sábado, 23 de abril de 2022

ORAÇÃO DA MANHÃ (SÃO PATRÍCIO)


Hoje eu me levanto 
movido por uma força poderosa,
pela invocação da Trindade,
pela fé em Deus três vezes santo,
pela confissão da unidade
do Criador da criação.

Hoje eu me levanto
pela fé no nascimento de Cristo e no seu batismo,
pela fé na sua crucificação e na sua morte de Cruz,
pela fé na sua ressurreição e na sua ascensão,
pela fé na Segunda Vinda e no Juízo Final.

Hoje eu me levanto
envolvido pelo amor dos querubins,
na obediência aos anjos,
ao serviço dos arcanjos,
na esperança da ressurreição e da herança eterna,
pelas orações dos patriarcas,
pelas palavras dos profetas,
pela pregação dos Apóstolos,
pela fé dos confessores ,
pela inocência das santas virgens,
pelas boas obras dos homens de bem.

Hoje eu me levanto
pela imensidão do céu,
pela luz do sol, 
pelo resplendor da lua, 
pelo calor do fogo,
pela cintilação do relâmpago, 
pelo frenesi do vento,
pela profundidade do mar,
pela rigidez da terra,
pela dureza da rocha.

Hoje eu me levanto
com o poder de Deus para me guiar,
com a fortaleza de Deus para me sustentar,
com a sabedoria de Deus para me iluminar,
com o olhar de Deus para me manter vigilante,
com os ouvidos de Deus para escutar,
com as palavras de Deus para falar,
nas mãos de Deus para me resguardar,
no caminho de Deus para O seguir,
com o escudo de Deus para me proteger,
no exército de Deus para me salvar
das armadilhas dos demônios,
das tentações dos vícios,
de todos que me possam desejar mal,
perto ou longe de mim, 
sozinhos ou em multidão.

Eu invoco hoje todos esses poderes para me proteger de todo o mal,
contra todo torpe desejo que possa ameaçar meu corpo e minha alma,
contra o misticismo dos falsos profetas,
contra as tenebrosas leis do paganismo,
contra as falsas doutrinas dos hereges,
contra as artes da idolatria,
contra os malefícios de bruxas, cartomantes ou feiticeiros,
contra todo conhecimento que corrompe o corpo e a alma do homem.

Que Cristo me proteja neste dia
contra venenos e contra o fogo,
contra afogamento e contra ferimentos,
para que hoje eu receba graças abundantes. 

Cristo comigo, Cristo diante de mim, Cristo atrás de mim,
Cristo em mim, Cristo abaixo de mim, Cristo acima de mim,
Cristo à minha direita, Cristo à minha esquerda,
Cristo quando me deito, Cristo quando me sento, Cristo quando me levanto .

Cristo no coração de todo aquele que pensa em mim,
Cristo na boca de todo aquele que fala de mim,
Cristo em todos os olhares que me veem e veem as minhas obras,
Cristo em todos os ouvidos que me podem ouvir.

Hoje eu me levanto 
movido por uma força poderosa,
pela invocação da Trindade,
pela fé em Deus três vezes santo,
pela confissão da unidade
do Criador da criação.

(tradução do autor do blog)

sexta-feira, 22 de abril de 2022

É PRECISO MUDAR O HOMEM INTERIOR

Carta enviada por Santo Inácio de Loyola a Bartolomeu Romano, então estudante jesuíta, em resposta à declarada intenção do mesmo pela não continuidade dos seus estudos religiosos no Colégio de Ferrara (Itália):

Roma, 26 de janeiro de 1555

Caríssimo Irmão Bartolomeu:

Pelas suas cartas e as dos outros, mas principalmente pelas suas, entendo o seu estado. E tanto mais me desagrada quanto mais desejo o seu bem espiritual e a sua salvação eterna. Está muito enganado se pensa que a causa de não conseguir aquietar-se nem dar fruto no caminho do Senhor está no lugar ou nos superiores ou nos irmãos. 

Isso vem de dentro de você e não de fora, isto é, da sua pouca humildade, pouca obediência, pouca oração e, enfim, pouca mortificação e pouco fervor para avançar no caminho da perfeição. Pode mudar de lugar, de superiores e de irmãos: mas se não mudar o seu homem interior, nunca agirá bem e em qualquer lugar será o mesmo, até que chegue a ser humilde, obediente, devoto, mortificado no seu amor-próprio. 

De modo que procure esta mudança e não outra. Digo que procure mudar o homem interior e dominá-lo como servo de Deus, e não pense em nenhuma mudança externa, porque ou você será bom aí, em Ferrara, ou não será bom em nenhum outro colégio. E tenho certeza disto, pois me consta que em Ferrara poderia ser mais ajudado que em qualquer outro lugar.

