sexta-feira, 17 de novembro de 2023

DOUTORES DA IGREJA (XXXI)

  31Santa Teresa de Ávila, Virgem (†1582)

Doutora da Espiritualidade

(1515 - 1582)

Concessão do título: 1970 - Papa Paulo VI
Celebração: 15 de outubro (Memória Obrigatória)

 Obras e Escritos 

  • Autobiografia (Livro da Vida)
  • O Caminho da Perfeição
  • Meditações sobre o Cântico dos Cânticos
  • O Castelo Interior
  • Relações (complemento da sua Autobiografia)
  • Conceitos de Amor
  • Exclamações
  • Cartas
  • Poemas

quinta-feira, 16 de novembro de 2023

OS FUNDAMENTOS DA REGRA ECLESIÁSTICA: FAZER O QUE SE PREGA!

Somos todos fracos, confesso, mas o Senhor Deus nos entregou meios com os quais, se quisermos, poderemos ser fortalecidos com facilidade. Tal sacerdote desejaria possuir uma vida íntegra, que dele é exigida, ser continente e ter um comportamento angélico, como convém, mas como se não se resolve a empregar estes meios: jejuar, orar, fugir das más conversas e de nocivas e perigosas familiaridades.

Queixa-se de que, ao entrar no coro para a salmodia, ao dirigir-se para celebrar a missa, logo mil pensamentos lhe assaltam a mente e o distraem de Deus. Mas, antes de ir ao coro ou à missa, que fez na sacristia, como se preparou, que meios escolheu e empregou para fixar a atenção?

Queres que te ensine a caminhar de virtude em virtude e como seres mais atento ao ofício, ficando assim teu louvor mais aceito de Deus? Escuta o que digo. Se ao menos uma fagulha do amor divino já se acendeu em ti, não a mostres logo, não a exponhas ao vento! Mantém encoberta a lâmpada, para não se esfriar e perder o calor; isto é, foge, tanto quanto possível, das distrações; fica recolhido junto de Deus, evita as conversas vãs.

Tua missão é pregar e ensinar? Estuda e entrega-te ao necessário para bem exerceres este encargo. Faze, primeiro, por pregar com a vida e o comportamento. Não aconteça que, vendo-te dizer uma coisa e fazer outra, zombem de tuas palavras, abanando a cabeça.

Exerces a cura de almas? Não negligencies por isso o cuidado de ti mesmo, nem dês com tanta liberalidade aos outros que nada sobre para ti. Com efeito, é preciso te lembrares das almas que diriges, sem que isto te faça esquecer da tua.

Entendei, irmãos, nada mais necessário aos eclesiásticos do que a oração mental que precede, acompanha e segue todos os nossos atos: 'Salmodiarei, diz o Profeta, e entenderei' (cf Sl 100). Se administras os sacramentos, ó irmão, medita no que fazes; se celebras a missa, medita no que ofereces; se salmodias no coro, medita a quem e no que falas; se diriges as almas, medita no sangue que as lavou e, assim, tudo o que é vosso se faça na caridade (1Cor 16,14). Deste modo, as dificuldades que encontramos todos os dias, inúmeras e necessárias, serão vencidas com facilidade. Teremos, assim, a força de gerar Cristo em nós e nos outros.

(São Carlos Borromeu)

quarta-feira, 15 de novembro de 2023

TESOURO DE EXEMPLOS (266/270)

 

266. OITO HORAS POR DIA

São Alfredo Magno, rei da Inglaterra, consagrava todos os dias oito horas à oração ou à leitura de livros piedosos. Outras oito horas aos negócios do Estado e oito horas ao descanso e às demais necessidades e ocupações. Levantava-se muito cedo e ia à capela, onde, prostrado por terra, fazia a sua oração.

267. UM PROTESTANTE

Um protestante teve a curiosidade de entrar numa igreja durante a missa em um domingo e pôs-se a observar os fiéis. Ao sair disse: 'Os católicos dizem que Jesus Cristo está presente na Eucaristia; mas muitos deles não creem nisso; do contrário, procederiam com mais respeito durante a missa'.

