sábado, 9 de julho de 2022

PARA SER UM HOMEM ETERNO... (I)

 ... SEJA UM HOMEM DE VIDA INTERIOR


Queremos mais, queremos tudo. E a nossa miserável condição humana nos empurra para os abismos das aspirações infundadas, das ilusões perdidas, das metas impossíveis, do orgulho ferido. Não mais nos contenta o papel de homens; temos que ser super-homens; não nos sustenta a vida pacata e costumeira, temos que almejar conquistas e feitos memoráveis; não há mais sentido em ser mais um na multidão; impõe-se ser o maior de todos em tudo. Criaturas, não; deuses, por que não?

Na imensa vertigem das miragens, cada um quer fazer o seu próprio caminho, ter o domínio absoluto sobre o seu corpo e o seu destino, fazer acontecer - a qualquer preço - o que seja do estrito interesse do seu projeto de vida pessoal. É um mergulho inevitável num poço sem fundo, que nunca se vai sozinho porque, neste desvario, a insensatez arrasta uma legião de incautos e loucura atrai loucura. O inferno não são os outros, mas o que recebemos em paga pelo que fazemos com eles.

O preço da miséria humana exposta e desenfreada? Irmão contra irmãos, pais contra filhos, criaturas de Deus contra criaturas de Deus. Nesta lida, o outro não passa de um espantalho, de um objeto de prazer, de um mantenedor, de um escravo pago a preço vil, de um trampolim descartável, de um companheiro torto de jornada, de um inimigo mortal. A felicidade não constitui uma meta a ser buscada entre dores e sobressaltos, mas é tomada como um direito inalienável. Não possuí-la ou não encontrá-la é culpa dos outros, fruto de uma abominável injustiça.

Miserável homem entre miseráveis! Libertino, propõe-se libertador. Insensato, anseia pelo naufrágio. Quer dominar o mundo aprendendo a não ter domínio algum sobre si mesmo, alimentando-se de trevas na insanidade doentia de encontrar a luz. Que caminho pode ser luminoso nos desvãos profundos das crateras de egos malsucedidos? Que luz pode brilhar no fundo dos abismos de uma alma gangrenada?

Para ser um homem eterno... seja um homem de vida interior. E não de exterioridades supérfluas, de vanglórias mundanas, de uma história de vida que tem a dimensão do homem de uma vida. Queira menos e doe-se mais. Domine o seu mundo interior antes de alçar voo até a esquina mais próxima. Deus não quer os seus atos de grandeza, Deus quer a grandeza dos seus atos. Faça o seu caminho nesta vida ser um caminho curto, curto e seguro, de muitos e vacilantes passos. A natureza humana, embora frágil e inconstante, tem meios de não produzir frutos de vertigens. 

E, lembre-se, cair é cair mesmo, bater com a cara do chão, porque a vida cristã é uma vida dura, muito dura. Jesus caiu por terra por três vezes na sua jornada para o Calvário. E ressuscitou. Erguer-se muitas vezes nessa caminhada terrena, não para não mais cair ao longo da pequena jornada dessa vida, mas para se vislumbrar horizontes de vida eterna. Aprenda, de uma vez por todas, que o caminho da felicidade não existe nesse mundo, mas momentos de felicidade sim. E podem ser muitos. E serão todos aqueles em que você, superando o seu orgulho e sua pequenez, como homem eterno, permaneceu de pé. 

sexta-feira, 8 de julho de 2022

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'Assim como há um só Deus, um só Cristo e um só Espírito Santo, assim também há uma só verdade divinamente revelada; uma só fé divina que é o princípio da salvação do Homem e o fundamento de toda a justificação, a fé pela qual o justo vive e sem a qual é impossível agradar a Deus e chegar à comunhão de seus filhos. Há uma só Igreja, una, verdadeira, santa e católica, que é a Igreja Apostólica Romana. Há uma só cátedra fundada sobre Pedro pela palavra do Senhor, fora da qual não podemos encontrar nem a verdadeira fé, nem a salvação eterna. Todo aquele que não tiver a Igreja como mãe não pode ter a Deus como pai, e quem quer que abandone a cátedra de Pedro sobre a qual a Igreja foi fundada, confia falsamente que está na Igreja de Cristo. Na verdade, não pode haver crime maior e mancha mais repugnante do que se opor a Cristo, do que dividir a Igreja gerada e comprada pelo seu Sangue, do que esquecer o amor evangélico e combater com o furor da discórdia hostil, a harmonia do povo de Deus'.

