quarta-feira, 24 de março de 2021

A COMUNHÃO NA MÃO

Um artigo de reflexão dos anos 70, muitíssimo atual...


... Damos nós um exemplo: 'a comunhão na mão'. Até poucos anos atrás, era um abuso praticado por vários membros da Outra Igreja [refere-se aqui à Igreja Conciliar, aquela pós-Concílio Vaticano II], com a intenção de bem marcar uma nova e desembaraçada atitude do crente diante da Hóstia Consagrada, isto é, o Santíssimo Sacramento do altar, que, além de conferir a graça, contém o Autor da Graça.

Se essa evoluída atitude não é a de um acintoso desrespeito, que a minha Igreja [refere-se à Igreja Católica tradicional] chama de sacrilégio e profanação, só pode ser a de uma simples e translúcida falta de fé na Presença Real. Ora, quem de tal modo publica essa falta de fé está exatamente no caso dos discípulos de Jesus (Jo 6,67). Já não são católicos. Isto era assim: mas agora as autoridades da Outra Igreja, a da CNL [Conselho Nacional de Leigos, atual Conselho Nacional do Laicato do Brasil - CNLB] da CNBB, acabam de declarar que aquele abuso tornou-se evolução que eles facilmente previam e agora aprovaram*.

Quando ouvi na missa do Corpo de Deus, especialmente escolhida, delicadamente aprazada, o pobre padre anunciar palavras emanadas de um 'bispo' chamado Castro Pinto, que anunciavam a oficialização da comunhão na mão, senti-me esbofeteado por satanás. E então compreendo que aquela missa reformada é uma invenção que permite a bispos da Outra Igreja ditarem regras à Igreja de Cristo: sim, inventada, composta, reformada, especialmente para tornar confuso, ambíguo, insuportavelmente misturados dois credos inconciliáveis. Tive uma pena enorme de toda aquela pobre gente que cumpria um mandamento da Igreja (ir à missa em dia de preceito é mandamento da Igreja; não ir, é pecado. Obviamente, isso não se aplica à chamada missa nova, porque ela não é católica; e nem a autoridade que a criou) numa arapuca comandada pela Outra Igreja.

Estão ali, sentados ou de pé, apatetados, desinformados, desdoutrinados, a perder dia a dia a fé na Presença Real de Jesus. Estão ali os pobres incautos que vagamente querem ser católicos, a ouvir instruções emanadas do bispo Castro Pinto que anos atrás festejou, contra a vontade de seu superior, o 450º centenário da reforma luterana.

Amanhã, começarão nas diversas dioceses as comunhões que levarão o Corpo de Deus até à macumba, para alegria dos abades beneditinos que já acharam certo enquadramento das feitiçarias na Regra de São Bento. Hipocritamente, as autoridades fingiram proteger o uso ainda mais profano das Hóstias consagradas, recomendando que sejam consumidas no ato. Mas quem poderá evitar as fáceis escamoteações? Aliás, essa nova profanação da Hóstia levada para todos os usos imagináveis já não está na linha de uma evolução facilmente previsível?

Compreendi com uma dor lancinante que a nova missa não é apenas uma liturgia achatada ou mutilada: é realmente, como se vê, uma oportunidade de deixar os católicos à mercê de autoridades anticatólicas. A evidência se impõe: é uma ocasião de pecado para os advertidos. Há trinta anos caminho procurando acertar os passos pela presença de Jesus. Não sei como fazer para conseguir receber o Santíssimo Sacramento do Altar em templos em que a Santa Hóstia esteja fora do alcance da CNL da CNBB e das autoridades que julgam possível servir à Igreja e à anti-Igreja. 

