quarta-feira, 7 de agosto de 2019

TRÊS PERGUNTAS SOBRE AS VIRTUDES QUE NOS FALTAM

Primeira: 

'Onde está o teu tesouro, lá também está o teu coração' (Mt 6,21)

'Tesouro” é aquilo que mais prezamos, que mais valorizamos. Pode ser uma pessoa querida, ou o nosso sucesso, ou o dinheiro, ou o prazer... O 'coração' – o mundo íntimo dos nossos pensamentos, sonhos, projetos e desejos – está centrado naquilo que mais estimamos e julgamos necessário para a nossa felicidade. Qual é seu ' tesouro'? Qual é o 'rei' que reina em seu mundo íntimo? Para muitas pessoas, o 'tesouro' são os três esses: Sucesso, Satisfação, Sossego. Se você se enquadra aí, não duvide: precisa urgentemente começar a lutar contra o egoísmo.

Para outras, o 'tesouro' consiste em acumular riquezas, entrar na lista dos 'mais'. Não entendem que, se os bens materiais são o seu Tesouro – assim, com maiúscula – estão a caminho de um suicídio moral, e podem despedir-se da felicidade que Cristo promete: 'Felizes os pobres em espírito [os que são desprendidos e generosos, ainda que tenham bens], porque deles é o Reino dos céus' (Mt 5,3). Para outros é a liberdade. Por enquanto, vou limitar-me a perguntar: Liberdade para quê? Dependendo da resposta, você vai conhecer seu coração. Se é liberdade para 'fazer o que eu quero', você é um lamentável egoísta; se for liberdade para poder dar-se mais a Deus e dedicar-se a grandes ideais em favor dos outros, você tem a virtude da generosidade. 

Segunda: 

'A boca fala daquilo de que o coração está cheio' (Lc 6,45) 

De que fala mais você? De você mesmo? Fala demais e escuta pouco? Não precisa refletir muito: você tem que lutar contra a vaidade. Talvez o despertem estas palavras de Caminho: 'Obstinas-te em ser o sal de todos os pratos... e – não te zangues se te falo claramente – tens pouca graça para ser sal... Falta-te espírito de sacrifício. E sobra-te espírito de curiosidade e de exibição' (n. 48). Você critica muito os outros? Acha logo defeito em tudo o que dizem ou fazem? Precisa adquirir a virtude da compreensão. E, se curte mágoas e rancores, precisa – mais do que o ar que respira – aprender a virtude da misericórdia. 

Você é boca-suja, que não pára de falar de sexo e baixarias? Precisa descobrir e começar a praticar uma virtude que provavelmente ignora, e até despreza, a castidade; e precisa também praticar a veracidade, isto é, lutar para não ficar enganando, traindo os compromissos de fidelidade que assumiu. Você pensa até dormindo – como se fosse um ingrediente imprescindível da felicidade – em requintes de comida, em bebidas, em prazeres do gosto que não consegue largar? Também é urgente que aprenda como se adquire a virtude da temperança. 

Terceira: 

'Por que estais tristes?' (Lc 24,17)

Essa é a primeira pergunta que Jesus ressuscitado fez aos discípulos de Emaús, quando voltavam para casa desesperançados, depois do 'fracasso' de Jesus na Cruz. As alegrias e as tristezas (não falo das que procedem do amor a Deus aos outros) são excelentes radiografias das doenças do coração. Causa-lhe alegria o que é 'fácil' ou o que é 'certo'? Diz, todo feliz: 'Consegui driblar um compromisso'? Então, no seu coração há um buraco negro no lugar que deveria ocupar a virtude da responsabilidade. 

Causa-lhe muito mais alegria o que recebe do que aquilo que dá? Há um vazio no lugar da caridade e da abnegação. Quando se porta mal, entristecem-no as ofensas feitas a Deus e ao próximo, ou só a humilhação de se ver fraco e ruim? Precisa, então, ganhar as virtudes da humildade e do arrependimento. Alegra-se com o fracasso dos outros, quando faz brilhar mais o seu sucesso? Não demore a iniciar uma luta séria contra os feios vícios da inveja e da vanglória. 