(Papa Pio IX - Encíclica Singulari Quidem, 1856)

BREVIÁRIO DIGITAL - LADAINHA DE NOSSA SENHORA (XXIV)

 

VIRGEM VENERÁVEL, rogai por nós.

(Ilustração da obra 'Litanies de la Très-Sainte Vierge', por M. L'Abbé Édouard Barthe, Paris, 1801)

quinta-feira, 7 de julho de 2022

O CÉU É UM LUGAR


Céu significa o lugar e, especialmente a condição, de suprema bem-aventurança (felicidade). Se Deus não tivesse criado corpos, mas unicamente puros espíritos, o Céu não teria de ser um lugar; seria apenas como o estado dos anjos, que se regozijam em Deus.

Mas, na verdade, o Céu é também um lugar. Lá encontramos a humanidade de Jesus, a bem-aventurada Virgem Maria, os anjos e as almas dos santos. Embora não possamos dizer com certeza onde se encontra esse lugar, ou qual é a sua relação com o Universo, a revelação não nos permite duvidar da sua existência (Um espírito puro pode estar em um lugar apenas na medida em que exerce uma ação num corpo naquele lugar, mas de si mesmo o espírito vive numa ordem superior à do espaço).

A Igreja ensina como doutrina da Fé, definida pelo Papa Bento XII: 'as almas de todos os santos estão no Céu antes da ressurreição dos corpos e do Julgamento Final. Eles veem a essência divina por uma visão que é intuitiva e facial, sem a intermediação de qualquer criatura. Por causa desta visão na qual desfrutam da essência divina, eles são verdadeiramente bem aventurados), têm a vida eterna e o repouso eterno'.

O Concílio de Florença diz que as almas em estado de graça, depois de purificadas, entram no Céu, veem Deus trino como Ele É em Si mesmo, mas com um grau maior ou menor perfeição, de acordo com os seus méritos durante a vida terrena.

(Excertos da obra 'Life Everlasting', do Pe. Garrigou-Lagrange)

quarta-feira, 6 de julho de 2022

O DOGMA DO PURGATÓRIO (XXXV)

Capítulo XXXIV

Razões da Expiação no Purgatório - Negligência na Oração - Venerável Inês de Langeac e Irmã Angelique - São Severino de Colônia - Venerável Francisca de Pamplona e os Sacerdotes - Padre Streit e sua única Falta

Devemos tratar as coisas sagradas de maneira santa. Toda irreverência nos exercícios religiosos é extremamente desagradável a Deus. Quando a Venerável Inês de Langeac, de quem já falamos, era prioresa do seu convento, ela recomendou expressamente às suas religiosas respeito e especial fervor em todas as suas relações com Deus, lembrando-lhes estas palavras da Sagrada Escritura: 'maldito aquele que faz o trabalho de Deus com negligência'. Uma certa irmã da comunidade chamada Angelique faleceu. A piedosa superiora estava rezando perto do seu túmulo, quando de repente viu a irmã falecida diante dela, vestida com o hábito religioso; ela sentiu ao mesmo tempo como se uma chama de fogo tocasse o seu rosto. Irmã Angelique agradeceu a ela por tê-la estimulado no fervor e, em particular, por tê-la feito repetir com frequência durante a vida estas palavras: maldito aquele que faz o trabalho de Deus com negligência. 'Continue, mãe' - acrescentou ela - 'a incitar as irmãs neste fervor; para que sirvam a Deus com a máxima diligência e amem a Deus de todo o coração e com todo o poder de sua alma. Se elas pudessem entender quão rigorosos são os tormentos do Purgatório, nunca seriam culpadas da menor negligência'.