268. EM QUE TE OCUPAS?

Queixava-se um jovem ao seu confessor, dizendo-lhe que ouvia mal a missa.
➖ Que fazes durante a missa? Em que te ocupas?
➖ Não faço outra coisa senão chorar os meus pecados.
➖ Continue assim, meu amigo; desse modo ouves muito bem a missa.

269. AQUELE É MEU PAI

O imperador da Áustria, José II, ordenara que os presidiários fossem empregados em trabalhos públicos. Alguns deles varriam a praça de Santo Estevão, em Viena. Um ministro observou que um moço bem trajado se aproximava de um daqueles varredores e beijava-lhe a mão. Um dia mandou chamar o moço e disse-lhe que aquele modo de agir não lhe convinha.

'Senhor' - disse o jovem - 'esse condenado é meu pai'. Comovido, o ministro referiu o fato ao imperador, o qual pôs o preso em liberdade, dizendo: 'Quem sabe educar seus filhos desta maneira não pode ser um malfeitor'.

270. GUARDÁ-LO-EI COMO LEMBRANÇA

Um inglês visitava a cidade de Viena. Entrou em uma loja de cabeleireiro no momento em que uma jovem oferecia sua formosa cabeleira pelo preço de dez coroas. Já se dispunha o cabeleireiro a cortá-la, quando o visitante quis saber por que a jovem ia sacrificar seus cabelos.

➖ Senhor - disse a jovem - meu pai foi negociante opulento; mas as coisas foram mal; agora ele é velho e desamparado; minha mãe está enferma e, como não encontro outra solução melhor, vejo-me obrigada a vender a minha cabeleira.
➖ A senhora não venda seus cabelos tão barato. Eu o pagarei melhor. E, entregando-lhe cem libras esterlinas, tomou a tesoura e disse:
➖ Permita-me que lhe corte um só fio do seu cabelo que guardarei como lembrança do seu amor filial.
Aquelas cem libras serviram de base para eles, em pouco tempo, reconstituírem a fortuna perdida.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)


terça-feira, 14 de novembro de 2023

O DOM DA PIEDADE

O dom do temor de Deus destina-se a curar em nós a chaga do orgulho; o dom da piedade é derramado em nossas almas pelo Espírito Santo para combater o egoísmo, que é uma das paixões más do homem decaído por causa do pecado original, e o segundo obstáculo à sua união com Deus. O coração do cristão não deve ser nem frio nem indiferente; é preciso que seja terno e devotado; do contrário não poderá se elevar à via para a qual Deus, que é amor, dignou-se chamá-lo. 

Assim o Espírito Santo produz no homem o dom da piedade, inspirando-lhe um retorno filial para seu Criador. 'Vós recebestes o Espírito de adoção' - nos diz o Apóstolo - 'e é por este Espírito que gritamos para Deus: Pai! Pai!'. Essa disposição torna a alma sensível a tudo o que toca a honra de Deus. Faz o homem alimentar em si mesmo a compunção dos seus pecados, tendo em vista a infinita Bondade que se dignou suportá-lo e perdoá-lo e o pensamento dos sofrimentos e da morte do Redentor. A alma iniciada no dom de piedade deseja constantemente a glória de Deus e quer por todos os homens aos seus pés; e os ultrajes que Ele recebe lhe são particularmente sensíveis. 

Sua alegria é ver o progresso das almas no amor e as devoções que este amor lhes inspira por Aquele que é o soberano Bem. Cheia de submissão filial para com o Pai universal que está nos céus, essa alma está pronta para todas as suas vontades. Resigna-se de coração com todas as disposições da Providência. Sua fé é simples e viva. Mantém-se amorosamente submissa à Igreja, sempre pronta a renunciar às suas próprias ideias e àquelas mais caras, se estas afastam-se de alguma forma de seu ensinamento ou de sua prática, tendo um horror instintivo da novidade e da independência. Essa devoção para com Deus que o dom de piedade inspira, unindo a alma a seu Criador pela afeição filial, a une, também, com uma afeição fraternal, a todas as criaturas, já que estas são obra do poder de Deus.