Dou-lhe um conselho: que se humilhe muito de coração ao seu Superior e lhe peça ajuda abrindo-lhe o seu coração em confissão ou como quiser e tome o remédio que este lhe dará. Ocupe-se em ver e chorar as suas imperfeições e não as dos outros, procure em diante dar maior edificação e não encha, por favor, a paciência daqueles que o amam em Jesus Cristo nosso Senhor e gostariam de vê-lo bom e perfeito servo do mesmo.

Cada mês me escreva duas linhas para dizer como se encontra quanto à humildade, obediência, oração e desejo de sua perfeição; e também como vai nos estudos. Cristo Nosso Senhor o guarde.

(Excerto da obra 'Cartas de Santo Inácio de Loyola', Vol. II, A. Cardoso, 1990)

quinta-feira, 21 de abril de 2022

OS GRANDES DOCUMENTOS DA IGREJA (VII)

Carta Encíclica INSCRUTABILI DEI CONSILIO
 [21 de abril de 1878]

Papa Leão XIII (1878 - 1903)

sobre os males da sociedade moderna, suas causas e seus remédios 


Veneráveis Irmãos, Saudação e Benção Apostólica.

INTRODUÇÃO

1. Apenas elevado, por um impenetrável desígnio de Deus, e sem o merecer, ao fastígio da Dignidade Apostólica, sentimo-nos impelido por um vivo desejo e por uma espécie de necessidade a dirigir-nos a Vós por carta, não somente para vos manifestar os sentimentos da nossa profunda afeição, mas ainda para cumprir junto a Vós, chamados que fostes a compartilhar a nossa solicitude, os deveres do cargo que Deus nos confiou, animando-vos a sustentar conosco os combates dos tempos atuais pela Igreja de Deus e pela salvação das almas.

I. OS MALES DA SOCIEDADE

2. Efetivamente, desde os primeiros instantes do nosso pontificado, o que se oferece aos nossos olhares é o triste espetáculo dos males que de todas as partes acabrunham o gênero humano: é essa subversão geral das verdades supremas que são como que os fundamentos em que se apoia o estado da sociedade humana; é essa audácia dos espíritos que não podem suportar nenhuma autoridade legítima; é essa causa perpétua de dissensões de onde nascem as querelas intestinas e as guerras cruéis e sangrentas; é o desprezo das leis que regulam os costumes e protegem a justiça; é a insaciável cupidez das coisas que passam e o esquecimento das coisas eternas, levados ambos até esse furor insensato que por toda parte induz tantos infelizes a levarem sobre si mesmos, sem tremerem, mãos violentas; é a administração inconsiderada da fortuna pública, o esbanjamento, a malversação, como também a impudência dos que, cometendo as maiores espertezas, se esforçam por dar-se a aparência de defensores da pátria, da liberdade e de todos os direitos; é, enfim, essa espécie de peste mortal que, insinuando-se nos membros da sociedade humana, não deixa a esta repouso e lhe prepara novas revoluções e funestas catástrofes.

II. A CAUSA DESSES MALES

3. Ora, havemo-nos convencido de que esses males têm a sua principal causa no desprezo e na rejeição dessa santa e augustíssima Autoridade da Igreja que governa o gênero humano em nome de Deus, e que é a salvaguarda e o apoio de toda autoridade legítima. Os inimigos da ordem pública, que perfeitamente o têm compreendido, pensaram que nada era mais próprio para subverter os fundamentos da sociedade do que atacar sem trégua a Igreja de Deus, do que torná-la odiosa e odiável por meio de vergonhosas calúnias, representando-a como inimiga da verdadeira civilização, do que enfraquecer-lhe a autoridade e a força por meio de feridas incessantemente renovadas, e do que derrubar o poder supremo do Pontífice Romano, que é neste mundo o guarda e o defensor das regras eternas e imutáveis do bem e do justo. 

Daí, pois, saíram essas leis subversivas da divina constituição da Igreja Católica, leis cuja promulgação na maioria dos países temos de deplorar; daí promanaram o desprezo do poder e spiritual e os entraves opostos ao exercício do ministério eclesiástico, a dispersão das Ordens religiosas e o confisco dos bens que serviam para sustentar os ministros da Igreja e os pobres; daí, ainda, o resultado de haverem sido subtraídas à salutar direção da Igreja as instituições públicas consagradas à caridade e à beneficência; daí essa liberdade desenfreada de ensinar e de publicar tudo o que é mal, ao passo que, contrariamente, de toda maneira se viola e se oprime o direito da Igreja à instrução e à educação da juventude. E outro não foi o fim que os homens se propuseram apoderando-se do principado temporal que a Divina Providência havia longos séculos concedera ao Pontífice Romano para que este livremente e sem peias pudesse, para a salvação eterna dos povos, usar do poder que Jesus Cristo lhe conferiu.