As perguntas poderiam prosseguir e continuarão em outros capítulos. Mas vou terminar agora com palavras de um sermão de Quaresma de São Bernardo, que inspiraram as perguntas acima: 'Examina com cuidado o que é que amas, o que é que temes, de que te alegras, com que te entristeces. Todo o coração consiste nestes quatro afetos' (Sermão no começo do jejum, n. 2-3). As virtudes que nos faltam são um cartaz luminoso. Cada uma delas nos lança um apelo: veja o caminho que ainda deve percorrer, e comece a andar. Pense. Reze. Peça luz a Deus e procure ver a verdade no fundo do seu coração (Sl 50, 8).

(Excertos da obra 'A Conquista das Virtudes', de Francisco Faus)

terça-feira, 6 de agosto de 2019

COMPÊNDIO DE SÃO JOSÉ (XVIII)


86. São José entrou também no folclore? 

A piedade popular e o amor a São José que os fiéis demonstraram teve um gosto folclorístico em muitos lugares. Na Sicília (Itália), por ocasião do dia 19 de março, os fiéis organizavam o 'Banquete de São José', convidando alguns pobres para almoçarem em suas casas. Ainda na Sicília, costumava-se vestir um velho de bons costumes com uma túnica e um manto, tendo nas mãos uma vara florida, com a qual abençoava o povo. Em outras localidades levam-se, neste dia, pães às Igrejas para serem abençoados e distribuídos aos pobres ou comidos em família. Ainda na Itália, numa localidade de nome Gela, costuma-se no dia 1º de maio levar à Igreja o 'Prato de São José', cheio de vários tipos de alimentos. Este é leiloado e a renda revertida para as obras de caridade. Da mesma forma, em Riccia (Itália), os fiéis praticam a devoção a São José, convidando para o almoço três pessoas: um casal e um adolescente ou jovem, representando a Sagrada Família. Em Siracusa, no dia 19 de cada mês, os devotos celebravam o chamado 'dezenove', onde doze devotos preparam, cada um, três roscas grandes e várias roscas pequenas e as levavam diante da imagem do santo durante a missa do dia; as três roscas grandes eram distribuídas uma para um idoso, outra para uma moça e a terceira para uma criança, enquanto que as pequenas eram dadas aos amigos. 

Em outros lugares, no dia 19 de março, as famílias preparam uma farta mesa convidando cinco pessoas representando Jesus, Maria , José, Santa Ana e São Joaquim, ou também preparam uma farta mesa na praça pública às 12 horas, onde participam dela os mais pobres e idosos. No dia 23 de janeiro, Festa dos Esponsais de São José com Maria, costuma-se mandar benzer muitos doces e confeitos para depois levá-los aos doentes e distribuí-los entre os amigos. Outro costume em Nápoles (Itália) é o de, na ocasião da festa do santo, organizar a 'Violeta de São José', onde os devotos oferecem estas flores ao santo nas igrejas ou diante das imagens que possuem em suas casas. Existe ainda o costume de organizar procissões que partem de duas igrejas, uma com a imagem de São José e outra de Nossa Senhora, e estas se encontram na praça principal, onde Nossa Senhora oferece um ramalhete de flores a São José. Atualmente no Brasil,  em várias igrejas, celebra-se a 'Novena de São José' nos dias 19 de cada mês, onde os devotos costumam levar alimentos, folhas de chá, flores para serem abençoadas e depois levadas para as suas casas ou distribuídas. 

87. São José é relacionado a alguma crença particular? 

Na Escócia, ele é tido como Patrono do Tempo, por isso a sua estátua é colocada fora de casa e coberta com um guarda-chuva para indicar o tempo que se deseja. Na Austrália sua estátua é colocada para fora com um guarda-chuva aberto. No nordeste do Brasil, ele é tido como o santo que envia a chuva; se não chove no dia de São José, o povo acredita que aquele ano será de seca, mas se chover no dia 19 de março ou proximidades desde dia, o tempo será bom e haverá boa colheita. Neste dia o povo faz uma procissão com sua imagem e solta muitos fogos de artifício. Na Califórnia (EUA), mantém-se viva a tradição de que, no dia 19 de março, os pássaros retornam para a primavera. São José disputa também com Santo Antônio o título de santo casamenteiro. No Brasil, desde o século XVIII, é invocado pelas mulheres grávidas, as quais sempre recorrem a Nossa Senhora do Bom-parto, mas com a participação de São José. Ainda no Brasil, sobretudo no Nordeste, é invocado como protetor para um bom casamento, ou para se livrar de um casamento indesejado. Sobretudo no Nordeste o povo faz procissões de penitência durante a seca onde cantam 'Bendito, louvado seja, Senhor São José, leva Deus Menino para Nazaré'. 