Em primeiro lugar, nas afeições do cristão animado pelo dom de piedade, estão as criaturas glorificadas, das quais, Deus goza eternamente e as quais se deleitam dEle para sempre. Ama ternamente a Santíssima Virgem Maria e é zeloso de sua honra; venera com amor os santos e os atos heroicos de virtude realizados pelos amigos de Deus; delicia-se com seus milagres, honra religiosamente suas relíquias sagradas. Mas sua afeição não é apenas pelas criaturas coroadas no céu; aquelas que ainda estão aqui embaixo ocupam um lugar importante em seu coração. O dom de piedade faz com que ele encontre nelas o próprio Jesus. Sua boa vontade para com seus irmãos é universal. Seu coração está inclinado ao perdão das injúrias, a suportar as imperfeições do outro, a desculpar as imperfeições do próximo. É compassivo para com o pobre, solícito aos pés do doente. Uma doçura afetuosa revela o fundo do seu coração e em suas relações com os irmãos da terra, o vemos sempre disposto a chorar com os que choram, a se alegrar com os que se alegram. 

Tal é, ó Divino Espírito, a disposição daqueles que cultivam o dom de piedade que derramais em suas almas. Por esse inefável benefício, neutralizais o triste egoísmo que afloraria em seus corações, livrando-os de uma frieza odiosa que torna o homem indiferente aos seus irmãos e fechais suas almas à inveja e ao ódio. Para isso, só foi preciso esta piedade filial para com o Criador; que enterneceu seus corações, fundindo-os com uma viva afeição por tudo o que sai das mãos de Deus. Fazei frutificar em nós este dom tão precioso, ó Divino Espírito! Não permitais que ele seja abafado pelo amor de nós mesmos. Jesus nos encorajou dizendo-nos que seu Pai Celeste 'faz o sol nascer sobre os bons e os maus'; não permitais, Divino Paráclito, que uma tão paternal indulgência seja um exemplo perdido para nós e dignai-vos desenvolver em nossas almas o germe de devoção, da benevolência e da compaixão que vos dignastes infundir no momento em que de nós tomastes possessão pelo santo batismo.

(Excertos da obra 'Os Dons do Espírito Santo', de Dom P. Gueranger)

domingo, 12 de novembro de 2023

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'A minh'alma tem sede de vós e vos deseja, ó Senhor!' (Sl 62)

Primeira Leitura (Sb 6,12-16) - Segunda Leitura (1Ts 4,13-18)  -  Evangelho (Mt 25,1-13)

 12/11/2023 - Trigésimo Segundo Domingo do Tempo Comum

51. A PARÁBOLA DAS DEZ VIRGENS


No Evangelho deste domingo, Jesus nos exorta a praticar a vigilância constante em relação à hora da nossa morte pois ela há de vir na hora mais inesperada: 'ficai vigiando, pois não sabeis qual será o dia nem a hora' (Mt 25, 13). No fim da nossa vida, não haverá mais tempo para prover-nos tributos de salvação e então, no Juízo Particular, Deus vai nos pedir contas da nossa vigilância à Sua Santa Vontade, do cumprimento de nossas ações cristãs e do acervo das graças recebidas e dos talentos aproveitados ou não. Neste momento tremendo de nossa existência, seremos julgados previdentes ou imprevidentes pelo Pai e merecedores ou não do Reino dos Céus.

São palavras de salvação, porque a única coisa realmente importante para o homem é a salvação eterna de sua alma, expressas sob a forma da parábola das dez virgens (Mt 25, 1 - 13) que esperam a chegada do noivo, que tarda a chegar. O ingresso no Reino de Deus se assemelha às núpcias das festas de casamento daquele tempo em que a entrada da esposa na casa do esposo era um evento singular, marcado pela condução ritual da noiva por um certo número de virgens auxiliares.

Na narração evangélica, estas virgens são dez ao todo, cinco delas previdentes e outras cinco imprevidentes. As primeiras, prevendo uma eventual demora do noivo (o Senhor), guardaram uma provisão de óleo para manterem acesas as suas lâmpadas qualquer que fosse a hora que o noivo chegasse; ao contrário, as virgens imprudentes, não tendo o mesmo cuidado, viam angustiadas o óleo ser consumido e as suas lâmpadas prestes a se apagarem. E então recorrem desesperadamente às primeiras para que estas lhes forneçam o óleo necessário, o que lhes é negado peremptoriamente. Na morte, na nossa morte, não teremos tempo nem acesso a 'óleos' alheios, a provisão dos nossos méritos será fruto tão somente daquilo que efetivamente levarmos desta vida.

