sexta-feira, 19 de setembro de 2014

HORA SANTA DE SETEMBRO


Caía a tarde da Quinta-Feira Santa... Junto com as primeiras sombras, os horrores de uma agonia espantável inundavam já o Coração dilacerado de Jesus. O Nazareno Salvador era o Filho do Homem, tinha uma Mãe, única em Sua ternura, divina em Sua formosura! Seu carinho e olhar eram para Jesus mais que o canto dos anjos, mais que a brisa perfumada dos céus. Era Ela a bênção do Pai. E devia deixá-la, por amor aos homens!

Ó Quinta-Feira Santa, dia das despedidas supremas do Mestre! Havia chegado Sua hora: prostrado por terra, de joelhos ante a Virgem Maria, o Filho-Deus lhe pede licença para morrer, para a redenção de Seus verdugos. E entrecortada a voz pelos soluços, descansando Sua cabeça soberana sobre o peito de Sua Mãe, lhe confia Jesus Suas ovelhinhas recuperadas do rebanho. Maria O tem apertado em Seus braços, pondo a lembrança no berço de Belém, e os olhos, milagrosamente iluminados, no Calvário de amanhã.

E essa Rainha chora, ungindo a cabeça do Redentor com Suas preciosas lágrimas; chora, oferecendo ao Eterno Pai essa Vítima, o Cordeiro Imaculado; chora, bendizendo ao mundo, cujo resgate começou no casebre ditoso de Nazaré, e que terminará no dia seguinte em um cadafalso de horror, de sangue e de vergonha. Abraça, delirante de amor, ao Filho, e antes que os espinhos profanem Sua fronte, a beija em nome do céu, porque é Seu Deus; volta a beijá-lO em nome da terra, porque é Seu Rei, e pronuncia um fiat! dilacerador, onipotente... Era já a noite; Jesus confiou Sua Mãe desolada aos amigos de Betânia e aos anjos, e Se separa, levando a alma inundada numa agonia mais amarga que a morte.

(Pausa)

As almas 

Jesus sacramentado, recordai-Vos nesta hora e neste dia incomparável, Vossa primeira angústia crudelíssima: o sacrifício de Vossa Mãe, por amor ao mundo infeliz. Senhor, não somente como Deus que sois, senão como Jesus, o Filho de Maria, Vós penetrais e compreendeis a crueldade mortal das separações da Terra e a dor que provocam as ausências, as despedidas e a morte. Ah!, precisamente porque sois Jesus, viemos, pois, nos desafogar naquela primeira ferida de Vosso Coração, aberta ao Vos despedir de Maria, dolorosa como nenhuma Mãe, desde esse instante.

Vede nela, Jesus, tantas mães, tantas esposas, tantas almas que choram hoje ante o Sacrário, a ausência de seres muito queridos. Quantas chegarão amanhã, sozinhas, ante a Cruz ensanguentada. Sim, virão sozinhas, porque a desgraça, ai!, e talvez a falta de fé, tenham separados do lar ou de vossos templos um irmão, um esposo ou algum filho separados, mas não despedidos, mil vezes não, do Sacrário de Vosso Coração, que é a ressurreição dos caídos. Nele, como num cálice, vêm chorar convosco, neste Getsêmani, as angústias da ausência, muitas mães atribuladas, tantos pais cristãos, muitos irmãos desolados, que reclamam de Vosso Coração a paz, no triunfo de Vosso amor em seus lares, a paz no regresso dos pródigos, a paz na resignação pelas crueldades da morte.

Não importa que soframos nós, Mestre, aqui a Vosso lado; mas que os nossos sejam também Vossos, que Vos adorem, que Vos amem todos, como no dia sem manchas da Primeira Comunhão. Ó, doce Nazareno, recordai as aflições de Maria, ao Vos despedir dela, na Quinta-Feira Santa, não esqueçais o último abraço de Vossa Mãe, e o encargo que Vos fez de velar, com especial ternura, na Eucaristia sacrossanta, pelas mães doloridas e por todos os ausentes do lar.