88. E o que dizer da presença de São José na arte? 

Juntamente com Nossa Senhora, São José é sem dúvida um dos personagens bíblicos mais presentes na arte. A arte espelha aquilo que foi pregado e ensinado aos fiéis ao longo dos séculos nos diversos lugares; a arte testemunha a catequese. Vemos São José sempre presente nas representações do nascimento de Jesus em Belém; vemo-lo ao lado de Maria, em sonho, com o Menino Jesus nos braços; apresentando o Menino no Templo; fugindo para o Egito; dentro da sua carpintaria com serrote nas mãos; ensinando Jesus, com o martelo nas mãos; em adoração diante do Menino; com o livro nas mãos ensinando Jesus… Apreciamos na arte um São José velho, com cabelos e barba brancos, com um bastão ou vara florida nas mãos, com uma auréola na cabeça, com um lírio na mão direita, na cena do casamento com Maria… Mas vemos também um São José jovem, jovial, alegre, robusto, sereno, afável, dócil, como aquele apresentado pelo diretor de cinema Franco Zeffirelli em seu filme: 'Jesus de Nazaré', no exercício de sua profissão de carpinteiro, inserido dentro de uma família, atraente, hebreu profundamente religioso… Podemos dizer que a presença de São José na arte é bastante satisfatória a ponto de possibilitar variadas exposições denominadas 'José na arte' em diversos lugares. 

89. Por que José é representado na arte com um bastão florido na mão? 

A origem do bastão florido é bíblica, está ligada à eleição de Araão para o serviço do tabernáculo (Nn 17,6-16). O bastão é símbolo de autoridade, é um instrumento para exprimir o juízo de Deus. Com o florescimento do próprio bastão, Araão foi divinamente eleito para o serviço do Santuário. A José foi reservada uma missão mais importante do que a de Araão, pois ele foi designado para servir o 'tabernáculo verdadeiro, constituído pelo Senhor, e não por um homem' (Hb 8,2; 9,11.24). Se para escolher aquele que devia servir o antigo Tabernáculo foi necessária uma eleição divina, com muito mais razão houve a necessidade da escolha divina para aquele que devia servir a realidade mesma da Nova Aliança, ou seja, Jesus. 

90. Por que, às vezes, os artistas representam o bastão de São José com flores de amendoeira e outras vezes com um lírio? 

Esta diferente representação é devida ao fato de uma prevalente interpretação moral sobre uma interpretação religiosa. A interpretação artística do bastão florido é símbolo de sua divina eleição como esposo de Maria e pai de Jesus e foi entendida como prova de sua castidade virginal e portanto representada pelo lírio. O simbolismo da flor de amendoeira recebe a explicação com o fato de que, na língua hebraica, a amendoeira é chamada saqed, que significa 'vigilante', porque é a primeira planta que floresce na primavera e aqui se entende a ligação do simbolismo com o fato descrito em Jeremias (Jr 1,11) entre o ramo de uma amendoeira visto pelo profeta e a vigilância que Deus exercita sobre a sua palavra. José é justamente aquele que deve estar sempre vigilante sobre Jesus e Maria, realizando assim a vigilância de Deus sobre as suas promessas.

('100 Questões sobre a Teologia de São José', do Pe. José Antonio Bertolin, adaptado)

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

O TESOURO DAS INDULGÊNCIAS

Para um católico seriamente praticante, que conhece pelo menos os pontos básicos do Catecismo, a Santa Igreja é de uma beleza incomparável. Seus tesouros espirituais, descobertos a cada dia, são sempre motivo de encantamento, alegria e admiração. Para os não católicos ou os indiferentes à Igreja, mas principalmente para aqueles que lhe têm um ódio profundo, qualquer pequena calúnia levantada contra Ela ou o mau procedimento de algum de seus filhos é pretexto para arroubos de indignação e deblateração. É o que sucede, por exemplo, com a doutrina sobre as indulgências.