Não posso, evidentemente, ir todos os dias a Petrópolis, Mariana, Campos ou Porto Alegre atualmente [dioceses que eram exceções em meados dos anos 70, que não são mais exceções nos dias atuais], ou outra diocese onde, com a Graça de Deus, os excelentíssimos senhores bispos resistiram e proibiram o novo abuso contra a fé na Presença Real e onde todos os católicos esperam que, com especial auxílio de Nossa Senhora de Fátima e de Nossa Senhora Aparecida, esses bispos católicos resistam e permaneçam fieis a Jesus e repilam energicamente a regra de evolução publicada em Itaici por Dom Clemente; e, assim, não podendo evidentemente colher esses frutos tão esparsos, só vejo uma saída para não me deixar levar pelos que se afastam de Jesus, na prática de tantos desrespeitos: pedir a Deus que me abrevie os dias que uma saúde ainda sólida ameaça de um incompreensível prolongamento.

* se o CNL já era assim, seria impossível a Corção imaginar o que representa hoje o tal CNLB...

(artigo publicado por Gustavo Corção, no jornal 'O Globo', de 05/06/1975, com inserção de trechos em itálico pelo autor do blog)

terça-feira, 23 de março de 2021

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

Você encontra-se afastado dos locais de culto, mas a fé habita ainda em você. Vejamos: o que é mais importante, o lugar ou a fé? Verdadeira fé, é claro. Quem perdeu e quem ganhou nesta luta, quem guarda a sé ou quem guarda a fé? É verdade, os edifícios são bons, quando a fé apostólica é pregada a você; são santos se tudo ali acontece de maneira santa ... Vós sois felizes, vós que permaneceis na Igreja por causa da vossa fé, que conservais os seus alicerces fortes, como vos foram transmitidos pela tradição apostólica. E se algum ciúme execrável tenta sacudi-lo em várias ocasiões, não consegue. São eles que romperam com isso na crise atual. Ninguém, nunca, prevalecerá contra sua fé, amados irmãos, e acreditarmos que Deus nos fará um dia retornar às nossas igrejas. Quanto mais violentos eles se tornam para ocupar os lugares de culto, mais se separam da Igreja. Eles afirmam que representam a Igreja mas, na realidade, são eles que, por sua vez, são expulsos dela e saem do verdadeiro caminho.

(Santo Atanásio de Alexandria, exortação aos cristãos perseguidos pelos arianos)

segunda-feira, 22 de março de 2021

A VIDA OCULTA EM DEUS: DEUS CRIA O VAZIO NA ALMA


Vós, ó meu Deus, separais progressivamente a alma de tudo o que não vem de Vós. Em torno dela e em si mesma, cria-se o vazio e nada além de Vós passa a dizer alguma coisa para ela. Os seus próprios exercícios de piedade são desprovidos de qualquer encanto. Eles por si só não a satisfazem mais. Ao perceber isso, a alma se inquieta mas continua a realizá-los, embora com pouca satisfação e pouco sucesso, e não os abandona por crer que, assim, ela pode pensar e se aproximar de Vós. 

Pensar em Vós e se aproximar de Vós passa a ase uma experiência dolorosa e deliciosa para a alma. No íntimo, Vós exerceis sobre ela uma atração misteriosa da qual ela só se encontra vagamente consciente e que não permite que se dedique mais às suas orações como antes. Isso porque agora o Vosso amor a envolve suavemente e a dispõe num recolhimento totalmente novo para ela. Quão feliz ela se sente, apesar de sua inquietação! Assim ela gostaria de permanecer sempre sob esse misterioso encantamento, cuja origem e cuja natureza mal acabou de compreender. 

Se pudesse, certamente diria: Domine bonum est nos hic esse (Mt 17,40) - 'Senhor, é bom estarmos aqui'. E assim, quando o encanto se desfaz, seu maior desejo é desfrutá-lo novamente. Vós, porém, geralmente não concedeis de imediato tal desejo. Entretanto, se a alma souber salvaguardar-se nesse recolhimento interior, Vós não tardareis a visitá-la outra vez. Então volvereis mais frequentemente e cada vez permanecereis mais tempo. Ah se pudésseis ficar o tempo todo...

