quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

HEI DE MORRER UM DIA...

Statutum est hominibus semel mori; post hoc autem iudicium [Está decretado que os homens morram uma só vez, e que depois venha o juízo (Hb 9, 27)].

I. É utilíssimo para a salvação eterna dizermos muitas vezes conosco: 'Hei de morrer um dia'. A Igreja lembra-o todos os anos aos fiéis no dia de Cinzas: Memento, homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris [Lembra-te, ó homem, que és pó e em pó hás de tornar]. Mas no correr do ano a lembrança da morte nos é sugerida frequentíssimas vezes, ora pela vista de um cemitério à beira da estrada, ora pelas campas que vemos nas igrejas, ora pelos defuntos que são levados à sepultura. Os objetos mais preciosos que os anacoretas guardavam nas suas grutas eram uma cruz e uma caveira: a cruz para se lembrarem do amor que nos teve Jesus Cristo e a caveira para não se esquecerem do dia da sua morte. Assim é que perseveraram na sua vida de penitência até ao termo de seus dias. Morrendo pobres no deserto morreram mais contentes do que morrem os monarcas em seus palácios régios.

Finis venit, venit finis [O fim vem, vem o fim!]. Nesta terra uns vivem mais tempo, outros menos; porém, mais cedo ou mais tarde, para cada um chegará o fim da vida, e nesse fim, que será a hora da nossa morte, nada nos dará consolo, senão o termos amado Jesus Cristo e o termos padecido com paciência, por amor dEle, as penalidades desta vida. Então nenhum consolo poderão dar-nos, nem as riquezas adquiridas, nem as dignidades possuídas, nem os prazeres gozados. Todas as grandezas terrestres não somente não consolarão os moribundos, antes lhes causarão aflições. Quanto mais as tiverem procurado, tanto mais lhes aumentará a aflição. Soror Margarida de Santanna, carmelita descalça e filha do imperador Rodolfo II, dizia: 'Para que servirão os reinos do mundo na hora da morte?'

Ah! Meu Deus, dai-me luz e dai-me força para empregar o tempo de vida que me resta em Vos servir e amar! Se tivesse de morrer neste instante, não morreria contente, morreria com grande inquietação. Para que, depois, esperar? Esperarei porventura até que a morte me surpreenda, com grande perigo para a minha eterna salvação? Se nos tempos passados tenho sido tão insensato, não o quero ser mais. Dou-me inteiramente a Vós; aceitai-me e socorrei-me com a vossa graça.

II. Não há que ver; para cada um chegará o fim da vida e, com este fim, o momento que decidirá a nossa eternidade feliz ou infeliz: o momentum a quo pendet aeternitas! [Ó momento do qual depende a eternidade!]. Oxalá, todos pensassem nesse grande momento e nas contas que então deverão dar ao divino Juiz acerca de toda a vida! Decerto não se preocupariam tanto com acumulação de dinheiro nem se afadigariam para serem grandes nesta vida, que deve findar; senão pensariam em tornar-se santos e em ser grandes na vida que nunca mais terá fim.

Se, portanto, temos fé e cremos que há uma morte, um juízo e uma eternidade, procuremos viver tão somente para Deus durante o tempo de vida que ainda nos resta. Por isso, vivamos quais peregrinos nesta terra. Lembrando-nos de que em breve a teremos de deixar. Vivamos sempre com o pensamento fito na morte e nos negócios da vida presente, prefiramos sempre o que, na hora da morte, quiséramos ter feito. As coisas da terra nos deixam ou nós havemos de deixá-las. Escutemos o que nos diz Jesus Cristo: thesaurizate vobis thesauros in coelo, ubi neque aerugo neque tinea demolitur [ajuntai para vós tesouros no céu, onde não os consome a ferrugem nem a traça]. Desprezemos os tesouros terrenos, que não conseguem contentar-nos e em breve perecerão e procuremos ganhar os tesouros celestes, que nos farão felizes e nunca poderão acabar.