Diante de Deus, cada um de nós deverá responder por si, como resultado de um julgamento pessoal e intransferível. Ou apresentamos as lâmpadas acesas da graça, providas pelo óleo abundante da fé, para merecermos entrar no Reino de Deus ou ficaremos às escuras diante da porta fechada e da terrível sentença do juiz eterno: 'Não vos conheço!' (Mt 25, 12): 'Não vos conheço, porque não seguistes os meus mandamentos, não vivestes segundo os meus princípios e leis, não vos tornastes na terra herdeiros dos Céus!'

sábado, 11 de novembro de 2023

SERMÕES DO CURA D'ARS (XIV)

 SOBRE OS MANDAMENTOS DE DEUS

'Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças' (Dt 6,5)

O Senhor nos deu o mandamento de o amarmos como Ele nos ama, com todo o nosso coração, com toda a nossa alma e com todas as nossas forças; e, assim, nos promete a recompensa eterna se cumprirmos fielmente o mandamento e nos ameaça com o castigo eterno se não o cumprirmos. Se somos assolados por tantos problemas neste mundo, é porque negligenciamos os mandamentos de Deus; pois Ele mesmo disse: 'Se guardardes fielmente os meus mandamentos, abençoar-vos-ei de muitas maneiras; se, porém, os transgredirdes, sereis amaldiçoados em tudo o que fizerdes'. Se, pois, meus caros irmãos, quisermos ser felizes neste mundo, na medida do possível, não temos outro meio para isso senão guardar fielmente os mandamentos de Deus; veremos que, se nos desviarmos do caminho que nos é indicado pelos mandamentos de Deus, a alma e o corpo serão infelizes, tanto neste como no outro mundo. A nossa bem aventurança eterna depende da nossa fiel observância aos mandamentos que o bom Deus nos deu, mas Deus recompensa já nesta vida aqueles que lhe são fiéis e eu vou mostrardes isso hoje.

A felicidade dos que obedecem aos mandamentos de Deus e a infelicidade dos que não os cumprem

Se, meus caros irmãos, abrirmos as Escrituras, encontraremos que todos aqueles que se empenharam em observar corretamente os mandamentos de Deus foram sempre felizes, porque Deus nunca abandona aqueles que se empenham em fazer aquilo que lhes ordena. Adão é um bom exemplo disso. Enquanto observou fielmente os mandamentos do Senhor, encontrava-se num estado de felicidade em todos os aspectos; seu corpo, sua alma, sua mente e todos os seus sentidos estavam voltados somente para Deus e até os anjos desceram do céu para lhe fazer companhia. A felicidade dos nossos primeiros pais teria permanecido a mesma para sempre, se tivessem continuado fiéis aos seus deveres; mas esse estado feliz não durou muito. O espírito maligno, invejoso de tal felicidade, mergulhou-os na ruína e roubou-lhes todos os seus bens, dos quais deveriam ter desfrutado por toda a eternidade. Assim que tiveram a infelicidade de transgredir os mandamentos do Senhor, tudo deu errado para com eles; problemas e preocupações, doenças, medo da morte, do julgamento e da punição na outra vida tomaram o lugar de sua felicidade anterior; sua vida agora não era nada além de um estado permanente de lágrimas e sofrimentos.