III. REMÉDIOS PARA OS MALES

4. Se relembramos, Veneráveis Irmãos, esses funestos e inúmeros males, não é para aumentar a tristeza que por si mesmo faz nascer em Vós tão deplorável estado de coisas; mas é por compreendermos que, à vista disso, reconhecereis qual é a gravidade da situação que reclama o nosso ministério e o nosso zelo, e com que solicitude devemos, nestes tempos inditosos, trabalhar para defender e garantir com todas as nossas forças a Igreja de Cristo e a dignidade da Sé Apostólica atacada por tantas calúnias.

Caridade Fraterna

5. Bem claro e evidente é, Veneráveis Irmãos, que à causa da civilização faltam fundamentos sólidos se ela não se apoia nos princípios eternos da verdade e nas leis imutáveis do direito e da justiça, se um amor sincero não une entre si as vontades dos homens e não regula felizmente a distinção e os motivos dos seus deveres mútuos. Ora, quem ousaria negá-lo? Não foi a Igreja quem, pregando o Evangelho entre as nações, fez brilhar a luz da verdade no meio dos povos selvagens e imbuídos de superstições vergonhosas, e quem os reconduziu ao conhecimento do divino Autor de todas as coisas e ao respeito de si mesmos? Não foi a Igreja quem, fazendo desaparecer a calamidade da escravidão, revocou os homens à dignidade da sua nobilíssima natureza? Não foi ela quem, desfraldando sobre todas as plagas da terra o estandarte da Redenção, atraindo a si as ciências e as artes ou cobrindo-as com a sua proteção, por suas excelentes instituições de caridade, onde todas as misérias acham alívio, por suas fundações e pelos depósitos cuja guarda aceitou, em toda parte civilizou nos seus costumes privados e públicos o gênero humano, reergueu-o da sua miséria e formou-o, com toda sorte de desvelos, para um gênero de vida conforme à dignidade e à esperança humanas? 

E agora, se um homem de espírito são comparar a época em que vivemos, tão hostil à Religião e à Igreja de Jesus Cristo, com aqueles tempos tão felizes em que a Igreja era honrada pelos povos como uma Mãe, convencer-se-á inteiramente de que a nossa época cheia de perturbações e destruições se precipita direitinho e rapidamente para a sua perda, e que aqueles tempos foram tanto mais florescentes em excelentes instituições, em tranquilidade da vida, em riqueza e em prosperidade, quanto mais submissos ao governo da Igreja e quanto mais observantes das suas leis se mostraram os povos. E, se os bens numerosos que acabamos de relembrar e que deveram o seu nascimento ao ministério da Igreja e à sua influência salutar, são verdadeiramente obras e glórias da civilização humana, muitíssimo longe está, pois, que a Igreja de Jesus Cristo abomine a civilização e a repila, visto ser a si, pelo contrário, que ela crê caber inteiramente a honra de lhe haver sido a nutriz, a mestra e a mãe.

6. Bem mais: essa espécie de civilização que, ao contrário, repugna às santas doutrinas e às leis da Igreja, não passa de uma falsa civilização, e deve ser considerada como um vão nome sem realidade. É esta uma verdade de que nos fornecem prova manifesta esses povos que não viram brilhar a luz do Evangelho; na vida deles podem-se ter vislumbrado algumas falsas aparências de educação mais cultivada, porém os verdadeiros e sólidos bens da civilização não prosperariam neles.

Respeito à Autoridade da Igreja

7. Com efeito, não se deve considerar como civilização perfeita a que consiste em desprezar audaciosamente todo poder legítimo; e não se deve saudar com o nome de liberdade a que tem por cortejo vergonhoso e miserável a propagação desenfreada dos erros, o livre saciamento das cupidezes perversas, a impunidade dos crimes e dos malfeitores e a opressão dos melhores cidadãos de toda classe. Esses são princípios errôneos, perversos e falsos; não poderiam, pois, certamente ter força para aperfeiçoar a natureza humana e fazê-la prosperar, pois o pecado torna os homens miseráveis (Pv 14, 34); pelo contrário, absolutamente inevitável se torna que, após haverem corrompido as mentes e os corações, pelo seu próprio peso esses princípios lançam os povos em toda sorte de desgraças, que subvertem toda ordem legítima e conduzem assim, mais cedo ou mais tarde, a situação e a tranquilidade pública à sua última perda.

8. Ao contrário, se contemplarmos as obras do Pontificado Romano, que pode haver de mais iníquo do que negar quanto os Pontífices Romanos têm nobremente e bem merecido de toda a sociedade civil? Nossos predecessores, com efeito, querendo prover à felicidade dos povos, empreenderam lutas de todo gênero, suportaram rudes fadigas e nunca hesitaram em se expor a ásperas dificuldades; de olhos fitos no céu, não abaixaram a fronte ante as ameaças dos maus, nem cometeram a baixeza de se deixarem desviar do seu dever, fosse pelas lisonjas, fosse pelas promessas. Foi esta Sé Apostólica quem apanhou os restos da antiga sociedade destruída e os reuniu juntos. Ela foi também o facho amigo que iluminou a civilização dos tempos cristãos; a âncora de salvação no meio das mais terríveis tempestades que tenham agitado a raça humana; o vínculo sagrado da concórdia que une entre si nações afastadas e costumes diversos; ela foi enfim o centro comum onde se vinha buscar tanto a doutrina da fé e da religião quanto os auspícios de paz e os conselhos dos atos a cumprir. Que mais? É uma glória dos Pontífices Romanos a de se haverem sempre e sem trégua oposto como uma muralha e um baluarte a que a sociedade humana tornasse a cair na superstição e na antiga barbárie.