Quanta calúnia se levantou contra a Igreja a propósito do famigerado heresiarca Lutero, com sua revolta baseada em uma suposta 'venda da salvação eterna pelas indulgências'! Quanta invenção, mentira, superficialidade e ignorância histórica! 

Dedicando-me à formação religiosa de adolescentes, tenho observado uma atenção e um interesse especial deles pelo assunto, o que me levou muitas vezes a orientá-los. Recentemente fui convidado a expor a doutrina sobre as indulgências para pessoas já bem longe da adolescência, conhecedores da doutrina católica e com décadas na prática séria da religião. Para surpresa minha, o interesse dos componentes desse público era igual ou até maior que o dos jovens, mas observei também, da parte deles, um conhecimento insuficiente e não aprofundado sobre a matéria, que os leva a não aproveitar esta riqueza incomparável da Igreja.

A grande Santa Teresa d’Ávila teve uma visão de Nosso Senhor, durante a qual ela viu no Céu uma religiosa de sua Ordem que era pouco fervorosa. Espantada, quis saber por que a mesma se livrou tão rapidamente do Purgatório. O Divino Redentor então lhe respondeu: 'Ela soube aproveitar bem as indulgências que a Santa Igreja lhe concedia'. Explicarei do modo mais sucinto e didático possível como um católico pode obter facilmente uma indulgência plenária, e também como ele pode ir diretamente para o Céu sem passar pelo Purgatório, bastando rezar algumas orações durante a vida.

Nada disso é impossível aos católicos que têm uma vida de piedade normal. Não se requerem méritos nem 'truques' pessoais, pois os benefícios advindos das indulgências nos são fornecidos pelos méritos infinitos de Nosso Senhor Jesus Cristo, da Virgem Santíssima e dos santos. Tudo está claramente definido no Manual das Indulgências, documento oficial da Santa Igreja, do qual colhi as condições, normas e vantagens para a obtenção durante a vida da remissão das próprias penas, bem como as vantagens decorrentes, como exponho a seguir.

A remissão das penas temporais devidas aos pecados já perdoados pode ser obtida de várias maneiras: por atos de penitência voluntária, jejuns, sofrimentos no Purgatório ou através das indulgências. São seis as condições para se receber uma indulgência plenária:

1. Ter a intenção de recebê-la; pode ser uma intenção genérica, enunciada no começo do dia, uma vez por semana ou até uma vez por mês.

2. Confessar-se; uma única confissão vale para muitas indulgências plenárias.

3. Comungar; uma comunhão vale apenas para uma indulgência plenária.

4. Rezar pelas intenções do Santo Padre; pode ser um Pai-Nosso e uma Ave-Maria.

5. Não ter apego ao pecado, mesmo venial; isto não significa a exigência de a pessoa não cometer pecado, mas sim de não ter apego a ele e desejar abandoná-lo.

6.  Execução da obra; dou cinco exemplos de atos fáceis de serem realizados:

a) Meia hora de visita ao Santíssimo Sacramento;

b) Rezar um terço em família, em grupo ou com algum amigo;

c) Ler durante meia hora um dos livros da Bíblia Sagrada;

d) Ensinar o Catecismo durante meia hora;

e) Assistir a uma Primeira Comunhão.

Além de ganhar uma indulgência plenária todos os dias, o fiel que ao longo de sua vida rezar — uma vez por semana, por exemplo — uma oração (a 'Alma de Cristo' ou qualquer outra) fazendo uso de um crucifixo, receberá uma indulgência plenária no momento de sua morte.

Uma dádiva como esta constitui uma verdadeira misericórdia de Deus, desde que queiramos e nos esforcemos para viver na sua amizade. Ela nos induz a abandonar o pecado e nos livra dos pesos de consciência que sempre acompanham o estado de pecado grave. Aproveitemos todas as indulgências que nos são concedidas para o nosso proveito, o bem das almas e as necessidades da Santa Igreja, mas principalmente para a maior glória de Deus Nosso Senhor.