(Pausa) 

(Pedi aos Sagrados Corações de Jesus e de Maria que, pela mútua aflição da Quinta-Feira Santa, remediem tantas desgraças morais dos lares; neste dia em que nos obsequiou Seu Coração na Santa Eucaristia, Ele não pode nos negar essa graça).

Com o Coração dilacerado, umedecido o peito e os cabelos com as lágrimas de Sua divina Mãe, sobe Jesus a colina de Sião e chega com os Seus à sala da última Ceia de Sua vida. Está ferido de amor. O choro avermelhou Seus olhos formosíssimos, e se esforça todavia em brotar abundantemente; mas o Mestre o contém prisioneiro em Seu Coração, que já agoniza. 'E como nos houvesse amado sempre com amor sem limites, nessa hora sublime, nos amou com excesso', com delírio infinito: deliciosamente enlouquecido, por Sua própria caridade, se fez Pão, se fez Eucaristia e, indefeso, aniquilado, Se entregou na Hóstia por nós, até a consumação dos tempos: 'Venceu-Vos o amor, que é Jesus. Viva Vosso Coração Sacramentado!'.

(Pausa)

Ao recordar a dádiva por excelência do Coração de Jesus Cristo, Sua maravilhosa Eucaristia, temos exclamado, com ardor da alma: 'Viva Vosso Coração Sacramentado!'. Mas ai!, não é esse, não, o grito de um mundo que herdou a dureza de um povo deicida, e ainda a perfídia do discípulo traidor. Aí tendes a Deus Sacramentado, aí está, decepcionado com milhares de Seus redimidos. Fabricou a prisão do Sacrário, inventou o céu da Hóstia, e Seu povo Lhe pagou com o esquecimento. Seu povo fez silêncio ao redor da Arca Santa, e aí onde O vedes, almas consoladoras, aí O tendes abandonado entre as sombras desse pobre calabouço, sendo Deus, que é a bem-aventurança dos céus.

Chama, e Sua voz se perde no deserto; pede, e Seu reclamo se dissipa no silêncio; Se queixa e Seu gemido é apagado, muitas vezes, com o clamor de Seus filhos, que riem e cantam, despreocupados por completo do Cativo do altar. E o Homem-Deus conheceu esta afronta, e a saboreou em toda sua inefável amargura, ao consagrar o primeiro pão, na Quinta-Feira Santa. Ó sim, o soube, e Seu Coração não vacilou, porque esperava a vós, almas fidelíssimas, porque as via chegar com uma oração de consolo e de vitória, ante Seu altar! Digamo-la com uma só voz, e que essa oração seja a um tempo o desagravo desse ignominioso esquecimento e o pedido imperioso de uma nova época de triunfo para o Coração de Jesus - Eucaristia.

As almas

Com o íntimo fervor com que comungou São João, de Vossa mão benditíssima, e com a fé ardorosa de São Paulo, Vos suplicamos, Jesus Sacramentado, que desperteis nas almas incontáveis desejos de comungar. Conjuramo-Vos, pois, que nos escuteis:

(Todos, em voz alta)

Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Pela primeira Comunhão, distribuída a Vossos apóstolos na Ceia misteriosa da Quinta-Feira Santa...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Pelos protestos de amor e de fidelidade, de Vossos discípulos ao lhes entregar o tesouro de Vosso Sagrado Coração...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Pelo poder maravilhoso conferido aos apóstolos e pela instituição do sacerdócio para a perpetuidade dos mistérios eucarísticos...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia. 

Pela renovação, não interrompida desde então, do holocausto do Cenáculo e da Cruz, no maravilhoso Sacrifício da Missa...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Pelas inesgotáveis bondades de Vosso Coração, nas vitórias outorgadas à Vossa Igreja pelo Sacramento do altar...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia. 

Pelos prodígios incessantes de santificação, operados na recepção frequente e cotidiana do maná sacramentado...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Por Vossa residência fidelíssima de vinte séculos de Sacrário, não obstante o esquecimento, o desdém e o sacrilégio...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Pela sabedoria de Vossa Igreja, ao convidar com santa pressa à recepção frequente e diária da adorável Eucaristia...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

Pela ternura redentora que abriu aos pequeninos de um mundo que se perde, o refúgio de Vosso Coração de Vosso Santo Tabernáculo...
Reinai, Coração Divino, pela Comunhão de cada dia.