9. Mas, oxalá que essa autoridade salutar nunca tivesse sido desprezada ou repudiada! Não teria então o poder civil perdido essa auréola augusta e sagrada que o distinguia, que a religião lhe dera, e que é só o que torna o estado de obediência nobre e digno do homem; não se teriam visto atear-se tantas sedições e guerras que foram a causa funesta de calamidades e morticínios; e tantos reinos, outrora tão florescentes, tombados hoje do fastígio da prosperidade, não estariam esmagados sob o peso de toda sorte de miséria. Temos ainda um exemplo das desgraças acarretadas pelo repúdio da autoridade da Igreja nos povos orientais que, quebrando os laços dulcíssimos que os uniam a esta Sé Apostólica, perderam o esplendor da sua antiga reputação, a glória das ciências e das letras e a dignidade do seu império.

10. Ora, esses admiráveis benefícios que a Sé Apostólica derramou sobre todas as plagas da terra, e de que fazem fé os mais ilustres monumentos de todos os tempos, foram especialmente sentidos por esta terra da Itália que tirou do Pontificado Romano frutos tanto mais abundantes quanto, em razão da sua situação, se achava ela mais próxima dele. É com efeito, aos Pontífices Romanos que a Itália deve reconhecer-se devedora da glória sólida e da grandeza com que brilhou no meio das outras nações. A autoridade e os desvelos paternais deles várias vezes a protegeram contra os vivos ataques dos inimigos, e foi deles que ela recebeu o alívio e o socorro necessários para que a fé católica fosse sempre integralmente conservada no coração dos italianos.

11. Estes méritos dos nossos predecessores, para não citar outros, nos são atestados sobretudo pela história dos tempos de São Leão Magno, de Alexandre III, de Inocêncio III, de São Pio V, de outros Pontífices, pelos cuidados e sob os auspícios dos quais a Itália escapou à última destruição de que estava ameaçada pelos bárbaros, conservou intacta a antiga fé e, no meio das trevas e das barbáries de uma época mais grosseira, desenvolveu a luz das ciências e o esplendor das artes, e as conservou florescentes. São eles atestados ainda por esta santa cidade, sede dos Pontífices, a qual deles tirou esta grande vantagem não somente de ser a mais forte cidadela da fé, mas ainda de haver granjeado a admiração e o respeito do mundo inteiro, tornando-se o asilo das belas artes e a mansão da sabedoria. E, como a grandeza destas coisas foi transmitida à lembrança eterna da posteridade pelos monumentos da história, fácil é compreender que, só por uma vontade hostil e por uma indigna calúnia, empregadas ambas em enganar os homens, é que se tem feito acreditar, pela palavra e pelos escritos, ter sido esta Sé Apostólica um obstáculo à civilização dos povos e à prosperidade da Itália.

Restauração do Poder Temporal dos Papas

12. Se, pois, todas as esperanças da Itália e do mundo inteiro estão colocadas nessa força, tão favorável ao bem e à unidade de todos, de que goza a autoridade da Sé Apostólica, e nesse vínculo tão estreito que une todos os fiéis ao Pontífice Romano, compreendemos que nada devemos ter mais a peito do que conservar religiosamente intacta a dignidade da Cátedra Romana e estreitar cada vez mais a união dos membros com a cabeça e a dos filhos com seu Pai.

13. É por isso que, para manter antes de tudo, tanto quanto está em nosso poder, os direitos da liberdade desta Santa Sé, jamais cessaremos de combater para conservar à nossa autoridade a obediência que lhe é devida, para afastar os obstáculos que impedem a plena liberdade do nosso ministério e do nosso poder, e para conseguir o retorno àquele estado de coisas em que os desígnios da Divina Sabedoria haviam outrora colocado os Pontífices Romanos. E não é, Veneráveis Irmãos, nem por espírito de ambição, nem por desejo de domínio que somos impelidos a pedir esse retorno; mas sim pelos deveres do nosso cargo e pelos compromissos religiosos do juramento que nos liga: ademais, somos a isso impelido não somente pela consideração de que esse principado nos é necessário para defender e conservar a plena liberdade do poder espiritual, como ainda porque tem sido plenamente verificado que, quando se trata do principado temporal da Sé Apostólica, é a própria causa do bem público e da salvação de toda a sociedade humana que está em questão. 