Ó meu Senhor, ai de mim que, por amor às coisas deste mundo, Vos tenho tantas vezes virado às costas, a Vós, ó Bem Infinito! Reconheço que fui insensato procurando ganhar no mundo grande reputação e fazer grande fortuna. De hoje em diante não quero para mim outra fortuna senão a de Vos amar e de cumprir em tudo a vossa santa vontade. Ó meu Jesus, arrancai do meu coração o desejo de fazer figura, fazei que eu ame os desprezos e a vida oculta. Dai-me força para me negar tudo o que não Vos agrada. Fazei que aceite com paz as enfermidades, as perseguições e todas as cruzes que me enviardes. Por vosso amor quisera morrer abandonado de todos, assim como Vós morrestes por meu amor. Ó Virgem Santa, as vossas orações me podem fazer achar a verdadeira fortuna, que consiste em amar muito o vosso divino Filho; por favor, rogai por mim, pois em vós confio. 

(Excertos da obra 'Meditações para Todos os Dias e Festas do Ano', Tomo I, de Santo Afonso Maria de Ligório).

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

OREMUS! (44)

A sequência completa destes pensamentos e reflexões é publicada diariamente na Página OREMUS na Biblioteca Digital deste blog.

13 DE FEVEREIRO 

Presbyteri sint ad commiserationem proni [os presbíteros devem ser movidos pela compaixão]

Era o que recomendava São Policarpo, acrescentando: Misericordes erga cunctos, non severi nimium in iudicio, scientes nos omnes debitores esse peccati [misericordiosos com todos, sem serem severos demais nos julgamentos, cientes de que todos nós estamos sob o débito do pecado; trecho da Epístola aos Filipenses, de São Policarpo de Esmirna]. 

A mansidão terá que ser a arma secreta do nosso apostolado. Fugindo à rudeza no falar, à rispidez no trato, o sacerdote será sempre o Bom Samaritano, sem fel nem vinagre, levando consigo o óleo inesgotável da misericórdia e da compreensão. Deus não quis distância entre a sua grandeza e a nossa miséria: Et homo factus est — mitis et humillis corde [E se fez homem — manso e humilde de coração].

Se pela nossa dignidade estamos muito acima dos fiéis, nem por isso precisamos olhar sempre de cima, encerrados na torre inacessível do nosso orgulho e vaidade. Estudamos mais, é certo; mas nem por isso podemos desprezar aqueles que estudaram menos. Temos certamente uma noção mais clara do Bem e do Mal; nem por isso podemos ter sempre uma palavra de crítica, à espera de todos e de tudo. Quanto mais nos julgarmos donos da verdade, tanto mais escravos seremos dos nossos erros. Não podemos fazer uma diferença que só a Deus pertence, scientes nos omnes debitores esse peccati [cientes de que todos nós estamos sob o débito do pecado].

(Oremus — Pensamentos para a Meditação de Todos os Dias, do Pe. Isac Lorena, 1963, com complementos de trechos traduzidos do latim pelo autor do blog)

terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

SUMA TEOLÓGICA EM FORMA DE CATECISMO (XXV)

XIX

ESPÉCIES DA JUSTIÇA PARTICULAR: JUSTIÇA COMUTATIVA E DISTRIBUTIVA 

Quantas espécies compreende a justiça particular? 
Duas: a distributiva e a comutativa (LXI, 1)*. 

Que entendeis por justiça distributiva? 
A justiça particular que estabelece o equitativo nas relações do grupo ou sociedade com as partes ou indivíduos (Ibid). 

Que entendeis por justiça comutativa? 
A justiça particular que governa as relações entre duas partes na mesma sociedade (Ibid). 

Que espécie de justiça preside às relações dos homens considerados como partes ou indivíduos subordinados ao todo ou sociedade?
A grande virtude da justiça legal (LXI, 1-acl 4). 

XX 

DA RESTITUIÇÃO COMO ATO DE JUSTIÇA COMUTATIVA 

Existe algum ato característico da justiça comutativa? 
Sim, Senhor; a restituição (LXII, 1). 

Que entendeis por esta palavra 'restituição'? 
O ato de restabelecer a igualdade exterior entre os homens, quando algum a quebra, apoderando-se do alheio (Ibid). 

O ato de restituir envolve sempre a reparação de uma injustiça? 
Não, Senhor; porque compreende também o ato de devolver com exatidão e escrúpulo o que em espécie se havia tomado. 