(Pausa)

(Pedi com especial fervor o triunfo do Sagrado Coração na Comunhão diária)

Ele que é Senhor do céu e soberano na Terra, é já o divino escravo dos homens; o que nos deu a vida, Se aniquilou, o que rompeu nossas correntes, as tomou para Si, e é, por amor incompreensível, prisioneiro nosso desde o Cenáculo.

Arrastando invisíveis cadeias, interna-se entre os esquecimentos do Getsêmani... e, caindo aí de joelhos, ora e começa a agonizar. Fecunda-se, nesse instante, a tempestade de todas as dores sobre Seu Coração despedaçado, e, em meio de todas as angústias, repete, entre soluços: 'Amo-os, Pai! Feri-Me, mas salvai, perdoai os humanos!'; aumentam as angústias; passaram os carrascos, os blasfemos, os insultadores de Vossa Cruz, os negadores de Vosso Evangelho e de Vosso amor. E tendes repetido: 'Amo-os, Pai!. Perdoai os humanos!'.

Passaram os apóstatas, os infelizes renegados, que pisotearam o altar em que adoraram; passaram a multidão infinita dos covardes, dos que temeram confessá-lO, dos que se envergonharam de seu Rei e Salvador, e tendes exclamado, dolorido: 'Amo-os, Pai! Perdoai os humanos!'. Passaram os perseguidores de Vossa Igreja, os que lutaram mentindo, os sedutores dos povos, os hipócritas, os soberbos; passaram os ruins, os indiferentes de consciência, a turba incontável dos gozadores que profanaram a alma num lodaçal de paixões nefandas e o divino Agonizante tem repetido: 'Amo-os, Pai! Salvai, perdoai os humanos!'. Passaram os sacerdotes tíbios e infiéis, os pais mundanos e culpáveis da perdição de seus filhos; passaram os lares com todos seus delitos, as sociedades com todas suas orgias, os povos e governantes com todas as suas insultantes rebeldias; passaram os que esbofetearam o Pontífice, Seu Vigário, e soluçando e afogando nesse lago insondável de tédios, de horrores e agonias, tendes ainda balbuciado: 'Sim, os amo, Pai, os amo! Perdoai os humanos!'

Ai, como milhares de seitas vieram, enfim, a açoitar sacrilegamente Vosso rosto e transpassar Vosso Coração; os nomes dos malditos..., daquela legião inumerável de réprobos que, ungidos por Vosso sangue e resgatados com Vossa morte, quiseram, no entanto, morrer e maldizer eternamente! Estala, então, o Coração de Jesus num soluço de dor infinita, e essa palpitação violenta rompe Suas veias. Empalidece Jesus; mas, um instante depois, Seu rosto lívido, Seus cabelos desgrenhados, todo Seu corpo estremecido está encharcado em sangue. Cai então com a face sobre o pó, exclamando: 'Pai, é aqui que vim fazer Vossa vontade; mas, se for possível, afasta de mim este cálice!' Estava prostrado por terra ainda quando ressoaram nossos nomes em seu Coração agonizante.

Nos viu, sim, nos viu a nós que estamos aqui presentes, nesta Hora doce e santa de consolo. Baixamos nós com o anjo para sustentá-lO. Sentiu que O fazíamos descansar, desfalecido, entre nossos braços, que O confortávamos com sacrifícios, com ternura, com amor da alma; e desde então nos segue olhando, através de Suas lágrimas e das grades de Seu cárcere, como os amigos, como os confidentes de Seu entristecido Coração. Esse mesmo Coração palpita aí, nessa misteriosa tumba. Calemos, e que os batimentos de Seu coração nos contem Suas aflições secretas, Seus reclamos de amor, Seu desejo de triunfo.