O Senhor disse a Moisés: 'Diz ao meu povo que, se observarem fielmente os meus mandamentos, enchê-los-ei de toda a espécie de bênçãos; mas se ousarem transgredi-los, castigá-los-ei com toda a espécie de sofrimentos'. Deus disse a Abraão: 'Porque guardaste fielmente os meus mandamentos, abençoar-te-ei em tudo. Abençoarei todos os que te abençoarem, amaldiçoarei todos os que te amaldiçoarem; da tua raça nascerá o Redentor do mundo'. Ele deu a conhecer ao povo de Abraão, quando chegou o momento de entrarem na terra prometida: 'Os povos que habitavam nesta terra cometeram grandes pecados; por isso, eu os expulsarei e colocar-vos-ei no seu lugar. Mas não transgridais os meus mandamentos. Se os guardares fielmente, eu abençoar-te-ei em tudo e sobre tudo. Quando estiverdes nos campos ou nas vossas casas, abençoarei os vossos filhos, que vos amarão, respeitarão e obedecerão, e vos darão toda a espécie de consolação. Ordenarei aos céus que vos deem chuva no momento oportuno, tanto quanto for necessário para regar os vossos campos e os vossos prados; tudo prosperará convosco'. Em outro lugar das Escrituras, Deus diz: 'Se guardardes fielmente os meus mandamentos, velarei incessantemente pela vossa conservação; podereis estar sem medo nas vossas casas; impedirei que as feras vos façam mal; podereis dormir em paz; nada vos perturbará. Estarei sempre convosco. Caminharei convosco. Eu sou o vosso Deus, e vós sereis o meu povo'. E ainda falou a Moisés: 'Dizei ao meu povo que, se guardarem os meus mandamentos, livrá-los-ei de todos os males que os oprimem'. E o Espírito Santo diz que 'aquele que guarda os mandamentos do Senhor é mais feliz do que se possuísse toda a riqueza da Terra'.

Ora, já pensastes que Deus dá tanta importância à observância dos seus mandamentos e que promete tão grandes benefícios em troca da sua fiel observância? Concordareis então comigo que toda a nossa felicidade consiste em guardar fielmente os mandamentos. Para vos provar, caros irmãos que, desde que transgridamos os mandamentos, só podemos ser infelizes, deixemos que Davi nos sirva de exemplo. Enquanto trilhou o caminho que os mandamentos lhe prescreveram, tudo lhe correu bem: era amado, estimado e obedecido pelos seus vizinhos. Mas, no exato momento em que deixou de observar os mandamentos, a sua felicidade terminou e toda a espécie de problemas o assaltou. A ansiedade e o remorso de consciência tomaram o lugar da paz e do contentamento que até então desfrutara. Lágrimas e sofrimentos eram o seu pão de cada dia. Um dia, enquanto lamentava os seus pecados, foi informado de que o seu filho Amon tinha sido trespassado com uma espada pelo seu irmão Absalão, num acesso de embriaguez. Absalão tentou destituir o pai, intentando até a sua morte, para poder reinar em seu lugar; Davi foi obrigado a esconder-se em um bosque para escapar à morte. Além disso, a peste matou um grande número de súditos de Davi.

Salomão nos dá outro exemplo. Enquanto guardou fielmente os mandamentos, teve a admiração do mundo; a sua fama chegou até aos confins da terra; a rainha de Sabá chegou mesmo a vir de longe para testemunhar as maravilhas que o Senhor tinha operado nele; mas, assim que teve a infelicidade de deixar de observar os mandamentos, tudo lhe correu mal. Ao ouvir esses exemplos, mesmo que sejam tirados do Antigo Testamento, concordareis comigo, queridos irmãos, que todos os nossos problemas decorrem do fato de não observarmos fielmente os mandamentos de Deus, e que, se esperamos felicidade e paz, tanto quanto podemos esperar possuir neste mundo, neste vale de sofrimento e tristeza, então, eu digo, o único meio de garantir esses benefícios é fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para agradar a Deus - tudo, portanto, que Ele nos pede para seguir os seus mandamentos.

Mas, se passarmos ao Novo Testamento, descobrimos que Cristo Nosso Senhor nos exorta constantemente a observar os mandamentos e nos promete uma grande recompensa. Jesus Cristo nos promete o céu, porque nada nesta terra é capaz de satisfazer o coração do homem, que foi criado unicamente para Deus, e que o homem não pode encontrar a felicidade senão em Deus. Jesus Cristo exorta-nos urgentemente a preocuparmo-nos pouco com as coisas deste mundo e a procurarmos as bênçãos do Céu, que nunca terão fim. Lemos no Evangelho que Jesus Cristo, estando certa vez entre certas pessoas que pareciam pensar apenas nas suas necessidades corporais, disse-lhes: 'Não vos preocupeis tanto com o que haveis de comer, nem com o que haveis de vestir'. E, querendo fazer-lhes compreender que tudo o que diz respeito ao corpo é de pouca importância, disse-lhes: 'Considerai os lírios do campo, que não trabalham nem fiam, e eis que vosso Pai celeste os veste; pois eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles. Observai as aves do céu: elas não semeiam nem ceifam, nem ajuntam em celeiros, mas vede como o vosso Pai celestial cuida delas. Ó vós, de pouca fé, não sois mais importantes do que elas? Buscai primeiro o Reino dos Céus, isto é, guardai fielmente os meus mandamentos, e todas as outras coisas vos serão acrescentadas, para além delas'. O que é que devemos deduzir destas palavras, caros irmãos? Apenas isto, que um cristão que procura, em primeiro lugar, agradar a Deus e salvar a sua alma, nunca passará falta em suas necessidades corporais.