Mas por que não? Não é esse o Vosso desejo, ó meu Deus, e o fim que perseguis constantemente, apesar das inquietações e das resistências mais ou menos conscientes da alma? Você sois a felicidade plena e quereis que toda criatura seja capaz de comungar o mais cedo possível das Vossas bem-aventuranças! Esperar pelo fim da vida é esperar por demais o Vosso amor. E é por isso que o Vosso amor invade aos poucos a alma fiel. Começa por apreender a sua vontade, o poder de amar e, depois, todas as demais  faculdades, para uni-las numa coisa só ou pelo menos para não permitir que a perturbem. E se for necessário para os seus desígnios, busca imobilizar os próprios sentidos para que a alma, por causa do que bem espiritual maior que possui, possa doar-se em todo o seu amor.

Vós restituireis a harmonia mais tarde, quando tiverdes feito a conquista total e quando a alma e Vós se tornarem dois seres, unidos em um único espírito e em um único amor. Esta será a hora da união perfeita e permanente. Vós vivereis no íntimo da alma e a alma viverá em Vós com a sua própria vida. E depois disso não haverá mais nada que não seja o Céu.

(Excertos da obra 'A Vida Oculta em Deus', de Robert de Langeac; Parte II -  A Ação de Deus; tradução do autor do blog)

domingo, 21 de março de 2021

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Criai em mim um coração que seja puro' (Sl 50)

 21/03/2021 - Quinto Domingo da Quaresma

17. A GLORIFICAÇÃO DE JESUS 


Aproxima-se a consumação do sacrifício de Jesus na Paixão e Morte de Cruz. E, neste cenário de antecipação do cumprimento integral de sua missão salvífica, o evangelho de hoje prenuncia que o triunfo messiânico de Jesus perpassa pela conversão dos gentios. O sinal da natureza universal deste triunfo e da aproximação da hora final de sua missão na terra estava dado, pela presença de alguns gregos (símbolo de todos os gentios) que queriam 'ver Jesus' (Jo 12, 21), no sentido de não apenas conhecer, mas também de aceitar e viver em plenitude a doutrina cristã.

Eis definida, então, num episódio aparentemente pouco relevante da subida daqueles gregos até Jerusalém, a revelação contundente da proximidade do calvário e, com ela, da manifestação da glorificação do Filho do Homem, ratificada prontamente pelo Mestre: 'Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado' (Jo 12, 23). A morte próxima de Jesus é prenunciada neste momento como um triunfo da glória de Deus, como expressa claramente logo na sequência: 'quando for elevado da terra, atrairei todos a mim. Jesus falava assim para indicar de que morte iria morrer' (Jo 12, 32 - 33).

A correlação direta entre sacrifício e glorificação é ensinada por Jesus pelo exemplo da semente que deve morrer para produzir muitos frutos: 'Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto' (Jo 12, 24). A glória perpassa pelo sacrifício, a vida humana nada mais é que uma estreita via de sofrimentos e tribulações rumo à pátria celeste; morrer para o mundo traduz a percepção cristã da debilidade da semente que morre, não apenas para não sucumbir às paixões humanas, mas para produzir frutos de salvação: 'Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna' (Jo 12, 25).

Jesus, diante a proximidade de sua hora final na terra, contempla, à luz da ciência divina, a vitória final da Cruz sobre as forças do mal ('julgamento do mundo'), na proclamação universal da sua Palavra e da conversão futura dos gentios. E, como a glória de Cristo é a glória do Pai, Jesus assim o manifesta: 'Pai, glorifica o teu nome!' (Jo 12, 28) e, de imediato, assim o faz também o Pai: 'Então veio uma voz do céu: Eu o glorifiquei e o glorificarei de novo!' (Jo 12, 28). Assim, pela terceira vez, Deus Pai glorifica o seu Filho (a primeira tinha sido no batismo de Jesus e a segunda, na transfiguração do Senhor); desta vez, como manifestação dirigida a todos os homens, povos, raças, nações e gentios, como revelação antecipada dos frutos da Paixão e do Triunfo e Glória do Verbo Encarnado.

sábado, 20 de março de 2021

OS SINAIS EXTERNOS DAS APARIÇÕES DE FÁTIMA


No contexto das aparições de Nossa Senhora em Fátima, são pouco conhecidos um grande número de fenômenos físicos que foram compartilhados por numerosas testemunhas destes eventos. Assim, não apenas os videntes, mas muitas outras pessoas, presentes ou mesmo algo distantes dos locais das aparições, puderam perceber ou sentir os sinais extraordinários da manifestação singular da presença sobrenatural da Mãe de Deus em Fátima. E estas testemunhas foram muitas: cerca de 50 na segunda aparição, entre 3000 e 4000 na terceira, umas 20.000 na quarta, 25000 a 30.000 na quinta e cerca de 70.000 na última aparição, quando ocorreu o sinal visível mais portentoso e extraordinário de todos, conhecido como o milagre do sol.