(Sérgio Bertoli, Revista Catolicismo n. 805, janeiro de 2018)

domingo, 4 de agosto de 2019

A VERDADEIRA RIQUEZA ESTÁ EM DEUS

Páginas do Evangelho - Décimo Oitavo Domingo do Tempo Comum


'Mestre, dize ao meu irmão que reparta a herança comigo' (Lc 12,13). Alguém, no meio da multidão, fez este pedido a Jesus. Um pedido movido por razões absolutamente terrenas e dirigido a alguém que era julgado apenas na dimensão da sabedoria humana. Um apelo, potencialmente justo, afeto às demandas de um juiz dotado de isenção e discernimento, bastava ao postulante. Mas, diante dele, estava Deus entre os homens e não um mero sábio das contendas humanas. Àquele homem, Jesus destinou então um ensinamento muito mais profundo, muito além da busca desenfreada da aquisição de bens materiais, mas centrado num caminho de heranças eternas. 

É preciso primeiro buscar as coisas do Alto. Os legítimos interesses humanos devem ser pautados pelo equilíbrio e pela moderação, para não ser instrumentos de afeições desmedidas e descontroladas, sementes de ganância. Jesus é enfático neste conselho: 'Tomai cuidado contra todo tipo de ganância' (Lc 12, 15). A abundância de bens é uma fonte de preocupações contínuas e a soberba do possuir é mera vaidade: 'Tudo é vaidade' como diz o Livro do Eclesiastes (Ecl 1,2). 

Para ilustrar a insensatez do homem que busca acumular tesouros na terra, Jesus apresenta, então, a parábola do homem rico. Entusiasmado por uma farta colheita, planeja em detalhes multiplicar sua riqueza com a construção de celeiros muito maiores, armazenar grandes quantidades de trigo, viver uma vida de gozo e tranquilidade. Mas, tolo entre tolos, não cuida que seus dias estão contados e não terá usufruto algum de tanta riqueza acumulada: 'Assim acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo' (Lc 12, 21). A ganância de querer sempre mais e a ânsia de ser ainda mais rico aviltam a legitimidade do bem possuído aos domínios da cobiça mórbida. 

Deus não tem lugar no coração abrasado de poder de tal homem porque o nosso coração permanecerá inquieto enquanto não repousar em Deus. A paz interior nasce da partilha, no ato de compartilhar os bens e os dons disponíveis com todos. Dispor o que se recebe, repartir o que se tem: eis a regra de ouro para se almejar as heranças eternas e acumular tesouros nos Céus. A verdadeira riqueza é aquela que se guarda no Coração de Deus.

sábado, 3 de agosto de 2019

DA PRÁTICA DA CARIDADE PELAS PALAVRAS

1. Quanto à caridade que devemos usar para com o próximo nas palavras, é preciso, antes de tudo, nos abster de toda a maledicência. O maldizente mancha a sua alma, diz o Espírito Santo, e incorre no ódio de todos, de Deus e dos homens (Eclo 21, 31). Se há, às vezes, quem o aplauda e excite a falar do próximo, para se divertir, esse mesmo logo foge e o evita com diligência, pensando com razão que também não será poupado, quando houver ensejo para isso. Diz São Jerônimo que alguns, depois de ter renunciado os outros vícios, parece que não podem deixar o da murmuração. E prouvera a Deus que tais indivíduos não penetrassem nos mosteiros! 

Infelizmente, porém, também ai se encontram, às vezes, certas religiosas [o texto foi dirigido originalmente à orientação espiritual de religiosas] que têm uma língua que não sabe mover-se sem morder e tirar sangue. Em outros termos, há algumas que nada sabem dizer, sem murmurar do próximo; de todas as pessoas de que falam, acham sempre que maldizer. Essas línguas viperinas deveriam ser absolutamente banidas dos claustros ou, ao menos, estar sempre encerradas no cárcere; porque perturbam o recolhimento, o silêncio, a devoção e a paz de toda a comunidade. Em suma, são a ruína dos mosteiros. E queira Deus não lhes suceda o que aconteceu a um sacerdote murmurador que, tendo expirado em um acesso de furor, dilacerou a língua com os próprios dentes. São Bernardo fala de um outro murmurador, que, tendo querido dizer mal de São Malaquias, sentiu logo a língua inchada e roída de vermes, e morreu miseravelmente depois de sete dias de cruéis sofrimentos. 

