terça-feira, 20 de dezembro de 2022

POEMAS PARA REZAR (XLIII)


Bendito és tu, Senhor,
que me alimentas
com os teus consolos,
à espera, como pai amoroso,
pela minha volta.

Bendito és tu, Senhor,
que não te impacientas
com a minha demora,
mas, espera, com infinita doçura,
a minha conversão.

Bendito és tu, Senhor,
que me acalentas
nos dias sem sol, 
na espera mais do que certa
da alma que amas.

(Arcos de Pilares)


segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

O SIMBOLISMO DO PAPADO

Os paramentos brancos e vermelhos, comumente utilizados pelos sumos pontífices, representam Cristo como os símbolos do martírio e da divindade, expressando, assim, de forma absolutamente inequívoca, o poder temporal e espiritual do Papa sobre a Igreja e os católicos do mundo inteiro. A composição do manto vermelho sobre a vestimenta branca sinaliza ainda a supremacia do poder espiritual sobre o poder temporal. Assim, somente o sumo pontífice pode usar  a capa vermelha, sinal inconteste de sua autoridade hierárquica, espiritual e de martírio.

(Pio XI)

A Igreja Católica, tal como instituída e inspirada por Deus, é essencialmente hierárquica. Esta constituição  divinamente instituída está sendo contestada nos tempos atuais, na forma de uma passagem da forma espiritual-hierárquica para um modelo de igreja laico-sinodal. Este processo de 'sinodalização' da Igreja está já em curso avançado, não apenas como uma consequência direta do Concílio Vaticano II, mas como o cenário mais perigoso e perturbador das mazelas do modernismo. Um cenário muito além da simples transgressão; um cenário de ruptura.

Neste contexto, não deixa de ser bastante simbólico também o posicionamento do Cardeal Bergoglio, durante a sua primeira aparição após eleito papa (foto abaixo), quando abriu mão expressamente do uso da capa vermelha sobre a vestimenta branca. Um simbolismo apenas? Algo pouco relevante? Muito além de simplesmente isso: uma fotografia explícita dos perigosos tempos atuais para o papado e para a Santa Igreja de Cristo.

domingo, 18 de dezembro de 2022

EVANGELHO DO DOMINGO

   

'O rei da glória é o Senhor onipotente; 
abri as portas para que Ele possa entrar!(Sl 23)

Primeira Leitura (Is 7, 10-14) - Segunda Leitura (Rm 1, 1-7)  -  Evangelho (Mt 1, 18-24)

 18/12/2022 - Quarto Domingo do Advento

04. 'TU LHE DARÁS O NOME DE JESUS'


Neste Quarto Domingo do Advento, São Mateus nos revela em palavras o mistério divino da Encarnação do Verbo. Em Maria e José, criaturas humanas personalíssimas, Deus se manifesta através dos Seus anjos, no silêncio da contemplação de desígnios tão extraordinários. No Evangelho de hoje, José, o carpinteiro, será assombrado pelas dúvidas mais inclementes e inesperadas mas, na bondade do coração humano elevado às mais sublimes virtudes, vai corresponder com o seu próprio fiat à Santa Vontade de Deus.

Prometida a José, conforme os costumes judaicos da época, eis que Maria ficou grávida do Espírito Santo, antes das núpcias formais com o carpinteiro de Nazaré. Nossa Senhora guardou para si o maior mistério dos tempos. São José também fez do silêncio a sua obra de graça extremada: 'José, seu marido, era justo e, não querendo denunciá-la, resolveu abandonar Maria, em segredo' (Mt 1,19). E o evangelista vai traduzir com palavras aparentemente simples: 'Enquanto José pensava nisso...' (Mt 1, 20) o turbilhão de sentimentos, dor e humilhação que deveriam estar a afligir o esposo de Maria...

José conhecia a santidade e as graças de Maria do fundo do coração e tal certeza conflitava dramaticamente com a realidade dos fatos cada vez mais evidentes. E, muito provavelmente, José teve medo, de estar diante de algo que sublimava toda a sua dimensão humana, consubstanciado pela manifestação da Encarnação do Verbo proclamada por tantas profecias e revelações. E certamente se consumiu em pensamentos e reflexões contínuas e antagônicas naqueles dias de aflição, até que, testado e pesado no cadinho das sublimes virtudes, teve de Deus a revelação em sonho: 'José, Filho de Davi, não tenhas medo de receber Maria como tua esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, e tu lhe darás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo de seus pecados. Tudo isso aconteceu para se cumprir o que o Senhor havia dito pelo profeta: 'Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de Emanuel, que significa: Deus está conosco' (Mt 1, 20-23).