Daí se segue, em razão do dever do nosso cargo que nos obriga a defender os direitos da Santa Igreja, que não podemos dispensar de renovar e de continuar nesta carta as declarações e os protestos que o nosso predecessor Pio IX, de santa memória, várias vezes formulou e renovou, tanto contra a ocupação do poder temporal como contra a violação dos direitos da Igreja Romana. Volvemos ao mesmo tempo a nossa voz para os príncipes e para os chefes supremos dos povos e instantemente lhes suplicamos, pelo augusto nome do Deus poderosíssimo, não repelirem o auxílio que a Igreja lhes oferece em momento tão necessário, cercarem amistosamente, como de desvelos unânimes, esta fonte de autoridade e de salvação, e a ela se prenderem cada vez mais pelos laços de um amor estreito e de um profundo respeito. Faça o Céu que eles reconheçam a verdade de tudo o que havemos dito, e se persuadam de que a doutrina de Jesus Cristo, como dizia Santo Agostinho, é a grande salvação do país quando as pessoas conformam a ela os seus atos (Ep. 138). Possam eles compreender que a sua segurança e tranquilidade, tanto como a segurança e a tranquilidade públicas, dependem da conservação da Igreja e da obediência que lhes prestarem, e aplicar então todos os seus pensamentos e todos os seus cuidados a fazer desaparecer os males de que a Igreja e seu Chefe visível são afligidos. Possa daí, enfim, resultar que os povos que eles governam entrem na trilha da justiça e da paz, e gozem de uma era feliz de prosperidade e de glória.

Fidelidade à Santa Sé Apostólica

14. Querendo também, em seguida, manter cada vez mais estreita a concórdia entre todo o rebanho católico e o seu Pastor supremo, com afeto particular aqui vos concitamos, Veneráveis Irmãos, e vos exortamos calorosamente a, pelo vosso zelo sacerdotal e pela vossa vigilância pastoral, inflamardes do amor da religião os fiéis que vos são confiados, a fim de que eles se prendam cada vez mais estreitamente a esta Cátedra de verdade e de justiça, a fim de que aceitem todos a doutrina dela com a mais profunda submissão de espírito e de vontade, e a fim de que rejeitem, enfim, absolutamente todas as opiniões, mesmo as mais difundidas, que souberem ser contrárias aos ensinamentos da Igreja. Sobre este assunto, os Pontífices Romanos nossos predecessores, e em particular Pio IX, de santa memória, sobretudo no Concílio do Vaticano, tendo incessantemente diante dos olhos estas palavras de São Paulo: 'Vede que ninguém vos engane por meio da filosofia ou de um vão artifício que seja segundo a tradição dos homens ou segundo os elementos do mundo, e não segundo Jesus Cristo' (Col 2, 8), todas as vezes que se tornou necessário não descuraram reprovar os erros que irrompiam e fulminá-los com as censuras apostólicas. 

Nós também, seguindo as pegadas dos nossos predecessores, confirmamos e renovamos todas essas condenações do alto desta Sé Apostólica de verdade e, ao mesmo tempo, pedimos vivamente ao Pai das luzes faça com que todos os fiéis, inteiramente unidos num mesmo sentimento e numa mesma crença, pensem e falem absolutamente como nós. O vosso dever, Veneráveis Irmãos, é empregardes os vossos desvelos assíduos em espalhar ao longe no campo do Senhor a semente das celestes doutrinas, e em fazer penetrar oportunamente na mente dos fiéis os princípios da fé católica, para que lancem nela profundas raízes e nela se conservem ao abrigo do contágio dos erros. Quanto maiores esforços fazem os inimigos da religião para ensinar aos homens sem instrução, e sobretudo aos jovens, princípios que lhes obscurecem a mente e corrompem o coração, tanto mais é precioso trabalhar ardentemente não só para fazer prosperar um hábil e sólido método de educação, mas sobretudo para não se apartar da fé católica, no ensino das letras e das ciências e em particular da filosofia, da qual depende em grande parte a verdadeira direção das outras ciências e que, longe de tender a derrubar a divina revelação, pelo contrário, se alegra de lhe aplanar o caminho e de defendê-la contra os seus assaltantes, como pelo exemplo e pelos escritos no-lo ensinaram o grande Agostinho e o Doutor Angélico, e todos os demais mestres da sabedoria cristã.

Reforma do Lar Cristão

15. Todavia, necessário se torna que, para ser uma garantia da verdadeira fé e da religião, e uma salvaguarda da integridade dos costumes, essa excelente educação da juventude comece no próprio interior da família, dessa família que, infelizmente perturbada nos tempos atuais, só pode recuperar a sua liberdade por essas leis que o próprio divino Autor lhe fixou ao instituí-la na Igreja. Jesus Cristo, com efeito, elevando à dignidade de sacramento a aliança do matrimônio, que Ele quis fazer servir a simbolizar a sua união com a Igreja, não somente tornou mais santa a ligação dos esposos, como também preparou tanto aos pais como aos filhos meios eficacíssimos próprios para lhes facilitar, pela observância dos seus deveres recíprocos, a obtenção da felicidade temporal e eterna.

