sábado, 11 de julho de 2015

DAS GRAÇAS EXCELSAS DE MARIA (II)

O RETRATO DE MARIA

Traçar o retrato da Virgem Maria - não seria isso uma temeridade sem nome? Como poderemos reproduzir a celeste fisionomia daquela que excede a toda beleza que se possa imaginar? Um dia, num arrojo de seu gênio, Fra Angelico quis representar-lhe na tela os traços incomparáveis. Ele tentou pintar a Anunciação. O ideal cintilava ante o seu espírito mas, na impossibilidade de reproduzi-lo, foi lançar-se aos pés de sua doce Mãe e esta, tocada pelas lágrimas do seu filho amoroso, fez acabar pelos anjos o quadro começado.

Ó doce e terna Mãe, assim como a Fra Angelico, vinde também esboçar o quadro de vossa beleza, para que a vossa fisionomia de Virgem e de Mãe atraia os corações e todas as almas viventes à chama ardente do amor. Nenhum retrato, nenhuma descrição completa nos transmitiu ainda a fisionomia da Santíssima Virgem. Mas, nos escritos dos primeiros doutores e de quase todos os santos, encontram-se palavras autorizadas que, confrontadas entre si, permitir-nos-ão entrever algo deste doce e simpático semblante de nossa Mãe.

Santo Epifânio diz que Maria tinha uma estatura um pouco acima da mediana. A sua face, de forma oval, era de notável fineza e de perfeita simetria em seus traços. São Nicéforo compara a cor do Seu rosto ao frescor do trigo sazonado, apresentando, assim, um cor róseo-pálida.. Os seus dedos eram longos, e tudo em sua pessoa era bem proporcionado e repleto de uma gravidade tão doce e atraente, que nada se podia comparar à sua beleza.

As telas atribuídas a São Lucas, e que datam incontestavelmente dos primeiros tempos do cristianismo, dão-lhe sempre um colorido de uma notável pureza. Nelas, a fronte é elevada, lisa e alva; as sobrancelhas bastante louras e suavemente arqueadas. Santo Epifânio e São Nicéforo, nas expressões que empregaram para indicar a cor dos olhos, indicam o azul-pálido. Os mesmos autores assinalam ainda a doçura e irresistível atração do seu olhar.

Estas representações indicam-na ainda tendo o nariz e a boca moderadamente delicados, os lábios de róseo carregado, as faces coloridas e o maxilar suavemente arredondado. Segundo Santo Epifânio, São Nicéforo e São Gregório Nazianzeno, sua cabeleira era loura, e eles acrescentam que Maria deixava os seus cabelos flutuarem livremente sobre os ombros. As suas vestes, como as que ainda hoje costumam usar as mulheres da Palestina, eram: a túnica de lã branca ou ligeiramente azulada, cinto de estofo simples, enrolado, véu branco, cobrindo-lhe a fronte, flutuando sobre os ombros e descendo até ao solo.

Um cuidadoso asseio fazia sobressair-lhe as vestes mais comuns e distinguia a humilde Virgem em suas maneiras e em suas conversações. Modesto e circunspecto era o seu porte, graves os seus passos e sem pretensões; o seu olhar era doce, firme e límpido e a sua voz afável e atenciosa. Um ligeiro e simpático sorriso, testemunho de sua bondade, aflorava-lhe os lábios. O seu exterior, irradiando benevolência e candura, inspirava a virtude. A sua presença parecia santificar o ambiente e as pessoas, nas quais tendiam irradiar-se a sua beleza, de tal modo que, ao seu aspecto, todos os vãos pensamentos da terra se afastavam, como desaparece o orvalho ao raiar do sol matinal.

As suas palavras eram sempre comedidas, quanto a sua conversação era calma e nobre, excitando ao bem e à virtude. Todos aqueles que tinham a felicidade se de entreter com ela não podiam admirar bastante o esplendor de suas perfeições e de suas inumeráveis graças. O mais belo dos elogios que se lhe pôde dirigir está nesta observação de São Nicéforo:

'Onde acabava a natureza, começava a graça, e o mais elevado grau de beleza que possa ter existido em uma simples criatura era apenas o primeiro grau da graça, pois lhe estava reservado completar esta obra-prima. Deste modo brilhava um quê de divino em suas ações'... e mais, 'a santidade com que Deus cumula a sua alma, transparecia nos seus gestos, em suas palavras, em seu olhar e em todos os seus movimentos'. A modéstia brilhava sobre a sua fronte; a doçura em seus olhos; o pudor em suas faces; a virgindade na alvura nívea do seu colo, de modo que todas as virtudes haviam nela encontrado a sua sede.

'Ela era unigênita de seu pai e de sua Mãe, que era estéril', diz São Pedro Crisólogo, 'para que nós soubéssemos que era menos uma obra da natureza do que uma obra-prima da graça e uma maravilha da mão do Onipotente'. Em uma palavra, os dons da natureza e da graça, que nela resplandeciam, tornaram-na tão divinamente bela, que teria sido até considerada como sendo uma divindade, se a fé não nos tivesse ensinado que ela era uma simples criatura, transfigurada pela graça.

Considerando tanta beleza, exclama, abismado, São João Damasceno: 'Eu Vos saúdo, ó Virgem dulcíssima; a vossa graça extasia e cativa a minha alma. Como descrever a nobreza de vossos traços?Como exprimir a simplicidade de Vossos adornos? Como reavivar algum dos mais débeis raios de vossa beleza? A majestade que ilumina toda a vossa pessoa é igualmente realçada e atenuada pela doçura do vosso olhar. Os vossos colóquios desalteram e trazem ânimo como tudo o que brota de um coração amoroso'

Aliás, convinha à Santíssima Virgem possuir tão excelente beleza, como já o dissemos, pois ela devia comunicar ao seu divino Filho, não somente a natureza corporal, mas também os traços do seu semblante, e isto de um modo muito mais inefável do que o fazem as outras mães aos seus filhos, porque só ela devia cooperar para a formação do corpo do seu Filho.

(Excertos da obra 'Por que amo Maria', pelo Pe. Júlio Maria)