóstolo: 'A paciência vos é necessária' (Hb 10,36), pois ela fortalece a fé, governa a paz, auxilia o amor, instrui a humildade, excita o arrependimento, faz satisfação pelos pecados, ata a língua, refreia a carne, resguarda o espírito, aperfeiçoa todas as virtudes e dota-nos ao fim desta vida com a bem-aventurada imortalidade: 'Porque agora o que é para nós uma tribulação momentânea e ligeira, produz em nós um peso eterno duma sublime e incomparável glória' (2 Cor 4,17).

(Excertos da obra 'Manual da Vida Espiritual', do  Pe. C. J. Morotius)