Poderíeis dar-me em poucas palavras as regras essenciais da restituição? 
Ei-las aqui como as dita a equidade natural: a restituição tem por objeto dar ou devolver o que a outro pertence ou que injustamente se lhe tirou. Deve devolver-se o subtraído ou o seu equivalente exato, no estado e forma em que atual ou virtualmente o possuía seu dono, antes do ato que modificou a posse, com mais a obrigação de compensar os estragos e prejuízos que naquele ato, ou em consequência dele, tenham sobrevindo em prejuízo do legítimo possuidor. Está obrigado a restituir o detentor ou causante voluntário da injustiça cometida. Excetuando-se a impossibilidade, deve restituir-se sem demora (LXII, 2, 8). 

XXI 

DA ACEPÇÃO DE PESSOAS: VÍCIO OPOSTO À JUSTIÇA DISTRIBUTIVA — VÍCIOS OPOSTOS À JUSTIÇA COMUTATIVA: DO HOMICÍDIO, DA PENA DE MORTE, MUTILAÇÃO, VERBERAÇÃO E ENCARCERAMENTO 

Entre os vícios opostos à virtude da justiça, há algum particularmente oposto à distributiva? 
Sim, Senhor; a acepção de pessoas (LXIII). 

Que entendeis por acepção de pessoas? 
A injustiça que comete o governante em conceder ou negar mercês e em impor ou isentar de impostos, em atenção às pessoas e não à dignidade e merecimentos que possam fazê-las dignas (LXVIII, 1). 

Quais são os vícios opostos à justiça comutativa? 
São muito numerosos e classificam-se em dois grupos (LXIII-LXXVIII). 

Quais são os que figuram no primeiro grupo? 
Os que prejudicam o próximo contra sua vontade (LXIV-LXVI). 

Poderíeis dizer-me o primeiro deles? 
O primeiro é o homicídio, pecado de ação contra o próximo e que consiste em arrebatar-lhe o maior bem que possui, que é a vida (LXIV). 

É muito grave o pecado de homicídio? 
É o maior dos pecados contra o próximo. 

Nunca é lícito atentar contra a vida do próximo? 
Não, Senhor. 

É a vida do homem um bem que nunca é lícito arrebatar-lhe? 
Nunca, exceto quando por um crime mereça ser privado dela (LIV, 2, 6). 

Quem tem neste caso o direito de a tirar? 
Somente a autoridade pública (Ibid). 

Em que se baseia este direito da autoridade pública? 
Na obrigação que tem de velar pelo bem comum (Ibid). 

Pode erigir o bem comum que se imponha a um homem a pena de morte? 
Sim, Senhor; porque bem pode ocorrer o caso em que não haja outro meio eficaz de por termo à arrogância dos criminosos ou em que a consciência pública exija esta satisfação por alguns crimes odiosos e execráveis (Ibid). 

Logo é o crime a única razão que pode invocar a autoridade pública para impor a pena de morte? 
Sim, Senhor (LIV, 6). 

A razão do bem público não poderia em algum caso justificar a morte do inocente? 
Não, Senhor; porque o bem supremo da sociedade é o bem da virtude (Ibid). 

É lícito aos particulares matar ao injusto agressor em defesa de suas pessoas ou bens? 
Não, Senhor; exceto quando seja necessário para defender a própria vida e a dos seus e não haja nenhum outro meio de repelir a agressão; e ainda neste caso, o que se defende não há de ter intenção de tirar a vida alheia, senão defender a própria (LXIV, 7). 

Quais são os outros pecados contra o próximo? 
Os de mutilação ou atentado contra a integridade; verberação, que consiste em privá-lo do repouso e tranquilidade e o encarceramento ou privação da liberdade (LXV, 1-3). 

Quando são pecaminosos estes atos? 
Quando os impõe quem não tem autoridade sobre o paciente ou se a tem, quando se excede no castigo (Ibid). 

XXII 

DO DIREITO DE PROPRIEDADE E SEUS DEVERES ANEXOS — VIOLAÇÃO DO DIREITO DA PROPRIEDADE: O ROUBO E A RAPINA 

Qual é o maior pecado contra o próximo, depois dos que o prejudicam na sua pessoa? 
Os que lhe ocasionam prejuízo em seus bens. 

Tem o homem direito de possuir alguma coisa como própria? 
Sim, Senhor; tem o direito de propriedade e de administrar suas posses, como melhor entender, sem que os outros possam intrometer-se nos seus negócios ou coagir a sua liberdade de ação (LXVI, 2). 

Em que se funda este direito? 
Na natureza humana porque, sendo o homem um ser racional, criado para viver em sociedade, assim o exige o seu próprio bem, o da família e o da coletividade de que faz parte (LXVI, 1, 2). 