Estes sinais exteriores foram muitos, dentre eles os seguintes:

(i) relâmpagos e trovões, mesmo com céu limpo: os relâmpagos antecediam as aparições; os trovões ocorriam no momento preciso da aparição ou no seu termo, e pareciam provir da azinheira;

(ii) curvatura dos galhos da azinheira, como afetado por um peso e um manto  que a cobria, de forma a empurrar e inclinar todas as folhas numa mesma direção (segunda aparição);

(iii) exalação de um perfume novo e desconhecido, com origem no arbusto da azinheira, sentido pela senhora Maria Rosa e demais presentes próximos, durante a quarta aparição;

(iv) aparição de um globo luminoso e iridiscente no céu, deslocando-se ordenadamente no sentido de leste para oeste e depois projetando-se em descida suave, até tocar a azinheira (quinta aparição);

(v) presença de uma nuvem branca, às vezes matizada, de aspecto singular, envolvendo a azinheira e os videntes como uma névoa e fluindo em sentido ascendente até cerca de cinco ou seis metros de altura até desvanecer, repetindo-se o processo por três vezes bem distintas (quinta aparição);

(vi) chuva evanescente de pétalas de rosas brancas, aparecendo e desaparecendo em sequência contínua, deslizando suavemente no ar e que tendiam a ficar cada vez menores à medida que se aproximavam do chão, quando se desvaneciam por completo (quinta aparição); 

(vii) diminuição visível e significativa da luz solar (em pleno meio dia, com céu limpo e sem eclipses), tornando também visíveis a lua e as estrelas (segunda até a quinta aparições);

(vii) milagre do sol, que, segundo os testemunhos, constou de três fases bem distintas: primeiro, o sol tornou-se opaco e em tons rosados, passível de visualização direta e continuada sem quaisquer dificuldades; em seguida, passou a cintilar com irradiações de cores diversas, com movimentos de rotação intensa e emitindo feixes irisados e irradiados pelo céu, como explosões de fogos-de-artifício; por último, apresentou um movimento vertiginoso do disco solar, em grau crescente e simulando precipitar-se contra a terra, apresentando, a seguir, movimentos de translação lineares ou irregulares por todo o espaço celeste.

sexta-feira, 19 de março de 2021

19 DE MARÇO - SÃO JOSÉ

 


São José, esposo puríssimo de Maria Santíssima e pai adotivo de Jesus Cristo, era de origem nobre e sua genealogia remonta a Davi e de Davi aos Patriarcas do Antigo Testa­mento. Pouquíssimo sabemos da vida de José, além de suas atividades de carpinteiro em Nazaré. Mesmo o seu local de nascimento é ignorado: poderia ser Nazaré ou mesmo Belém, por ter sido a cidade de Davi. Ignora-se igualmente a data e as condições da morte de São José, mas existem fortes razões para afirmar que isso deve ter ocorrido an­tes da vida pública de Jesus. Com certeza, José já teria falecido quando da morte de Jesus, uma vez que não se explicaria, então, a recomendação feita aos cuidados mútuos à mãe e ao filho, dados, da cruz,  por Jesus a Maria e a São João Evangelista.