2. Ao contrário, ó quanto é amada de Deus e dos homens uma religiosa que fala bem de todos! Dizia Santa Maria Madalena de Pazzi que, se tivesse conhecido uma pessoa que nunca houvesse falado mal do próximo, a teria proclamado santa. Tende, pois, cuidado de vos abster de toda a palavra que envolva murmuração de quem quer que seja, mais especialmente de vossas irmãs e ainda mais dos vossos superiores, como o prelado, a superiora, o confessor; porque falar mal dos superiores, além de lhes danificar a fama, faz as outras perder-lhes a obediência ou, pelo menos, faz perder a submissão do espírito.E, se acaso, as irmãs, por vossa causa, chegam a compreender que os superiores agem sem razão, depois dificilmente lhes obedecerão como devem.

Comete-se murmuração não só quando se procura denegrir a reputação do próximo, imputando-lhe uma falta que ele não fez, ou exagerando suas faltas reais, ou revelando as que ocultou, mas também quando se interpretam mal suas ações boas ou se diz que são feitas com má intenção. É também murmuração negar o bem que fez ou contradizer os justos elogios que se fazem do próximo. Para tornar a murmuração mais crível, que não fazem certas línguas malignas? Começam a louvar uma pessoa, e depois acabam murmurando: fulana é muito talentosa, mas é soberba; é liberal, mas é vingativa...

3. Procurai pois sempre falar bem de todos. Falai dos outros como quereis que falem de vós. A respeito dos ausentes, segui esta máxima de Santa. Maria Madalena de Pazzi: 'não se deve dizer na ausência de alguém aquilo que se não diria em sua presença'. Se vos acontecer ouvir uma irmã murmurar de outra, guardai-vos de incitá-la a falar, ou mostrar-lhe que tendes prazer em ouvi-la, porque então vos tornaríeis cúmplices do seu pecado. Nesse caso, repreendei-a ou interrompei a conversa, ou retirai-vos ou, ao menos, não lhe deis atenção. 'Quando ouvirdes alguém murmurar', diz o Espírito Santo, 'cercai os ouvidos com espinhos, para que os não penetre a malediência' (Eclo 28, 28).

É preciso então, ao menos pela guarda do silêncio, mostrando um ar triste ou baixando os olhos, testemunhar que tal conversa vos desagrada. Portai-vos, sempre, de modo que ninguém, para o futuro, ouse atacar a fama alheia em vossa presença. E a caridade exige que tomeis a defesa da pessoa de quem se murmura, quando vos for possível. 'Esposa minha', diz o Senhor, 'eu quero que vossos lábios sejam como uma fita vermelha', como explica São Gregório Nazianzeno, sejam vossas palavras abrasadas de caridade de modo que ocultem os defeitos alheios, quanto possível ou, ao menos escusem a intenção, se for impossível desculpar a ação, acrescenta São Bernardo...

4. Guardai-vos também de referir às vossas irmãs o mal que outras delas disserem. Daí nascem muitas vezes perturbações e rancores que duram meses e anos. Ó que contas hão de dar a Deus as línguas semeadoras de discórdias nos mosteiros! Quem tal pratica incorre no ódio de Deus; pois diz o Sábio: 'há seis coisas que o Senhor odeia e uma sétima que detesta' (Sb 6, 16). Qual é esta sétima? É aquela que semeia discórdias entre os irmãos. Quando uma religiosa fala arrastada pela paixão, merece alguma escusa: mas a que, de sangue frio, sem paixão, fomenta a discórdia e perturba a paz comum, como Deus a poderá sofrer? Se ouvirdes uma palavra contra alguma de vossas irmãs, segui o conselho do Espírito Santo: 'Não a deixeis ir adiante, abafai-a no vosso coração, e fazei-a morrer aí' (Eclo 19, 10).