Por que? 
Porque a propriedade é condição necessária para ter independência e liberdade de ação; porque é o meio por excelência para constituir e perpetuar a família e, por último, porque a sociedade obtém grandes benefícios não só porque a propriedade individual evita inumeráveis litígios e desavenças que sobre o uso das coisas possuídas em comum se produziriam, mas também porque os bens serão melhor administrados e gozados em benefício da coletividade. 

O direito de propriedade tem obrigações anexas? 
Sim, Senhor, ei-las em poucas palavras: a primeira obrigação do proprietário é não deixar improdutivos os seus bens. Descontando dos produtos o que necessita para sua vida e decoro seu e de sua família, não lhe é permitido considerar o restante como propriedade privada, excluindo em absoluto de sua participação os demais membros da sociedade; tem, por conseguinte, o dever de justiça social de repartir o supérfluo com a maior equidade possível, principalmente facilitando trabalho e ocupação para o desenvolvimento do bem estar comum e como meio para que todos possam atender às suas necessidades. A razão do bem público autoriza o Estado a tomar da propriedade o que julga necessário e útil com o objetivo de socorrer as necessidades sociais, e neste caso, os súditos estão obrigados, em justiça estrita, a conformar-se e obedecer. As necessidades particulares não impõem ao proprietário deveres tão imperiosos como as públicas e não há nesta matéria lei positiva alguma, cujo cumprimento possa exigir-se por via judicial; porém fica de pé, com toda a sua força e vigor, a lei natural e peca contra ela, faltando à obrigação primária de amar e socorrer ao próximo, quem, possuindo bens supérfluos, se desinteressa da miséria e angustiosa situação do necessitado. Esta obrigação, rigorosa por lei natural, adquire o caráter de dever sagrado em virtude da lei positiva divina, e particularmente da lei evangélica, como se Deus quisesse corroborar, impondo sanção penal, o preceito que gravara nos corações humanos (conforme LXVII, 2-7; XXXII, 5,6). 

Supostas as ditas obrigações, que direitos tem os proprietários? 
Têm direito a que todos respeitem os seus bens e a que ninguém lhes arrebate o domínio legitimo contra a sua vontade (LXVI, 5,8). 

Como se chama o ato de apropriar-se do alheio contra a vontade do proprietário?
Chama-se roubo e rapina (LXVI, 3-4). 

Que entendeis por roubo? 
O ato de tomar o alheio às escondidas do dono (Ibid). 

E o que é a rapina? 
O ato de despojar alguém de alguns dos seus bens, não às escondidas como no roubo, mas ostensiva e violentamente (LXVI. 4). 

Qual dos dois pecados é o mais grave? 
O segundo; todavia, tanto o roubo como a rapina são sempre, por sua natureza, pecados mortais, se não os escusa o pouco valor do objeto roubado (LXVI. 9). 

Logo têm os homens obrigação de abster-se de todo ato que tenha aparência de roubo? 
Sim, Senhor; porque assim o requer o bem da sociedade.

referências aos artigos da obra original

('A Suma Teológica de São Tomás de Aquino em Forma de Catecismo', de R.P. Tomás Pègues, tradução de um sacerdote secular)

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

POEMAS PARA REZAR (XXX)


'EU ESTOU COM JESUS AGORA?'

Se Jesus estivesse ao seu lado agora
em sua casa, 
no seu trabalho,
na rua,
em todos os lugares onde você está:

sua casa seria a mesma?
seu cotidiano de trabalho não mudaria?
não seriam outros seus caminhos e ruas?
em quantos destes lugares você iria voltar?

ainda leria os livros e revistas que estão sobre a sua mesa?
assistiria esse programa na TV?
passaria tanto tempo no facebook ou na internet?
seriam longas assim as suas horas de lazer?

quem sabe Ele pudesse rezar em sua companhia,
talvez lhe sussurrar uma confissão tardia,
ou lhe pedir para ver o amor de Deus nos seus filhos,
ou até mesmo querer apenas o seu silêncio.

Se Jesus estivesse ao seu lado agora
em sua casa, 
no seu trabalho,
na rua,
em todos os lugares onde você está:

ele encontraria você bem vestido,
imbuído de humildade e mansidão,
ele poderia chamar você de 'Meu filho!'
e lhe dar um abraço de Pai?