A provação de José é desfeita de imediato pela confirmação angélica da linhagem nobre de Jesus: 'José, Filho de Davi'... (Mt 1, 20), conforme as santas profecias. Desfaz-se a realidade humana e irrompe o mistério sobrenatural do nascimento do próprio Filho de Deus, 'pois ele vai salvar o seu povo de seus pecados' (Mt 1, 21). Do rigor da provação humana ao êxtase da revelação dos Santos Mistérios, José obedeceu em tudo aos desígnios divinos e, assim, tornou-se o primeiro entre os homens a ser servo fiel da Virgem e do Menino.

sábado, 17 de dezembro de 2022

ANTÍFONAS DO Ó

As Antífonas do Ó são sete orações especialmente cantadas durante o tempo do Advento, particularmente ao longo da semana que antecede o Natal. A autoria das antífonas, que remontam aos séculos VII e VIII, tem sido comumente atribuída ao papa Gregório Magno. São sete orações extremamente curtas, sempre iniciadas pela interjeição Ó, correspondendo a sete diferentes súplicas manifestadas a Jesus Cristo, na expectativa do nascimento do Menino - Deus entre os homens, que é invocado sob sete diferentes títulos messiânicos tomados do Antigo Testamento. 

17 de dezembro

O Sapientia
quæ ex ore Altissimi prodisti,
attingens a fine usque ad finem,
fortiter suaviter disponens omnia:
Veni ad docendum nos viam prudentiae   


Ó Sabedoria
que saístes da boca do altíssimo
atingindo de uma a outra extremidade
e tudo dispondo com força e suavidade:
Vinde ensinar-nos o caminho da prudência

18 de dezembro

O Adonai
et Dux domus Israel,
qui Moysi in igne flammæ rubi apparuisti
et ei in Sina legem dedisti:
Veni ad redimendum nos in brachio extento
 

Ó Adonai
guia da casa de Israel,
que aparecestes a Moisés na chama do fogo
no meio da sarça ardente e lhe deste a lei no Sinai
Vinde resgatar-nos pelo poder do Vosso braço.
 
19 de dezembro 

O Radix Jesse
qui stas in signum populorum,
super quem continebunt reges os suum,
quem gentes deprecabuntur:
Veni ad liberandum nos; jam noli tardare  


Ó Raiz de Jessé
erguida como estandarte dos povos,
em cuja presença os reis se calarão
e a quem as nações invocarão,
Vinde libertar-nos; não tardeis jamais.  

20 de dezembro 

O Clavis David
et sceptrum domus Israel:
qui aperis, et nemo claudit;
claudis et nemo aperit:
Veni, et educ vinctum de domo carceris,
sedentem in tenebris et umbra mortis   


Ó Chave de Davi
o cetro da casa de Israel
que abris e ninguém fecha;
fechais e ninguém abre:
Vinde e libertai da prisão o cativo
assentado nas trevas e à sombra da morte. 

21 de dezembro

O Oriens
splendor lucis æternæ, et sol justitiæ
Veni et illumina sedentes in tenebris
et umbra mortis.  


Ó Oriente
esplendor da luz eterna e sol da justiça
Vinde e iluminai os que estão sentados
nas trevas e à sombra da morte. 

22 de dezembro

O Rex gentium
et desideratus earum
lapisque angularis,
qui facis utraque unum:
Veni et salva hominem quem de limo formasti  


Ó Rei das nações
e objeto de seus desejos,
pedra angular
que reunis em vós judeus e gentios:
Vinde e salvai o homem que do limo formastes.  

23 de dezembro

O Emmanuel,
Rex et legifer noster,
exspectatio gentium,
et Salvador earum:
Veni ad salvandum nos, Domine Deus noster  


Ó Emanuel,
nosso rei e legislador,
esperança e salvador das nações,
Vinde salvar-nos,
Senhor nosso Deus.  

sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

O DOGMA DO PURGATÓRIO (XLVI)

Capítulo V

Consolação das Almas - A Santíssima Virgem como Mãe das Almas do Purgatório - Padre Jerônimo Carvalho - Beato Renier de Citeaux

As almas do Purgatório recebem também grande consolação por meio da Santíssima Virgem. Ela não é a Consoladora dos Aflitos? E que aflição pode ser comparada à das pobres almas do Purgatório? Ela não é a Mãe da Misericórdia? E não é para essas santas almas sofredoras que ela deve mostrar toda a misericórdia do seu coração? Não devemos pois estranhar que, nas Revelações de Santa Brígida, a Rainha do Céu se dê o belo nome de 'Mãe das Almas do Purgatório'. 'Eu sou' - disse Nossa senhora àquela santa - 'a Mãe de todos aqueles que estão no lugar de expiação e minhas orações mitigam os castigos que  lhes são infligidos por suas faltas'.