Não existem quaisquer relíquias de São José e se desconhece o local do seu sepultamento. Muitos pais da Igreja defendiam que, devido à sua missão e santidade, São José, a exemplo de São João Batista, teria sido consagrado antes do nasci­mento e já gozava de corpo e alma da glória de Deus no céu, em companhia de Jesus e sua santíssima Esposa. As virtudes e as graças concedidas a São José foram extraordinárias, pela enorme missão a ele confiada pelo Altíssimo. A dig­nidade, humildade, modéstia e pobreza, a amizade íntima com Je­sus e Maria e o papel proeminente no plano da Redenção, são atributos e méritos extraordinários que lhe garantem a influência e o poder junto ao tro­no de Deus. Pedir, portanto, a intercessão de São José, é garantia de ser ouvido no mais alto dos céus. Santa Tereza, ardorosa devota de São José, dizia: 'Não me lembro de ter-me dirigido a São José sem que tivesse obtido tudo que pedira'.

A devoção a São José na Igreja Ca­tólica é antiquíssima. A Igreja do Oriente celebra-lhe a festa, desde o século nono, no domingo depois do Natal. Foram os carmelitas que in­troduziram esta solenidade na Igreja Ocidental; os franciscanos, já em 1399, festejavam a comemoração do Santo Pa­triarca. Xisto IV inseriu-a no bre­viário e no missal; Gregório XV ge­neralizou-a em toda a Igreja. Cle­mente XI compôs o ofício, com os hinos, para a celebração da Festa de São José em 19 de março e colocou as missões na China sob a proteção do Santo. Pio IX introdu­ziu, em 1847, a festa do Patrocínio de São José e, em 1871, declarou-o Pa­droeiro da Igreja; muitos pontífices promoveram solenemente a devoção a São José, por meio de orações, homilias, encíclicas e devoções diversas.

quinta-feira, 18 de março de 2021

TESOURO DE EXEMPLOS (58/60)


58. NOSSA SENHORA E O FAMOSO CAÇADOR

Certo manhã, pouco antes do almoço, descia do trem em Lourdes um certo senhor, completamente indiferente, que mal se resolvera a acompanhar a esposa e a filha ao balneário. Não pensava em demorar-se ali mais que o tempo que medeia entre dois trens: era tudo o que conseguiram alcançar dele a esposa e a filha.

Apenas lá chegadas, correram as duas à gruta para rezar pelo chefe da família, que tanta pena lhes causava por sua irreligião. Ele, porém, mais preocupado com o estômago do que com a alma, foi à procura do melhor hotel e, chamando o garçom, disse:
➖ Enquanto espero a minha senhora e a minha filha, prepare para nós três um bom almoço.
➖ Deseja o senhor comida como de sexta-feira?
➖ Como? De sexta-feira?
➖ É que hoje é dia de abstinência e quase toda gente o guarda, pelo menos aqui.
➖ Que me importa o dia? disse o livre-pensador. Ora essa! O almoço tem que ser substancioso, e demais sou caçador, quero carne, ouviu?

O garçom inclinou-se respeitoso e deu ordem ao cozinheiro de preparar a comida com carne. Acendendo um bom charuto, o nosso homem dizia de si para si:
➖ Não há que se dizer que não vi a famosa gruta... irei ver aquilo.
Chegou lá muito antes que as duas senhoras tivessem terminado suas visitas à gruta, à basílica e à cripta, em toda a parte rezando e suplicando por seu querido rebelde. Quando chegaram de novo à gruta, que surpresa! Ali estava o homem ajoelhado, chorando e rezando com todo o fervor. Era ele mesmo? Quase não podiam crer. Sim, era ele mesmo. Não se atreviam a falar-lhe, mas ele, logo que as viu, exclamou:
➖ Sim, sou eu, rezo e choro. Somente sei que vim sem pensar em nada, mas, achando-me diante desta imagem, uma emoção indescritível se apoderou de mim. Caí de joelhos e, ao ver um padre, perguntei-lhe se podia me confessar. Atrás do pequeno altar da gruta fiz minha confissão. Oh! como sou feliz! Ficaremos aqui hoje e amanhã comungaremos.

Não foi o único a derramar lágrimas; os três choravam e davam graças a Nossa Senhora. Ao chegar ao hotel, e vendo o salão repleto de gente, exclamou:
➖ Senhores, eu sou o famoso caçador N. N. Quando cheguei aqui ainda era um ímpio; agora tendes aqui um homem que acaba de confessar-se e vai comungar amanhã.
➖ Garçom, sirva para nós o almoço de sexta-feira...
Que surpresa para todos os assistentes! Desde aquela sexta-feira o Sr. N. N. tornou-se um cristão fervoroso!