Enquanto um se acha encerrado em um lugar, pode daí evadir-se, e aparecer à vista de todos, mas quem morreu, não pode mais sair da sepultura: Em outros termos, estai atentas para não deixar transparecer nenhum sinal do que ouvistes; porque se derdes o menor indício, ainda que fosse só uma meia palavra ou um simples movimento de cabeça, as outras poderão combinar as circunstâncias e adivinhar ou, ao menos, gravemente suspeitar o que tiverdes ouvido. Há certas religiosas, que, ouvindo algum segredo, parece que sofrem angústias mortais, enquanto o não revelam de qualquer modo: sentem como um espinho a pungir-lhes o coração, até que o lancem fora. Quando descobrirdes qualquer defeito de alguma, podeis dizê-lo somente aos superiores, e isto somente quando for necessário fazê-lo para reparar o dano da comunidade ou da mesma irmã que falta ao seu dever. 

5. Quando estiverdes no recreio, nas conversas, guardai-vos de dizer palavras picantes, ainda por gracejo. Gracejos que desagradam ao próximo, são contrários à caridade e ao que disse Jesus Cristo: 'Tratai os outros como quereis que vos tratem' (Mt 7, 12). Porventura vos agradaria serdes zombada e chacoteada diante das outras, do mesmo modo como tratais as vossas irmãs? Portanto, não mais o façais. Além disso, procurai fugir das discussões e contendas, quanto for possível. Às vezes, por bagatelas e ninharias, travam-se disputas que degeneram em distúrbios e injúrias. Há algumas pessoas que tem o espírito de contradição, pois, sem nenhuma necessidade nem utilidade, mas somente para contrariar, começam a levantar questões impertinentes e fantásticas, e assim ferem a caridade e perturbam a união fraterna. 

Segui o conselho do Espírito Santo: 'Não discutais de coisas que vos não molestam' (Eclo 11, 9). Mas dirá aquela: 'Eu não posso ouvir absurdos'. Eis o que lhe responde o Cardeal Belarmino: 'Mais vale uma onça de caridade do que cem carradas de razões'. Quando se questionar, especialmente de uma coisa de pouca importância, dizei o vosso parecer, se quiserdes tomar parte na conversação, e depois ficai em paz, sem porfiar em defender a vossa opinião; é até melhor então ceder e adotar a opinião das outras. Dizia São Frei Gil que, em tais controvérsias, quando um cede, então vence, porque fica superior em virtude e assim conserva também a paz, que é um bem muito maior do que a vantagem de ter vencido com razões, e ter feito prevalecer a sua asserção. E, por isso, dizia Santo Efrém que ele, para manter a paz, tinha sempre cedido nas contendas e discussões. Pelo que São José Calasanz dava a seguinte advertência: 'Quem quiser paz, não contradiga a ninguém'. 

6. Se quereis amar a caridade, procurai ser afáveis e brandas com todo gênero de pessoas. A brandura é chamada a virtude do Cordeiro, isto é, a virtude estimada de Jesus Cristo que, por isso, quis ter o nome de Cordeiro. Sede mansas na vossa maneira de falar e de agir, não só com as superioras oficiais, mas também com qualquer outra pessoa, e especialmente com as irmãs que, no passado, vos ofenderam, ou que no presente vos olham de má vontade, ou são do partido contrário, ou para as quais tendes natural antipatia, seja por suas maneiras pouco polidas, seja por sua falta de reconhecimento a vosso respeito. A caridade tudo suporta, porque é paciente (1 Cor 13, 4). 

Não se pode dizer que tem verdadeira caridade quem não quer suportar os defeitos do próximo. Neste mundo não há pessoa alguma, por mais virtuosa que seja, que não tenha seus defeitos. Quantos não tendes vós, e quereis que as outras vos tratem com caridade e compaixão. É, pois, necessário que tenhais também caridade com as outras, e vos compadeçais das suas misérias e imperfeições, segundo exorta o Apóstolo: 'Auxiliai-vos uns aos outros' (Gl 6, 2). Vede com que paciência sofrem as mães as travessuras dos filhos: e por quê? Porque os amam. Pelo mesmo sinal se reconhecerá se amais as vossas irmãs com caridade verdadeira, amor que sendo sobrenatural, deve ser mais forte do que o amor natural. 