A advertência anterior diz respeito de maneira especial aos sacerdotes, cujas relações com Deus são contínuas e mais sublimes. Lembrem-se, portanto, sempre e nunca se esqueçam disso, quer ofereçam a Deus o incenso da oração, quer distribuam os Tesouros Divinos dos sacramentos, quer no altar celebrem os mistérios do Corpo e Sangue de Jesus Cristo. Veja o que relata, por exemplo, São Pedro Damião em sua 14ª Carta a Desidério.

São Severino, Arcebispo de Colônia, edificou a sua igreja como exemplo de todas as virtudes. A sua vida apostólica e as suas grandes obras de de evangelização e proclamação do reino de Deus nas almas fizeram que merecesse as honras da canonização. No entanto, após a sua morte, ele apareceu a um dos cônegos de sua catedral para pedir orações. Este digno sacerdote, não sendo capaz de entender como um santo prelado - como sabia que Severino o era - precisaria obter orações na outra vida, ouviu o seguinte do falecido bispo: 'É verdade que Deus me deu a graça de servi-lo com todo o meu coração e trabalhar na sua vinha, mas muitas vezes o ofendi com a pressa com que recitei o Santo Ofício. As ocupações de cada dia absorviam tanto a minha atenção que, quando chegava a hora da oração, eu buscava me desincumbir desse grande dever sem a devida atenção e, muitas vezes, em horários diversos daqueles recomendados pela Santa Igreja. Assim agora estou expiando essas infidelidades, e Deus me permite vir até aqui e pedir as suas orações'. A biografia acrescenta que Severino permaneceu seis meses no Purgatório por estas faltas.

A Venerável Irmã Francisca de Pamplona, que também já mencionamos, viu um dia no Purgatório um pobre padre cujos dedos estavam carcomidos por terríveis úlceras. Foi assim castigado por ter feito o Sinal da Cruz no altar com demasiada leviandade e sem a necessária gravidade. Ela disse que, em geral, os padres permanecem no Purgatório por mais tempo do que os leigos e que a intensidade dos seus tormentos é proporcional à sua dignidade. Deus revelou a ela o destino de vários sacerdotes falecidos. Um deles teve que suportar quarenta anos de sofrimento por ter permitido, por sua negligência, que uma pessoa morresse sem os sacramentos; outro ali permaneceu quarenta e cinco anos por ter desempenhado com certa leviandade as sublimes funções do seu ministério. Um bispo, cuja liberalidade o levou a ser nomeado esmoler [um capelão encarregado de distribuir dinheiro aos pobres], ficou detido ali por cinco anos por ter ansiado por tal dignidade; outro, não tão caridoso, foi purgado por quarenta anos pelo mesmo motivo.

Deus quer que o sirvamos com todo o nosso coração e que evitemos, na medida em que a fragilidade da natureza humana assim o permita, até as menores imperfeições; mas o cuidado de agradá-lo e o temor de desagradá-lo devem ser acompanhados por uma humilde confiança em sua misericórdia. Jesus Cristo nos admoestou a ouvir aqueles a quem Ele designou para serem os nossos guias espirituais como nós o ouviríamos e a seguir o conselho do nosso superior ou confessor com perfeita confiança. Assim, um temor excessivo é uma ofensa à sua misericórdia.

Em 12 de novembro de 1643, padre Philip Streit, da Companhia de Jesus, religioso de grande santidade, faleceu no Noviciado de Brünn, na Boêmia. Todos os dias ele fazia o seu exame de consciência com o maior cuidado e assim adquiriu uma grande pureza de alma. Algumas horas depois de sua morte, ele apareceu glorioso para um dos Padres de sua Ordem, o Venerável Martin Strzeda. 'Uma única falta' - disse ele - 'ainda me impede de ir para o Céu e me detém por oito horas no Purgatório; é a de não ter confiado suficientemente nas palavras do meu superior que, nos últimos momentos da minha vida, esforçou-se por acalmar-me um pequeno problema de consciência. Eu deveria ter considerado as suas palavras como a voz do próprio Deus'.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)

BREVIÁRIO DIGITAL - LADAINHA DE NOSSA SENHORA (XXIII)

 

VIRGEM PRUDENTÍSSIMA, rogai por nós.

(Ilustração da obra 'Litanies de la Très-Sainte Vierge', por M. L'Abbé Édouard Barthe, Paris, 1801)