(Pausa)

(Consagrai-vos nesta Hora mil vezes Santa a Seu Sagrado Coração, e jurai-Lhe amor eterno, em Sua Divina Eucaristia) 

Era plena noite: 'Vamos' – disse, de pronto, Jesus despertando os Apóstolos - 'vamos, pois se aproxima o que vai Me entregar'. Um momento mais, e Seu Coração se estremeceu, cruelmente torturado, à vista de Judas, o traidor. Havia-o amado tanto! Havia-o predestinado entre milhares; o fez Seu apóstolo e sacerdote; por um vil punhado de moedas vem entregar o Salvador! Estende-lhe os braços... e aproximando-se do rosto de Jesus, onde o beijou Sua Mãe Imaculada, aí o beija Judas. Dulcíssimo, mas profundamente comovido, lhe diz Jesus: 'Amigo, com um beijo me entregas?' Ai, como não se perdeu, em tantos séculos, essa palavra de infamante reprovação! É que os traidores vivem ainda espiando Seu Mestre. Essa raça perdura, vive de Seu sangue, segue sorteando Sua túnica e negociando Seu Evangelho. E o Senhor Jesus, porque é manso e porque é eterno, cala nesse Tabernáculo, testemunha das promessas que fizeram, monumento acusador das traições.

Beijam-nO e O entregam tantos, ai! que por renegar seu Mestre, recebem postos importantes, situação e moedas vis, sempre cobiçadas. Beijam-nO com perfídia e O entregam os infelizes que se dizem desenganados de Sua doutrina salvadora e que não suportam a santidade de Seu olhar e de Sua lei. Beijam-nO e O entregam tantos tímidos, que temem aos doutores e fariseus que perseguem a esse Deus, que condena a falsidade e toda covardia. E estes Judas são refinadamente cruéis com Jesus, que se aproximam dEle com fingimento de respeito, O traem, segundo dizem, por dever iniludível de sua situação, por honradez de convicção, por delicadeza de consciência.

As almas

Ó nesta Hora Santa, sepulta no esquecimento o ultraje sangrento de tantos que se sentaram em Vosso banquete, que participaram de Vossas confidências, que foram Vossos amigos e depois Vos pospuseram à escória da Terra!

(Todos, em voz alta)

Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pela imensa dor que afligiu Vosso Coração, na traição vilã do apóstolo, que Vos entregou com um beijo de perfídia...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pela decepção sofrida na fuga vergonhosa dos onze discípulos, que haviam jurado amar-Vos até à morte...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pela amargura saboreada na tripla negação de Pedro, pelas lágrimas humildes com que reparou sua presunção e, depois, sua lamentável covardia...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pelo horrível desengano de Vosso povo, que depois de glorificar Vosso nome, aclamou Vossos carrascos e exigiu Vosso sangue...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pela aflição que sofrestes pela ingratidão daqueles que curastes em Vosso caminhos, que recolheram Vossos prodígios e se unirão, no entanto, à turba deicida...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pelo pranto que arrancou de Vossos olhos a maldição daquelas mães, cujos filhos bendissestes; pelo lodo que esses meninos lançaram em Vosso rosto...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pela profunda ferida que Vos abriu o desespero de Judas, ao desconfiar de Vossa misericórdia inesgotável...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pelas tristezas que Vos causaram as inumeráveis deserções previstas no Getsêmani, e que Vos ultrajaram, dilacerando no transcurso dos séculos, a túnica irrepartível da Vossa Igreja...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

Pela agonia mortal sofrida pelas apostasias públicas de alguns ministros de Vosso altar; por esse cruel golpe, pelos gemidos que Vos arrancaram as blasfêmias desses desditosos Judas...
Perdoai as traições, Coração Agonizante de Jesus.

(Desagravai a Jesus por tantas traições de baixo interesse e de covardia)

(Pausa)

'A quem buscais?' – disse Jesus aos soldados, dominando com majestade divina uma dor imensa – 'A Jesus de Nazaré' – contestam a uma voz, os que vinham sedentos de Seu sangue –. Um momento mais, e o dulcíssimo Mestre Se adianta, oferece as mãos, dobra Seu pescoço e cativo dos homens, lhes entrega novamente o enamorado Coração. E vós, a quem buscais, almas fervorosas, nesta noite, aqui neste Getsêmani de Seu Sacrário?