16. Infelizmente, depois que leis ímpias e sem nenhum respeito pela santidade desse grande sacramento o rebaixaram à mesma categoria dos contratos civis, tem sucedido que, profanando a dignidade do matrimônio cristão, cidadãos tenham adotado o concubinato legal ao invés das núpcias religiosas; esposos têm descurado os deveres da fé que se haviam prometido, filhos têm recusado aos pais a obediência e o respeito que lhes deviam, os laços da caridade doméstica têm-se afrouxado, e, o que é bem triste exemplo e muito prejudicial aos costumes públicos, a um amor insensato muitíssimas vezes têm sucedido separações funestas e perniciosas. Impossível é, Veneráveis Irmãos, que a vista dessa miséria e dessas calamidades lamentáveis não excite o vosso zelo e não nos induza a, com cuidado e sem tréguas, exortar os fiéis confiados à vossa guarda a prestarem ouvido dócil aos ensinamentos que se relacionam com a santidade do matrimônio cristão, e a obedecerem às leis da Igreja que regulam os deveres dos esposos e dos filhos.

Reforma dos Costumes Públicos

17. Assim é que conseguireis essa reforma tão desejável dos costumes e do modo de viver de cada homem em particular, porquanto, assim como de um tronco apodrecido não podem brotar senão galhos estragados e frutos secos, assim também por um triste contágio essa funesta chaga que corrompe as famílias e se estende a todos os cidadãos e torna-se um mal e um defeito comum. Ao contrário, uma vez moldada a sociedade doméstica a uma forma de vida cristã, cada membro se acostumará pouco a pouco a amar a religião e a piedade, a detestar as falsas e perniciosas doutrinas, a praticar a virtude, a obedecer aos seus superiores e a reprimir essa procura insaciável do interesse puramente privado que tão profundamente abaixa e enerva a natureza humana. Um bom meio para realizar este objetivo será dirigir e incentivar essas pias associações que, mormente nestes tempos de agora, têm sido mais particularmente instituídas para favorecer os interesses católicos.

18. Em verdade, Veneráveis Irmãos, grandes coisas, coisas mesmo superiores às forças humanas são as que nós assim abraçamos com os nossos votos e com as nossas esperanças; mas, como Deus fez as nações do mundo curáveis e fundou a sua Igreja para a salvação dos povos, prometendo assisti-la até à consumação dos séculos, temos a firme confiança de que o gênero humano, ferido por tantos males e calamidades, graças aos vossos esforços, acabará buscando a salvação e a prosperidade na submissão à Igreja e no magistério infalível desta Cátedra Apostólica.

CONCLUSÃO

Regozijo pela União e Concórdia entre Bispos

19. E agora, Veneráveis Irmãos, antes de encerrarmos esta carta, sentimos a necessidade de participar-vos a nossa alegria ao vermos a união admirável e a concórdia que reinam entre vós e vos unem tão perfeitamente a esta Sé Apostólica, e em verdade ficamos persuadidos de que essa perfeita união é não somente um baluarte inexpugnável contra os assaltos dos inimigos, mas é ainda um presságio feliz e próspero de tempos melhores para a Igreja; ela proporciona um grande alívio à nossa fraqueza, e levanta, assim, de maneira feliz o nosso espírito, ajudando-nos a sustentar com ardor, no difícil múnus que havemos recebido, todas as fadigas e todos os combates pela Igreja de Deus.

Agradecimento pelas Declarações de Amor e Obediência

20. Também não podemos separar dessas causas de esperanças e de alegria que acabamos de vos manifestar, essas declarações de amor e de obediência que, nestes primórdios do nosso pontificado, vós, Veneráveis Irmãos, haveis formulado à nossa humilde pessoa, e que também nos têm sido feitas por tantos eclesiásticos e fiéis provando assim pelas cartas enviadas, pelas larguezas recolhidas, pelas peregrinações realizadas e por tantas outras provas de piedade, que essa devoção e essa caridade que eles não haviam cessado de testemunhar ao nosso digno predecessor permaneceram tão firmes, tão estáveis e tão íntegras, que se não arrefeceram à vinda de um sucessor tão pouco digno dessa herança. 