Com que caridade nosso divino Salvador não suportou as grosserias e imperfeições de seus discípulos durante todo o tempo, que com eles viveu? Com quanta caridade não suportou Judas, chegando até a lavar-lhe os pés para enternecê-lo? Mas para que falar de outros? Falemos de vós mesmas. Com que paciência o Senhor não vos tolerou até agora? E vós não quereis sofrer pelas vossas irmãs? O médico detesta a enfermidade, mas estremece o enfermo; e assim vós, se tendes caridade, deveis aborrecer os defeitos mas, ao mesmo tempo, deveis amar as pessoas que os cometem. Alguma dirá: 'que hei de fazer eu! Sinto uma antipatia natural por aquela irmã, que não posso vê-la sem enfado!'. E eu vos respondo: 'Tende um pouco mais de bom espírito e de caridade e desaparecerá essa antipatia'.

(Excertos da obra 'A Verdadeira Esposa de Jesus Cristo', de Santo Afonso Maria de Ligório)

04 DE AGOSTO - SÃO JOÃO MARIA VIANNEY (CURA D'ARS)

São João Batista Maria Vianney (Cura D' Ars)

A mais difícil, extraordinária e espantosa obra feita pelo Cura d’Ars foi a sua própria vida

Existem vidas extraordinárias entre os santos da Igreja. Mas poucas delas foram tão cingidas pela pequenez, pela humildade e pelo aniquilamento interior como a do pobre cura de Ars, São João Batista Maria Vianney (nascido em 08 de maio de 1786, em Dardilly, na França). Ordenado sacerdote em 1815, aquele que teria o dom extraordinário de ler consciências foi proibido inicialmente de atender confissões, 'porque não teria capacidade para guiar consciências'. Três anos depois, aceitou ser o vigário do minúsculo povoado de Ars, situado ao norte de Lyon, na época com pouco mais de 200 habitantes e nenhuma prática religiosa. Ali chegou em fevereiro de 1818, ali construiu uma santidade ímpar entre os padres da Igreja, ali se tornou um santuário de peregrinação de toda a Europa. Ali viveu incansavelmente a fadiga das confissões intermináveis (geralmente 17 horas diárias), da oração constante, da devoção incondicional à pequenez e à pobreza, até a sua morte, em 04 de agosto de 1859, aos 73 anos de idade. 

São João Batista Vianney foi canonizado em 1925 pelo Papa Pio XI e seu corpo incorrupto encontra-se depositado na igreja da paróquia de Ars. Foi proclamado Padroeiro dos Sacerdotes e no dia de sua morte, 4 de agosto, celebra-se o Dia do Padre

'Nós devemos nutrir um grande amor por todos os homens, pelos bons e pelos maus. Quem tem o amor não pode querer que alguém faça o mal, porque o amor perdoa tudo'


Corpo Incorrupto do Santo em Ars


Conta-se que, indo em direção a ArsSão João Batista Vianney perguntou a um menino a direção a seguir para se chegar ao povoado. Diante da orientação recebida, o santo respondeu a ele: "já que você me ensinou o caminho para Ars, eu lhe ensinarei o caminho para o céu". Que, no dia de hoje, os sacerdotes de Cristo reflitam sobre esta mensagem do Cura D'Ars e assumam incondicionalmente esse caminho de vida religiosa para a salvação de muitos homens.

PRIMEIRO SÁBADO DE AGOSTO


Mensagem de Nossa Senhora à Irmã Lúcia, vidente de Fátima: 
                                                                                                                           (Pontevedra / Espanha)

‘Olha, Minha filha, o Meu Coração cercado de espinhos que os homens ingratos a todo o momento Me cravam, com blasfêmias e ingratidões. Tu, ao menos, vê de Me consolar e diz que a todos aqueles que durante cinco meses seguidos, no primeiro sábado, se confessarem*, recebendo a Sagrada Comunhão, rezarem um Terço e Me fizerem 15 minutos de companhia, meditando nos 15 Mistérios do Rosário com o fim de Me desagravar, Eu prometo assistir-lhes à hora da morte com todas as graças necessárias para a salvação.’
* Com base em aparições posteriores, esclareceu-se que a confissão poderia não se realizar no sábado propriamente dito, mas antes, desde que feita com a intenção explícita (interiormente) de se fazê-la para fins de reparação às blasfêmias cometidas contra o Imaculado Coração de Maria no primeiro sábado seguinte.