As almas 

Viemos em busca de Vós, Jesus de Nazaré, nesta hora do poder das trevas, da solidão e do pecado. Por isso temos escolhido o momento supremo de Vosso desamparo, ó Divino Agonizante do altar!, para Vos surpreender a sós e ocupar nesta Hora Santa o posto de São João e dos Anjos. Sim, eu sou Vosso proprietário. Prisioneiro desse tabernáculo e de minha alma pobrezinha, eu sou Vosso proprietário, como tenho sido tantas vezes Vosso carrasco. Deixai-nos, pois, nos aproximarmos de Vosso cárcere voluntário e permiti que beijemos Vossas correntes, que bendigamos os ditosos muros de Vosso calabouço; consenti que choremos de amor ao meditar no sublime e incomparável cativeiro do Filho de Deus vivo. Aqui já não foi um pecador que Vos entregou: foi Vosso próprio Coração, o ditoso, o amabilíssimo, culpável desta prisão de amor.

Permiti-nos, pois, Vos ressarcir agora das amarguras de Vosso cativeiro com o clamor de nossa humilde adoração. Aproximai-Vos, Jesus, das portas de Vosso cárcere e recolhe a prece de Vossos filhos fidelíssimos... nos Sacrários todos da Terra, nas Hóstias consagradas do mundo inteiro.

(Todos em voz alta)

Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

Naqueles Tabernáculos inteiramente abandonados e distantes onde ficais largos meses esquecido, entre o pó do altar...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

Naqueles inúmeros templos onde se ofende com irreverência a humilde majestade de Vosso Sacrário...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

No pavimento do Santuário, no pó do caminho, na lama, em que as mãos de um sacrílego profanaram a Hóstia consagrada...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

Nos lábios do que Vos recebe como Judas em seu coração manchado pela culpa...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

No esplendor e pompa com que a Igreja Vos louva nos cultos públicos desse sacramento do amor...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

No feliz retiro dos monastérios, no coração de Vossas esposas virgens, que cantam ao Cordeiro um hino de amor imaculado...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

Em união com todos Vossos amigos que, na adoração perpétua e na Hora Santa, vêm para reparar e para Vos visitar, ó Deus encarcerado!...
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia. 

No peito do moribundo que Vos chamou em seu socorro, nesse coração agonizante que desfalece já, ferido de morte... 
Adoramo-Vos, Coração de Jesus-Eucaristia.

(Pausa)

Não houve noite mais horrenda em suas dores que a noite da primeira Quinta-Feira Santa da Terra. Não tendes porque reconstituir a cena de vinte séculos atrás, almas fervorosas, quando aí tendes Jesus sentando sempre no banquinho dos criminosos, réu de um amor infinito. Aí O tendes, desde então, vendados os divinos olhos pelo pranto que Lhe arranca a tibieza dos bons, dos Seus; aí está, objeto incessante do desprezo dos sábios e dos honrados da Terra: aí segue sendo o ludíbrio sangrento dos que temem em Sua mesma inércia, em Seu silêncio sacramental. 'Vós, que ressuscitais dos mortos' – Lhe diz a incredulidade –'saí, se podeis, dessa tumba'; 'se sois Rei – Lhe dizem os governantes 'se é verdade que palpitas, Deus, nessa Hóstia, adivinha quem Vos feriu'. E O golpeiam com sacrílega legalidade, e profanam Seus templos, e insultam a mansidão de Seu Coração, que cala e que espera sempre perdoar.

Mas é, sobretudo, o pecado de altivez e de soberba o que mais Lhe ultraja na dulcíssima humildade de Seu Sacrário. É a rebeldia de Lúcifer, o orgulho humano, o excremento mais amargo de Seu cálice. Ó neste dia, espera de nós, com direito, um consolo de humildade. Ah!, sim, recebei-o mil vezes, Jesus Sacramentando, em paga de amor, por aquela eterna noite de sacrílega profanação de Vossa pessoa, sofrida na Quinta-Feira Santa.