59. O ROSÁRIO NOS PERIGOS

Já faz bastante tempo, que ocorreu na cidade de Cartago, na república de Costa Rica, um terremoto tão violento que a destruiu quase por completo. A Revista 'América', dos jesuítas de Nova York, narrando os pormenores da pavorosa catástrofe, chamou a atenção dos leitores para o fato seguinte:

Dom Ezequiel Gutiérrez, que fôra presidente daquela república, no momento do cataclismo, achava-se em sua casa rezando o rosário acompanhado de toda a sua família. Algumas pessoas quiseram interromper a reza e fugir para a rua, mas o chefe obrigou-as a ficar até terminar o rosário.

Acabada a oração, saíram à rua e qual não foi o assombro de todos ao verem as casas convertidas em ruínas. Em toda a redondeza nenhum edifício ficara intacto; a desolação era completa; somente a casa do ex-presidente não sofrera nenhum dano, nem sequer um abalo. Evidentemente Nossa Senhora a tomara sob a sua especial proteção, porque ali se rezava o seu rosário.

60. O SENHOR AMA A SUA MÃE?

Foi um valente soldado o cabo Pedro Pitois, que fez essa pergunta a Napoleão. Pedro estava sempre na primeira linha de combate, não temia as balas inimigas, e, a 6 de julho de 1809, na batalha de Wagram, ainda pelejou valorosamente. Depois desapareceu. Desertara do exército. Não demorou muito, foi preso e condenado à morte.
➖ Tu, um dos mais valentes, por que fizeste isso? perguntavam-lhe os companheiros.
➖ Não me arrependo - respondia - não fiz por mal.

À meia-noite, na véspera da execução, um oficial entrou na cela de Pedro. Era Napoleão e o preso não o reconheceu. Tomando-o o pela mão, o Imperador disse-lhe com carinho: 'Amigo, eu como oficial sempre admirei o teu valor nos combates. Agora venho saber se tens alguma recordação para tua família, que a enviarei depois da tua morte'.
➖ Não, nenhuma.
➖ Não queres mandar um adeus ao teu pai, a teus irmãos ou irmãs?
➖ Meu pai é falecido; não tenho irmãos nem irmãs.
➖ E a tua mãe?
➖ Ai! não a nomeie, porque, quando ouço nomeá-la, tenho vontade de chorar e um soldado não deve chorar.
➖ Por que não? replicou Napoleão. Eu não teria vergonha de chorar ao lembrar-me de minha mãe.
➖ Ah! o senhor quer bem a sua mãe? Pois vou contar-lhe tudo.

De tudo que existe no mundo, nada amei tanto como minha mãe. Quando parti, deu-me sua bênção e disse-me: 'Se me amas, cumpre o teu dever'. Nas batalhas, diante das balas, sempre me recordei de suas palavras. Não tinha medo algum. Um dia soube que estava gravemente enferma; pedi licença para ir abraçá-la pela última vez e não me deixaram partir. Recebi, afinal, a notícia de que falecera e pedi licença para ir vê-la ao menos morta. Pela segunda vez me disseram que não. Não aguentei mais: era preciso ir depositar uma flor ao menos sobre a sua sepultura. Fui, chorei e recolhi esta flor de miosótis que aqui trago sobre o meu coração. Morrerei amanhã, mas a morte não me amedronta.

Napoleão, depois de algumas palavras de consolo, retirou-se grandemente comovido. No outro dia foi o preso conduzido ao lugar do suplício. Estando a guarda para disparar, chegou o imperador a cavalo, poupou a vida de Pedro Pitois e nomeou-o oficial.
➖ Amais a vossa mãe do céu?
Respondereis certamente com Santo Estanislau: 'Como não a hei de amar, se é minha Mãe?'. E ela vos dirá: 'Cumpri o vosso dever, e eu vos alcançarei a perseverança e a graça final'.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

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