À vista de testemunhos tão esplêndidos da fé católica, devemos humildemente confessar que o Senhor é bom e benevolente, e a vós, Veneráveis Irmãos, e a todos esses filhos queridos de quem as havemos recebido, exprimimos os numerosos e profundos sentimentos de gratidão que inundam o nosso coração, cheios de confiança de que, na angústia e nas dificuldades dos tempos atuais, o vosso zelo e o vosso amor, bem como os dos fiéis, jamais nos faltarão. Tão pouco duvidamos de que esses notáveis exemplos de piedade filial e de virtude cristã contribuam poderosamente para tocar o coração do Deus misericordiosíssimo, e para o fazer deitar um olhar de benevolência sobre o seu rebanho e conceder à Igreja a paz e a vitória. E, como estamos convencido de que essa paz e essa vitória nos serão mais pronta e mais facilmente concedidas se os fiéis dirigirem constantemente a Deus preces e votos para as pedir, vivamente vos exortamos, Veneráveis Irmãos, a excitardes com esse fim o zelo dos fiéis, concitando-os a empregarem como mediadora junto a Deus a Imaculada Rainha dos Céus, e como intercessores São José, padroeiro celeste da Igreja, e os santos apóstolos Pedro e Paulo, a cujo poderoso patrocínio recomendamos a nossa humilde pessoa, todas as ordens da hierarquia eclesiástica, e todo o rebanho do Senhor.

Votos e Bênção Apostólica

21. Finalmente, desejamos que estes dias em que festejamos o solene aniversário da ressurreição de Jesus Cristo sejam, para Vós e para todo o rebanho do Senhor, felizes, salutares e cheios de santa alegria, pedindo a Deus, que é tão bom, apague as faltas que havemos cometido e nos faça misericordiosamente remissão da pena que elas nos mereceram e, pela virtude desse Sangue do Cordeiro Imaculado, apague a sentença lavrada contra nós (Col 2, 14).

22. A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, a caridade de Deus e a comunicação do Espírito Santo sejam com todos vós (2 Cor 13, 13), Veneráveis Irmãos, e é de todo coração que, a vós e a cada um em particular, bem como aos nossos caros filhos o clero e os fiéis de vossas Igrejas, concedemos a bênção apostólica como penhor da nossa especial benevolência e como presságio da proteção celeste.

quarta-feira, 20 de abril de 2022

O DOGMA DO PURGATÓRIO (XXX)

Capítulo XXX

Razões da Expiação no Purgatório - Pecados da Juventude - Santa Catarina da Suécia e a Princesa Gida

São muitas as vezes que os cristãos não refletem suficientemente sobre a necessidade de se fazer penitência pelos pecados cometidos na juventude, os quais serão um dia expiados pela mais rigorosa penitência do Purgatório. Tal foi o caso da princesa Gida, nora de Santa Brígida, como lemos nas Vidas dos Santos - Vida de Santa Catarina (24 de março). Santa Brígida estava em Roma com a sua filha Catarina, quando esta foi privilegiada com uma aparição da alma de sua cunhada Gida, cuja morte então ignorava. 

Quando se encontrava em oração na antiga basílica de São Pedro, Catarina viu diante de si uma mulher vestida com uma túnica branca e um manto preto, que lhe veio pedir suas orações por uma pessoa falecida: 'É uma de suas conterrâneas' - acrescentou ela - 'e que precisa da sua ajuda'. 'Qual é o nome dela?' - perguntou a santa. 'É a princesa Gida da Suécia, a esposa do seu irmão Charles'. Catarina implorou então à aparição que a acompanhasse até sua mãe Brígida, para dar a ela estas tristes notícias. 'Estou encarregado de dar esta mensagem só para você' - disse a aparição - 'e não tenho permissão para fazer outras visitas, pois devo partir imediatamente. Você não tem motivos para duvidar da veracidade desse fato; em poucos dias deverá chegar um mensageiro da Suécia, trazendo a coroa de ouro da princesa Gida. Ela a legou a você por testamento, a fim de garantir a assistência de suas orações; mas estenda-lhe desde agora a sua ajuda caridosa, pois ela precisa muito e urgentemente das suas orações'. Com essas palavras, retirou-se. Catarina a teria seguido mas, embora os seus trajes a tivessem distinguido facilmente, ela não mais  se encontrava em lugar algum.

Surpreendida e abalada por este estranho acontecimento, Catarina apressou-se a regressar à casa da mãe e contar a ela tudo o que tinha acontecido. Santa Brígida respondeu com um sorriso: 'Foi a sua cunhada Gida que apareceu a você. Nosso Senhor teve a delicadeza de revelar isso para mim. A querida falecida morreu nos mais consoladores sentimentos de piedade; é por isso que obteve o favor de aparecer a você pedindo as suas orações. Ela tem ainda que expiar as inúmeras falhas de sua juventude. Vamos ambas fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para lhe dar alívio. A coroa de ouro que ela lhe enviou impõe esta obrigação a você'.