Mas, dirás, talvez, se não tivermos nada, ninguém nos dará nada! Responder-vos-ei que tudo o que temos vem da beneficência de Deus e não de nós próprios. Se quereis, meus caros irmãos, experimentar a grandeza da bondade de Deus, fazei o dever de observar exatamente o que os mandamentos vos ordenam, e vereis com espanto como Deus cuida daqueles que se esforçam por agradá-lo. Se quiserdes ver uma prova disso, voltai-vos para as páginas da Sagrada Escritura, e lá encontrareis plena confirmação disso. Lemos, por exemplo, na Sagrada Escritura que o profeta Elias se escondeu num bosque para escapar às perseguições da rainha Jezabel. Ali, privado de todo auxílio humano, pensais que o Senhor o deixou morrer de fome? Não, caros amigos, certamente que não. O Senhor não perdeu de vista o seu servo fiel. Enviou imediatamente um anjo do céu para o consolar e lhe trazer tudo o que era necessário para a sua subsistência. Vede também como o Senhor se preocupou com a viúva de Sarepta. Ele disse aos seus profetas: 'Procurai esta boa viúva, que tão fielmente me serve e guarda os meus mandamentos; aumentai-lhe a provisão de alimentos, para que não tenha fome'. Outro exemplo é a sua ordem a um dos profetas, Habacuc, para levar comida a Daniel na cova dos leões em Babilônia. 

Todos esses exemplos são tirados do Antigo Testamento mas, no Novo Testamento, os milagres que Deus opera em favor daqueles que observam seus mandamentos não são menos grandiosos ou numerosos. Vede como Deus, com cinco pequenos pães e dois peixes, alimentou milhares de pessoas que, seguindo Jesus Cristo, procuravam o reino dos Céus e a santificação das suas almas. Vede como, durante quarenta anos, Ele proveu o sustento do santo eremita Paulo por meio de um corvo; prova inequívoca de que Deus nunca perde de vista aqueles que o amam, e que lhes fornece tudo o que é necessário. Ó meu Deus, como é grande o vosso amor por aqueles que vos amam! Que cuidado tendes para que não lhes falte nada! Dizei-me, caríssimos irmãos, quem deixou que as provisões de cada dia fossem levadas por um cão a São Roque no deserto? Não foi Deus, meus caros irmãos? E por que é que Deus cuidou tanto do sustento de todos os santos, se não foi senão porque eles observaram fielmente os mandamentos que Ele nos deu?

Sim, queridos irmãos, podemos dizer com segurança que os santos encontravam toda a sua felicidade em guardar os mandamentos e que preferiam sofrer o martírio a transgredi-los; e os mártires não sofreram torturas e morte apenas porque não ousaram transgredir os mandamentos de Deus? Que vergonha para nós, queridos irmãos, quando, no dia do juízo, nos defrontarmos com esses mártires; nós que tantas vezes somos levados a agir pelo simples pensamento 'daquilo que nos pode dizer o mundo' ?Sim, queridos irmãos, se quisermos alcançar a verdadeira felicidade, as próprias palavras de Deus e a história, tanto da antiga como da nova lei, ensinam que é necessária a exata observância dos mandamentos. E uma vez que Deus, em sua misericórdia, nos ajuda com a sua graça a observá-los, por que deveríamos recuar e ser tão temerosos?

Que a nossa firme resolução desta manhã seja obedecer fielmente os mandamentos de Deus e não deixar que qualquer consideração de ganho ou perda terrena, de medo ou favor, nos induza a transgredi-los, para que no fim dos nossos dias possamos ter a grande sorte de olhar para trás e ver uma vida temente a Deus e fiel, que nos abrirá as portas de uma recompensa eterna, o que desejo a todos vós. Amém.