A 25 de outubro de 1604, no Colégio da Companhia de Jesus de Coimbra, o Padre Jerônimo Carvalho faleceu em odor de santidade, com a idade de cinquenta anos. Este admirável e humilde servo de Deus sentiu uma viva apreensão pelos sofrimentos do Purgatório. Nem as cruéis macerações que infligia a si mesmo várias vezes ao dia, sem contar aquelas induzidas a cada semana pela memória da Paixão, nem as seis horas que dedicava de manhã e à noite à meditação de temas sagrados, pareciam suficientes a ele para protegê-lo do castigo que ele imaginava esperar após a morte. Mas um dia a Rainha do Céu, a quem ele manifestava uma terna devoção, condescendeu em consolar o seu servo com a simples certeza de que ela era uma Mãe de Misericórdia para os seus queridos filhos no Purgatório, tanto como para os da terra. Difundindo mais tarde esta consoladora doutrina, o santo homem deixou escapar acidentalmente, no ardor de suas palavras, esta revelação: 'Ela mesma me disse isto'.

Conta-se que um grande servo de Maria, o Beato Renier de Citeaux, tremeu ao pensar em seus pecados e na terrível Justiça de Deus após a morte. Em seu temor, dirigindo-se à sua grande protetora, a quem chamava de Mãe de Misericórdia, foi arrebatado em espírito e viu a Mãe de Deus suplicando ao seu Filho em seu favor. 'Meu Filho' - dizia ela - 'cuida dele com misericórdia no Purgatório, porque ele humildemente se arrepende de seus pecados'. 'Minha Mãe' - respondeu Jesus - 'coloco a causa dele em tuas mãos', significando dizer que se fizesse segundo o desejo da sua Mãe. O Beato Renier compreendeu então, com indescritível alegria, que Maria obtivera a sua isenção do Purgatório.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

'CONSIDERA COMO MUITO O POUCO'

Para que buscas repouso se nascestes para o trabalho? Dispõe-te mais à paciência que à consolação, mais para levar a cruz que para ter alegria. Quem dentre os mundanos não aceitaria de bom gosto a consolação e a alegria espiritual, se a pudesse ter sempre ao seu dispor? As consolações espirituais excedem todas as delícias do mundo e todos os deleites da carne. Pois todas as delícias do mundo ou são vãs ou torpes, e só as do espírito são suaves e honestas, nascidas que são das virtudes e infundidas por Deus nas almas puras. Mas ninguém pode lograr estas divinas consolações à medida de seu desejo, porque não cessa por muito tempo a guerra da tentação.

Grande obstáculo às visitas celestiais é a falsa liberdade do espírito e a demasiada confiança em si mesmo. Deus faz bem dando-nos a graça da consolação; mas o homem faz mal não retribuindo tudo a Deus, com ação de graças. E se não se nos infundem os dons da graça, é porque somos ingratos ao Autor, não atribuindo tudo à fonte original. Pois sempre Deus concede a graça a quem dignamente se mostra agradecido e tira ao soberbo o que costuma dar ao humilde.

Não quero consolação que me tire a compunção, nem desejo contemplação que me seduz ao desvanecimento; porque nem tudo que é sublime é santo, nem tudo que é agradável é bom, nem todo desejo é puro, nem tudo que nos deleita agrada a Deus. De boa mente aceito a graça, que me faz humilde e timorato e me dispõe melhor para renunciar a mim mesmo. O homem instruído pela graça e experimentado com sua subtração não ousará atribuir-se bem algum, antes reconhecerá sua pobreza e nudez. Dá a Deus o que é de Deus e atribui a ti o que é teu; isto é, dá graças a Deus pela graça, e só a ti atribui a culpa e a pena que a culpa merece.

Põe-te sempre no ínfimo lugar, e dar-te-ão o supremo, porque o mais alto não existe sem o apoio do inferior. Os maiores santos diante de Deus são os que se julgam menores e, quanto mais glorioso, tanto mais humildes são no seu conceito. Como estão cheios de verdade e glória celestial, não cobiçam a glória vã. Em Deus, fundados e firmados, nada os pode ensoberbecer. Atribuindo a Deus todo o bem que receberam, não pretendem a glória uns dos outros; só querem a glória que procede de Deus; seu único fim, seu desejo constante é que ele seja louvado neles e em todos os santos, acima de todas as coisas.