(Lento e cortado)

As almas

Amamo-Vos, Jesus. Concedei-nos a glória de sermos pospostos, por Vosso entristecido Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Outorgai-nos a sorte de sermos confundidos, por Vosso amargurado Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Concedei-nos a graça de seremos desatendidos, por causa de Vosso misericordioso Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Outorgai-nos a honra imerecida de sermos enganados, por Vosso acorrentado Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Concedei-nos a recompensa de sermos desprezados, pela glória de Vosso ferido Coração...
Amamo-Vos, Jesus, outorgai-nos a distinção preciosa de sermos injuriados, pelo triunfo de Vosso Sagrado Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Concedei-nos o gozo incomparável de sermos algum dia perseguidos, pelo amor de Vosso Divino Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Outorgai-nos a coroa de sermos caluniados, no apostolado de Vosso Sagrado Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Concedei-nos a amável regalia de sermos traídos, em holocausto de Vosso Divino Coração...
Amamo-Vos, Jesus. Outorgai-nos a honra de sermos aborrecidos em união com Vosso Agonizante Coração...
Amamo-Vos, Jesus, concedei-nos o privilégio de sermos condenados pelo mundo, no obséquio de Vosso Divino Coração...
Amamo-Vos, Jesus, outorgai-nos a amargura deliciosa de sermos esquecidos, por amor a Vosso Sagrado Coração...

Se o discípulo não há de ser mais que seu Mestre, Vos suplicamos, Jesus, dai-nos a parte que nos corresponde nos vilipêndios de Vosso Coração Sacramentado. Consolai-Vos de todos eles, Mestre muito amado, pois estes Vossos amigos que, pondo em Vosso Lado ferido, uma palavra de humildade, Vos protestam que Vós sois nessa Hóstia sua única fortuna, seu único Paraíso.

(Breve pausa)

A Quinta-Feira Santa não foi senão a hora de caridade e de agonia daquele dia de séculos que viverá encarcerado nos altares, cativo dos corações, prisioneiro de nossos templos, Jesus-Eucaristia. A Quinta-Feira Santa do Cenáculo e do Getsêmani perpetua-se para glorificação de Jesus até à consumação dos tempos; este Sacramento do amor e da fé ficará conosco até que a última Hóstia se consuma no peito do último homem que agonize.

Ah!, mas esse Sol de amor, o Coração oculto no peito de Jesus e nessa Hóstia, não permaneceu sempre velado a nossos olhos, não... Incontido em Seus ardores de caridade e nos fulgores de luz misericordiosa, pela ferida do Lado nos fala desse Coração Sagrado, com gemidos de pomba e, por fim, se revela, um dia venturoso, em toda a magnificência de Seu amor. E é Ele, o Nazareno divino, é o Mestre da Judeia, apaixonado pelas almas; é o mesmo Agonizante adorável, o mesmo cativo triunfante do Getsêmani; o que aparece ante os olhos extasiados de Margarida Maria, e o que, mostrando-lhe Seu Coração envolto em chamas, lhe diz:

'Eis aqui o Coração que tem amado tanto os homens; tenho podido conter por mais tempo o amor que por eles me devora. Vede que aqui venho, pois, pedir amor por amor, coração por coração; quero trocar Minha vida por vossa vida. Estou triste se Me esquece, se Me ultraja! Quero consolo, tenho ânsias de um solene desagravo numa grande festividade a Meu Coração! Venho exigir para Ele uma homenagem, um culto vitorioso; pois por Ele tenho de reinar! Vinde acompanhar-Me na adoração reparadora; vinde converter  o mundo na Hora Santa. Ah, vinde comungar, vinde, tenho sede de ser adorado no sacramento do altar! Traze-Me as almas, muitas almas e logo, levai-Me ao seio do lar, ao Coração do que padece, ao leito do pecador empedernido e vereis as glórias e os prodígio de Meu amor. Tomai e recebei, nesta Eucaristia, Meu Divino Coração; todo Ele vos pertence; amai-O; amai-O e fazei-O reinar!'.

(Assim falou o Deus de Santa Margarida Maria, assim nos segue falando pela deliciosa chaga de Seu peito. Espera uma resposta nesta noite que, ao esfumar-se, como uma visão do céu, irá confundir-se nas horas de uma eternidade feliz). 

(Pausa)

As almas

Anjo do Gestêmani, São João e Margarida Maria, adoradores felizes do Cenáculo, Virgem Imaculada, aproximai-vos todos, velai e orai conosco, e depositai nossa última prece, não aos pés de Jesus Sacramentado, mas na ferida sangrenta do Seu Lado.