Ou Ele poderia lhe erguer do chão
movido pela misericórdia e pelo perdão
diante do seu coração arrependido
em busca da herança do filho pródigo?

Jesus está ao teu lado agora 
e este agora é toda a sua vida:
Se Jesus está sempre ao seu lado
com um tempo que vale a eternidade,
então viver uma vida de cristão
seria se perguntar a cada hora:
'eu estou com Jesus agora?'
                                                            (Arcos de Pilares)

domingo, 10 de fevereiro de 2019

'AVANÇA PARA ÁGUAS MAIS PROFUNDAS!'

Páginas do Evangelho - Quinto Domingo do Tempo Comum


'Avança para águas mais profundas' (Lc 5,4). A orientação imperativa de Jesus aos pescadores, às margens do Lago de Genesaré, é um clamor que reverbera a todos os homens de todos os tempos. Que os filhos de Deus manifestem, além dos horizontes estreitos de sua religiosidade comum, a vocação de autênticos apóstolos, movidos na plenitude do amor e da generosidade de corações verdadeiramente cristãos. Não nos basta sermos artífices da graça de Deus em nós; neste quinto domingo do Tempo Comum, Jesus nos convoca a sermos missionários das graças de Deus para a salvação de muitos.

Após uma noite de duro trabalho totalmente infrutífero, os pescadores exaustos sabiam e tinham razões mais do que suficientes para julgar que o pedido de Jesus seria inútil. Com toda a experiência acumulada de anos de pesca naquelas águas, da pescaria mais adequada sob a luz noturna, voltar às águas à luz da manhã parecia um despropósito completo. Pedro, no entanto, abre mão do seu conhecimento especializado e do seu juízo dos fatos, em obediência e em generosa confiança às palavras do Mestre: 'Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos. Mas, em atenção à tua palavra, vou lançar as redes' (Lc 5, 5). Naquele pescador de lida bruta, Jesus divisou a alma do verdadeiro apóstolo! E o milagre dos peixes antecipou o milagre da salvação dos homens. 

Quanto trabalho e esforço em vão dispensaram tantos pescadores naquela noite sem resultados... E, certamente, eles eram os mais preparados e os mais qualificados para a tarefa. Não são assim as práticas daqueles que se vêem em suas obras? Que partilham com os outros sua diligência e disponibilidade como senhores dos seus dons? E, por mais que julguemos tais obras meritórias do ponto de vista das concepções humanas, são apenas trabalho e esforço vão de pescadores qualificados e disponíveis. Porque foi o próprio Cristo quem nos alertou: 'Sem mim, nada podeis fazer' (Jo, 15,5). E nada é nada mesmo. Sem a reparação infinita por Jesus Cristo, qualquer atitude nossa, por maior que seja sua relevância e excepcionalidade, torna-se meramente figurativa e essencialmente insignificante, porque moldada na superficialidade dos valores humanos. 

Eis porque se impõe o avanço confiante às águas mais profundas, para ir ao encontro de tantos que estão perdidos no submundo das drogas, do aborto e do hedonismo, nas trevas do pecado, submersos no emaranhado de tantas consciências afastadas de Deus, na miséria do ateísmo e da indiferença religiosa. Em águas profundas, com Cristo, por Cristo e em Cristo, um nosso ato de generosidade confiante é capaz de produzir prodígios, um nosso ato de amor tem o poder de operar milagres! E, feitos apóstolos dos nossos dias, como Pedro e os homens à beira do Lago de Genesaré, poderemos ser também pescadores de homens! E, como eles, seremos aqueles outros que 'levaram as barcas para a margem, deixaram tudo e seguiram a Jesus' (Lc 5,11).

sábado, 9 de fevereiro de 2019

CANÇÕES DE FÁTIMA


Coro do Santuário de Fátima


(vídeo de autoria de Porfírio Lima e disponível no youtube)

01. Ave Maria
02. Hino dos Pastorinhos
03. Senhora, um dia descestes
04. Ave O Theotokos
05. Mater Ecclesiae
06. Magnificat
07. Ó Senhora da Azinheira
08. Ó Santíssima
09. Senhora, nós Vos louvamos
10. Bendizemos o Teu nome
11. Salve, nobre padroeira
12. Sobre os braços da azinheira
13. Senhora nossa, Senhora minha
14. Adeus de Fátima