Agradece, pois, os menores benefícios, e maiores merecerás. Considera como muito o pouco, e o menor dom por dádiva singular. Se considerarmos a grandeza do benfeitor, não há dom pequeno ou de pouco valor; porque não pode ser pequena a dádiva que nos vem do soberano Senhor. Ainda quando nos der penas e castigos lhe devemos agradecer, porque sempre é para a nossa salvação, quanto permite que nos suceda. Se desejares a graça de Deus, sê agradecido quando a recebes e paciente quando a perdes. Roga que ela volte, anda cauteloso e humilde, para não vires a perdê-la.

(Da Imitação de Cristo - II, 10; Thomas de Kempis)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

AS QUATRO TÊMPORAS

 

É lícito e de grande valia a Igreja proclamar a natureza como obra da excelência da divina criação, mais do que tudo porque a natureza representa o reflexo direto da grandeza e da imensa bondade e amor de Deus por nós. Uma outra razão particularmente relevante nesta celebração da natureza pela Igreja está no contraponto de uma abordagem verdadeiramente cristã ao ecologismo panteísta militante e artificial em voga, edulcorado da retórica vazia de coisas como planeta verde e mãe terra.

Tal visão cristã torna-se ainda mais relevante nestes tristes tempos em que a verborragia do paganismo militante alçou a defesa do meio ambiente a uma escala de religião panteísta, cujos principais dogmas são o aquecimento global, o desmatamento e a poluição urbana. Investida de cenários apocalípticos, os ativistas desta seita universal se escalpelam na defesa intransigente da preservação ambiental dos habitats do mico leão dourado ou das tartarugas em nidação. E incensam, com a mesma determinação frenética, o aborto como um direito da mulher e o sacrifício inocente de milhares de fetos indesejados como conquistas sociais. Aqueles que defendem a natureza com tanta veemência são os mesmos que violam os preceitos mais elementares da vida humana.

A visão cristã da natureza como obra do amor e da misericórdia de Deus remonta às próprias origens de Cristianismo, associada à prática de jejuns sazonais. Os cristãos do primeiro século jejuavam regularmente às quartas (dia em que ocorreu a traição de Judas) e sextas (dia da crucificação e morte de Jesus). Este costume foi se consolidando como eventos sazonais, dando origem às Festas das Têmporas ou Quatro Estações, que passaram a incluir também o jejum aos sábados, dia em que o Senhor jazia no sepulcro. 

As Quatro Têmporas, como períodos específicos de jejum e penitência associados em sintonia ao ciclo da natureza e às quatro estações do ano, foram formalmente estabelecidas pelo Papa Gregório VII. Aplicadas ao hemisfério sul, a primavera contempla as Têmporas de Setembro (terceira semana de setembro), o verão relaciona-se às Têmporas de Dezembro (tempo do Advento, terceira semana de dezembro); ao outono corresponde as Têmporas da Quaresma (primeira semana da quaresma) e, finalmente, o inverno compreende as Têmporas de Pentecostes, que ocorrem dentro da Oitava de Pentecostes (primeira semana de pentecostes). Nos jejuns sazonais dos judeus ou nas Têmporas cristãs, manifestava-se o amor incondicional das criaturas pela natureza e suas estações, como louvor à obra do Criador.

Como expressões dos ciclos da natureza, as Têmporas passaram a representar, no âmbito litúrgico, tempos especiais de retiro espiritual e de amor à natureza como obra do Pai, caracterizados por intensos períodos de jejum e de oração. Assim, durante quatro épocas do ano, na mudança das estações, três dias da semana – quarta, sexta e sábado – eram devotados ao jejum e à oração, de modo a agradecer os bens naturais recebidos e evocar as graças e as bênçãos de Deus para a nova estação que então se iniciava. E, em função do antigo costume cristão de se impor o jejum antes das ordenações sagradas, estas consagrações ocorriam comumente durante os sábados das Têmperas, porque os ordenados constituem por excelência as primícias do povo cristão.

E, como as estações da natureza material, as Têmporas produziram sementes e frutos espirituais de grande relevo na história da Igreja. E, como tantas outras colunas de pedra, forjadas no rigor da fé e das tradições da civilização cristã, estas também ruíram em nome da praticidade de se ajustar a Igreja aos tempos e aos modismos dos homens, a ponto de restar atualmente pouquíssimo zelo pela sua prática e reavivamento*.

* um exemplo dessas enormes perdas litúrgicas são os repetidos e recorrentes temas das recentes campanhas da fraternidade, inseridas sempre num contexto de base social ou ambiental, tão ao gosto dos princípios da nova ordem mundial da globalização e do ecumenismo e de uma perda crescente dos valores da autêntica civilização cristã.