Poucas semanas depois, um emissário da corte do príncipe Charles chegou a Roma, carregando a coroa e crendo ser o primeiro a transmitir a notícia da morte da princesa Gida. A bela coroa foi vendida e o dinheiro arrecadado foi usado para a celebração de missas e outras boas obras em intenção do repouso da alma da falecida princesa.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog)

terça-feira, 19 de abril de 2022

BREVIÁRIO DIGITAL: PALAVRAS ETERNAS


'A minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai que me enviou vive, e eu vivo pelo Pai, assim também aquele que comer a minha carne viverá por mim' (Jo 6, 55 - 57)

segunda-feira, 18 de abril de 2022

TESOURO DE EXEMPLOS (143/145)

 

143. O PRESENTE DE NATAL

Conta o acadêmico francês J. Marmier que, na manhã de Natal, Bertinha, filha do porteiro, entregou-lhe seus jornais e cartas. Tinha na mão uma moeda de prata novinha de cinco francos e disse-lhe:
➖ Olha o que o Menino Jesus me encarregou de te dar.

A menina ao olhar com olhos grandes aquela moeda e exclama:
➖ Como é bom o Menino Jesus!
➖ Sim, Ele queria por esta moeda em teus sapatinhos na chaminé, mas não os viu.
➖ Meus sapatinhos! Como é possível? Lá estavam e de manhã lá encontrei uma boneca e uma laranja...
➖ Sim, mas como nesta noite de Natal Jesus muito o que fazer e me conhece bem, me parou por um instante e me disse: 'Isto é para a Bertinha'.
➖ O Menino Jesus sabe o meu nome?
➖ Como não? Tanto sabe que me deu essa moedinha para ti.
➖ Ah! - murmurou Bertinha juntando as mãozinhas - terei que lhe agradecer muito.

E subiu correndo escada acima para à sua mamãe o presente que lhe mandara o Menino Jesus. Se algum livre pensador lesse por acaso esta história, diria provavelmente que o acadêmico e a Bertinha são dois idiotas, mas... que talentosos e que sábios são os livre pensadores!

144. O SACRIFÍCIO POR JESUS

Um sacrifício - disse a mãe - seria, por exemplo, em lugar de gastar com brinquedos os cinco cruzeiros que te deu a vovó pelo Natal, dá-los por amor de Jesus a algum menino pobre que não tem o que comer nem o que vestir.
O menino calou-se. Na manhã seguinte, porém, quando foi abraçar a mamãe, disse-lhe:
➖ Mamãe, quero fazer um sacrifício pelo Menino Jesus. Vou dar os cinco cruzeiros ao pobrezinho enfermo que um dia destes fomos visitar.

No café, pôs de lado o pão com manteiga.
➖ Não tens fome, filhinho?
➖ Guardo-o para o pobrezinho.
➖ Come, eu te darei outro para o pobrezinho.
➖ Não, não, mamãe! Não seria a mesma coisa; não seria um sacrifício para o Menino Jesus.
E brotaram lágrimas dos olhos da feliz mãe...

145. MAÇÃS E ROSAS DO CÉU

No ano de 304, no maior furor da perseguição movida por Diocleciano, uma virgem cristã, chamada Dorotéia, foi conduzida ao tribunal do governador de Cesareia, na Capadócia. Como não quis sacrificar aos deuses e aos ídolos pagãos, a esposa de Cristo teve de sofrer um terrível martírio. 

Mantendo-se tranquila no meio dos tormentos, disse ao juiz:
➖ Apressa-te a fazer o que queres, e sejam os suplícios o caminho que me leve ao celeste esposo. Amo-o e nada temo. Desejo os tormentos, pois são leves e passageiros, uma vez que por meio deles chegamos às delícias do paraíso, onde há frutos e flores de maravilhosa formosura e suavidade, que nunca murcham, fontes de águas vivas, onde os santos são saciados na alegria eterna de Jesus Cristo.

Ao ouvir estas palavras o assessor do juiz, um letrado chamado Teófilo, dirigiu-se à santa caçoando e rindo:
➖ Envia-me então rosas e maçãs do jardim de teu esposo do paraíso quando lá chegares.
➖ Sim, eu as enviarei - respondeu a jovem.

Estava-se em pleno inverno. O verdugo apoderou-se do corpo da virgem e cortou-lhe a cabeça. Teófilo, chegando em casa, contou a pilhéria aos amigos, entre zombarias e sarcasmos. De repente, porém, apareceu-lhe um menino de rara beleza, levando nas pregas de seu manto três magníficas maçãs e três rosas de extraordinária frescura e fragrância.
➖ Eis aqui - disse o menino - o que a virgem Dorotéia prometeu enviar-lhe da parte do seu esposo do Céu.

Teófilo, estupefato, tomou as maçãs e as rosas e, contemplando-as um instante, exclamou:
➖ Verdadeiramente Jesus Cristo é Deus, o Deus que cumpre o que promete.
Fazendo esta confissão, Teófilo selava assim a sua sentença de morte. Algumas horas depois conduziam-no ao suplício, tornando-se então mártir da fé católica de que antes zombara.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)