Senhor Jesus, Vós o dissestes, Vós sois Rei; para isso viestes ao mundo; para reinar, estabelecestes o sacrifício perpétuo do altar; para reinar, nos revelastes os tesouros e as aspirações de Vosso Divino Coração;não em vão nos assegurastes, Jesus, que por Ele incendiaríeis em Vosso amor o mundo infeliz. Cumpre, pois, vossas promessas; estabelece já, exigimos, o reinado de Vosso amante Coração.

(Todos em voz alta)

Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração

1ª. Já, Jesus, sim, reinai imediatamente, antes que Satã e o mundo Vos arrebatem as consciência e profanem, em Vossa ausência, todos os estados da vida...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

2ª. Adiantai-Vos, Jesus, e triunfai nos lares, reinai neles pela paz inalterável prometidas aos que Vos têm recebido com hosanas...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

3ª. Não demoreis, Mestre muito amado, porque muitos destes padecem aflições e amarguras, que somente Vós prometestes remediar...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

4ª. Vinde, porque sois forte; Vós, o Deus das batalhas da vida; vinde, mostrai-nos Vosso peito ferido, como esperança celestial na hora da morte...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

5ª. Sede Vós o êxito prometido em nossos trabalhos; somente Vós a inspiração e recompensa em todas as empresas...
Venha a nós o reinado de vosso amante Coração.

6ª. E Vossos prediletos, quero dizer, os pecadores, não esqueceis que, para eles, sobretudo, revelastes a ternura incansável de Vosso amor.
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

7ª. Ai! São tantos os tíbios, Mestre, tantos os indiferentes, a quem deveis inflamar com esta admirável devoção..
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

8ª. 'Aqui está a vida', nos dissestes, nos mostrando Vosso peito atravessado. Permiti, pois, que aí bebamos o fervor, a santidade a que aspiramos...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

9ª. Vossa imagem, a Vosso pedido, tem sido entronizada em muitas casas. Em nome delas Vos suplico que sigais sendo em todas o Soberano muito amado...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

10ª. Colocai palavras de fogo, persuasão irresistível, vencedora, naqueles sacerdotes que Vos amam e que Vos pregam como João, Vosso apóstolo amado...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

11ª. E a quantos ensinem esta devoção sublime, a quantos publiquem suas inefáveis maravilhas, reservai-lhes, Jesus, um espaço vizinho àquele em que tendes gravado o nome de Vossa Mãe...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

12ª. E, por fim, Senhor Jesus, dai-nos o céu de Vosso Coração e a quantos compartilhamos Vossa agonia na Hora Santa, por esta hora de consolo e pela Comunhão das primeiras sextas: cumpri conosco Vossa promessa infalível; Vos pedimos que, na hora decisiva da morte...
Venha a nós o reinado de Vosso amante Coração.

(Breve pausa)

E reclinados agora docemente em Vosso sagrado peito, deixai-nos dizer-Vos:

Bendizemo-Vos e amamo-Vos, Jesus, por todos os que Vos aborrecem.
Bendizemo-Vos e amamo-Vos por todos os que Vos blasfemam.
Bendizemo-Vos e amamo-Vos por todos os que Vos profanam com o sacrilégio.
Bendizemo-Vos e amamo-Vos por todos os que Vos negam neste Sacramento.
Bendizemo-Vos e amamo-Vos por todos os indiferentes que Vos esquecem.
Bendizemo-Vos e amamo-Vos por todos os bons que abusam da graça.
Bendizemo-Vos e amamo-Vos nesta Eucaristia com o Coração de Vossa divina Mãe, e com a caridade de todos os predestinados.

E se Vos negamos alguma vez, perdoai-nos, ó Deus Sacramentado e, em desagravo, deixai-nos Vos reconhecer no Sacrário em que Vós viveis. Se Vos ofendemos por fragilidade ou por malícia, deixai-nos Vos servir em eterna escravidão de amor eterno, porque é mais morte que vida a que não se consome em amar e em fazer amar Vosso amante, Vosso esquecido, Vosso Divino Coração, na Santa Eucaristia. Venha a nós o Vosso reino!