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

08 DE FEVEREIRO - SANTA JOSEFINA BAKHITA


A primeira santa africana nasceu numa aldeia próxima a Dardur, no Sudão, por volta de 1869 – ela mesma não sabia a data precisa. Raptada por traficantes de escravos aos nove anos de idade, foi trancada inicialmente em um quarto escuro e miserável, depois espancada barbaramente e vendida cinco vezes nos mercados do Sudão, padecendo todo tipo de humilhação e selvageria nas mãos dos seus senhores. Este martírio atroz desde tenra idade roubou-lhe o próprio nome; o nome Bakhita - 'afortunada' em árabe -  foi-lhe dado pelos próprios traficantes.

Mas o pior dos tormentos ainda estava por vir. Comprada por um general turco, foi submetida a sofrimentos inimagináveis a serviço da mãe e da esposa deste homem, que incluíram dezenas de tatuagens no seu corpo abertas por navalha e que lhe legaram 144 cicatrizes e um leve defeito ao caminhar. A descrição destes tormentos foi assim exposta nas palavras da santa:

'Uma mulher habilidosa nesta arte cruel [tatuagem] veio à casa principal... nossa patroa colocou-se atrás de nós, com o chicote nas mãos. A mulher trazia uma vasilha com farinha branca, uma vasilha com sal e uma navalha. Quando terminou de desenhar com a farinha, a mulher pegou da navalha e começou a fazer cortes seguindo o padrão desenhado. O sal foi aplicado em cada ferida... Meu rosto foi poupado, mas 6 desenhos foram feitos em meus seios, e mais 60 em minha barriga e braços. Pensei que fosse morrer, principalmente quando o sal era aplicado nas feridas... foi por milagre de Deus que não morri. Ele havia me destinado para coisas melhores'.

Em 1882, com o retorno do general à Turquia, Bakhita foi comprada pelo cônsul italiano Calixto Legnani que a tratou como serviçal e não como escrava, sem humilhações e castigos. Diante de uma revolução nacionalista no Sudão, o cônsul retornou à itália levando Bakhita consigo, que foi cedida então a amigos do cônsul, o casal Michieli, em cuja casa começou a morar na região do Veneto, tendo por encargo especial os cuidados da filha do casal, a pequena Mimina. Foi nesta família católica que Bakhita conheceu a revelação de Jesus Cristo, sua flagelação e sua morte de cruz. O caminho de Bakhita estava traçado: da conversão à santidade pela via da caridade e do perdão. 

Em 9 de janeiro de 1890, foi batizada e crismada com o nome de Josefina e recebeu a Sagrada Comunhão das mãos do Patriarca de Veneza. Pouco depois, solicitou seu ingresso no Instituto das Filhas da Caridade, fundado por Santa Madalena de Canossa. Em 8 de dezembro de 1896, em Verona, pronunciou os votos finais de religiosa da congregação. A partir de então, por mais de 50 anos, sua vida foi um ato constante de amor a Deus e à caridade para com todos. Além de operosa nos serviços simples como na sacristia e na portaria do convento, realizou várias viagens através da Itália para difundir a sua missão: a libertação dada a ela pelo encontro com Cristo deveria ser compartilhada com o maior número possível de pessoas; a redenção que experimentara não podia ser guardada como posse, mas levada como sinal de esperança para todos.


Em 8 de fevereiro de 1947, após muito sofrimento de doenças como bronquites e pneumonias, a Irmã Josefina faleceu no convento canossiano de Schio, com a idade de 78 anos. Na hora da sua morte, seu semblante pareceu iluminar-se e exclamou com alegria suas últimas palavras 'Como estou contente! Nossa Senhora, Nossa Senhora!' A Irmã Moretta - a Irmã Morena - como era carinhosamente conhecida entregava serenamente a sua alma ao Senhor, rodeada pela comunidade em pranto e em oração. Seu corpo foi enterrado originalmente na capela de uma família de Schio, para um sepultamento definitivo posterior no Templo da Sagrada Família. Quando isso foi finalmente preparado, verificou-se que o corpo de Bakhita estava incorrupto, sendo o mesmo sepultado então sob o altar da igreja do mesmo convento. Em 17 de maio de 1992 foi beatificada e, em 1º de outubro de 2000, foi elevada à honra dos altares e declarada santa pelo Papa João Paulo II.