Pai-Nosso e Ave-Maria, pelas intenções particulares dos presentes.
Pai-Nosso e Ave-Maria, pelos agonizantes e pecadores.
Pai-Nosso e Ave-Maria, pedindo o reinado do Sagrado Coração mediante a Comunhão frequente e diária, a Hora Santa e a Cruzada da Entronização do Rei Divino nos lares, sociedades e nações.

(Cinco vezes)

Coração Divino de Jesus, venha a nós o vosso reino!

Ato final de consagração

Hosana a Vós, Jesus, hosana em reparação dos milhões de criaturas que ignoram por completo Vossa presença real nos Sacrários; em nome de todos eles Vos adoramos, Senhor, e Vos amamos com amor mais forte que a morte!

Hosana a Vós, Jesus, hosana em reparação dos que, crendo neste sublime mistério, vivem tranquilos, sem comungar jamais, desprezando o maná de Vossos altares; em nome de todos eles, Vos adoramos, Jesus, e Vos amamos com amor mais forte que a morte!

Hosana a Vós, Jesus, hosana em reparação dos que creem em Vossa Eucaristia e a profanam com horrendo sacrilégio; em nome de todos eles, Vos adoramos, Senhor, e Vos amamos com amor mais forte que a morte!

Hosana a Vós, Jesus, hosana em reparação dos que, por culpável tibieza, se afastam da mesa de comunhão e Vos recebem somente muito de vez em quando e, com receios de um temor exagerado, que Vos ofende; em nome de todos eles Vos adoramos, Senhor, e Vos amamos com amor mais forte que a morte!

Hosana a Vós, Jesus, hosana em reparação de tantos bons e piedosos, de tantos sacerdotes que poderiam ser santos unicamente dando-se generosamente à devoção de Vossa Sagrada Eucaristia, consagrando-se sem reserva a este amor dos amores, a este culto reparador, incomparável; em nome de todos eles, Vos adoramos, Senhor e Vos amamos com amor mais forte que a morte!

Ó segui, Jesus, revelando as maravilhas de Vosso Coração desde essa Hóstia! Avançai, Deus oculto e vencedor, avançai, conquistando na mesa de comunhão alma por alma, família por família, até que a Terra inteira exclame, alvoroçada: 'Louvado seja o Divino Coração em sua Eucaristia salvadora; a Ele, somente a Ele, nos altares, glória e honra pelos séculos dos séculos; venha a nós o Vosso reino!'.

Fórmula de consagração individual ao Sagrado Coração de Jesus,
composta por Santa Margarida Maria

Eu (...) vos dou e consagro, ó Sagrado Coração de Jesus Cristo, minha pessoa e minha vida, minhas ações, penas e sofrimentos, para não querer mais servir-me de nenhuma parte de meu ser, senão para Vos honrar, amar e glorificar.

É esta minha vontade irrevogável: ser todo Vosso e tudo fazer por Vosso amor, renunciando de todo o meu coração a tudo quanto Vos possa desagradar. Tomo-Vos, pois, ó Sagrado Coração, por único objeto de meu amor, protetor de minha vida, segurança de minha salvação, remédio de minha fragilidade e de minha inconstância, reparador de todas as imperfeições de minha vida e meu asilo seguro na hora da morte. Sede, ó coração de bondade, minha justificação diante de Deus, Vosso Pai, para que desvie de mim sua justa cólera. Ó coração de amor! Deposito toda a minha confiança em Vós, pois tudo temo de minha malícia e de minha fraqueza, mas tudo espero de Vossa bondade!

Extingui em mim tudo o que possa desagradar-Vos, ou se oponha à Vossa vontade. Seja o Vosso puro amor tão profundamente impresso em meu coração, que jamais possa eu esquecer-Vos, nem separar-me de Vós. Suplico, por Vosso infinito amor, que meu nome seja escrito em vosso coração, pois quero fazer consistir toda a minha felicidade e toda a minha glória em viver e morrer como vosso escravo. Amém.

(Hora Santa de Setembro*, pelo Pe. Mateo Crawley - Boevey)

* aplicável também para a Quinta - Feira Santa.